Acórdão nº 54/19.6GESLV-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 09 de Março de 2020

Magistrado ResponsávelFERNANDO RIBEIRO CARDOSO
Data da Resolução09 de Março de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora
  1. RELATÓRIO O senhor juiz do Juízo de competência genérica de Silves, da comarca de Faro, veio, nos termos do artigo 35.º, n.º1 do CPP, denunciar a existência de um alegado conflito negativo de competência e suscitar a sua resolução, porquanto, no âmbito dos autos de processo comum singular com o n.º 54/19.6GESLV, na qualidade de juiz substituto (despacho proferido em 23-12-2019) declarou-se incompetente para a realização do julgamento do referido processo, por entender que competente para tal, por não se verificar qualquer motivo de impedimento, é o senhor Juiz 1, Dr. AA, do Juízo de competência genérica de Silves, a quem o processo foi distribuído para julgamento, o qual se havia declarado impedido para presidir à audiência de julgamento, face ao disposto no art. 40.º, al. a), do CPP.

    Estando certificado que o trânsito da decisão proferida em 2.º lugar ocorreu no dia 10 de fevereiro de 2020 e não sendo passível de recurso a decisão proferida pelo senhor juiz titular do processo, quanto ao seu alegado impedimento, estão criadas as condições para apreciar e resolver o impasse derivado das sobreditas decisões.

    Cumprido o disposto no artigo 36.º, n.º1 do CPP, o Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto é de parecer que inexiste fundamento para a declaração de impedimento do senhor juiz titular do processo e, por isso, deverá ser declarada a sua competência para a realização do julgamento e ulteriores termos do processo.

  2. FUNDAMENTAÇÃO: Nos referidos autos, o Meritíssimo juiz titular do processo, Dr. AA, proferiu em 16-12-2019 o despacho de saneamento, a que alude o artigo 311.º do CPP, tendo recebido a acusação deduzida contra o arguido AR, pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152.º, n.º1, al. b) e n.º2, al. a), n.º4 e 5 do Código Penal. E, sem ter designado data para a realização do julgamento, pronunciando-se sobre o estatuto processual do arguido, determinou que este aguardasse os ulteriores termos do processo sujeito a TIR (já prestado), bem como sujeito à proibição de se aproximar da residência da vítima, e do eventual local de trabalho desta, com sujeição a pulseira eletrónica; bem assim a proibição de quaisquer contactos com a ofendida e a proibição de aquisição de armas de fogo, ou outras com potenciais efeitos letais, tudo nos termos dos artigos 191.º, 192.º, 194.º, 195.º, 196.º e 200.º, n.º1, al. a), d) e e) do CPP. E, nos termos do artigo 40.º, n.º1, al. a) do CPP, declarou-se impedido para presidir à audiência de julgamento e ordenou que os autos fossem conclusos ao senhor juiz Dr. AF, para os efeitos tidos por convenientes.

    O senhor juiz substituto, a quem o processo foi concluso, por seu despacho de 23-12-2019, declarou-se incompetente para a tramitação do processo, por considerar inexistir fundamento legal para a declaração de impedimento que foi prolatada, (cujos fundamentos não se transcrevem, por não nos ter sido enviado o suporte informático, em formato word, e para não atrasar mais a resolução da questão).

    Na sequência foi suscitado o presente conflito.

  3. O direito A questão é, saber se há fundamento de impedimento do senhor juiz titular do processo e os trâmites processuais devem ser prosseguidos pelo senhor juiz substituto ou, não se verifica esse fundamento de impedimento e, respeitando o princípio constitucional do juiz natural, deve ser o senhor juiz titular a prosseguir com o processo.

    É manifesto que não nos deparamos com um verdadeiro conflito negativo de competência, tendo em conta que este, de acordo com o disposto no art. 34.º, do CPP, só ocorre quando dois ou mais tribunais de diferente ou da mesma espécie se considerarem competentes ou incompetentes para conhecer do mesmo crime imputado ao mesmo arguido.

    No caso em apreço, o senhor juiz titular do processo declarou-se impedido para o julgamento, por ter aplicado medida de coação ao arguido, prevista no artigo 200.º do CPP, e determinou a apresentação dos autos ao juiz substituto.

    Sendo irrecorrível o despacho em que o juiz se considere impedido (cf. artigo 42.º, n.º 1, do CPP), sem a intervenção deste tribunal, a situação exposta redundaria, no domínio dos atos em causa, numa interrupção da relação processual penal, impasse a determinar que se considere verificar-se um conflito de competência atípico, definidor de uma situação que reclama solução urgente, desde logo, atenta a natureza urgente do processo em que foi suscitado (processo por crime de violência doméstica) decidindo se há real motivo de impedimento e, em tal situação, fazer funcionar o regime de substituição.

    Vejamos.

    Dispõe o artigo 40.º do CPP, sob a epígrafe de «Impedimento por participação em processo» Nenhum juiz pode intervir em julgamento, recurso ou pedido de revisão relativos a processo em que tiver: a) Aplicado medida de coação prevista nos artigos 200.º a 202.º; b) Presidido a debate instrutório; c) Participado em julgamento anterior; d) Proferido ou participado em decisão de recurso anterior que tenha conhecido, a final, do objeto do processo, de decisão instrutória ou de decisão a que se refere a alínea a), ou proferido ou participado em decisão de pedido de revisão anterior.

    e) Recusado o arquivamento em caso de dispensa de pena, a suspensão provisória ou a forma sumaríssima por discordar da sanção proposta.

    O senhor juiz titular do processo fundamenta o seu impedimento na alínea a) do transcrito preceito, por ter aplicado ao arguido, no despacho que recebeu a acusação, medida de coação prevista nas alíneas a), d) e e) do art. 200.º do CPP.

    Por sua vez, o senhor juiz substituto diz que o invocado impedimento não se verifica, uma vez que os autos se encontram na fase de julgamento, não tendo tido o senhor juiz em questão qualquer intervenção na fase de inquérito do presente...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT