Acórdão nº 1159/18.6T8LLE.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Setembro de 2020

Magistrado ResponsávelMÁRIO COELHO
Data da Resolução24 de Setembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Sumário: (…) Acordam os Juízes da 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: No Juízo Local Cível de Loulé, em 05.04.2018, (…) demandou (…) e (…), pedindo que, em virtude da resolução do contrato, fosse o 1.º R. condenado a entregar imediatamente os imóveis livres e devolutos, com excepção dos bens constantes do inventário; que ambos os RR. fossem condenados, solidariamente, no pagamento das rendas vencidas e não pagas, na data da apresentação da petição inicial fixadas em € 9.850,00, e ainda nas vincendas até à entrega dos imóveis, acrescidas da indemnização legal, no montante de € 14.775,00, e nos correspondentes juros de mora à taxa legal; e que o 1.º R. fosse condenado a realizar as reparações necessárias para restituir os imóveis no estado em que os recebeu.

De acordo com a causa de pedir, o A. era proprietário de duas fracções autónomas e do estabelecimento de cafetaria, bar e bebidas instalado em ambas as fracções. Em 01.05.2012, o A. cedeu ao 1.º R. a exploração do estabelecimento comercial, pelo prazo de cinco anos, renovável por iguais períodos, salvo denúncia efectuada com 90 dias de antecedência; por carta registada com A/R datada de 30.01.2017, o A. opôs-se à renovação automática do contrato, procedendo à sua denúncia, mas o 1.º R. nunca procedeu à entrega das fracções; acresce que, tendo sido estipulado que as rendas seriam pagas no primeiro dia útil do mês anterior àquele a que dissessem respeito, o 1.º R. pagou as rendas de Janeiro e Fevereiro de 2017 após esse prazo, e depois deixou de as pagar na íntegra (à data da propositura da acção, faltava pagar parte das rendas relativas aos meses de Março a Outubro de 2017, e as rendas de Novembro de 2017 a Abril de 2018 encontravam-se totalmente por pagar, num total de € 9.850,00); acresce, ainda, que o 1.º R. retirou do estabelecimento os respectivos móveis e utensílios, alterou o respectivo nome, não subscreveu o seguro de incêndio e efectuou obras não autorizadas, violando cláusulas do contrato, motivo pelo qual procedeu à resolução do contrato, por notificação judicial avulsa; finalmente, o 2.º R. constituiu-se fiador e principal pagador de todas as obrigações assumidas no contrato.

Na contestação afirma-se que não foi estipulada a submissão do contrato ao regime do arrendamento, pelo que a sua resolução não está sujeita às regras previstas para esse regime; por outro lado, as rendas encontram-se pagas, sublinhando que a maioria dos pagamentos era efectuado em dinheiro, sem entrega de recibo; quanto às alterações introduzidas no estabelecimento, foram conhecidas e aprovadas pelo Autor.

Realizado julgamento, a sentença julgou a causa procedente, declarando resolvido o contrato de arrendamento relativo ao estabelecimento comercial instalado nas fracções identificadas nos autos, condenando os RR. a entregar o arrendado ao A., no prazo de um mês, livre e devoluto, com excepção dos bens constantes do inventário anexo ao contrato, mais condenando os RR. a pagar as rendas actualmente em dívida – Novembro de 2018 e seguintes, acrescidas de juros de mora, à razão de € 850,00 nos meses de Janeiro, Fevereiro, Março, Abril, Maio, Junho, Outubro, Novembro e Dezembro, e de € 1.250,00 nos meses de Julho, Agosto e Setembro, e bem assim no pagamento de € 850,00 por cada mês que decorra até à entrega efectiva aos AA., sendo aquele montante € 1.250,00 nos meses de Julho, Agosto e Setembro.

Recorrem os RR., concluindo: I. Em matéria de montante da renda, no âmbito do instrumento particular com a epígrafe “Contrato de Exploração de Estabelecimento Comercial”, datado de 1 de Julho de 2012 (cfr. Ponto 3 dos factos provados), conforme decorre da sua Cláusula terceira (3º), A. e R. acordaram que após Setembro de 2015 as condições referentes ao montante a pagar a título de renda deveriam ser objecto de renegociação.

  1. Quanto ao montante da renda devida após Abril de 2015, no âmbito dos factos não provados, o Tribunal, sob a al. c) considerou não provado “Que o Autor e Primeiro Réu tenham acordado que após 30 de Abril de 2015 os valores da renda seriam renegociados, fixando-se o valor da renda em € 1.200,00 mensais; III. Para fundamentar a sua convicção, o Tribunal em sede Motivação da Decisão de facto, considerou o seguinte: “(…) Não se fez prova segura de que as partes tenham convencionado a renda mensal de mil e duzentos euros pois tal convenção não resultou de qualquer meio de prova, sendo pouco provável que assim tivesse ocorrido em face da prova documental junta aos autos, pelo que se justifica a não prova deste facto (mencionado em c).

  2. Desta forma, salvo melhor opinião, se o A., Recorrido não logrou ou conseguiu provar, qual o valor da renda devida pelo R. após o mês de Abril de 2015, conforme alegado no artigo 17º da Petição Inicial, não pode, em consequência, o Tribunal, contraditoriamente, considerar provados os pagamentos (posteriores a essa data) identificados nos artigos 16º a 32º dos factos provados, que atento o erro de julgamento, contradição e obscuridade, entendendo-se, ao invés, que a factualidade constante nos Pontos 16 a 32 dos factos provados, deverá ser considerada não provada.

  3. Se o contrato de locação já fora, validamente resolvido, através da oposição tempestiva à sua renovação, com efeitos a 01.05.2017, não pode, depois, o Tribunal decretar a resolução do contrato de locação com fundamento na falta de pagamento de rendas, designadamente, conforme refere, “(…) Atentos os factos de que partimos, temos por certo que na data em que foi intentada a acção - 5 de Abril de 2018 - encontravam-se em dívida as rendas relativas aos meses de Novembro e Dezembro de 2017 e Janeiro, Fevereiro, Março e Abril de 2018, cada uma no montante de Euros 850,00 (visto que as rendas de Novembro de 2017 e parte de Dezembro de 2017 foram pagas em 13 de Abril de 2018 porquanto o Primeiro Réu entregou naquela data a quantia de Euros 1.800,00).

  4. Na verdade, salvo melhor opinião, e com o devido respeito, parece-nos inequívoca a nulidade do processo com fundamento na ineptidão da petição inicial (cfr. art. 186º do CPC), pois tendo em conta a matéria alegada pelo Recorrido e que integra a sua causa de pedir, podia (e devia) ter deduzido pedidos subsidiários, mas, ao invés, alcança-se que omitiu o pedido de decretamento da resolução do contrato de locação com fundamento na sua denúncia ou oposição à renovação, deduzindo, única e contraditoriamente, pedido de validação da resolução do contrato com fundamento na falta de pagamento de rendas operada (antes) através de notificação judicial avulsa.

  5. Ao contrário do entendido na sentença recorrida, o artigo 1109.º, n.º 1, do Código Civil, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 6/2006, de 17 de Fevereiro, mudou a terminologia, mas nada mais, adoptando na epígrafe, a denominação correcta deste contrato, enquanto “locação de estabelecimento”, e não “cessão de exploração do estabelecimento comercial”, como antes era, incorrectamente, designado e tipificou o seu regime, ou seja, a locação do estabelecimento partilha, nalguma medida, e, ainda assim, com “as necessárias adaptações” do regime previsto para o contrato de arrendamento para fins não habitacionais, mas não é um contrato de arrendamento.

  6. Dentro deste enquadramento, pois, não há qualquer razão para a resolução do contrato de locação de estabelecimento dever ser feita por via judicial, pelo que, destinando-se a acção de despejo “a fazer cessar a situação jurídica do arrendamento sempre que a lei imponha o recurso à via judicial para promover tal cessação…” (artigo 14.º, n.º 1, do NRAU), é nítido que não é essa acção a adequada para extinguir o contrato de locação de estabelecimento.

  7. Compulsado o pedido formulado na petição inicial, alcança-se que o Recorrido requer a condenação do Recorrente à entrega imediata dos imóveis livres e devolutos, com fundamento na resolução do contrato, que conforme alegado no âmbito do artigo 45º da Petição Inicial a resolução contratual foi fixada com a concretização da notificação judicial avulsa.

  8. Ora, confrontadas as rendas cuja falta de pagamento o Recorrido invoca na Notificação Judicial avulsa (cfr. ponto 36 dos factos provados) com as rendas consideradas em sede de sentença para decretamento da resolução, verifica-se que não existe correspondência, resultando, ao invés (a contrario) que à data da interposição da acção...

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