Acórdão nº 1168/13.1TBGRD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 27 de Maio de 2014

Magistrado ResponsávelCARLOS MOREIRA
Data da Resolução27 de Maio de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA P (…) – Transportes, Ld.ª, instaurou contra a C (…) –, Ld.ª ação declarativa de condenação, sob a forma única de processo comum.

Pediu: Que a ré seja condenada a pagar-lhe uma indemnização no montante de 17 077,21€, acrescida dos juros de mora que se vencerem a partir da citação, à taxa legal em vigor, até integral pagamento.

Para o efeito, alegou: Celebrou com a ré um contrato de transporte internacional de mercadorias, documentado no CMR respetivo, nos termos do qual se comprometeu a efetuar um transporte de mercadorias, desde as instalações da ré até Gorzon, na Polónia, contra o pagamento do preço convencionado; No dia 4/10/2010 procedeu ao carregamento da carga e iniciou o transporte.

No entanto, por razões alheias à sua vontade, pois que mantém em perfeito estado de conservação e utilização as suas viaturas, às 23h00m do dia 06.10.2010, na A9, ao km 119,350, direcção Berlin, Alemanha, o sistema de travagem do veículo (trela) começou a arder, tendo o incêndio deflagrado “de forma rápida, destruindo toda a carga, que era composta por fio de cobre que ficou queimado, e o semi-reboque C61614.

Os destroços da carga ficaram depositados nas instalações da empresa alemã H..., para onde a polícia alemã ordenou que fossem levados; Participou o acidente à sua companhia de seguros, a qual assumiu a responsabilidade pelos danos decorrentes do referido acidente, tendo indemnizado a ré no montante de 99 273,41€ pelo valor da mercadoria destruída no incêndio, deduzido o valor dos salvados, que ficaram em poder da ré; Em consequência do acidente e da remoção dos destroços para as instalações daquela empresa, esta exigiu-lhe o pagamento do custo associado ao aluguer de contentores para depósito do cobre queimado, no valor de 9 900,00€, os custos das operações de carregamento da sucada de cobre para um reboque, no valor de 650,00€, os custos do inspetor, no valor de 1 175,50€, e os custos relativos ao depósito da mercadoria transportada e queimada, no período compreendido entre o dia 16/1/2011 e o dia 22/3/2011, no montante de 3 123,75€, tudo no montante global de 14 953,46€, quantia que pagou àquela empresa; Estando em causa mercadoria sujeita ao incoterm “DDU” (nos termos do qual o vendedor tem que suportar todos os custos e o risco de transportar a mercadoria até ao local de destino), impendendo sobre ela o risco por perdas e danos desde a fábrica até ao local de destino, não estava obrigada o pagamento de quaisquer outras indemnizações, para além da já paga à ré, pelo que, tendo pago aquela quantia, por indevida, deve a ré ser condenada a restituir-lhe idêntico montante.

Contestou a ré.

Alegou: O risco pela perda da mercadoria, em consequência do contrato de transporte celebrado, corria por conta da transportadora, motivo pelo qual, tendo a mercadoria perecido no decurso do transporte, deve ser responsabilizada por todos os danos decorrentes do acto de transporte, não sendo devida a quantia peticionada.

O artigo 23º/6 da Convenção CMR limita a indemnização do valor da mercadoria transportada, mas não limita a indemnização a esse valor, não excluindo a responsabilidade da autora pelo pagamento de outros prejuízos que tenham sido causados, como aqueles que determinaram a instauração da ação.

A ré pretendia o transporte da mercadoria para o local do seu destino, devendo a autora responder por todos os danos decorrentes do ato de transporte até à entrega da mercadoria, aplicando-se a esta matéria, entre as partes do contrato de transporte, também as disposições do direito interno relativamente ao risco no transporte da mercadoria, em consequência do que, presumindo-se a culpa da autora, não estando em causa qualquer facto excludente da responsabilidade, deve suportar todos os custos do acidente de que é responsável.

  1. Foi proferida sentença na qual se julgou a ação improcedente e absolveu a ré do pedido.

  2. Inconformada recorreu a autora.

    Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: (…) Contra-alegou a recorrida pugnando pela manutenção do decidido com os seguintes argumentos finais: (…) 4.

    Sendo que, por via de regra - artºs 635º e 639º-A do CPC -, de que o presente caso não constitui exceção - o teor das conclusões define o objeto do recurso, as questões essenciais decidendas são as seguintes: 1ª - Alteração da matéria de facto.

    1. - (Im)procedência da ação.

  3. Apreciando.

    5.1.

    Primeira questão.

    5.1.1.

    Pretende a recorrente que, fundando a sua pretensão na figura do enriquecimento sem causa, deveria dar-se como provado e considerar-se na sentença o por ela alegado nos artºs 29º e 31º da pi, a saber: a) que a ré não efetuou a declaração expressa do valor da mercadoria ou declarou juro especial na entrega, o que implicaria que pagasse frete acrescido; b) que efetuou a venda da mercadoria em causa de acordo com os INCOTERMS sigla DDU – delivered duty unpaid, ie. entregue se direitos pagos.

    O que, no primeiro caso, implica a conclusão de que a sua responsabilidade, como transportador, está sujeita ao limite do artº 23º nº6 da Convenção CMR; e, no segundo caso, que será a ré, como vendedora, que terá de suportar todos os custos e o risco de transportar a mercadoria até à sua entrega ao comprador.

    Atentemos.

    Desde logo verifica-se incongruência na fundamentação, de jure, da presente pretensão.

    Na verdade a autora funda a sua pretensão na figura do enriquecimento sem causa.

    Mas esta figura assume o cariz de totalmente residual, apenas podendo ser chamada à colação quando outro instituto, figura ou norma jurídica não possam ser convocadas para a tutela do direito invocado. Sempre que a ação normal possa ser exercida, o empobrecido deve optar por ela.

    Ora é a própria recorrente que alicerça a sua pretensão num contrato de transporte internacional subsumido, essencial e primarcialmente, na Convenção relativa ao Contrato Internacional de Mercadorias por Estrada – CMR –, de 19/5/56, inserida no direito português, ex vi do DL 46235 de 18/3/65, alterado pelo Protocolo de Genebra de 5/7/78, aprovado em Portugal para sua adesão pelo DL 28/88 de 6/9.

    Assim, e bem vistas as coisas, a pretensão da recorrente deveria ser indeferida desde logo por inadmissibilidade da figura e normas legais – artº 473º e sgs do CC –invocadas.

    Pois que se o seu direito existia, como diz, ao abrigo de um contrato de transporte internacional, deveria, atempadamente, com base nele e na legislação aplicável, requerer tutela para o seu direito.

    Pelo que se o deixou prescrever, como alega, não pode, depois, invocar o enriquecimento sem causa para suprir a sua inercia.

    Não obstante não tendo o tribunal assim decidido e não sendo colocada tal questão em recurso, apreciar-se-á o mesmo nos termos nele delineados.

    Apreciação esta porém a efetivar, perante o estatuído, liminar e essencialmente, nas normas de tal diploma – Convenção CMR - e, subsidiariamente, nas normas de direito interno atinentes; que não perante o instituto do enriquecimento sem causa, ao abrigo do artº 473º e sgs do CC.

    Assim e quanto ao facto da al. a).

    Não obstante se ter passado, na recente reforma, com a introdução dos temas da prova em detrimento da consideração dos concretos factos alegados, do «oitenta para o oito» - cfr. Abílio Neto in NCPC, 2013, p.219 -, certo é que tal alteração não pode, através de uma tema genérico e não densificado factualmente, comprometer a apreciação do pedido.

    Para que tal não se verifique devem continuar a ser atendidos todos os factos provados que se revelem pertinentes atentas as «várias soluções plausíveis da questão de direito», na boa terminologia do anterior artº 511º nº1do CPC.

    Ora no caso vertente a autora entende que pelo facto alegado no artº 29º e acima mencionado, a sua responsabilidade está limitada e não pode abranger as despesas que no processo impetra.

    Tanto basta para...

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