Acórdão nº 1198/08.5TBCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Abril de 2012
Magistrado Responsável | JUDITE PIRES |
Data da Resolução | 24 de Abril de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam os Juízes da 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I.RELATÓRIO 1. M (…), viúva, auxiliar de farmácia, contribuinte fiscal n.º (...), residente na Rua (...), Coimbra, intentou acção declarativa, em processo comum e sob a forma ordinária, contra “G (…)– Companhia de Seguros, S.A.”, pessoa colectiva n.º (...), com sede na Avenida (...) Lisboa, pedindo a condenação da Ré:
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A pagar ao “Banco (…), SA” a quantia de € 86.025,24 (oitenta e seis mil e vinte e cinco euros e vinte e quatro cêntimos) correspondente ao valor em débito à data do falecimento de L (…) (22-07-2007).
b) A pagar à Autora a quantia de € 6.265,67 (seis mil e duzentos e sessenta e cinco euros e sessenta e sete cêntimos) que esta despendeu desde a data do falecimento do seu marido até 09 de Junho de 2008, relativo ao pagamento: a. Prestações bancárias ao “Banco (…), SA”; b. Prémios de seguro mensais relativos ao seguro multirriscos habitação “Génesis Lar Plus”, pagos à Companhia de Seguros “G (…)is”.
c. A pagar à Autora o montante de €540,00 (quinhentos e quarenta euros) a título de prémio de seguro que esta despendeu e pagou à Ré desde a data do decesso do seu marido, valor computado até à data de 01.08.2008; c) A pagar à Autora as prestações bancárias que esta pagou ou venha a pagar ao “Banco (…) SA” desde 09 de Junho de 2008, reservando e relegando para liquidação e execução de sentença o concreto apuramento dos valores pagos pela Autora; d) A pagar à Autora os prémios de seguro mensais relativos ao seguro multirriscos habitação “Génesis Lar Plus” que esta pagou ou venha a pagar à seguradora G (…)” desde a data de 09 de Junho de 2008 e que esta venha a pagar à Ré, reservando e relegando para liquidação e execução de sentença o concreto apuramento dos valores despendidos; e) A pagar à Autora os juros de mora, computados à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento; f) A pagar todas as despesas do processo, incluindo custas de parte e procuradoria condigna.
Para tanto alegou, em síntese, que para aquisição de um imóvel que identifica no artigo 1º da Petição Inicial, solicitou, com L (…), junto do Banco (…), S.A., um empréstimo bancário, o qual lhes foi concedido, no montante de €85.293,00, pelo prazo de 288 meses, ao abrigo do Regime Bonificado de Crédito à Habitação. A tal operação bancária foi associado, como reforço da garantia exigida pela entidade bancária e nos termos da cláusula oitava do documento complementar que faz parte da escritura pública, a subscrição da apólice de seguro de vida n.º 0320.50017433.000, perante a Companhia de Seguros “G (…) – Companhia de Seguros, S.A.”, cobrindo o risco de falecimento e de invalidez total e permanente, do qual foi beneficiário a referida instituição bancária.
Em 22 de Julho de 2007 ocorreu a morte de L (…), devida a causas naturais, pneumonia, falência respiratória total, da qual foi a Ré informada pela Autora, objectivando desencadear a cobertura do contrato de seguro de vida celebrado, recusando-se a Ré, no entanto, a assumir o pagamento das prestações em dívida à data do decesso do marido da Autora.
Alega, ainda, que tem assegurado o pagamento de todas as prestações acordadas com a entidade bancária desde a ocorrência do decesso do seu marido e o pagamento à Ré de todos os prémios de seguro associados ao mútuo.
Regularmente citada, contestou a Ré G (…), Companhia de Seguros, S.A., invocando a excepção da ilegitimidade da Ré, aceitando a celebração do referido contrato de seguro de vida e o âmbito do mesmo, com inicio de vigência a 01 de Agosto de 2002.
Pugna a Ré pela improcedência da acção, pedindo que o contrato seja considerado “nulo” em virtude de o falecido ter prestado, ao tempo da subscrição do respectivo contrato (08.07.2002), informações incorrectas, incompletas e omissas sobre o seu estado de saúde, as quais seriam relevantes para a aferição e determinação do risco a suportar pela seguradora.
Alega ainda que caso o falecido não tivesse prestado informações falsas, a Ré nunca teria aceite o seguro nas condições em que o fez.
A Autora M (…), devidamente notificada da contestação apresentada pela Ré, apresentou réplica na qual pugna pela improcedência da excepção da ilegitimidade da Ré, alegando, no mais, que L (…) quando subscreveu com a Ré o contrato de seguro desconhecia ser portador de qualquer uma das doenças aludidas nos autos, as quais apenas foram conhecidas por via do internamento hospitalar e, posteriormente, com o decesso deste.
Foi elaborado despacho saneador, no qual as partes foram consideradas legítimas, sendo, assim, julgada improcedente a excepção dilatória de ilegitimidade invocada pela Ré, tendo ainda sido seleccionada a matéria de facto considerada relevante à apreciação do mérito da causa, sem reclamação.
Na sequência de requerimento apresentado pela Ré a fls. 292 a 294, no sentido de se proceder à ampliação da base instrutória, por despacho constante de fls. 301 foi ordenado aditamento de dois quesitos àquela peça processual Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, após o que se proferiu decisão sobre a matéria de facto a ele submetida, que igualmente não foi objecto de reclamação.
Ambas as partes usaram da faculdade de alegarem por escrito: a fls. 394 – 398, a Ré, mantendo a posição manifestada na sua contestação, pugnando pela anulabilidade do contrato de seguro, e consequente improcedência da acção; a fls. 400-403, a Autora, pugnando pela total procedência dos pedidos por si formulados.
No final, foi proferida sentença, que julgou totalmente improcedente a acção, absolvendo a Ré dos pedidos contra si formulados pela Autora.
2. Por não se conformar com tal decisão, dela interpôs a Autora recurso de apelação para este Tribunal da Relação, formulando com as suas alegações as seguintes conclusões: (…) A apelada contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar.
II.OBJECTO DO RECURSO 1. Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pela recorrente e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras[1], importando destacar, todavia, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito[2].
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Considerando, deste modo, a delimitação que decorre das conclusões formuladas pela recorrente, no caso dos autos cumprirá apreciar fundamentalmente: - Se o marido da Autora, com a proposta de seguro prestou declarações falsas, reticentes ou omitiu factos relativos ao seu estado de saúde; - Na afirmativa, as consequências legais.
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FUNDAMENTOS DE FACTO Pela primeira instância foram julgados provados os seguintes factos: 1) No dia 30 de Agosto de 2002, no Primeiro Cartório Notarial de Competência Especializada de Coimbra, foi celebrada escritura pública de compra e venda e mútuo com hipoteca relativa à fracção autónoma designada pela letra “C”, correspondente à habitação no segundo andar direito (lado sul), posterior centro, do prédio misto situado em (...), freguesia de (...), concelho de Coimbra, inscrito na competente matriz urbana sob o artigo 4301 e na matriz rústica sob o artigo (...) e descrito na Conservatória do Registo Predial de Coimbra sob a ficha número (...)/ (...).
2) Outorgaram como vendedores (…) e como compradores L (…) e a Autora M (…), estes casados entre si sob o regime da comunhão de adquiridos.
3) O imóvel destinou-se exclusivamente à habitação própria e permanente dos outorgantes compradores.
4) Para aquisição do imóvel L (…) e M (…) solicitaram ao “Banco (…) S.A.” um empréstimo bancária no montante de €85.293,00 (oitenta e cinco mil duzentos e noventa e três euros), pelo prazo de 288 (duzentos e oitenta e oito) meses, ao abrigo do Regime Bonificado de Crédito à Habitação.
5) Foi acordado que o capital e juros remuneratórios seriam pagos em 288 (duzentos e oitenta e oito) prestações, através do débito da conta Depósitos à Ordem de que L (…) e M (…) , mutuários, eram titulares.
6) Para garantia do pagamento da quantia mutuada pelo Banco (…)S.A., cobrindo o risco de falecimento e de invalidez total e permanente dos mutuários, L (…) em 31 de Julho de 2002, subscreveu com a companhia de seguros ora ré, contrato de seguro a que corresponde a apólice de seguro n.º 0320.50017433.000.
7) Sendo Condições Especiais: g) Seguro de Vida na modalidade Temporário a Prémio Anual Renovável: a companhia obriga-se a pagar o capital seguro, após o falecimento da Pessoa segura, se esta ocorrer antes de findo o contrato; o prémio é pago anualmente, em cada data aniversária da apólice e pagável durante o prazo do contrato, cessando, porém, com a morte da Pessoa Segura.
h) E Condições Particulares: Beneficiários em caso de morte: beneficio irrevogável a favor do Banco (…), S.A., até ao montante em dívida, no máximo de €99.508,00 euros; o remanescente a pagar ao cônjuge; na sua falta, os herdeiros legais.
8) L (…) faleceu no Centro Hospitalar de Coimbra em 22 de Julho de 2007, pelas 02:00 horas.
9) Do Certificado de Óbito n.º (...), averbado sob o n.º (...), na data de 23.07.2007, referente ao processo n.º (...), Maço 1, ano 2007 da Conservatória do Registo Civil de Coimbra, consta como causa...
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