Acórdão nº 68/21.6T8LMG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 11 de Outubro de 2022
Magistrado Responsável | VÍTOR AMARAL |
Data da Resolução | 11 de Outubro de 2022 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em Conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra I - Por decisão, datada de 24/06/2022, proferida pelo relator ao abrigo do disposto no art.º 656.º do NCPCiv., foi decidido julgar inadmissível o recurso interposto, não se conhecendo do seu objeto, assim findando a instância recursiva, nos seguintes termos: “I - O A., AA, com os sinais dos autos, intentou, no Julgado de Paz ..., ação declarativa de condenação contra BB, também com os sinais dos autos, formulando pedido de condenação da R. a: a) Reconhecer ser o Demandante o proprietário do veículo identificado no art.º 1.º da petição, por o haver adquirido por contrato de compra e venda; ou, se assim não se entender, b) Reconhecer que o Demandante adquiriu à luz institucional da usucapião a propriedade sobre o veículo, tipo Agrícola, de matrícula ..-..-TA, da marca ...; c) Seja ordenado o cancelamento de todas as inscrições registrais em vigor sobre o referido veículo a favor da Demandada, de modo a proceder ao registo a favor do Demandante; d) A pagar ao Demandante a quantia total de € 1.000,00, a título de indemnização por danos morais; e) Pagar ao Demandante a quantia de € 50,00 por cada dia de atraso no cumprimento, nos termos supra expostos; f) Pagar as custas e demais encargos com o processo.
Contestou a R., concluindo pela total improcedência da ação, com a sua consequente absolvição.
Tramitados os autos, foi proferida sentença: a) Condenando a Demandada a reconhecer que o Demandante adquiriu o direito de propriedade do trator, tipo Agrícola, de matrícula ..-..-TA, da marca ..., por via de usucapião; b) Determinando o cancelamento das inscrições registais em nome de CC e BB ao abrigo do disposto nos art.ºs 8.º e 13.º do CRPredial e art.º 29.º do DLei n.º 54/75, de 12-02; c) Determinando a inscrição do direito de propriedade sobre o veículo indicado em a) a favor do Demandante em virtude de o ter adquirido por usucapião.
De tal sentença recorreu a R. para o Juiz de Direito do Tribunal da Comarca de ... - Juízo Local de ..., pedindo a revogação da decisão recorrida, com declaração de verificação dos vícios e nulidades arguidos.
Apresentada contra-alegação, subiram os autos ao Juízo Local de ..., que decidiu o recurso nos seguintes termos: «Pelo exposto, decide este Tribunal julgar procedente o recurso, determinando a nulidade da decisão recorrida – art.º 615º nº 1 c) do CPC Por conseguinte, determina a remessa dos autos ao Julgado de Paz para que apure a factualidade supra exposta e profira nova decisão, caso as partes, sendo pai e filha, não logrem, entretanto, alcançar um acordo.
Custas pelo Recorrido / Demandante – art.º 527º do CPC» ([1]).
Inconformado, veio, então, o A. interpor recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra (TRC), apresentando motivação e conclusões e pugnando, a final, pela revogação da decisão judicial assim impugnada, mantendo-se a decisão do Julgado de Paz.
Contra-alegou a R., pugnando pela improcedência deste recurso.
Admitida a apelação, foi ordenada a subida dos autos a este TRC.
II - No anterior despacho do aqui Relator, datado de 20/05/2022, consignou-se assim: «O Recorrente suscitou, na sua peça recursiva, a seguinte «QUESTÃO PRÉVIA»: «Perante a norma, de natureza especial, do art. 62.º, n.º 1, da Lei n.º 78/2001, de 13-07 (Lei de Organização, Competência e Funcionamento dos Julgados de Paz), as decisões proferidas pelos Julgados de Paz poderão ser objeto de recurso para o Tribunal Judicial em que esteja sediado esse Julgado e desde que o valor exceda metade do valor da alçada do tribunal de 1.ª instância.
A norma do art. 63.º do mesmo diploma institui o CPC como direito subsidiário pelo que “é subsidiariamente aplicável, no que não seja incompatível com a presente lei e no respeito pelos princípios gerais do processo nos julgados de paz, o disposto no Código de Processo Civil, com excepção das normas respeitantes ao compromisso arbitral, bem como à reconvenção, à réplica e aos articulados supervenientes”.
Num processo judicial comum, regra geral, são possíveis duas possibilidades de recurso (para a Relação e para o STJ) Assim num processo intentado no julgado de paz, são de igual modo possíveis dois graus de recurso, ou seja, para o tribunal da Comarca e para a Relação.
Razão por que se é de admitir o presente recurso, por ser decisão admissível de recurso e o Recorrente estar em tempo e ter legitimidade.».
Respondeu a Recorrida pela seguinte forma: «DA IRRECORRIBILIDADE DA DECISÃO IMPUGNADA – Da inexistência de dupla jurisdição numa decisão do Julgado de Paz da violação do disposto no artigo 62º da LJP: A primeira questão a apreciar nesta resposta, prende-se com a irrecorribilidade da sentença proferida, nos autos atento o facto de se terem esgotado as hipóteses recursivas no caso em concreto.
Como consta dos autos, estamos perante uma decisão do Julgado de Paz ..., com a qual a recorrente BB (ora recorrida) não se conformou e, por isso, dela interpôs recurso.
Veio a Senhora Juiz do Juízo Local Cível ..., a considerar procedente a nulidade invocada e nessa medida a proferir sentença, com o seguinte dispositivo: Pelo exposto, decide este Tribunal julgar procedente o recurso, determinando a nulidade da decisão recorrida – art.º 615º nº 1 c) do CPC. Por conseguinte, determina a remessa dos autos ao Julgado de Paz para que apure a factualidade supra exposta e profira nova decisão, caso as partes, sendo pai e filha, não logrem, entretanto, alcançar um acordo.
Não se conformando o recorrido com tal aresto decisório dele interpôs o recorrido AA recurso para o Tribunal da Relação, recurso este a que agora se responde.
Assim, desde logo, entende a recorrida que o recurso interposto deve ser rejeitado – senão desde logo proferido despacho em primeira instância que não o admita – na medida em que, contrariamente ao que o recorrente pretende fazer crer não existe um “duplo grau de jurisdição”.
Como já foi decidido noutros processos, não cabe recurso para o Tribunal da Relação de decisões de Tribunais judiciais que apreciaram recursos de decisões provindas do Julgado de Paz (…).
Pelo que, acolhendo-se tal entendimento também neste caso ser proferida decisão que considere não admissível o recurso intentado pelo recorrente, como de direito se afigura devido, já que, nos termos da Lei, não é admissível recurso de decisão do tribunal de Comarca que decidiu recurso intentado de decisão proferida no Julgado de Paz.».
O Tribunal de Comarca admitiu o recurso para a Relação, «Embora com dúvidas, pelas razões apontadas pelos recorridos, que pugnam pela inadmissibilidade do recurso, e sempre ressalvando melhor e superior entendimento, considerando que o teor da decisão aqui proferida foi de declarar nula a decisão do Julgado de Paz (…)».
A Recorrida invoca jurisprudência fundamentada e ponderada no sentido da não admissibilidade deste...
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