Acórdão nº 1985/20.6T8LRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelANTÓNIO DOMINGOS PIRES ROBALO
Data da Resolução25 de Outubro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na Secção Cível (3.ª Secção), do Tribunal da Relação de Coimbra 1.1.- AA veio intentar acção comum de impugnação de paternidade contra BB e CC, pedindo que se declare que o R. perfilhante não é o pai do R. perfilhado, se declare a nulidade do acto de perfilhação feito pelo primeiro e se ordene o cancelamento do averbamento da paternidade do 1º R. no registo de nascimento do 2º.

Para fundamentar tal pretensão alega, em síntese que é mãe do 2º R. e embora se encontre averbada como pertencente ao primeiro R. a paternidade do segundo, na realidade isso não corresponde à verdade biológica, pois ela A. manteve com terceiros, relações sexuais nos primeiros 120 dias dos 300 que antecederam o nascimento do 2º R..

Foi nomeado curador especial ao R. CC, atenta a sua menoridade e a circunstâncias de A. e 1º R., serem partes nos autos.

*** 1.2. - O dito R. foi citado na pessoa do curador especial nomeado e o 1º R, na sua própria pessoa.

Não foi apresentada contestação.

*** 1.3. - Por escrito, foi proferido despacho saneador que, de forma tabelar, aferiu positivamente os pressupostos de validade e regularidade da instância.

Na mesma sede se fixou o objecto do litígio e consignou os temas de prova, sem que tivessem sido apresentadas reclamações.

Na sequência de pretensão nesse sentido apresentada, foi determinada a realização de exames hematológicos, os quais não foi possível concluir, pois o 1º R., não obstante regular a pessoalmente notificado para tal não compareceu nas várias datas agendadas e nada disse tendente a justificar a sua ausência.

A A. nada requereu, em consequência da comunicação que de tal ocorrência lhe foi feita.

Realizou-se audiência de julgamento, com observância do legal formalismo, conforme da acta elaborada, nessa sequência, melhor consta.

Os pressupostos de validade e regularidade da instância mantêm-se inalterados desde o momento da sua apreciação.

Após foi proferida sentença onde se decidiu: 1)- Julgar a ação improcedente; 2)-Manter o registo ao assento de nascimento do segundo R., nos exactos termos em que se encontra redigido.

3)- Condenar a A. nas custas do processo, sem prejuízo do apoio judiciário que a beneficia.

Registe e notifique.

*** 1.4. – Inconformada com tal decisão dela recorreu a A. AA, terminando a sua motivação com as conclusões que se transcrevem: “1ª- Vem este recurso interposto da douta sentença proferida nos autos à margem identificados em 30/9/2021, pelo qual foi a ação de impugnação de perfilhação, totalmente improcedente, por não provada.

  1. - Nos arts. 1º a 9º da p.i., o ora recorrente alegou o seguinte: -No dia 30 de Junho de 2018 nasceu o menor CC, aqui segundo réu.

    -No respectivo assento de nascimento, lavrado a 03 de Julho de 2018, com o n.º 2161 a paternidade do segundo réu não foi estabelecida.

    -Todavia, por declaração de 27 de Julho de 2018, prestada junto da Conservatória do Registo Civil ..., o 1,º Réu declarou que “reconhece como seu filho” o aqui segundo réu.

    -A dita Conservatória do Registo Civil lavrou o respectivo assento de perfilhação, com o n.º 7 do ano de 2018 .

    -Pelo que, actualmente, o segundo réu está registado com a indicação de maternidade da aqui Autora, e com a menção de paternidade do ora 1.º Réu.

    -Ora, sucede que o 1.º Réu não é o pai biológico do segundo réu.

    -Com efeito, a autora manteve relações sexuais com terceiros durante os primeiros 120 dias dos 300 dias que precederam o nascimento do segundo réu.

    -Não correspondendo, portanto, à verdade que o segundo réu é filho do 1.º Réu.» 3ª- Requerendo que fosse efetuado o exame de ADN, ao 1.º Réu para que efetivamente se prove de que o mesmo não é o Pai.

  2. - O 1.º Réu recusou se a comparecer nas várias tentativas de recolha e com a sua conduta determinou a impossibilidade da prova direta da procriação biológica, que era em concreto, o meio idóneo para a Autora fazer prova da invocada falta de coincidência entre a verdade registada e a verdade biológica, enquanto facto essencial constitutivo do direito, que se arroga na ação de impugnação da perfilhação.

  3. - Deve operar a inversão do ónus da prova, nos termos do artigo 344.º n.º 2 Código Civil.

  4. -Passando a incumbir ao 1.º Réu demonstrar que é efetivamente o pai biológico da criança, aqui 2.º Réu.

    Por conseguinte, entende a ora recorrente que A Mmª Juíza a quo deveria ter considerado o ónus da prova nos termos do previsto no artigo 344.º n.º 2 CC e julgando a ação de impugnação de perfilhação procedente.

    Termos em que, deve a apelação ser julgada procedente, com o que se fará a necessária e costumada Justiça!” *** 1.5. Feitas as notificações a que alude o art.º 221.º, do C.P.C. respondeu o Ministério Público, terminando a sua motivação com as conclusões que se transcrevem: “1- A Autora AA invoca a sua discordância relativamente à interpretação dada às normas jurídicas na sentença recorrida; 2- Já que, tendo o 1.º Réu recusado comparecer nas várias tentativas de recolha, sua conduta determinou a impossibilidade da prova direta da procriação biológica, o que em concreto era o meio idóneo para a Autora fazer a prova da invocada falta de coincidência entre a verdade registada e a verdade biológica, enquanto facto essencial constitutivo do direito, que se arroga na ação de impugnação de perfilhação.

    3- Todavia, entendeu, e bem, o Tribunal não assacar consequências à falta de comparência do 1.ª réu do INML,CF, para a recolha de material biológico e realização de exames hematológicos; 4- Não operando, neste caso, a inversão do ónus da prova a que alude o art.º 344.º n.º 2 do Código Civil.

    5- Já que havendo dois réus, em litisconsórcio necessário, o 2.º réu não adotou conduta omissiva, culposa, não lhe podendo ser imposta a sanção da inversão do ónus da prova.

    6- E, tendo o 1.º R. declarado perante oficial publico ser o pai do 2.º R. não foi apresentada prova da desconformidade do declarado com a verdade.

    Pelo exposto, deverá ser mantida a douta sentença proferida, nos seus precisos termos, pugnando-se, assim, pela total improcedência do recurso interposto.

    Termos em que se conclui pela manutenção da sentença recorrida, devendo assim o presente recurso ser julgado improcedente.

    Mas, V.Ex.ªs farão acostumada JUSTIÇA!” *** 1.6. - Foi proferido despacho a receber o recurso do seguinte teor: “ Recurso interposto com legitimidade e em tempo, que vai admitido a subir imediatamente, nos próprios autos e efeito suspensivo.

    Notifique.” *** 1.7. - Com dispensa de vistos cumpre decidir.

    *** 2.- Fundamentação Da discussão da causa resultou provada a seguinte factualidade: 1. No dia 30.6.2018, na freguesia ..., ..., ... e ..., concelho ..., nasceu uma pessoa do sexo masculino, a quem foi dado o nome de CC.

    1. Tal indivíduo foi registado como filho de AA, no estado de divorciada, sem referência à paternidade.

    2. No dia 27.7.2018, nas instalações da Conservatória do Registo Civil ..., BB...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT