Acórdão nº 3892/12.8TBLRA-B.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelPAULO CORREIA
Data da Resolução28 de Setembro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Apelação n.º 3892/12.8TBLRA-B.C1 Juízo de Comércio de Leiria – Juiz 1 _________________________________ Acordam os juízes que integram este coletivo da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1]: I-Relatório No incidente de verificação de créditos relativo à insolvente S..., S.A.

, foi proferida, a 24.03.2022 a seguinte decisão: “5.1 Impugnação apresentada pela insolvente relativamente aos créditos reconhecidos à Fazenda Nacional Em sede de impugnação (fls. 462 e ss. do p.f) veio a insolvente alegar que os créditos reconhecidos pelo Sr. Administrador à Fazenda Nacional, no montante total de € 145.902,99, reportados a impostos, juros e coimas referentes aos anos de 2008 a 2015, não são da responsabilidade da insolvente, mas sim da massa insolvente.

Mais alega que todos os valores reclamados pela AT se reportam a valores vencidos e reclamos pela credora na pendência do processo de insolvência, pelo que deveria o Sr. Administrador da Insolvência ter procedido ao respetivo pagamento.

Conclui que os créditos em causa são dívidas da massa insolvente e, como tal, deverão ser reconhecidos como dívidas da massa e não como créditos sobre a insolvente.

* O Digno Magistrado do Ministério Público, em representação da Fazenda Nacional, pugnando pela improcedência da impugnação apresentada.

Também o Sr. Administrador da Insolvência respondeu à impugnação apresentada, pugnando que os créditos em causa, no valor global de € 145.902,99, deverão ser reconhecidos como dívidas da insolência nos exatos termos constantes da lista de créditos reconhecidos.

*** 5.1.1 Objeto do Litígio: - Da natureza dos créditos reclamados pela Fazenda Nacional 5.1.2 Factos Assentes Da prova documental junta aos autos e respetivos apensos, resulta assente a seguinte factualidade, com interesse para a decisão da causa: 1. Por ação entrada em juízo a 19 de julho de 2012, o Banco 1..., S.A. – atualmente denominado por “Banco 2..., S.A.” - requereu a declaração de insolvência de “J..., S.A.”, que viria a alterar a sua designação para “S..., S.A.”.

  1. Os autos de insolvência suspenderam-se com o início do Processo Especial de Revitalização, apresentado em juízo a 08.11.2012, que correu termos sob o n.º 5649/12...., J..., deste Juízo de Comércio ..., e que viria a culminar com a não aprovação do plano conducente à revitalização da Requerente aqui insolvente.

  2. O Sr. Administrador Judicial Provisório, no âmbito dos identificados autos de PER, emitiu parecer no sentido de ser declarada a insolvência da devedora, a qual viria a ser decretada por sentença de 29.05.2013, convertendo-se o PER em processo de insolvência.

  3. Na sequência de recurso interposto, pelo Acórdão do STJ datado de 08.09.2015 foi revogada a sentença de declaração de insolvência proferida em 29.05.2013, por existência de ação de insolvência anteriormente proposta, com a consequente cessação da suspensão da instância e prosseguimento dos autos de insolvência.

  4. Em consequência, foi ordenada a cessação da instância, vindo em 20.06.2016 a ser proferida sentença no âmbito dos presentes autos que decretou a insolvência de “S..., S.A.”.

  5. No âmbito da lista definitiva de créditos reconhecidos pelo Sr. Administrador da Insolvência, foi reconhecido à Fazenda Nacional um crédito no montante total de € 145.902,99, que se reporta aos seguintes impostos/juros/coimas: ü IUC do ano de 2011, referente ao veículo com a matrícula ..-..-ZY e respetivas custas, no montante total de € 92,61 (vencido a 18.12.2013, período de tributação do ano de 2011).

    ü IUC do ano de 2012, referente ao veículo com a matrícula NO-..-.. e respetivas custas, no montante total de € 613,17 (vencido a 18.12.2013, período de tributação do ano de 2012).

    ü Coimas e Encargos de processos de contraordenação, no monte total de € 388,94 (vencido a 19.06.2015, período de tributação de fevereiro de 2014).

    ü IUC do ano de 2014, referente ao veículo com a matrícula AV-..-.. e respetivas custas, no montante total de € 528,41 (vencido a 19.06.2015, período de tributação do ano de 2014).

    ü IUC do ano de 2013, referente ao veículo com a matrícula AV-..-.. e respetivas custas, no montante total de € 508,62 (vencido a 19.06.2015, período de tributação do ano de 2013).

    ü Coimas e Encargos de processos de contraordenação, no monte total de € 486,74 (vencido a 13.08.2015, período de tributação de maio de 2015).

    ü IUC do ano de 2015, referente ao veículo com a matrícula AV-..-.. e respetivas custas, no montante total de € 470,39 Coimas e Encargos de processos de contraordenação, no monte total de € 388,94 (vencido a 05.05.2016, período de tributação de 2015).

    ü IRC do ano de 2008 e respetivas custas, no montante total de € 13.165,88 (vencido a 12.01.2013, período de tributação de 2008).

    ü IRC do ano de 2009 e respetivas custas, no montante total de € 118.245,47 (vencido a 12.04.2013, período de tributação de 2009).

    ü IRC do ano de 2010 e respetivas custas, no montante de € 9.900,65 (vencido a 15.04.2013, período de tributação de 2010).

    ü Coimas e Encargos de processos de contraordenação, no monte total de € 1.502,01 (vencido a 16.12.2013, período de tributação de 2013).

    Motivação Os factos dados como provados resultaram da prova documental junta (não impugnada).

    5.1.3. Do Direito Em sede de impugnação, pretende a insolvente que os créditos reconhecidos à Autoridade Tributária sejam considerados como dívida da massa insolvente e não como créditos da insolvência, uma vez que tratando-se de tributos cuja data de vencimento ocorreu em 2013 e tendo a primeira sentença de insolvência sido decretada a 29.05.2013 (que viria a ser anulada), nos termos do artigo 81.º, n.º1, do CIRE ficou a insolvente impossibilitada de dispor de património e de proceder ao pagamento, por livre iniciativa, de quaisquer dívidas.

    Mais defende que os montantes reclamados pela ATA reportam-se a montantes vencidos na pendência do processo de insolvência devendo, segundo a impugnante, ser da responsabilidade da massa e não da insolvência.

    Vejamos se assim é.

    Em primeira linha, e a propósito da questão suscitada pela impugnante, importa definir o que sejam dívidas da massa insolvente e dívidas da insolvência.

    Tal como decorre dos artigos 47.º a 51.º, do CIRE, consagrou-se e tratou-se de forma diferenciada duas categorias de dívidas: as dívidas da insolvência (os denominados créditos sobre a insolvência) e as dívidas da massa insolvente (os créditos sobre a massa insolvente).

    As primeiras, que se encontram definidas pelo citado artigo 47.º, do CIRE reportam-se a créditos de natureza patrimonial sobre a insolvente, ou garantidos por bens integrantes da massa insolvente, cujo fundamento seja anterior à data da declaração de insolvência; as segundas são as enunciadas pelo art. 51º, além de outras que, como tal, sejam qualificadas pelo Código.

    A classificação e distinção entre dívidas da insolvência e dívidas da massa insolvente assume, naturalmente, a maior importância, dado o regime diferenciado a que se encontram sujeitas.

    De facto, como resulta do disposto nos artigos 46º e 172º, as dívidas da massa insolvente são pagas com precipucidade, o que significa que os créditos sobre a insolvência são preteridos no confronto com os créditos sobre a massa insolvente.

    Diferente é também o regime a que está submetido o exercício desses direitos de crédito. Os credores da insolvência apenas poderão exercer os seus direitos em conformidade com os preceitos do Código, durante o processo de insolvência (art. 90º), o que significa que, para obterem na insolvência a satisfação dos seus direitos, terão que reclamar o seu crédito, nos termos do art. 128º ou, desde que verificados os necessários requisitos, através de ação a que aludem os arts. 146º e segs. e que corre por apenso ao processo de insolvência, sendo certo que, em conformidade com o disposto no art. 173º, o pagamento dos créditos sobre a insolvência apenas contempla os que estiverem verificados por sentença transitada em julgado.

    As dívidas da massa insolvente deverão ser pagas nas datas dos respetivos vencimentos, qualquer que seja o estado do processo (art. 172º, nº 3) e, não sendo pagas, poderão ser objeto de ação declarativa ou executiva a instaurar, nos termos do art. 89º nº 2, por apenso ao processo de insolvência (cfr. Ac. do TRP, de 18-06-2009, in www.dgsi.pt).

    No caso dos presentes autos, cumpre desde logo realçar que a sentença datada de 29.05.2013, que decretou a insolvência, veio a ser revogada por Acórdão proferido a 17.10.2013.

    E a propósito da revogação da sentença que decreta a insolvência, informa Carvalho Fernandes e João Labareda (in CIRE Anotado) que, não obstante a revogação da sentença que decreta a insolvência, são válidos, v. g., todos os actos, entretanto praticados, de apreensão de bens e elementos de contabilidade levados a efeito pelo administrador da insolvência, como o são a fixação da residência do devedor e a nomeação do próprio administrador, com relevância na...

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