Acórdão nº 1444718.7T8CTB-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Dezembro de 2019
Magistrado Responsável | FONTE RAMOS |
Data da Resolução | 10 de Dezembro de 2019 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Em 15.10.2018, P (…) e mulher C (…) deduziram oposição por embargos à execução que lhes é movida por Banco (…), S. A.
[1], pedindo que seja declarada extinta.
Alegam, em síntese: a livrança dada à execução garante o contrato de mútuo celebrado entre as partes; celebraram em simultâneo um contrato de seguro de vida crédito pessoal com a O (…) - Companhia de Seguros de Vida, S. A., cuja apólice cobria a invalidez absoluta e definitiva por doença; o embargante accionou o seguro por comprovada invalidez; a embargante é doente oncológica, já requereu a pensão de invalidez e quando deferida irá accionar o mesmo seguro.
Requereram também a intervenção principal provocada da O (…)-Companhia de Seguros de Vida, S. A.. A exequente contestou, alegando, nomeadamente: foi informada pela O (…) Companhia de Seguros de Vida, S. A., que “após apreciação clínica o processo de indemnização por Invalidez da Pessoa Segura foi recusado por doença considerada pré-existente à data da subscrição da apólice de seguro de vida em causa, pelo que não haverá lugar ao pagamento do respectivo Capital Seguro” e que iria “proceder à anulação do contrato de seguro”; desconhece a situação clínica da executada; os executados são devedores solidários e, por isso, o contrato de seguro não os exonera das obrigações assumidas. Concluiu pela improcedência da oposição à execução e pelo indeferimento do incidente de intervenção principal provocada.
Foi admitida a intervenção principal provocada da O (…) - Companhia de Seguros de Vida, S. A., que, devidamente citada, não contestou.
No despacho saneador, a Mm.ª Juíza a quo firmou o objecto do litígio e enunciou os temas da prova.
Realizada a audiência de julgamento, o Tribunal a quo, por sentença de 23.5.2019, julgou os embargos de executado totalmente procedentes com fundamento na inexigibilidade da obrigação exequenda e, em consequência, determinou a extinção da execução a que a estes autos são apensos.
Inconformadas e visando a revogação da sentença recorrida, a exequente/embargada e a chamada apelaram, formulando, a primeira, as conclusões que assim vão sintetizadas: 1ª - O apelante celebrou com os embargantes/executados um contrato de mútuo, mais conhecido por contrato de crédito pessoal, em 14.7.2016 que deixou de ser pago por estes em Agosto de 2017.
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- Na mesma data, os embargantes/executados celebraram um contrato de seguro com a O (…)-Companhia de Seguros, S. A., para garantir o pagamento daquele contrato.
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- Em 24.7.2017, o embargante/executado P (…) accionou o seguro com fundamento em invalidez total e permanente e a O (…) enviou carta ao embargante a declinar o pagamento da quantia em dívida com os fundamentos constantes do ponto 14 dos factos considerados provados.
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- Não foi considerado provado pelo tribunal a quo a invalidez definitiva do embargante P (…) 5ª - Tendo a seguradora O (…) informado o embargante/executado que anulava o seguro e não procedia ao pagamento da quantia devida ao apelante.
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- O apelante preencheu a livrança-caução assinada pelos executados e executou a mesma.
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- A garantia/livrança assinada pelos embargantes/executados pode ser executada pelo apelante, cabendo aos primeiros instaurar, se assim o entenderem, acção contra a seguradora para pagamento da quantia devida ao apelante para discussão da situação da saúde/invalidez do embargante/executado.
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- O apelante tinha legitimidade para exigir dos embargantes/executados as quantias emergentes do incumprimento do aludido contrato de mútuo, sendo que a livrança serviu para determinar o valor em dívida face ao incumprimento verificado.
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- No âmbito da sua actividade celebrou o mútuo/crédito pessoal com os embargantes/executados, agindo com a devida legitimidade para exigir o pagamento da quantia mutuada em dívida, assim como para accionar os mesmos em face do incumprimento verificado no mútuo.
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- A acção executiva instaurada destinou-se a permitir ao apelante, de forma legítima e devidamente titulada, obter o pagamento dos seus créditos.
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- Quanto à apólice de seguro contratada, o apelante solicitou que subscrevessem, antes da celebração do contrato de mútuo-crédito pessoal, onde consta como beneficiário - situação corrente e normal neste tipo de operações, visando proteger a sua posição enquanto entidade que concede o crédito.
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- Apesar do apelante constar como beneficiário do dito seguro, o respectivo contrato de seguro foi celebrado entre a O (…) e os embargantes/executados.
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- A recusa da seguradora em assumir o alegado sinistro, inviabiliza o pagamento ao apelante.
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- A discussão da situação da invalidez entre a seguradora e os embargantes/executados, a propósito da ocorrência ou não do sinistro e da sua integração nas condições da apólice, não obriga ou vincula o apelante a qualquer acto ou omissão, numa relação jurídica onde é apenas terceiro interessado.
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- O tribunal a quo considera que o apelante tem um direito sobre a seguradora O(…), mas não tem - esta declinou o pagamento da quantia em dívida com os fundamentos expostos na carta enviada aos embargantes/executados. Logo, não pode o apelante obter o pagamento da seguradora.
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- Não existe qualquer fundamento de facto ou de direito que possa determinar a procedência dos embargos e extinção da execução.
E concluiu a chamada:[2] 1ª - A existência de um contrato de seguro de vida não é meio adequado para fazer cessar os efeitos jurídicos do título executivo dado à execução: a livrança.
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- O exequente pode escolher, como credor, a garantia que julgar mais conveniente uma vez que o contrato de mútulo entrou em incumprimento.
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- A questão do contrato de seguro não tem que ser discutida aqui neste processo, pois é de todo alheia ao título executivo dado à execução.
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- Deve a sentença que julgou os embargos procedentes ser revogada, com as consequências legais, ou seja, julgando-se os mesmos improcedentes.
Os embargantes responderam concluindo pela improcedência dos recursos.
Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto dos recursos, importa apreciar e/ou decidir se existe fundamento para a procedência dos embargos (se antes de exigir o pagamento aos executados, impendia sobre a apelante/exequente a obrigação - prévia - de accionar o seguro associado ao contrato de mútuo do qual emerge o seu crédito) ou se, pelo contrário, é (desde já) exigível a quantia exequenda.
* II. 1. A 1ª instância deu como provados os seguintes factos: 1.
Em 04.9.2018, o Banco (…), S. A., deu entrada de requerimento executivo pelo qual deu à execução uma livrança (para pagamento da quantia de € 28 747,66 de capital, € 65,62 de juros de mora vencidos, dos juros de mora vincendos à taxa de 4 % e do imposto de selo)[3].
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É do seguinte teor o requerimento executivo: “Os factos constam exclusivamente do título executivo.”.
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A livrança dada à execução tem aposta os seguintes dizeres: “Local e Data de Emissão: Porto, 2016.07.14; Importância em EUROS: € 28 747,66; VALOR: CONTRATO DE EMPRÉSTIMO ILS (...) ; VENCIMENTO: 2018.08.14” e está subscrita por P (…) e C (…)..
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Por documento particular denominado “Crédito Pessoal - Contrato n.º (...) ”, datado de 14.7.2016, foram identificados como mutuários P (…) e C (…) e consta do mesmo que “Pelo presente, o(s) Mutuários contratam com o Banco (…), S. A. o presente empréstimo nas Condições Particulares aqui indicadas e submetidas às Cláusulas das Condições Gerais que se seguem infra.” 5.
Consta do documento identificado no número anterior: “CONDIÇÕES PARTICULARES DO EMPRÉSTIMO”: Finalidade: Multifinalidades Montante Total do Empréstimo: 28.106,28 EUR Dia de Vencimento das Prestações: 5 Data de Vencimento da Prestação intercalar: 05-8-2016 Descritivo da Taxa de Juro: Taxa Base Crédito Pessoal TAEG 11,8 % Livrança subscrita em branco pelos Mutuários: Sim (indispensável) Prazo do Empréstimo 96 meses Regime de Prestações: Constantes (Capital e Juros) Montante da prestação intercalar: 136,41 EUR Regime de Taxa Juro: Taxa Fixa (PERÍODO INICIAL) Taxa Juro Nominal do período inicial: 8,000 % Período de aplicação da Taxa de juro: 12 meses N.º Prestações constantes de Capital e Juros: 12 Montante (indicativo) de cada Prestação: 401,92 EUR/cada, inclui imposto de selo de 4 % Data de vencimento da 1ª Prestação de Capital e Juros: 05-9-2016 Periodicidade das Prestações de Capital e Juros: mensal Montante dos juros diários (indicativo): 6,25 EUR (PERÍODO REMANESCENTE) Taxa Juro Nominal do período 10,000 % Remanescente Período de aplicação da Taxa de juro: 84 meses N.º de Prestações constantes de Capital e Juros: 84 Montante (indicativo) de cada Prestação: 429,04 EUR/cada, inclui imposto do selo de 4 % Data de vencimento da 1ª Prestação de Capital e juros Periodicidade das Prestações de Capital e Juros: mensal Montante dos juros diários (indicativo): 7,81 EUR.
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Consta das “CONDIÇÕES GERAIS” do contrato identificado em II. 1.
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, na cláusula 10: “Para titulação e garantia das obrigações emergentes deste contrato o(s) Mutuário(s) obrigam-se a entregar, nesta data, ao Banco, uma livrança subscrita em branco, ficando, desde já, o Banco expressamente autorizado, através de qualquer um dos seus funcionários, a proceder, livre e integralmente, ao preenchimento do referido título de crédito, designadamente quanto à data de emissão, montante em dívida, à data de vencimento e ao local de pagamento pelo valor correspondente à totalidade dos créditos e encargos emergentes do presente contrato (incluindo o capital em dívida, juros remuneratórios e moratórios), acrescida de todos e quaisquer encargos com a selagem caso se verifique o incumprimento por parte do Mutuário de qualquer das obrigações que lhe competem e que aqui são referidas, o Banco poderá descontar essa livrança e utilizar o seu produto para pagamento dos créditos emergentes deste contrato.” 7.
Na mesma data, 14.7.2016, os executados/mutuários subscreveram a proposta de seguro de vida crédito pessoal/Ramo Vida Grupo n.º (...) da...
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