Acórdão nº 118/18.3JALRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 18 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelANA CAROLINA CARDOSO
Data da Resolução18 de Setembro de 2019
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Apresentado projeto pela primitiva relatora, o mesmo não mereceu a concordância da maioria que se formou, motivo pelo qual foi determinada a mudança de relator, e a elaboração do presente acórdão.

* Acordam em Conferência na 5ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra I. RELATÓRIO 1. Acórdão recorrido: Em 9 de Abril de 2019, os juízes que compuseram o tribunal coletivo do Juízo Central Criminal de Leiria, após realização da audiência de julgamento do arguido A.

, proferiram a decisão que a seguir se transcreve: «i) Julgar a acusação improcedente e não provada quanto aos imputados: i-

  1. Crime de homicídio qualificado na consumada, agravado pelo uso de arma, p. e p. nos art°s. 132º nº 2 al. j) do Cod. Penal e 86º nº 3 da Lei nº 5/296, de 23/02 e, consequentemente, absolvem o arguido da prática desse crime.

    i-b) Crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. nos art°s 143° n°1 e 145° n°s 1 e 2 al. a) e 132° nos 2 al. b) e h) do Cod. Penal, e, consequentemente absolvem o arguido da prática do mesmo crime.

    Sem embargo, nesta parte operando as respectivas convolações, ii) Julgar a acusação — com a alteração não substancial dos factos e alteração da qualificação jurídica comunicadas no decurso da audiência – parcialmente procedente e provada e, consequentemente, condenam o arguido pela prática em autoria material e concurso efectivo de: ii-

  2. Um crime de homicídio simples, agravado pelo uso de arma, na forma consumada, p. e p. nas disposições conjugadas dos artºs. 131º do Cod. Penal, e 86º nº 1 al. c), e nºs 3 e 4 da Lei nº 5/2006, de 23/02, na pena de 17 (dezassete) anos de prisão.

    ii-b) Um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. no artº 143º nº 1 do Cod. Penal, na pena de 9 (nove) meses de prisão.

    ii-c) Um crime de detenção de arma proibida, p. e p. no art.º 86º nº 1 al. c) e d), por referência aos artºs. 2º nº 1 als. c), p), q), ad) e aad) e nº 3 al. p), e 3º nº 4 al. b), todos da Lei nº 5/2006, de 23/02, na pena de 2 (dois) anos de prisão.

    ii-d) Operando o respectivo cúmulo jurídico das penas parcelares supra aplicadas, condenam o arguido na PENA ÚNICA de 18 (dezoito) de prisão.

    (…) iii) Julgar o pedido de indemnização civil deduzido pelo Centro Hospitalar de Y (...), EPE totalmente procedente e provado e, consequentemente, condenam o demandado A. a pagar àquele a quantia de E 171,82, acrescida de juros de mora contados à taxa legal, vencidos desde a notificação, e vincendos, até integral pagamento.

    (..) iv) Julgar o pedido de indemnização civil deduzido pelas demandantes (…) parcialmente procedente e provado e, consequentemente, condenam o demandado a pagar àquelas demandantes as seguintes quantias: § Às demandantes (…): 1. A quantia de € 50.000,00, a título de indemnização pelo dano morte sofrido por (…), acrescida de juros de mora contados à taxa legal, vencidos desde a notificação, e vincendos, até integral pagamento; 2. A quantia de € 4.128,45, a título de indemnização pelos danos patrimoniais (danos emergentes) sofridos em consequência do decesso de (…), acrescida de juros de mora contados à taxa legal, vencidos desde a notificação, e vincendos, até integral pagamento.

    §§ À demandante (…), a quantia de € 30.000,00, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais por ela sofridos em consequência do decesso de seu companheiro (…), acrescida de juros de mora contados à taxa legal, vencidos desde a notificação, e vincendos, até integral pagamento.

    §§§ A cada uma das demandantes (…), a quantia de € 15.000,00, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais por cada uma delas sofridos em consequência do decesso de seu pai (…), acrescida de juros de mora contados à taxa legal, vencidos desde a notificação, e vincendos, até integral pagamento.

    §§§§ À demandante (…), a quantia de € 3.000,00, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais por ela sofridos em consequência da conduta de que foi vítima por parte do demandado / arguido, acrescida de juros de mora contados à taxa legal, vencidos desde a notificação, e vincendos, até integral pagamento.

    (…)».

    1. Recurso do arguido (conclusões que se transcrevem integralmente): Inconformado com esta condenação, dela recorre o arguido, formulando as seguintes Conclusões: «1.Face à prova produzida em julgamento e aos documentos juntos aos autos, não deveriam ter sido dados como provados os factos constantes dos n.ºs a.4), a.5), a.15) (no que se refere à assistente (…), a.17), a.21), a.46), a.47) e a.49), conforme retro referimos.

    2. Deveria ter sido dado como provado que o (…) tinha uma arma de fogo que dizia ser para matar o arguido, conforme afirmou a seu neto, filho do arguido.

    3. Deveria ter sido dado como provado que o arguido estava de costas para a entrada da escola, não tendo possibilidade de se aperceber da aproximação do (…).

    4. Deveria ter sido dado como provado que, após disparar o arguido ficou com olhar estático, não reagindo a perguntas e observações que lhe foram feitas 5. Deveria ter sido dado como provado que o arguido, em data anterior à dos factos, se havia dirigido à escola para ver o seu filho e que tudo correu com a maior das correcções e educação 6. Deveria ter sido dado como provado no nº a.16) dos factos provados que o (…) tinha uma postura ameaçadora.

    5. Deveria ter sido dado como provado que o arguido não se apercebeu de ter ferido a assistente, embora o admita como possível.

    6. Deveria ter sido dado como provado que antes de o arguido ter empunhado a arma o (…) levou a mão ao bolso.

    7. Deveria ter sido dado como provado que perante tal movimento o arguido se convenção que o (…) se propunha pegar na arma com que há anos o ameaçava e, por isso, temeu pela sua vida.

    8. Deveria ter sido dado como provado que quando o arguido ia a casa do (…) buscar os seus filhos, aquele se colocava à entrada da porta, com ar ameaçador, e de arma de fogo à cintura, a exibi-la.

    9. Que o arguido, conforma resulta da perícia de avaliação psicológica, não apresenta qualquer perigosidade.

    10. A eliminação dos factos provados e o aditamento dos factos que deveriam ter sido dados como provados, justifica-se quer pela ausência de prova, quer por má interpretação da prova produzida, designadamente dos depoimentos das testemunhas arroladas pela acusação, cujos depoimentos se transcrevem retro, (…), e ainda das testemunhas de defesa (…), retro se identificando quer as datas quer o momento temporal dos respectivos depoimentos.

    11. Também os relatórios das perícias efectuadas resultam os factos que devem ser dados como provados, e retro referidos.

    12. Fazendo-se o ajuste dos factos à prova produzida, e às regras da experiência, temos de salientar o seguinte, que deveria, em súmula, ser dado como provado, permitindo uma correcta aplicação da lei e da sanção: a) O arguido sempre foi cidadão exemplar, trabalhador, dedicado à família, com comportamento social adequado, não tendo antecedentes criminais.

  3. Apesar da etnia a que pertence, sempre teve condutas adequadas à vida na nossa sociedade, respeitando as suas leis e regras, tendo mesmo, contrariamente ao que acontece com a grande maioria dos da sua etnia, contraído casamento.

  4. Enquanto no EP, sempre procurou valorizar a sua formação, frequentando cursos e acções de formação.

  5. O arguido era impedido pela assistente (…) de manter contactos com o seu filho mais novo, no que esta era apoiada por seu pai, o (…).

  6. Ao longo dos anos, e após o seu divórcio da assistente (…), o arguido era frequentemente confrontado com ameaças, não só contra a sua integridade física, como também contra a sua vida, pelo (…) que, numa fase inicial em que o arguido ia a casa daquele buscar os seus filhos, lhe exibia uma arma de fogo com ar ameaçador.

  7. O arguido, face à proibição de ver o filho mais novo, que lhe era imposto pela (…) e seu pai, (…), e perante as ameaças deste, passou a estar emocionalmente instável e perturbado, no contexto de um quadro afectivo depressivo, receando pela sua vida.

  8. Como pai responsável e presente que pretendia ser, e face ao amor dedicado a seus filhos, o arguido traçou um plano para conseguir ver o seu filho mais novo, que passou, simplesmente, por ir vê-lo em ambiente escolar, durante o período lectivo, assim evitando encontrar-se com a assistente (…) e com o pai desta, o (…).

  9. Pretendia o arguido assim, não só ver o filho, como salvaguardar as suas vida e integridade física, face às constantes ameaças de que era alvo.

  10. Em momento anterior à data dos factos em apreço, o arguido dirigiu-se à escola onde estava seu filho e teve comportamento adequado, abandonando o local sem qualquer problema apesar de ter sido impedido de contactar com o filho, já que na assistente (…) o havia proibido expressamente. O arguido foi educado no trato com todos com quem contactou.

  11. No dia dos factos o arguido dirigiu-se à escola, mais uma vez em período lectivo, altura em que sabia que aí se não encontravam nem a assistente (…), nem o pai desta, o (…).

  12. O horário escolhido pelo arguido foi-o de molde a evitar encontrar-se com eles.

  13. Conforme resulta do depoimento da assistente (…), foi esta alertada para o facto de o arguido, seu ex-marido, se encontrar na X (...), o que a levou a chamar o seu pai, o (…) e a dirigir-se de imediato à escola para impedir que o arguido contactasse o seu filho.

  14. O arguido, não tendo conseguido falar com o seu filho, pediu ao director da escola que o autorizasse a vê-lo, ao longe, quando este saísse para o recreio, no intervalo das aulas.

  15. Assim, o arguido colocou-se no átrio da escola, de costas para a entrada, aguardando pela saída de seu filho.

  16. Nessa posição foi abordado pelo (…) que, súbita e inesperadamente se lhe dirigiu e lhe perguntou o que ele estava ali a fazer, ao que o arguido respondeu que pretendia ver o seu filho.

  17. Na sequência desta resposta do arguido, o (…), aproximou-se do arguido, lateralmente, e encostou-se ao seu pescoço, falando-lhe ao ouvido, ameaçando-o.

  18. Na sequência desta atitude do (…), o arguido voltou-se e envolveu-se em...

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