Acórdão nº 873/16.5T8CTB-B.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 20 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelALBERTO RUÇO
Data da Resolução20 de Abril de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Recurso de Apelação – Processo n.º 873/16.5T8CTB-B.C1 Juiz relator…………....Alberto Augusto Vicente Ruço 1.º Juiz adjunto………José Vítor dos Santos Amaral 2.º Juiz adjunto……….Luís Filipe Dias Cravo Sumário: I – Em sede de recurso da matéria de facto só de aditam aos factos provados os factos instrumentais ou complementares que sejam indispensáveis à decisão – al. c) do n.º 2 do artigo 662.º do Código de Processo Civil.

II - A cessação de um acompanhamento psicológico prolongado, do qual beneficiava uma menor de 12 anos, com necessidades especiais, decidida apenas por um dos pais, sem conhecimento e acordo do outro, integra-se no conceito de «questão de particular importância» mencionado no n.º 1 do artigo 1906.º do Código Civil.

III – A condenação em multa do progenitor que falta ao cumprimento dos deveres parentais, prevista no n.º 1 do artigo 40.º (Incumprimento) do Regime Geral do Processo Tutelar Cível – Lei n.º 141/2015, de 08 de setembro –, só deve ocorrer nas situações em que a sua aplicação seja necessária para assinalar a gravidade da conduta sancionada ou para motivar o agente no sentido de evitar novo incumprimento no futuro.

IV – A indemnização por danos não patrimoniais, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 496.º do Código Civil e n.º 1 do artigo 40.º (Incumprimento) do Regime Geral do Processo Tutelar Cível – Lei n.º 141/2015, de 08 de setembro –, só deve ser atribuída nos casos graves, por ser exigível que os sujeitos passivos do dano suportem altruisticamente alguns danos em prol da coesão das relações familiares ou entre ex-cônjuges quando cooperam no desempenho das responsabilidades parentais.

* Recorrente (pai) …………..V...; Recorrida (mãe)……………A...; Menores……………………..B...; e ………………………………...M...

  1. Relatório a) O presente recurso vem interposto da sentença que antecede, a qual decidiu os pedidos formulados pelo recorrente V... relativos ao incumprimento das responsabilidades parentais que este imputa à requerida A...

    Em síntese, alega que a Recorrida, mãe das duas menores filhas de ambos, interrompeu o acompanhamento terapêutico da menor M... com o Dr. J..., psicólogo, que a acompanhava desde outubro de 2015, sem ter obtido o acordo do pai, o ora recorrente, tendo-o feito sem informar sequer o recorrente, tendo-o feito porque ficou desagradada com um relatório elaborado pelo referido psicólogo e sem ter tido em conta o interesse da filha, sendo certo que se trata de assunto que respeita às questões de particular importância a decidir por ambos os pais, consoante o regime previamente fixado.

    Em relação à filha B..., referiu que a mãe declarou na conferência de pais, ocorrida em 2016, que esta já tinha uma consulta de psicologia agendada, mas apenas a terá agendado em 2018, o que configura igualmente incumprimento.

    Terminou pedindo a condenação da recorrida em multa e indemnização a favor do Recorrente e das filhas menores.

    A mãe das menores confirmou que retirou a filha das mencionadas consultas de psicologia, mas que o acompanhamento da filha não foi interrompido porquanto passou a ser feito por outro psicólogo, no caso pela Dra. M..., a qual já tinha procedido anteriormente a uma avaliação da M...

    Justificou a alteração por duas razões: por um lado, porque o psicólogo que acompanhava a M... exarou num relatório factos ofensivos para a pessoa da Recorrida, sem prévio contraditório, os quais são e não correspondem à realidade e, por outro, porque o psicólogo lhe disse que não era previsível que as limitações pessoais da sua filha tivessem uma evolução positiva.

    Antes da audiência de julgamento o tribunal solicitou ao inquérito crime n.º ... remessa de certidão do relatório pericial referente à perícia cuja realização aí havia sido determinada com referência à jovem M...

    Solicitou-se também a realização de uma perícia psicológica e psiquiátrica à progenitora das crianças, com vista a aferir, para além do mais que for tido por pertinente, se aquela padece de doença que lhe retire ou diminua as competências para cuidar adequadamente das filhas; Pediu-se ao Agrupamentos de Escolas frequentados pelas menores informação sobre a assiduidade, pontualidade, aproveitamento e comportamento das menores; Oficiou-se ao Departamento de Psiquiatria do Hospital da … e ao Serviço de Pedopsiquiatria do Hospital …, informação sobre a atual situação clínica de M...

    Em 25 de junho de 2018 o pai das menores juntou aos autos um requerimento, alegando que a M... afinal não tinha tido consultas com a Dra. M..., como a mãe tinha dito na conferência de pais e informava que o Dr. J... considerava contraproducente a M... ser acompanhada por dois psicólogos ao mesmo tempo, pedindo a condenação da mãe das menores como litigante de má fé.

    Em conferência de pais realizada em 4 de setembro de 2018 (no apenso A), apurou-se que por falta de acordo entre os pais quanto à identidade do psicólogo, a M... não frequentava consultas de psicologia desde o pretérito mês de julho de 2018, pelo que tribunal determinou que o acompanhamento da menor se realizasse no Departamento de Pedopsiquiatria do Centro Hospitalar da …, onde a menor já frequentava a consulta de psiquiatria da infância e adolescência e onde não se encontrava a ter acompanhamento psicológico pelo facto de, até Junho de 2018, estar a ser apoiada por outro psicólogo.

    Após outras diligências, realizou-se a audiência de julgamento e foi proferida a sentença recorrida, com o seguinte dispositivo: «Em face do exposto, decido julgar improcedente a presente acção, absolvendo a progenitora dos pedidos contra si peticionados e, designadamente, da implícita pretensão de retoma, pela jovem M..., do acompanhamento psicológico que mantinha com o Dr. J..., considerando que o actual acompanhamento de que beneficia (no Centro Hospitalar da …) tem vindo a revelar-se adequado à salvaguarda do superior interesse daquela.

    Custas pelo requerente».

    b) É desta decisão que vem interposto recurso por parte do pai da menores, cujas conclusões são as seguintes: ...

    c) Contra-alegou a mãe das menores pugnando pela manutenção da decisão porquanto «…ainda que se entenda que a alteração de psicólogo, no caso da M..., é uma questão de particular importância, o contexto em que a decisão da mãe foi tomada justifica plenamente a referida mudança, não só porque não havia condições de confiança da parte da mãe, sendo posta em causa em relatórios que foram distribuídos por várias pessoas, com acusações graves e sem a mínima legitimidade ou conhecimento para tal (uma vez que nunca a mãe foi consultada por aquele clínico), como claramente a terapêutica não era a adequada, sendo notória a evolução da M... após a mudança.

    Não se tratou assim de uma decisão egoísta e fútil (até porque se assim fosse teria sido, com certeza, em data anterior), mas antes de uma decisão que permitiu continuar o acompanhamento psicológico da filha nas condições adequadas em que o envolvimento dos progenitores, em particular daquele com quem a M... reside, é fundamental e isso estava inevitavelmente comprometido.

    Acresce que seria muito difícil, em tempo útil, ter o acordo do pai para uma solução alternativa. Na verdade, até hoje o pai não aceitou mais nenhum dos psicólogos, nem a escolhida pela mãe, nem a indicada pelo tribunal, pois, como acima se disse, o pai continua, à data de hoje, a proibir a senhora psicóloga do Hospital da C… de dar consultas à filha».

    d) O Ex.mo Procurador do Ministério Público pronunciou-se sobre o recurso e concluiu do seguinte modo: «1 – Por sentença datada de 18/11/2020, proferida nos autos referenciados em epígrafe, foi julgada improcedente a ação de incumprimento do regime de RERP, fixado relativamente a B... e a M..., nascidas ambas a 16/11/2004, filhas de V... e de A...

    2 - Com efeito, por decisão datada de 25/02/2013, proferida nos autos de Divórcio por Mútuo Consentimento nº ..., da Conservatória do Registo Civil de …, foi homologado acordo de RERP, relativamente às jovens B... e M..., sendo que a residência destas foi fixada junto da mãe, exercendo as responsabilidades parentais, em comum, ambos os progenitores, no que às questões de particular importância respeita. Mais foi estabelecido um regime de convívios, das jovens com o pai, bem assim um regime de alimentos, a prestar pelo progenitor às filhas.

    3 - Por sentença datada de 27/06/2017, proferida nos autos principais de alteração do regime de RERP, foi julgada improcedente tal ação, no que diz respeito à pretensão do progenitor das jovens, no sentido da fixação da residência, consigo, das duas filhas. Procedeu-se, no entanto, à alteração do regime de convívios, do progenitor com as jovens, mantendo, no mais, o regime de RERP em execução.

    4 - Por sentença datada de 18/11/2020, proferida nos apensos autos de alteração do regime de RERP (apenso A), foi julgada improcedente tal ação, no que diz respeito a todas as pretensões do progenitor das jovens.

    5 - Sob o apenso C corre termos processo de promoção e proteção, em benefício das jovens B... e M..., devido a alegados maus tratos destas, por parte da progenitora, os quais tiveram início num relatório psicológico, datado de 04/05/2018, elaborado pelo Dr. J..., psicólogo que, à data, acompanhava a jovem M..., portadora de diversas patologias, entre as quais, perturbação do espetro do autismo.

    6 - Tal factualidade deu origem ao inquérito criminal nº ... da Procuradoria da República do Juízo Local Criminal de Castelo Branco, sendo que, por despacho, datado de 17/04/2019, foi ordenado o arquivamento dos autos, nos termos do disposto no art. 277, nº 2, do C. Processo Penal, por se haver entendido não indicar, o processo, a prática, pela progenitora das jovens, de qualquer crime de violência doméstica, cometido na pessoa das filhas.

    7 - Requerida, nesse processo, a abertura de instrução, foi o mesmo rejeitado, por inadmissibilidade legal, por decisão datada de 02/08/2019.

    8 - Interposto recurso, de tal despacho, por acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 15/01/2020, foi aquele...

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