Acórdão nº 1446/17.0T8VIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Janeiro de 2020
Magistrado Responsável | BARATEIRO MARTINS |
Data da Resolução | 14 de Janeiro de 2020 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório Z (…), S.A.
intentou acção declarativa de condenação, com processo comum, contra P (…) pedindo que este seja “condenado no pagamento da quantia de € 9.669,40, acrescida de juros vincendos até integral pagamento”.
Alegou para tal, em resumo, que o R. era seu segurado (quanto à responsabilidade civil decorrente de acidentes de viação com o veículo MS (...) ) e que (com tal veículo) foi, com culpa (não respeitando o sinal de cedência de passagem), interveniente em acidente de viação (ocorrido em 19/05/2014, pela 00,45 horas, em Viseu), sendo que conduzia o veículo com uma TAS de 1,40g/l, razão pela qual, tendo a A. indemnizado os danos materiais e não patrimoniais causados à lesada em tal acidente, no que despendeu o total de € 9.669,40, vem agora aqui exercer o direito de regresso (previsto no art. 27.º/1/c) do DL n.º 291/2007) contra o R., então condutor do veículo MS e seu segurado.
O R. contestou.
Alegou, em síntese, que, para o direito de regresso, para além de provar a culpa do condutor, tem a seguradora “de alegar e provar ainda factos de onde resulte o nexo de causalidade entre a condução com uma taxa de alcoolemia superior à legalmente permitida e o evento dele resultante”[1], o que a A. não fez; e que “as despesas apresentadas não se encontram minimamente descritas e comprovadas, pelo que se impugnam por não se saber a que respeitam, nem sequer se derivadas do sinistro e efectivamente pagas”[2]; razões pelas quais concluiu pela total improcedência da acção.
Dispensada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador, em que foi declarada a total regularidade da instância, estado em que se mantém.
Instruído o processo e realizada a audiência, a Exma. Juíza proferiu sentença, em que julgou a acção totalmente improcedente e, em consequência, absolveu o R. do pedido.
Inconformados com tal decisão, interpôs a A. o presente recurso, visando a sua revogação e substituição por outra que que julgue integralmente procedente a Acção e condene a Ré no pedido formulado na P.I.”.
Terminou a sua alegação com as seguintes conclusões: “ (…) 1) A ora Apelante não se pode conformar com a douta sentença, no que respeita à absolvição do Réu da totalidade do pedido contra si deduzido, entendendo que douto Tribunal a quo fez errada interpretação dos factos provados, aplicando incorrectamente o direito substantivo e processual aos mesmos, incorrendo em erro aquando da decisão proferida.
2) Dos factos dados como provados, nos pontos 3º a 8º, 10º, 11º e 14º e 15º na douta Sentença de que ora se recorre, e que supra se transcreveram, resultam, inequivocamente e com especial importância para a decisão de mérito os seguintes: 1) Aquando da ocorrência do acidente o aqui Reu conduzia com uma TAS de 1,40 g/l. 2) No local onde provinha o veículo MS, conduzido pelo aqui Réu, existia um sinal de cedência de passagem, que impunha ao mesmo ceder passagem aos veículos que circulavam na Rua Nuno Alvares Pereira, como era o caso do veículo BBW. 3) O veículo conduzido pelo Réu invadiu a faixa de rodagem onde circulava o BBW. 4) O embate ocorreu entre a frente do MS e a lateral frente direita do BBW.
3) Salvo o devido respeito pela posição assumida pelo doutro Tribunal a quo, a ora recorrente não pode nem consegue aceita que em face dos factos supra enumerado se tenha decidido que o Réu ilidiu a presunção de culpa que sobre si recaia e que não se tenha demonstrado a verificação de nexo de causalidade entre a TAS que o Réu apresentava no momento do acidente e a ocorrência do mesmo.
4) É entendimento unanime da Jurisprudência dos Tribunais Superiores que o D.L. 291/2007, aplicável à data dos factos, deixou de exigir a demonstração do nexo de causalidade entre a ocorrência do acidente e a TAS detectada no condutor.
5) É Jurisprudência pacífica e uniformizada que a entrada em vigor do D.L. 291/2007 teve como consequência dispensar a seguradora do ónus de demonstração do nexo de causalidade entre a condução com álcool e a verificação do acidente. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Proc: 1658/14.9TBVLG.P1.SI, de 6/4/2017, Tribunal da Relação de Évora, Proc: 287/16.7T8STR. E1, de 24/5/2018, in www.dgsi.pt 6) Pelo exposto, torna-se evidente que no caso em apreço andou mal o douto Tribunal a quo quando refere que a ora recorrente não conseguiu demonstrar o nexo de causalidade entre a verificação do acidente e a TAS que o Réu possuía no momento da ocorrência do mesmo, à ora recorrente não exigível esse tipo de prova, estando dispensada de o fazer pela lei substantiva, estabelecida no art. 27º do D.L. 291/2007.
7) O art. 27º do D.L. 291/2007 exige apenas e só que a seguradora demonstre que o acidente ocorreu por culpa do condutor do veículo seu segurado, aqui Réu, que no momento do acidente o condutor do veículo seu segurado conduzisse com uma TAS superior à legal, leia-se 0.5 g/l, e que do acidente tenham resultado danos indemnizáveis pela seguradora.
8) É evidente que dos três pressupostos para a consagração do seu direito de regresso no presente caso, dois deles, estão sobeja e claramente demonstrados, sendo, por demais evidentes: - A condução no momento do acidente, por parte do aqui Réu, com uma TAS superior à legal, no caso uma TAS crime de 1,40 g/l.
- A existência de danos indemnizáveis e indemnizados, conforme factos 1º e 2º, 9º a 13º do elenco dos factos dados como provados na douta Sentença ora recorrida.
9) Quanto ao terceiro e último pressuposto para a existência do direito de regresso da ora recorrente, a culpa do Réu na produção do acidente, salvo o devido respeito por opinião diversa, entende a aqui Recorrente que o mesmo resultou, também provado em consonância com os pontos 3º a 8º e 9º do elenco dos factos provado na douta Sentença.
10) Tendo resultado provado que o aqui Réu conduzindo o veículo MS com uma TAS de 1,40 g/l, numa estrada à qual estava aposto um sinal de cedência de passagem, que o obrigava a ceder passagem a todos os veículos que circulavam na Rua Nuno Alvares Pereira, não tendo cedido passagem ao veículo BBW, que circulava nesta artéria, indo-lhe embater com a frente direita, na lateral direita do BBW, deu causa exclusiva ao acidente.
11) A imposição de um sinal de cedência de passagem ao aqui Réu, impunha-lhe um dever especial de cuidado ao entrar na estrada onde ocorreu o acidente. Por outro lado, circulando com uma TAS de 1,40 g/l, o aqui Réu estava notória e evidentemente limitado na sua actuação e condução. Acresce que tendo o embate ocorrido entre a lateral direita do BBW e a frente do MS fica claro que o BBW já estava a passar a zona do cruzamento quanto o MS entra no mesmo e lhe embate.
12) Pelo exposto, entende a aqui recorrente que o aqui Réu não cumpriu com o dever de cuidado que lhe era exigível nem com a imposição de cedência de passagem que o sinal lhe impunha.
13) O aqui Réu não ilidiu, de todo, a presunção de culpa que sobre ele recaia, não pode valer ao aqui Réu a simples duvida se o veículo BBW circulava com os faróis ligados ou não. Era ao Réu que incumbia essa prova clara e irrefutável de forma a que pudesse ilidir a presunção de culpa que sobre ele recaia.
14) Teria que ter ficado, cabalmente, demonstrado e provado nos autos que o veículo BBW aquando da ocorrência do acidente não circulava com os faróis ligados, que isso tenha impossibilitado o aqui Réu de o visualizar, e que essa circunstância tenha sido a causa para a ocorrência do acidente.
15) Pelo exposto entende a ora recorrente que o douto Tribunal a quo andou mal na aplicação do direito aos factos, tendo violado o disposto no art. 27º do D.L. 291/2007 e o art. 342º do CPC, entre outros, bem indo contra jurisprudência uniformizada dos tribunais superiores.
. (…)” O R. respondeu, sustentando, em síntese, que a sentença recorrida não violou qualquer norma substantiva, designadamente, as referidas pela recorrente, pelo que deve ser mantida nos seus precisos termos; e, subsidiariamente, ampliou o objecto do recurso, devendo dar-se por não provado o facto 13 dos factos provados, por ausência de prova do valor dos danos decorrentes do sinistro em causa.” Terminou a sua alegação com as seguintes conclusões: “(…) 1. O Recorrido entende dever manter-se nos exactos termos a douta sentença absolutória proferida pelo Tribunal a quo, não reconhecendo mérito ao recurso interposto pela Autora, ora Recorrente.
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Em alegações a Recorrente vem recorrer da matéria de direito, nomeadamente por errada interpretação dos factos provados e aplicação incorrecta do direito substantivo e processual aos mesmos e consequente erro aquando da decisão.
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Pelo que a matéria de facto será dada por assente, limitando-se o recurso à apreciação da matéria de direito.
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Ora, tendo em conta dos provados em 4.º e 8.º e não provados em a) a d) e f) a h), dos quais resulta que ao aproximar-se do sinal de cedência de passagem o Recorrido abrandou e não constatou a existência de luzes rodoviárias na Rua Nuno Álvares Pereira, para a qual pretendia seguir e por isso avançou, não ficando provado que o veículo no qual o recorrido embateu seguisse com os faróis ligados, bem como não ficando provado que o sinistro se deveu ao excesso de álcool no sangue do Recorrido ou que a TAS com que seguia afectasse a sua condução, ou que o Recorrido tivesse incumprido os deveres de cuidado, zelo, precaução e...
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