Acórdão nº 5078/17.5T8CBR-D.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 03 de Março de 2020

Magistrado ResponsávelMARIA CATARINA GONÇALVES
Data da Resolução03 de Março de 2020
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I.

C (…) residente (…), (…), veio, por apenso ao processo onde foi declarada a sua insolvência, instaurar acção contra Massa Insolvente de C (…), ao abrigo do disposto no art. 125º do CIRE, pedindo que se considere extemporânea a resolução do acto de repúdio de herança ou, caso assim não se entenda, que se considere a falta de fundamentação da resolução, condenando-se a Ré a reconhecer a validade e eficácia do repúdio da herança e revogando-se a declaração de resolução de negócio em benefício da Massa Insolvente que infundadamente a Sra. Administradora de Insolvência operou.

Alega, em resumo: que, através de carta registada com aviso de recepção datada de 14 de Janeiro de 2019, a Ré procedeu à resolução em benefício da Massa Insolvente do repúdio da herança efectuado pela Requerente no dia 8 de Maio de 2017; que a Ré teve conhecimento do repúdio da herança através de comunicação feita pela própria Autora, na pessoa do seu mandatário, através de e-mail datado de 13 de Abril de 2018, pelo que e tendo em conta o disposto no art. 123º, nº 1, do CIRE, à data em que foi efectuada a resolução já havia caducado o direito de a ela proceder; que tal resolução carece de fundamento legal, sendo cero que não foi indicado o concreto fundamento com base na qual era efectuada nem foram alegados os requisitos legais; que não existiu má-fé no repúdio em causa, sendo certo que não teve intenção de beneficiar ninguém e que apenas repudiou a herança por considerar que moralmente não lhe devia caber tendo em conta a ajuda que o seu pai lhe prestou em vida.

A Ré contestou, sustentando não ter caducado o direito à resolução e alegando que, na missiva que enviou, constavam todos os elementos essenciais para fundamentar a sua decisão. Mais alega que o repúdio da herança constitui um acto prejudicial para a massa insolvente e seus credores, na medida em que se altera a titularidade dos bens que a insolvente possuía, sem se receber qualquer preço pelos mesmos e, de acordo com o estatuído nos termos do artigo 121.º, n.º 1 alínea b) do CIRE, os actos aí mencionados são susceptíveis de resolução independentemente de quaisquer outros requisitos.

Conclui pedindo a improcedência da acção.

Por despacho proferido em 03/06/2019, a Autora foi convidada a aperfeiçoar a sua petição nos seguintes termos: “- Para efeitos de apurar o interesse processual da Autora na impugnação da resolução do ato de repúdio de herança por si própria praticado, mostra-se necessário que concretize factualmente os efeitos pessoais ou patrimoniais que decorreram do ato resolvido que não interessam à insolvência e que possam cessar em consequência da resolução (vd. Luís Carvalho Fernandes e João Labareda, em CIRE Anotado, 2.ª Edição, Quid Juris, pág. 539, anotação 4. ao artigo 125.º do CIRE); - Juntar aos autos os documentos que a senhora AI terá apresentado com a carta de resolução datada de 14.01.2019, nesta referidas como documentos 01 a 13”.

A Autora veio aperfeiçoar a sua petição, dizendo: que, se há alguém que tem interesse processual na impugnação é a própria Autora pois foi ela quem praticou o acto; que, além do mais, foi notificada da resolução pela Sr.ª Administradora o que demonstra o seu interesse na impugnação; que viveu, nos últimos tempos, uma situação financeira de pré-insolvência e a sua sobrevivência só foi possível através de ajudas do seu pai e dos seus irmãos, principalmente da sua irmã mais velha, M (…) com quem ainda reside; que o repúdio à herança de seu pai foi a forma que adoptou para os poder compensar, sendo certo que, se os irmãos se arrogassem credores da Autora no âmbito da insolvência, certamente que a dívida da massa seria exponencialmente superior.

Subsidiariamente e para o caso de se entender que não tem interesse processual nos autos, requer a intervenção principal provocada da cabeça de casal da herança aberta por óbito de seu pai M (…)..

Foi realizada a audiência prévia no âmbito da qual foi comunicada às partes a possibilidade de se poder conhecer da exceção dilatória de ilegitimidade activa, tendo sido facultada às partes a oportunidade de se pronunciarem sobre a aludida excepção.

Na sequência desses actos, foi proferida decisão que, julgando verificada a excepção de ilegitimidade activa, absolveu a Ré da instância.

Inconformada com essa decisão, a Autora veio interpor recurso, formulando as seguintes conclusões: (…) A Massa Insolvente de C (…) apresentou contra-alegações, formulando as seguintes conclusões: (…) ///// II.

Questões a apreciar: Atendendo às conclusões das alegações da Apelante – pelas quais se define o objecto e delimita o âmbito do recurso – são as seguintes as questões a apreciar e decidir: ● Saber se a excepção de ilegitimidade podia e devia ter sido apreciada antes de ser apreciada a excepção de caducidade do direito de resolução do acto que a Autora/Apelante havia invocado na petição inicial; ● Saber se a Autora tem (ou não) legitimidade para instaurar a presente acção com vista à impugnação da resolução em benefício da massa insolvente que foi efectuada pela Administradora de insolvência relativamente ao acto – praticado pela Autora – de repúdio da herança aberta por óbito de seu pai.

///// III.

Na 1ª instância consideraram-se assentes os seguintes factos: A) No dia 26.06.2019, C (…) solteira, NIF (…), residente (…), interpôs ação especial de insolvência, requerendo a declaração da sua insolvência; B) Por sentença proferida no dia 14.07.2017, já transitada em julgado, foi declarada a insolvência de C (…), tendo sido nomeada como Administrador da Insolvência (AI) a senhora Dr.ª (…) C) No dia...

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