Acórdão nº 88/10.6 JAGRD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 23 de Novembro de 2011

Magistrado ResponsávelBRÍZIDA MARTINS
Data da Resolução23 de Novembro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I – Relatório.

1.1.

A...

, entretanto mais identificado nos autos, e a cuja ordem se encontra preventivamente detido, desde 22 de Maio de 2010 [fls. 94/5 e 1.101/2], foi conjuntamente [c/ B...] submetido a julgamento, porquanto acusado (s) pelo Ministério Público da prática de factos que o (s) instituiria (m) na co-autoria material, e em concurso efectivo de infracções, a) de um crime tentado de homicídio qualificado, previsto e punido através das disposições conjugadas dos art.ºs 22.º; 23.º; 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, alíneas c), h) e j), todos do Código Penal; b) de um crime consumado de roubo, previsto e punido pelo art.º 210.º, n.º 1, do mesmo diploma; c) de um crime tentado de burla informática e nas comunicações, previsto e punido pelo art.º 221.º, n.ºs 1 e 3, ainda do Código Penal, e, finalmente, d) de um crime consumado de furto de uso de veículo, previsto e punido este pelo art.º 208.º, do mencionado diploma substantivo [fls. 694/701].

Por despacho de fls. 816 foi admitido a intervir nos autos, na qualidade de assistente, C...

, também mais identificado.

C... este que igualmente deduziu pedido de indemnização contra os dois visados arguidos nos autos [fls. 770 e segs.], pedindo a sua condenação a solverem-lhe, a título de ressarcimento dos danos patrimoniais e não patrimoniais sobrevindos em consequência da conduta delitiva assacada, a quantia de € 186.266,31, acrescida dos competentes juros moratórios, contabilizados à taxa legal, desde a data da sentença e até integral pagamento.

Pedido admitido conforme despacho exarado a 843.

Também os Hospitais da Universidade de Coimbra, EPE, formularam contra ambos os ditos arguidos pedido de reembolso da quantia € 3.242,35 e respectivos juros, correspondente ao valor da assistência médica por si prestada ao assistente em causa.

Findo o contraditório – em cujo decurso se procedeu à comunicação aos arguidos de uma alteração jurídica da factualidade mencionada supra como a) e b), a qual integraria, entendeu-se então, a prática, em co-autoria, de um crime de roubo qualificado, previsto e punido nos termos do art.º 210.º, n.º 2, alínea a), do Código Penal [fls. 1.131] –, prolatou-se acórdão determinando ao mais ora relevante, e no que contende com o arguido em causa:

  1. Julgar não provada e improcedente a acusação quanto à prática do apontado crime de burla informática e nas telecomunicações, dele se absolvendo o mesmo.

  2. Julgá-lo autor de factos integrantes da previsão típica de um crime qualificado de roubo e outro de furto de uso de veículo, previstos e punidos, respectivamente, pelos citados art.ºs 210.º, n.º 2, alínea a) e 208.º.

  3. Declará-lo, todavia, inimputável e perigoso, assim lhe impondo medida de segurança de internamento, medida esta que – no caso de se proceder à sua execução – terá a duração que o tribunal de execução das penas entender adequada, ao abrigo do disposto no art.º 92.º, n.ºs 1 e 2 do Código Penal, sem nunca exceder quinze anos.

  4. Suspender a execução desta medida de segurança, suspensão esta que vigorará por período a concretizar, até o tribunal verificar que cessou o estado de perigosidade que levou à aplicação da medida, mas sempre por período não superior a cinco anos. Durante a suspensão, o arguido ficará sujeito a vigilância tutelar por parte da equipa da Beira Norte da DGRS, que reportará ao tribunal semestralmente as ocorrências adequadas à apreciação da medida, e deverá respeitar as directivas que lhe forem fixadas pelos respectivos técnicos, devendo apresentar-se nas instalações da equipa sempre que tal lhe for solicitado. Mais deverá observar todas as regras e cumprir todos os deveres que lhe forem transmitidos quer pela equipa quer pelos técnicos de saúde que o acompanhem, de modo a manter os tratamentos e regimes de cura apropriados, bem como prestar-se aos exames, observações e avaliações que para tanto lhe forem fixados.

  5. Julgar totalmente improcedente o pedido de reembolso formulado pelos Hospitais da Universidade de Coimbra, EPE.

  6. Relativamente ao pedido de indemnização formulado por C..., remeter os sujeitos processuais para os meios comuns, não tomando conhecimento do mesmo.

1.2. Parcialmente desavindos com segmentos do sentenciado, interpuseram recurso quer o Ministério Público [quanto a d)], quer o assistente [quanto a f)], extraindo das motivações apresentadas as seguintes ordens de conclusões: (o Ministério Público) 1. O arguido A..., declarado inimputável e perigoso, praticou, para além do mais, factos integradores do crime de roubo qualificado previsto e punido pelo art.º 210.º, n.ºs 1 e 2, alínea a), do Código Penal, com moldura penal abstracta de 3 a 15 anos de prisão.

  1. Atenta a gravidade do crime cometido, e as condições de vida desse seu agente, a suspensão da execução da medida de segurança de internamento nem se revela compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social, nem permite razoavelmente supor que assim se alcance a finalidade da medida.

  2. Decidindo pela forma em que o fez, o aresto recorrido violou o disposto nos art.ºs 91.º, n.º 2 e 98.º, n.ºs 1 e 2 do Código Penal.

    Terminou pedindo a revogação parcial do sentenciado, determinando-se para o recorrido o efectivo internamento com a duração mínima de três anos, nos termos do disposto no aludido art.º 91.º, n.º 2.

    (o assistente) 1. Resulta como facto provado que em virtude das condutas assumidas pelo (s) arguido (s), sobrevieram ao assistente C... sequelas que o afectam de forma permanente na capacidade para o trabalho, nas suas capacidades intelectuais, na possibilidade de utilizar o corpo, os sentidos e a linguagem.

  3. E, ainda, que o ofendido apresenta deterioração cognitiva, e alterações de percepção espaço-temporal, caracterizadoras de uma situação de incapacidade de facto.

  4. Pelo que o acórdão recorrido, ao considerar que relativamente ao assistente não se invoca que seja ou esteja, momentânea ou definitivamente, incapacitado para entender e querer, incorre numa contradição óbvia e erro notório na apreciação da prova.

  5. A fim de fundamentar a decisão de reenviar o pedido de indemnização civil para os meios comuns o Tribunal a quo considerou que para clarificação da questão da representação haveria lugar à determinação da prática de actos vários que, na altura – para mais no âmbito de um processo com arguidos em observância de medida de coação capital – seguramente iriam, “retardar intoleravelmente o processo penal”.

  6. Ora, sem especificar de que actos se trata e em que medida os mesmos retardariam intoleravelmente o processo penal, o Tribunal sindicado violou os art.ºs 82.º, n.º 3 e 97.º, n.º 4, ambos do Código de Processo Penal, sendo que aquele primeiro deve ser entendido no sentido de que o juiz não tem aqui um poder discricionário, livre ou desvinculado.

  7. A decisão recorrida carece de oportunidade, pois tendo o Tribunal a quo conhecimento de que o assistente estava incapacitado para entender e querer, devia no decurso do processo penal, suprir tal incapacidade com recurso aos mecanismos previstos nos artigos 11.º e 92.º, ambos do Código Civil.

  8. Não se verificando qualquer complexidade nem demora na prática destes actos de suprimento.

  9. Quer o pedido de constituição do lesado como assistente, quer o pedido de indemnização civil por si apresentado, presentes por sua filha, no âmbito do presente processo penal, foram admitidos conforme despachos judiciais de fls. 816 e de fls. 843, respectivamente.

  10. A questão controvertida não contende com a legitimidade do assistente na dedução do pedido de indemnização civil, mas com a sua representação.

  11. Donde que se mostre irrelevante apurar se a invocada qualidade (de filha) unicamente a ela lhe cabe, uma vez que a mesma apenas se colocaria acaso ele houvesse falecido, hipótese que poderia suscitar um litisconsórcio necessário se o demandante civil não fosse o seu único herdeiro e surgisse desacompanhado dos outros.

  12. A remessa dos autos para os meios comuns é altamente prejudicial para o lesado porque o obriga a aguardar pela nomeação de representante nos autos de interdição, retardando assim o apoio financeiro que tanto necessita podendo até redundar em absoluta negação de tutela no caso de vir a falecer entretanto.

  13. Traduz-se ainda numa redundância dos meios de prova porque obriga o lesado a submeter-se a nova perícia, com os custos e os transtornos que uma deslocação ao IML de Coimbra implica para uma pessoa que carece de auxílio permanente de terceiros.

  14. Assinala-se ainda a inconveniência e a desnecessidade do recurso aos meios comuns porque tal solução vai atrasar o recurso às medidas de apoio à vítima, já que como é óbvio o arguido não possui bens susceptíveis de assegurar o seu ressarcimento.

  15. Não existem razões que se prendam com a celeridade processual num julgamento que comportou 5 sessões, aguardando-se pela junção aos autos dos relatórios de perícia do foro psiquiátrico do recorrido, junto a 29/06/2011, e do relatório da perícia de avaliação do dano corporal do ofendido, junto a 20/06/2011.

  16. Encontram-se junto aos autos todos os elementos periciais que permitem decidir sobre o pedido de indemnização civil – fls. 1.112 a 1.116 –.

  17. Ao decidir pela forma em que o fez, o Tribunal a quo violou o princípio da suficiência do processo penal e o princípio de adesão obrigatória do pedido plasmados nos art.ºs 7.º; 71.º; 74.º e 82.º, n.º 3, todos do Código de Processo Penal.

  18. Cominando o acórdão proferido com nulidade por omissão de pronúncia, ut art.º 379.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Penal.

  19. Padece ainda tal aresto do mesmo vício, ut art.ºs 374.º e 379.º, n.º 1, alínea c), do mesmo diploma adjectivo, quando não deu como provados ou não provados os factos que o recorrente apresentou no pedido de indemnização civil sob os pontos n.ºs 52, 63 a 69, referentes aos danos patrimoniais, 81 a 84 e 108, e, finalmente, o grau de incapacidade permanente geral de que ficou a padecer o ofendido.

    Terminou pedindo que no provimento do recurso seja revogado o segmento do...

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