Acórdão nº 1240/12.5PBVIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 03 de Julho de 2013

Magistrado ResponsávelLUÍS TEIXEIRA
Data da Resolução03 de Julho de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: I 1.

Nos autos de processo de inquérito nº 1240/12.5PBVIS a correr termos na secção de processos dos Serviços do Ministério Público do Tribunal Judicial de Viseu, Findo o respectivo inquérito, pelo Ministério Público foi determinado o arquivamento dos autos com o fundamento na verificação dos respectivos pressupostos para a dispensa de pena, quanto aos crimes de ofensas à integridade física simples que então se indiciavam.

2.

Este arquivamento mereceu a concordância da Srª Juiz de instrução, que também entendeu verificarem-se os respectivos pressupostos.

3.

Entretanto, a assistente A...

, melhor id. nos autos, na sua qualidade de ofendida e assistente, veio interpor recurso deste despacho judicial de concordância com o arquivamento determinado pelo Ministério Público, formulando as seguintes conclusões: I.

VEM O PRESENTE RECURSO INTERPOSTO DO DESPACHO DA M.MA JUIZ DE INSTRUÇÃO A QUO, DE CONCORDÂNCIA COM O ARQUIVAMENTO DO INQUÉRITO, POR DISPENSA DE PENA, PROPOSTO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO, QUANTO AO CRIME DE OFENSAS À INTEGRIDADE FÍSICA QUE VINHA IMPUTADO À ARGUIDA B...

; II.

O INSTITUTO DA DISPENSA DA PENA ESTÁ, CONFORME DECORRE DA LEI, PREVISTO PARA OS ILÍCITOS DE REDUZIDA DIGNIDADE PENAL, EM QUE A ILICITUDE DO FACTO E A CULPA DO AGENTE SÃO DIMINUTAS E EM QUE NÃO SE VERIFICA A OCORRÊNCIA DE QUAISQUER DANOS OU SE VERIFICA A SUA REPARAÇÃO INTEGRAL PELO AGENTE (CFR. ALS. A) A C) DO N.° 1 DO ART. 74.° DO C.P.); III.

TAL NÃO É, MANIFESTAMENTE, O CASO DOS PRESENTES AUTOS, ATENTA A GRAVIDADE DA AGRESSÃO, PERPETRADA PELA ARGUIDA B..., QUE PROVOCOU GRAVES LESÕES CORPORAIS À ASSISTENTE, E QUE DEMANDOU QUE ESTA FOSSE, DE IMEDIATO, ASSISTIDA PELO INEM E CONDUZIDA, DE URGÊNCIA, AO HOSPITAL DE S. TEOTÓNIO, ONDE, ALÉM DE EFECTUAR DIVERSOS EXAMES, TEVE AINDA DE SER SUBMETIDA A UMA PEQUENA INTERVENÇÃO CIRÚRGICA (SUTURA NO NARIZ); IV.

ACRESCE QUE A ASSISTENTE TEVE, AINDA, DE SUPORTAR DIVERSOS CUSTOS ASSOCIADOS À ASSISTÊNCIA MÉDICA DE QUE CARECEU (CFR. DOC. N.° 2 E 3), FICOU COM O SEU VESTUÁRIO RASGADO, PERDEU PARTE DO SEU RENDIMENTO MENSAL (CFR. DOC. N.° 4), EM VIRTUDE DE BAIXA MÉDICA E SOFREU DANOS NÃO PATRIMONIAIS RELEVANTES, OS QUAIS NÃO FORAM, DE FORMA ALGUMA, RESSARCIDOS PELA ARGUIDA B...; V.

A REPARAÇÃO DO DANO É “CONDITIO SINE QUA NON’ PARA A APLICAÇÃO DO INSTITUTO DA DISPENSA DA PENA, PELO QUE NÃO SE VERIFICANDO A MESMA NOS PRESENTES AUTOS, ENCONTRA-SE VEDADA AO MINISTÉRIO PÚBLICO A SUA APLICAÇÃO E À M.MA JUIZ A QUO A CONCORDÂNCIA COM A MESMA, INCASU.

VI.

ADEMAIS, CONSIDERANDO AS DECLARAÇÕES PRESTADAS PELA ORA ASSISTENTE, PELA OFENDIDA C... E PELA TESTEMUNHA D...

(A FLS. 127), SEMPRE ESTARIA, INCLUSIVAMENTE, EM CAUSA A VERIFICAÇÃO DAS AIS. A) E B) DO N.° 3 DO ART. 143.° DO C.P.; VII.

A POSSIBILIDADE DE DISPENSA DE PENA, PREVISTA NO ART. 280.° DO C.P., FOI, INEQUIVOCAMENTE, CONCEBIDA PARA ILÍCITOS DE ESCASSA RELEVÂNCIA PENAL E SOCIAL, DE DIMINUTA ILICITUDE E CULPA DO AGENTE, DE INEXISTÊNCIA DE DANOS OU DO SEU RESSARCIMENTO INTEGRAL PELO AGENTE E NÃO PARA SITUAÇÕES DE OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA COM A GRAVIDADE DESCRITA, COM AS CONSEQUÊNCIAS E OS DANOS ENUNCIADOS E NAS CIRCUNSTÂNCIAS EM QUE AQUELA OCORREU; VIII.

O DESPACHO DA M. JUIZ DE INSTRUÇÃO A QUO, DE CONCORDÂNCIA COM O ARQUIVAMENTO DOS AUTOS POR DISPENSA DE PENA, VIOLOU, DESIGNADAMENTE, O DISPOSTO NOS ARTS. 74º E 143. °, AMBOS DO C.P. E DO ART. 280.° DO C.P.P.; IX.

PELO QUE SE IMPÕE, ATENTO O EXPOSTO E AS NORMAS LEGAIS APLICÁVEIS, A REVOGAÇÃO DO DESPACHO RECORRIDO E A SUA SUBSTITUIÇÃO POR OUTRO QUE NÃO CONCORDE COM O ARQUIVAMENTO DOS AUTOS, QUANTO AO CRIME DE OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA DE QUE FOI VÍTIMA A ASSISTENTE, POR PARTE DA ARGUIDA B..., TUDO COM AS DEVIDAS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS. ASSIM SE FAZENDO JUSTIÇA. 4. O Ministério Público respondeu ao recurso, dizendo o seguinte: Ora, com todo o respeito, e como já havíamos referido no nosso despacho que determinou tal arquivamento, dos autos resulta suficientemente indiciada a existência de agressões mútuas entre a assistente e sua filha, por um lado, e a ofendida B...por outro, sendo que cada uma destas partes faz recair sobre a outra a culpa pelo início da contenda. Quanto a testemunhos, veja-se que para além das três ofendidas, que são simultaneamente arguidas, apenas foram inquiridos: F... (cunhado da A... e tio da C... ), que nos relatou ter havido agressões mútuas, tendo visto a assistente cair ao chão e a sua filha C... interpor-se, tentando separar a B...da sua mãe; E...

, que conhece a assistente, mas nada viu das agressões e D... , vizinha da assistente e da filha desta, que não viu as agressões, tendo relatado o que ouvira dizer sem esclarecer quem lho contara. Face a tais relatos, mantemos que não há qualquer motivo para darmos mais credibilidade ao depoimento da recorrente e da sua filha do que ao depoimento da ofendida/arguida B... , aliás, corroborado pela testemunha F... , e assim uma vez mais concluirmos que as agressões foram mútuas e não foi possível apurar quem iniciou as mesmas. Quanto à ilicitude dos factos, considerámos (tal como continuamos a considerar) a mesma diminuta porquanto as lesões que de tais agressões ocorreram não foram de grande monta e não passaram de meras escoriações e hematomas, apresentando a ofendida/arguida C... uma escoriação que lhe determinou 5 dias de doença todos sem qualquer incapacidade; a ofendida/arguida B...sofreu 2 escoriações e 3 hematomas, para cuja cura necessitou 8 dias de doença, o primeiro dos quais com afectação paro o trabalho geral mas todos sem afectação do trabalho profissional e a recorrente sofreu uma ferida contusa suturada na base da pirâmide nasal, 2 escoriações superficiais e 5 hematomas, cuja cura demandaram 20 dias de doença, sendo os primeiros 5 com afectação da capacidade para o trabalho geral e profissional. Nenhuma das três ficou com quaisquer consequências permanentes. Relacionado com esta escassa extensão dos danos causados (e impõe-se referir que se a recorrente ficou com roupa rasgada também a rasgou à ofendida B... ), há ainda que considerar o facto de que a recorrente caiu ao chão, e que entre si e a B...se interpôs a arguida/ofendida C... . Ora, é por demais sabido que nestas situações de agressões mútuas acaba por não se saber muito bem quem concretamente provocou cada uma das Iesões ou se acaso algumas dessas escoriações sofridas não acabam por ser consequência da acção da própria ofendida (veja-se que dos autos não se consegue perceber se foi a B...que empurrou a A... para o chão ou antes acabaram por cair as duas em virtude de estarem agarradas a lutar, também acabamos por não saber se as lesões que a recorrente sofreu acaso não resultaram dos seus próprios movimentos a debater-se com a outra, tão pouco nos parece que tal pudesse vir a ser apurado em sede de audiência de julgamento face aos já aludidos depoimentos das testemunhas inquiridas). No que concerne à culpa das arguidas, é a mesma tida por diminuta porquanto agiram as três em clima de grande exaltação, ofendendo-se umas às outras, tendo por início da discussão a relação amorosa que as arguidas B...e A... teriam tido com o mesmo homem, pelo que o comportamento de uma (e, repetimos, não se apurou qual foi a causadora da contenda) sempre será efeito/reacção ao comportamento da outra. Por último, quanto à reparação dos danos, se é certo que os danos sofridos por cada uma das ofendidas (e não apenas pela recorrente) não se encontram reparados, é igualmente verdade que também isso foi explicado no nosso despacho de arquivamento. Com efeito, tivemos em devida conta que não houve lugar à reparação de nenhum dano, mas explicámos também que perante os elementos já juntos aos autos, dificilmente se logrará provar em sede de audiência até que ponto cada uma das três arguidas é responsável pelos danos sofridos pelas outras. E, sem nos querermos repetir, uma vez mais convocamos o facto de estarmos perante lesões recíprocas, em cujo cenário cada ofendida é igual e simultaneamente agressora, e que por vezes acaba por se magoar em consequência das suas próprias reacções, acaba por se desequilibrar quando ela própria ia agredir, acaba por se magoar quando se desvia para acertar na outra, ou mesmo acaba por sair magoada quando uma terceira (no caso, a C... ) se interpõe para separar e inadvertidamente empurra ou puxa ambas. Por isso dizíamos, lesões todas tiveram, umas mais outras menos, mas daí sequer se pode depreender que a que teve mais ou maiores lesões tenha sido a que mais foi agredida, danos na roupa e danos morais também todas apresentaram, tendo igualmente todas declarado pretenderem ser ressarcidas por tais...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT