Acórdão nº 178/05.7TBYND-B.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Outubro de 2013

Magistrado ResponsávelALBERTINA PEDROSO
Data da Resolução01 de Outubro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I – RELATÓRIO 1. JL (…), na execução para entrega de coisa certa que foi movida pela Caixa A..., S.A.

contra JA (…), invocando a qualidade de arrendatário do prédio, sito na Rua (...) Tondela, adjudicado à Exequente, interpôs o presente recurso de apelação do despacho proferido nos autos em 23.11.2012, com o seguinte teor: «Uma vez que a jurisprudência maioritária tem entendido que a venda em processo executivo faz caducar a arrendamento nos termos do disposto no artigo 824º nº 2 do Código Civil (neste sentido, vejam-se, entre outros os Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 14/03/2006, 21/10/2008 e 09/10/2012, todos disponíveis, in, www.dgsi.pt ) defere-se o requerido pelo exequente no requerimento electrónico com a referência 348526, determinando-se a notificação do arrendatário para no prazo de 15 ( quinze ) dias proceder á desocupação e entrega do imóvel ao exequente».

Terminou a minuta recursória formulando as seguintes conclusões: «1ª- O Tribunal de Tondela decidiu no despacho proferido electronicamente nos Autos em 23.11.2012, com a referência 1505785, notificar o arrendatário para no prazo de 15 (quinze) dias proceder á desocupação e entrega do imóvel sito na Rua (...)Tondela , inscrito na matriz inicialmente sob o artigo urbano (...)º , hoje artigo (...)º da freguesia e concelho de Tondela, e descrito na Conservatória do Registo Predial de Tondela sob o nº (...), ao exequente, Caixa A...s, despacho este que é contrário á Lei e á Jurisprudência dominante.

Senão vejamos, 2ª – O ora recorrente veio informar a Exequente e a Srª Agente de Execução que os pais do executado celebraram com ele um contrato de arrendamento urbano datado 27.10.1999.

  1. - Este contrato foi celebrado pelo prazo de 5 anos, renovável de acordo com a Lei na altura em vigor e foi assinado pelas partes, pelo que é válido.

  2. - O recorrente ocupa desde então e legitimamente o imóvel em questão.

  3. – O recorrente não tem qualquer outro imóvel onde possa exercer a sua actividade profissional.

  4. - A desocupação do r/c do imóvel causa um prejuízo imenso ao recorrente, que é muito superior à vantagem que é conferida à exequente.

  5. - Sendo certo que como já se referiu o recorrente não tem outra oficina para onde possa ir exercer a sua actividade profissional.

  6. – A desocupação põe a subsistência do Recorrente e do seu agregado familiar.

  7. – O direito ao trabalho consagrado na Constituição é um bem maior do que a simples entrega do imóvel livre e devoluto à exequente.

  8. - A aquisição pela credora hipotecária do direito de propriedade sobre o prédio hipotecado, por meio de adjudicação, não importa, sem mais, a caducidade deste contrato de arrendamento que tinha sido celebrado validamente pelo anterior proprietário e estava em vigor à data dessa adjudicação, como é o caso nos autos.

  9. – Assim, o direito ao arrendamento deve assim manter-se na esfera jurídica do aqui recorrente, mantendo-se válido o contrato de arrendamento, celebrado entre o recorrente e os pais do executado, posteriormente com o executado e agora com a Caixa A...S.A..

  10. – O douto despacho recorrido ao investir a exequente na posse do imóvel e ordenar a entrega efectiva das chaves do r/c do mesmo, violou a Lei fundamental, designadamente os artigos 58º e 59º da Constituição da República, e o artigo 824º, nº 2, entre outros do Código Civil.

  11. - Efectivamente, as relações locatícias constituídas antes do registo de qualquer hipoteca, e bem assim como aquelas cuja eficácia, perante terceiros, dependa do registo e este haja sido efectuado, é que subsistem, mesmo ocorrendo a venda da coisa locada, em processo de execução.

  12. - Os contratos de arrendamento não sujeitos a registo não caducam com a venda executiva, se a constituição da relação locativa for anterior à data do registo da hipoteca, garantia invocada nesta execução.

  13. - Recaindo hipoteca sobre imóvel objecto de venda executiva, constituída e registada, em data posterior à do contrato de arrendamento celebrado entre o locatário e os executados senhorios, a locação é oponível ao adquirente do imóvel, não se extinguindo o arrendamento, que prevalece sobre aquela garantia real, após a realização da venda executiva.

  14. - O regime legal decorrente do artigo 1057º é aplicável à venda de coisa locada, em processo executivo, por se tratar de hipótese que deve considerar-se incluída, no âmbito do disciplinado pelo artigo 824º, nº 2, ambos do CC.

  15. - Nestes termos, a venda judicial/adjudicação do imóvel ocorrida no Autos não afectou o contrato de arrendamento que sobre ele incide, houve sim uma transmissão da posição do locador, facto regulado por Lei, atento o disposto no artigo 1057º do C.C..

  16. - Atento o alegado, deve ser concedido total provimento ao presente recurso, julgando-se o agravo procedente e, em consequência, revogar-se a decisão proferida em 23.11.2012 pelo 2º Juízo do Tribunal de Tondela a de fls. dos Autos, devendo considerar-se válido o contrato de arrendamento do ora recorrente e em consequência seja decidido que o recorrente pode continuar a utilizar o r/c do imóvel sito na Rua (...)Tondela, inscrito na matriz inicialmente sob o artigo urbano (...)º, hoje artigo (...)º da freguesia e concelho de Tondela, e descrito na Conservatória do Registo Predial de Tondela sob o nº (...), na qualidade de arrendatário.

NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO e com o douto suprimento de V.Exªs, deve ser concedido total provimento ao presente recurso, julgando-se o agravo procedente e, em consequência, revogar-se a decisão proferida em 23.11.2012 pelo 2º Juízo do Tribunal de Tondela a de fls. dos Autos, com as inerentes consequências, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA».

2. Para instruir o presente recurso de agravo o Recorrente juntou 23 documentos, de entre os quais um intitulado “contrato promessa de arrendamento”, vários cheques e recibos de renda e, por certidão, as seguintes peças processuais dos Autos de Execução nº 178/05.7TBTND – 2º Juízo do Tribunal de Tondela: 1- Requerimento Executivo de fls. 3 a fls. 43; 2- Escritura Pública de constituição de hipoteca outorgada no Cartório Notarial de Santa Comba Dão em 21 de Agosto de 2001, fls. 33 a fls 37; 3- Certidão da Conservatória do registo predial de Tondela, fls. 84 a fls. 85; 4- Auto de Penhora, fls. 69 a fls 74; 5- Auto de abertura de propostas, a fls. 163 a fls 164; 6- Requerimento da Srª Agente de Execução Madalena Sanches, a fls. 177 a fls. 180; 7- Despacho electrónico deste 2º Juízo do Tribunal de Tondela datado de 23/11/2012, com a referência 1505785; 8- Requerimento de interposição de recurso a fls. 182 a fls. 200; e despacho electrónico do 2º Juízo do Tribunal de Tondela datado de 05.03.2013, com a referência 1574839, a admitir o presente recurso.

  1. A Caixa A...apresentou contra-alegações pugnando, desde logo, pela inadmissibilidade do presente recurso e concluindo pela respectiva improcedência.

    Colhidos os vistos, cumpre decidir.

    *****II. O objecto do recurso[1].

    O presente recurso de apelação integra duas questões essenciais, a apreciar segundo a sua ordem lógica, e versa matéria estritamente de direito: A primeira, consiste em apreciar a validade do invocado contrato de arrendamento; A segunda, em saber se, existindo contrato de arrendamento, atenta a data da sua celebração, o mesmo caduca ou não com a venda da fracção ao credor reclamante; Em consequência, decidir se deve ou não ser proceder-se, no âmbito destes autos, à entrega efectiva do imóvel ao Banco adquirente, conforme determinado no despacho recorrido.

    *****II – Fundamentos II. 1. De facto Os factos que importam à decisão do presente recurso, para além dos já constantes do relatório supra, são os seguintes[2]: 1. Por documento particular outorgado no dia 27 de Outubro de 1999, o ora recorrente celebrou um contrato-promessa de arrendamento com R (…), pais de JA (…), executado nos Autos, do r/c do prédio urbano sito na freguesia e concelho de Tondela, inscrito na matriz predial sob o artigo urbano (...)º, descrito na Conservatória do Registo Predial de Tondela sob o nº (...).

  2. Desse documento consta que o contrato é por prazo certo e com a duração efectiva de cinco anos, a partir do seu início que se considera no dia 1 de Novembro de 1999.

  3. Consta ainda que o promitente arrendatário ficou autorizado a partir de 1 de Novembro de 1999, a ocupar e utilizar o rés-do-chão em causa, podendo nele efectuar as obras acima previstas e dar início à exploração do estabelecimento.

    4. No aludido documento particular, ficou estipulada uma renda mensal de 55.000$00 no primeiro ano da vigência deste contrato e a partir do segundo ano de 60.000$00.

  4. Na cláusula sexta do referido documento estabeleceu-se que o local arrendado destina-se a “stand” de vendas de motos motorizadas e bicicletas, motores de rega, motosserras atomizadores e acessórios e afinação e assistência dos mesmos.

  5. O referido acordo foi-se renovando mesmo já depois da morte dos acima citados (…), nunca tendo sido celebrada a Escritura Pública que nos termos da cláusula décima seria efectuada logo que fosse obtida a licença de utilização a emitir pela Câmara Municipal de Tondela, em data então a acordar entre os dois outorgantes.

  6. JA (…), executado nos autos, adquiriu o identificado prédio urbano, que se encontra inscrito no registo como destinado a habitação, por partilha da herança de (…) casada com (…), no regime da comunhão geral.

  7. Em garantia de um contrato de empréstimo, o referido JA (…) outorgou com a Caixa A...em escritura de constituição de hipoteca sobre o identificado imóvel, celebrada em 20 de Agosto de 2001 no Cartório Notarial de Santa Comba Dão.

  8. A referida hipoteca foi registada provisoriamente por natureza na Conservatória do Registo Predial de Tondela, em 6 de Agosto de 2001 pela Ap. 3, tendo sido convertida em 23-08-2001, e a penhora sobre o imóvel foi registada em 01.06.2005.

  9. O ora recorrente emitiu vários cheques a favor de JA (…), e a seu...

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