Acórdão nº 846/17.0T8FIG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA TERESA ALBUQUERQUE
Data da Resolução28 de Novembro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I – J..., R. na acção de divórcio que contra ele interpôs M..., fazendo-o com fundamento na separação de facto por um ano consecutivo, nos termos da al a) do art 1781º CC, tendo sido citado e não a tendo contestado, veio requerer, após o trânsito em julgado da sentença que decretou o divórcio com o referido fundamento, que, visto que a sentença deu como provado que A. e R. deixaram de ter vida em comum, pelo menos desde Abril de 2016, e que pelo menos desde essa data não viveram em comunhão de leito, mesa e habitação, o tribunal declare a retroacção dos efeitos do divórcio à referida data da separação de facto - Abril de 2016.

A A., notificada, veio referir que ao pretender-se fixar a data em que os efeitos do divórcio retroajam, tal data deverá ser concretizada e não meramente genérica, como consta da sentença, resultando de per si que em 1 de Abril de 2016 a coabitação já havia cessado (“pelo menos desde Abril de 2016”) e por tal motivo, tais efeitos, quanto às relações patrimoniais entre os cônjuges, deverão retroagir a 1 de Abril de 2016, e não, como o R. pretende, genericamente, a Abril de 2016.

Foi proferido despacho em que se indeferiram os requerimentos do R. e da A. para que se declare, após o trânsito em julgado da sentença dos autos, a retroacção dos efeitos do divórcio à data da separação de facto do casal, por se terem entendido tais requerimentos como extemporâneos e, de todo o modo, não se ter provado com exactidão a data da separação de facto, condenando-se nas custas do incidente em partes iguais, R. e A. por ambos decaíram nas suas pretensões.

II – É do assim decidido que apela o R., tendo concluído as respectivas alegações nos seguintes termos: ...

Não foram produzidas contra alegações.

III – Cumpre decidir, tendo para o efeito em consideração o circunstancialismo fáctico processual que resulta do acima relatado, pondo-se ainda em evidência que na matéria de facto que foi julgada como provada na acção de divórcio consta, nos respectivos pontos 3 e 4, que «a A. e o R. deixaram de ter vida em comum, pelo menos desde Abril de 2016, e que, pelo menos desde tal data, não mais viveram em comunhão de leito, mesa e habitação».

IV – Como resulta com facilidade do confronto entre a decisão recorrida e as conclusões do recurso, a questão objecto deste é, essencialmente, a de saber se o requerimento a que se refere o nº 2 do art 1789º CC tem de ser apresentado antes de ser proferida a sentença a decretar o divórcio, ou se pode ser apresentado após o próprio trânsito dessa sentença em incidente autónomo. No caso de se entender que tal requerimento pode dar origem a um incidente autónomo mesmo após o trânsito da sentença- situação fáctica essa a dos presentes autos - importará ainda saber se a circunstância de dos factos provados não resultar definida uma data precisa para aquela separação obstará a que a mesma seja fixada em função apenas do mês de Abril de 2016.

Aquela primeira questão já não é nova, como foi acentuado na decisão recorrida e nas alegações de recurso, e coloca-se hoje essencialmente nos mesmos termos em que se colocava antes da alteração da redacção daquela norma decorrente da Lei 61/2008, de 31 /10.

Como é sabido, esta Lei eliminou o regime do divórcio litigioso ao extinguir o divórcio por violação culposa dos deveres conjugais – o chamado divórcio/sanção - e instituiu o divórcio sem consentimento, fazendo-o com base numa cláusula de falência do casamento - afinal, qualquer facto objectivo demonstrativo da ruptura definitiva do casamento o pode fundamentar nos termos genéricos da al d) do art 1781º CC. Trata-se do chamado divórcio/constatação da ruptura do casamento [1]. Hoje qualquer dos cônjuges pode requerer o divórcio na falta de concordância do seu cônjuge para o mesmo, fazendo-o com base no falhanço objectivo da sociedade conjugal e, consequentemente, da maior ou menor contribuição de qualquer dos dois para o mesmo, que deixa de relevar no decretamento e efeitos do divórcio.

[2] Assim, onde se dizia na redacção do nº 2 do art 1789º CC, que foi introduzida pela Reforma de 77 (DL 496/77, de 25/11), que «se a falta de coabitação entre os cônjuges estiver provada no processo, qualquer deles pode requerer que os efeitos do divórcio se retrotraiam à data, que a sentença fixará, em que a coabitação tenha cessado por culpa exclusiva ou predominante do outro», hoje diz-se, «se a separação de facto entre os cônjuges estiver provada no processo, qualquer deles pode requerer que os efeitos do divórcio retroajam à data, que a sentença fixará, em que a separação tenha começado».

As questões que a norma em causa tem colocado – numa e noutra das suas versões - são, tanto quanto se perspectivou da jurisprudência consultada, as de saber se a retroacção dos efeitos patrimoniais do divórcio à data da cessação da coabitação dos cônjuges /data do início da separação de facto tem de ser requerida no próprio processo de divórcio, ou se o pode ser em processo autónomo [3]; se o requerimento para essa superior retroacção relativamente à normal estabelecida no nº 1 da norma em referência – que é a data da propositura da acção de divórcio ou a da apresentação do requerimento no divórcio por mútuo consentimento - tem de ser feito antes de ser proferida a sentença ou se o pode ser depois da sua prolação e mesmo após o seu trânsito em julgado [4]; por último, se esse requerimento se mostra admissível no âmbito do processo de divórcio por mútuo consentimento, seja em função da homologação de um específico acordo dos cônjuges referente à data dessa cessação de coabitação/início da separação de facto, seja através de um incidente autónomo despoletado por qualquer dos cônjuges igualmente depois da sentença que decrete o divórcio.

A única questão que interessa a este recurso é, como resulta já claro, a segunda evidenciada.

Mas não poderá deixar de se referir, porque não totalmente irrelevante no que se reporta àquela segunda questão, que, quanto à...

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