Acórdão nº 219/09.9TCGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 16 de Fevereiro de 2012

Magistrado ResponsávelRITA ROMEIRA
Data da Resolução16 de Fevereiro de 2012
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I – RELATÓRIO Os AA., HC e marido DV, residentes em França instauraram a presente acção declarativa sob a forma de processo ordinário, acção de petição de herança, contra os RR., PC e mulher MC, residentes em França e MS e marido JF, residentes em Guimarães, pedindo que a acção seja procedente por provada e, por via dela: I) seja declarado e reconhecido: a) que a Autora HC é filha e herdeira legitimária de João e de Joaquina, que também usava Joaquina..., falecidos em França, respectivamente, no dia 10 de Setembro de 1941 e de 20 de Agosto de 1957; b) que das heranças ainda ilíquidas e indivisas abertas por óbito dos pais da Autora faz parte o prédio urbano sito no lugar de Vila Fria da freguesia de Sande São Clemente, constituído por uma morada de casas térreas, telhadas, com leiras de terrenos de horta com árvores de vinho, tudo junto e unido, limitado por parede, valado e silvado, a confrontar do nascente com a estrada nova, do sul com a estrada nova e caminho público, do norte com o rio Fêveras e terra do Casal da Corredoura e do Poente com caminho e terra do Casal da Corredoura, omisso à matriz, mas descrito na 1.ª Conservatória do Registo Predial de Guimarães sob o número 8... da freguesia de Sande São Clemente; c) que o prédio descrito na mesma Conservatória sob o n.º 002... da freguesia de Sande São Clemente é constituído apenas pelos terrenos de horta do prédio identificado na alínea anterior; d) que os Réus PC e mulher não adquiriram nem possuíram o prédio rústico, cujos direitos de propriedade e de posse alegaram na acção de justificação de posse que correu termos pela 5.ª Secção do Tribunal Judicial da Comarca de Guimarães – Processo n.º 8/92; e) que os Réus PC e mulher obtiveram, por meios fraudulentos, o registo da descrição n.º 002... da freguesia de Sande São Clemente, da 1.ª Conservatória do Registo Predial de Guimarães, e inscrição do mesmo prédio, em seu nome, por usucapião; f) que os Réus MS e marido tinham perfeito conhecimento de todos e cada um dos factos mencionados nas alíneas anteriores, quando eles e os Réus PC e mulher outorgaram a escritura de compra e venda que teve por objecto a descrição n.º 002...da freguesia de Sande São Clemente; g) que a venda referida na alínea anterior é nula, nos termos do disposto no artigo 892º do Código Civil, por se tratar de venda de coisa alheia e os vendedores carecerem de legitimidade para a realizar; II) seja ordenado o cancelamento do registo da descrição n.º 002... da freguesia de Sande São Clemente da 1.ª Conservatória do Registo Predial de Guimarães e de todas as respectivas Inscrições e Averbamentos; III) sejam condenados os Réus MS e marido a restituírem, às heranças ainda ilíquidas e indivisas abertas por óbito dos pais da Autora, o prédio que delas faz parte e é objecto da escritura de compra e venda referida na alínea f) do anterior n.º I.

E, para a hipótese de vir a entender-se que a acção improcede contra os segundos Réus, por terem adquirido o prédio, do herdeiro aparente e de boa-fé pedem que sejam condenados: IV - os Réus PC e mulher a pagar, às heranças mencionadas no pedido da alínea b) do número I, uma indemnização de montante correspondente ao valor do prédio que usurparam, estimado em € 120.000.

V - solidaraiamente todos os Réus a pagar-lhes uma indemnização do montante de € 25.000 pelos danos patrimoniais e não patrimoniais que lhe causaram e causam com os alegados actos ilícitos que, dolosamente, praticaram.

Alegam, em síntese, que João, casado com Joaquina faleceu a 10 de Setembro de 1941, em França, sucedendo-lhe como únicos e universais herdeiros, os dois filhos de ambos, EC e a demandante. Por sua vez, a mãe faleceu no estado de viúva a 20 de Agosto de 1957, deixando os referidos filhos como únicos e universais herdeiros.

Faziam parte das respectivas heranças, ainda ilíquidas e indivisas, bens imóveis situados no lugar de Vila Fria da freguesia de Sande S. Clemente, desta comarca: uma morada de casas térreas, telhadas, com leiras de terrenos de horta com árvores de vinho, tudo junto e unido, limitado por parede, valado e silvado, omisso na matriz, mas descrito na 1.ª Conservatória do Registo Predial de Guimarães sob o número 8... da freguesia de Sande São Clemente e uma leira de terreno de monte, do outro lado da estrada também omisso na matriz e igualmente na mesma Conservatória sob o número 8... da referida freguesia.

Referem que a demandante e o irmão aceitaram as heranças, que administraram, sendo que o prédio urbano era ocupado, em parte, por António Faria, ao abrigo de um contrato de arrendamento, para habitação, celebrado com os seus pais e a restante parte era ocupada por PS, irmão e cunhado daqueles que a haviam cedido para sua habitação por mero favor e gratuitamente.

Após aquele falecimento a demandante e o irmão consentiram que o seu tio continuasse a habitar na parte do prédio que os seus pais lhe haviam destinado, nas mesmas condições e mandataram BS para proceder à cobrança das rendas devidas pelo arrendatário, funções que o mesmo desempenhou até ao termo desse contrato de arrendamento na década de 70 do século anterior. Posteriormente, ambos os irmãos cederam o gozo dessa parte da casa, por mero favor e gratuitamente, à sua prima, Joaquina, filha do dito PS e mãe da Ré Maria e, mais tarde, igualmente a parte da casa e dos terrenos de horta deixados vagos pelo falecimento do seu pai, situação que ainda se mantém.

No início de 2009, foram informados de que os primeiros Réus teriam vendido o prédio urbano aos segundos Réus e que estes teriam já construído um edifício e diversos barracos, nos terrenos de horta do mesmo. Nunca mandataram os primeiros Réus para alienarem ou sequer para administrarem os seus bens e direitos prediais, em Portugal, mas sabiam que EC e esposa tinham passado ao Réu, filho daquele, uma procuração, no dia 17 de Setembro de 1988, com amplos poderes para administrar e vender todos os seus bens presentes e futuros situados em Portugal.

Deslocaram-se a Portugal, no período da Páscoa de 2009, para ajuizarem do acerto dessas informações tendo constatado que os prédios herdados não se encontravam registados em nome dos herdeiros de João e de Joaquina, que tinham sido construídos um edifício de rés-do-chão e andar, com paredes de tijolo não rebocadas exteriormente, e diversos barracos nos terrenos de horta do prédio urbano e estava registado na 1.ª Conservatória do Registo Predial de Guimarães a descrição n.º 002...da freguesia de Sande São Clemente um prédio rústico com 1.070m2, inscrito na respectiva matriz sob o art.º 6..., encontrando-se averbadas, sucessivamente, as aquisições a favor dos Réus, no primeiro caso, por usucapião e no segundo por compra. O primeiro averbamento foi instruído com certidão de sentença proferida numa acção de justificação judicial que os primeiros Réus haviam intentado contra incertos e declarações complementares identificando os antepossuidores como Manuel e José, ambos residentes na freguesia de S. Clemente de Sande, Guimarães. Porém os factos alegados na petição inicial de tal acção e as declarações complementares para o registo não correspondiam à verdade.

Por escritura de compra e venda outorgada no dia 25 de Maio de 2005 os primeiros Réus venderam o referido prédio rústico aos segundos, pelo preço de € 7.500, mas estes tinham e têm perfeito conhecimento de que aqueles não eram e nunca dele foram donos, que o mesmo é constituído apenas pelos terrenos de horta do prédio urbano onde vive Joaquina, mãe e sogra dos segundos Réus e faz parte das referidas heranças.

Referem que os Réus se apropriaram abusivamente dum bem com um valor real e de mercado de cerca de € 120.000 e que causaram e causam-lhes prejuízos materiais, obrigando-os a fazer despesas com deslocações e estadias em Portugal, em buscas para recolha de documentos e despesas judiciais e de patrocínio, cujo montante estimam em € 15.000, além de dor e vergonha por tal comportamento.

Citados, contestaram o alegado pelos AA., apenas, os primeiros RR., por excepção e impugnação, invocando a caducidade do direito de aceitar as heranças, alegando que os Autores nunca o fizeram, quer expressa quer tacitamente, e nunca manifestaram qualquer interesse pelas mesmas nem pelos bens que delas fazem parte, nunca entraram na sua posse nem praticaram qualquer acto de administração. Sendo, que logo após a morte de Joaquina os Autores comunicaram ao irmão e cunhado EC que poderia fazer o que quisesse com os bens que faziam parte daquelas heranças, o qual, perante tal desinteresse, acabou por outorgar a favor do seu filho a aludida procuração a fim de administrar todos os seus bens em Portugal e no início de 1980 declarou verbalmente doar o prédio em discussão nos autos.

Mais, alegam que desde o ano de 1980 até ao ano de 2005, por si e antepossuidores, durante mais de 30 e 50 anos, usaram o referido prédio, transformando-o e colhendo as suas utilidades, pagando as contribuições e impostos, com conhecimento da generalidade das pessoas, sem oposição de ninguém e à vista de toda a gente, ininterruptamente, na convicção de não lesarem direitos de outrem e de quem exerce um direito de propriedade. Nessa qualidade ajustaram a venda à segunda Ré. Referem que o prédio em causa encontrava-se omisso na respectiva matriz e não se encontrava descrito na Conservatória do Registo Predial de Guimarães, tendo sido o demandado quem, em 7 de Junho de 1991, procedeu à sua inscrição e registado na sequência da acção de justificação judicial, sendo que o mesmo é autónomo relativamente ao prédio urbano referido pelos Autores.

Alegam que o valor comercial do prédio não ultrapassa os € 7.500 e que os montantes peticionados são exagerados.

Concluem pedindo que sejam julgadas procedentes as excepções da caducidade e da prescrição aquisitiva –usucapião- ou, então deve a acção ser julgada improcedente, por não provada, com as legais consequências.

Os AA. a...

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