Acórdão nº 537/19.8T8VNF-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelEDUARDO AZEVEDO
Data da Resolução21 de Abril de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Neste apenso de verificação e graduação de créditos do processo de insolvência de J. S. & Companhia, Lda, na qualidade de herdeiros da herança indivisa de A. L., M. L., que foi esposa daquele e os filhos de ambos, M. P., T. M. e C. J., bem como T. M., impugnaram a lista de credores reconhecidos no que lhes respeitava.

  1. L., M. P., T. M. e C. J. pedindo que seja reconhecido o crédito no montante de “280.000,00€, acrescido de juros de mora calculados à taxa legal em vigor para as operações civis e contados desde a data da presente reclamação até efetivo e integral pagamento, devendo o crédito dos Credores Reclamantes ser graduado como crédito garantido por garantia real”, alegaram, em síntese: discordavam do reconhecimento dos seus dois créditos pelos montantes de 70.000,00€ cada um e a sua qualificação como comuns; em 2009 e 2010 foram celebrados dois contrato-promessa de compra e venda pelo falecido com a insolvente como promitente-vendedora, relativamente a duas frações autónomas (C e J) pelo montante no citado valor para cada, sendo que por conta do preço foi entregue uma quantia inicial e até ao momento da celebração da escritura, a ser convocada pelo falecido, depois da devedora reunir todos os documentos necessários e os entregar, prestações parciais; foi pago a título de sinal o montante global de 140.000,00€; operou-se em setembro de 2014 a tradição das frações que passaram a ser fruídas pelo falecido como verdadeiro proprietário, tendo inclusivamente sido entregue a terceiro a título de comodato; têm o direito de retenção; desde 20.10.2014, que a devedora foi diversas vezes interpelada pelo falecido e por T. M. para a celebração das escrituras públicas de compra e venda, contudo, sem as celebrar, chegando a ser interpelada admonitoriamente, por carta registada remetida a 09.07.2018; à data da declaração da insolvência (04.04.2019), os contratos promessa estavam resolvidos, em consequência da promitente vendedora ter faltado à escritura marcada para 18.07.2018 e mais que não seja também porque as frações foram penhoradas em execução, daí resultando a vontade em não se querer (ou não poder) celebrá-los a consubstanciar a recusa de cumprimento e incumprimento definitivo; além disto, usufruem do estatuto de consumidores (Lei 24/96, de 31.07), para efeitos de titularidade de direito de retenção e prevalência do direito de retenção sobre hipoteca que tenha por objeto o mesmo imóvel.

  2. M., pedindo que seja reconhecido o seu crédito de “140.000,00€, acrescido de juros de mora calculados à taxa legal em vigor para as operações civis e contados desde a data da presente reclamação até efetivo e integral pagamento, devendo ainda o crédito da Credora Reclamante ser graduado como crédito garantido por garantia real”, em súmula, alegou no mesmo sentido que os anteriores credores e mais precisamente: discordava do reconhecimento do seu crédito pelo montante de 70.000,00€ e a sua qualificação como comum; em 10.11.2009, celebrou contrato-promessa de compra e venda com a insolvente como promitente-vendedora, relativamente a fração autónoma (Q) pelo preço no montante citado; por conta do mesmo foi entregue uma quantia inicial e até ao momento da celebração da escritura, a ser convocada por si, depois da devedora reunir todos os documentos necessários e os entregar, prestações parciais; foi pago a título de sinal 70.000,00€; operou-se em Agosto de 2016 a tradição da fração que passou a ser fruída por si como verdadeira proprietária, tendo inclusivamente sido entregues a terceiro a título de comodato; tem o direito de retenção; desde 27.09.2014, que a devedora foi diversas vezes interpelada para a celebração da escritura de compra e venda, contudo, sem que tal ocorresse, chegando a ser interpelada admonitoriamente, por carta registada remetida a 09.07.2018; à data da declaração da insolvência (04.04.2019), o contrato-promessa estava resolvido, em consequência da promitente vendedora ter faltado à escritura marcada para 18.07.2018 e mais que não seja também porque a fração foi penhorada em execução, daí resultando a vontade em não se querer (ou não poder) celebrá-lo a consubstanciar a recusa de cumprimento e incumprimento definitivo.

    O Administrador da Insolvência expôs, mantendo-se quer quanto à natureza e classificação dos créditos, quer quanto aos seus montantes, não reconhecendo aos credores o direito de retenção porquanto não seriam os utilizadores finais dos bens, destinando-se a compra dos imóveis para revenda ou para serem dados de arrendamento; além disso, a devedora não foi devidamente interpelada para comparecer em qualquer escritura, no caso dos primeiros credores; e em termos contratuais o prazo tinha sido estabelecido a favor da mesma.

    Na fase de saneamento e condensação fixou-se o objeto do litígio e enumeraram-se os temas de prova.

    Realizou-se audiência de julgamento e nesta fase, após homologação de transações respeitantes a outros credores impugnantes, ficaram por apreciar tais impugnações.

    Proferiu-se sentença pela qual se decidiu quanto a tais credores: “… Assim e em face deste incumprimento definitivo, assiste aos credores reclamantes o direito a serem indemnizados pela quantia que entregaram à insolvente, fixando-se o seu valor em: - € 70.000,00 o crédito de T. M.; - € 140.000,00 o crédito dos herdeiros do falecido A. L..

    … O seu crédito deve ser qualificado como comum.

    Improcedem, desta forma, as impugnações apresentadas pelos credores T. M. e M. L., M. P., T. M. e C. J., estes na qualidade de herdeiros da herança indivisa de A. L..

    ….

    O art.º 130º, n.º 3, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE) prevê que, não havendo impugnação à lista de credores reconhecidos, com os fundamentos estabelecidos no n.º 1 do mesmo artigo, é imediatamente proferida sentença de verificação e graduação dos créditos em que, salvo o caso de erro manifesto, se homologa a lista de credores reconhecidos elaborada pelo administrador de insolvência e se graduam os créditos em atenção ao que conste dessa lista.

    Pelo exposto, homologo a lista de credores reconhecidos com as correções resultantes das decisões às impugnações apresentadas nos termos supra expostos.

    … Considerando os princípios atrás expostos, procede-se ao pagamento dos créditos, através do produto da massa insolvente, na seguinte forma (sendo a graduação igual relativamente a todos os imóveis apreendidos, far-se-á uma única graduação): 1) As dívidas da massa insolvente saem precípuas (n.º 1 e n.º 2 do artigo 172.º do CIRE); 2) o crédito reclamado pela Autoridade Tributária e Aduaneira referente a IMI, pelo produto da venda do imóvel a que respeita o imposto; 3) crédito hipotecário de X, Unipessoal, Lda, pelo produto da venda do imóvel sobre que incide a hipoteca; 4) créditos privilegiados do Instituto de Segurança Social, IP e da Autoridade Tributária e Aduaneira referente a IRC; 5) do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos comuns.”.

    Os primeiros credores, M. L., M. P., T. M. e C. J., recorreram, concluindo: “1. A douta Sentença a quo julgou improcedente a Impugnação.

    1. Considerou o Tribunal de 1.ª instância que (i) os contratos promessa não foram definitivamente incumpridos pela Insolvente antes da sua declaração de insolvência, pelo que, consequentemente, não é aplicável aos créditos dos Credores Reclamantes o regime do incumprimento do contrato promessa consagrado no CC; e (ii) que os Credores Reclamantes não são consumidores para efeitos do gozo do direito de retenção sobre a Fração C e a Fração J, nos termos dos artigos 754.º e 755.º, n.º 1, al. f) do CC, e dos Acórdãos de Uniformização de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça números 4/2014 e 4/2019, tendo quantificado o crédito dos Credores Reclamantes em € 140.000,00 (cento e quarenta mil euros) como crédito comum.

      Do incumprimento definitivo dos contratos promessa anterior à declaração de insolvência da promitente vendedora e consequente aplicabilidade do regime legal do Código Civil.

    2. Considerou o Tribunal de 1.ª instância que a mora da promitente vendedora no cumprimento dos contratos promessa de compra e venda não se converteu em incumprimento definitivo antes da declaração da sua insolvência, de tal forma que o incumprimento definitivo se deu apenas com a comunicação aos autos pelo Sr. Administrador de Insolvência de que não pretendia cumprir o contrato promessa.

    3. Porém, da prova produzida resulta claro que a conversão da mora em incumprimento definitivo já se tinha dado bem antes da declaração de insolvência da aqui Insolvente (a insolvência foi declarada no dia 04.04.2019, cfr. sentença de declaração de insolvência).

    4. Tal como a douta Sentença a quo deu como provado (factos provados T e U): (i) desde outubro de 2014, o promitente comprador interpelou por diversas vezes a Insolvente para que fossem agendadas as escrituras de compra e venda, não tendo nunca a Insolvente diligenciado no sentido da celebração das referidas escrituras, o que a constituiu em mora (conforme dado como provado pelo Tribunal a quo); e (ii) os Credores Reclamantes enviaram para a sede da Insolvente, via carta registada com aviso de receção, interpelação admonitória com vista à celebração das escrituras de compra e venda (i.e., fixando prazo razoável para o cumprimento dos contratos promessas – marcação e celebração das escrituras -, sob pena de o contrato se considerar definitivamente incumprido), tendo a carta sido enviada no dia 09.07.2018.

    5. Ficou provado que a referida comunicação foi enviada pelos Credores Reclamantes.

    6. Tendo também ficado demonstrado que a comunicação foi recebida pelo gerente da Insolvente, Sr. F. S., ao contrário do que foi dado como provado pelo Tribunal a quo.

    7. É o próprio gerente da Insolvente que assume, no seu testemunho durante a audiência de julgamento, que recebeu as cartas (termina dizendo que não as recebeu no seu escritório, embora inicialmente afirme que as recebeu) e que teve conhecimento do seu conteúdo, mais concretamente do...

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