Acórdão nº 667/20.3T8CHV.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 24 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelALCIDES RODRIGUES
Data da Resolução24 de Novembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório G. J. interpôs, no Juízo Local Cível de Chaves - Juiz 2 - do Tribunal Judicial da Comarca de Vila Real, a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra X Seguros Gerais, S.A., pedindo a condenação da Ré no pagamento da quantia de € 21.910,00 a título de indemnização pelo furto do veiculo automóvel de marca Mercedes-Benz, com a matricula JU, acrescida de juros de mora e ainda da quantia de € 2.000,00 pela privação de uso da mesma viatura, quantia esta à qual devem acrescer juros de mora desde a citação, à taxa legal, até efectivo e integral pagamento.

Para tanto, e em síntese, alegou ter celebrado com a ré um contrato de seguro do ramo responsabilidade civil automóvel relativo à viatura ligeiro de passageiros, de marca Mercedes-Benz, modelo classe E coupé Diesel, com a matrícula JU da qual aquele é proprietário, cobrindo, entre outros, o risco de furto daquele veículo, com capital seguro de € 21.910,00.

No dia 16/05/2017, entre as 20h30 e as 23h00 (horário espanhol), a viatura automóvel do Autor foi alvo de um furto em circunstâncias que descreve na PI, cabendo por isso à Ré o pagamento da correspondente indemnização.

Mais reclama o pagamento pela R. duma quantia de € 2.000,00 para compensação da privação do uso da viatura furtada.

*Citada, contestou a Ré, pugnando pela improcedência da acção.

Em abono da sua defesa rejeitou, em síntese, a responsabilidade pela indemnização peticionada pelo autor, alegando ignorar a ocorrência do furto assim como as circunstâncias de tempo, lugar e modo em que tal possa, porventura, ter ocorrido, atentas as averiguações por si efectuadas, negando igualmente a responsabilidade pelo pagamento do dano da privação do uso, uma vez que tal cobertura não foi contratualmente fixada.

*Dispensada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador, onde se afirmou a validade e regularidade da instância; de seguida, procedeu-se à identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova, bem como foram admitidos os meios de prova.

*Foi realizada a audiência de discussão e julgamento.

*Posteriormente, a Mm.ª Julgadora “a quo” proferiu sentença, nos termos da qual, julgando a ação parcialmente procedente, decidiu condenar «a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 21.910,00 (vinte e um mil, novecentos e dez euros), acrescida de juros de mora, contados à taxa legal, desde 17/07/2017 até efectivo e integral pagamento, absolvendo a Ré do restante peticionado».

*Inconformada, a ré-seguradora interpôs recurso dessa sentença e, a terminar as respetivas alegações, formulou as seguintes conclusões (que se transcrevem): «1. Vem o presente recurso interposto da Douta Sentença proferida pelo Meritíssimo Tribunal a quo que julgou a presente ação parcialmente procedente, condenando a Seguradora R. no pagamento ao A. G. J. da quantia de Euro 21.910,00 acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal de 4%, contados desde 17/07/2017, até integral e efetivo pagamento.

  1. Salvo o devido respeito, a Seguradora Apelante não pode concordar com os fundamentos de facto e de direito que sustentam a Douta decisão proferida, considerando que a mesma advém de uma errada apreciação da prova produzida e com o consequente erro de julgamento, o que redundou numa desadequada subsunção jurídica dos factos e injusta decisão de mérito.

  2. Alegando ter ocorrido o furto do veículo seguro na ora R/Recorrente, e do qual resultaram necessariamente danos – desaparecimento do veículo -, veio o A./Recorrido, ao abrigo da cobertura facultativa contratada («furto, roubo e furto de uso»), peticionar a condenação da Seguradora R. no pagamento da quantia de Euro 21.910,00, correspondente ao valor do capital seguro constante da apólice, acrescido de Euro 2.000,00 a título de indemnização atinente à privação do uso.

  3. Em face da matéria de facto que foi considerada provada, o douto Tribunal a quo proferiu a douta decisão ora posta em crise, de acordo com a qual julgou a ação parcialmente procedente, e condenando a Seguradora R. no pagamento da primeira das referidas parcelas.

  4. Ora, salvo o devido respeito por diversa opinião, não pode a Seguradora Apelante concordar com a apreciação da prova levada a cabo, discordando, consequentemente dos fundamentos que suportam a douta decisão proferida, quanto à matéria de facto e quanto à inerente solução de direito.

    DO ERRO DE JULGAMENTO: DA REAPRECIAÇÃO DA PROVA: 6. O presente recurso sobre a douta decisão proferida quanto à matéria de facto funda-se na convicção da Apelante de que o Douto Tribunal a quo terá efetuado uma incorreta apreciação da prova, e concretamente na instrução da matéria factual plasmada nos: - arts. 2º, 3º, 4º, 6º, 7º, 8º, e 14º, do elenco da factualidade considerada provada, os quais, pelos motivos que se infra se demonstrará, deveriam ter sido considerados não provados.

    - Alíneas d), e) e f) do elenco da factualidade julgada não provada, e que deveriam ter sido considerados provados 7. Com efeito, o Meritíssimo Tribunal “a quo” considerou provados os factos constantes dos artigos 2º, 3º, 4º, 6º, 7º, 8º e 14º supra descritos (essencialmente atinentes à ocorrência do furto participado e suas circunstâncias), fundando-se essencialmente no teor das declarações prestadas pelo A., G. J., do seu filho, E. P., da testemunha A. L., e do teor da participação realizada junto das autoridades espanholas.

  5. O Meritíssimo Tribunal “a quo” não ajuizou bem a globalidade da prova produzida pois a mesma não se mostrou minimamente suficiente e coerente para alicerçar a convicção aduzida na douta sentença proferida, no sentido de se dar como demonstrada a ocorrência de um furto do veículo, sobretudo quanto confrontada com as regras da experiência e do normal acontecer.

  6. Não se olvida que o ónus da prova da ocorrência de um sinistro suscetível de fazer funcionar as garantidas da apólice de seguro incumbe ao segurado ou ao tomador, no caso, incumbindo ao A. a prova da ocorrência do sinistro participado (furto do veículo automóvel de matrícula JU).

  7. Não se ignora também que fruto da dificuldade probatória que acarreta a prova de um furto de um automóvel, tem a nossa Douta Jurisprudência entendido, dever “aligeirar” o cumprimento deste onus probandi , e considera que para a demonstração do evento danoso/furto, se haverá que exigir (apenas) a existência de uma participação às autoridades policiais, levada a cabo em circunstâncias tais que não ponham em causa a seriedade da mesma, isto é, que apontem para a verosimilhança da ocorrência do furto participado.

  8. Tendo em linha de conta este entendimento – que foi, aliás, o entendimento seguido na douta sentença recorrida – e analisando o acervo probatório carreado ao processo e o circunstancialismo que rodeia este evento/sinistro, impõe-se concluir (em sentido diverso do que foi decidido pelo Mmo. Tribunal a quo) que foram efetivamente apuradas circunstâncias (várias) que levam ao afastamento desta prova de primeira aparência do furto participado às autoridades e que inculcam no julgador uma dúvida séria a respeito da ocorrência do furto que serve de causa de pedir.

  9. Na realidade, e sempre com o merecido respeito por entendimento divergente, considera a Apelante Seguradora que a apreciação da prova levada a efeito, e o facto de se ter acolhido, sem mais, a versão dos factos descrita em audiência de julgamento Apelado G. J., quando o mesmo fez uma descrição do sinistro em sede de diligências de averiguação que se mostra diametralmente oposta quanto a “pormenores” absolutamente relevantes para a credibilização do seu depoimento, se mostra verdadeiramente errada.

  10. Não se pode, pois, acompanhar o entendimento vertido na douta fundamentação da decisão de facto, quando se refere que as incongruências detetadas na(s) versão(ões) dos factos não são suficientes para se concluir pela não verificação do furto tal como descrito na participação às autoridades.

  11. Discordando-se igualmente da decisão no que diz respeito à não valoração dos documentos juntos aos autos em requerimento de 20/02/2022 (relatório de averiguação contendo declarações escritas pelo A. aquando das diligências de averiguação do sinistro), que nem sequer foram impugnados pelo A.

  12. Sempre com o máximo respeito por diverso entendimento a divergência – tudo menos inocente ou irrelevante – verificada entre a versão dos factos contida nas sobreditas declarações escritas pelo A., e aquela que o mesmo apresenta nos autos e retrata em sede de audiência de julgamento aquando das declarações de parte, teria de ser valorada pelo Mmo. Tribunal a quo.

  13. Com efeito, são os seguintes os elementos de prova produzidos nos autos – que foram mal apreciador - , e que, no modesto entendimento da Apelante Seguradora, demandavam diversa decisão da proferida relativamente à factualidade aqui objeto de impugnação (toda ela contendendo com a ocorrência do sinistro e com as circunstâncias ao mesmo inerentes) na medida em que colocam, inelutavelmente, em causa, a verosimilhança dos factos vertidos na participação às autoridades: -Depoimento de parte e declarações de parte de G. J., prestadas em audiência de julgamento de 21/09/2021, gravadas em suporte digital, ficheiro 20210921143216_1394674_2871993 (nos concretos trechos e minutos indicados no corpo das presentes alegações) - Depoimento da testemunha J. S., prestado em audiência de julgamento de 08/11/2021 e de 16/12/2021, gravado em suporte digital, ficheiros 20211108152138_1394674_2871893 e 20211216104016_1394674_2871893 (nos concretos trechos e minutos indicados no corpo das presentes alegações) - Documentos juntos aos autos em 19/01/2022 (com especial relevo para o documento intitulado “DECLARAÇÃO”, manuscrito e assinado pelo A.) 17. Escalpelizado o depoimento prestado em audiência de julgamento pelo A., e confrontando o mesmo com o depoimento da testemunha J. S.2 e com o teor da referida DECLARAÇÃO, tal como já se salientou...

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