Acórdão nº 5919/20.0T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelPEDRO MAURÍCIO
Data da Resolução06 de Outubro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACÓRDÃO (1) ACORDAM OS JUÍZES DA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES, * * *1. RELATÓRIO 1.1. Da Decisão Impugnada O Requerente A. S.

intentou contra a Requerida A. L. LDA, o Requerido C. A.

e o Requerido J. P.

, a presente acção especial de realização de inquérito judicial, pedindo que «a) seja julgado que existem motivos para proceder a inquérito; b) sejam fixados como pontos que a diligência deve abranger os elencados no artigo 75.º da petição [1) o volume, a natureza e saldos das transações havidas entre a requerida e a sociedade X Madeiras Lda e a sociedade Y - Biocombustíveis Lda (outra parte relacionada); 2) os produtos transacionados entre aquelas sociedades e o valor pelos quais são transacionados; 3) apurar se entre as mencionadas sociedades existem compras ou vendas de propriedades e outros activos, prestação ou recepção de serviços, locações, transferências de pesquisa e desenvolvimento, transferências segundo acordos de licenças, transferências segundo acordos financeiros (incluindo empréstimos obtidos e contribuições de capital em dinheiro ou em espécie), prestação de garantias ou de colaterais, e liquidação de passivos em nome da entidade ou pela entidade em nome de outra parte; 4) os dados constantes dos “dossiers” de preço de transferência; 5) a correcção do relato financeiro e se o mesmo se mostra fiel à realidade; 6) se o inventário mensurado da requerida é real; 7) a posição financeira e os resultados das operações da requerida; 8) as contas, a gestão financeira e de tesouraria; 9) práticas susceptíveis de fazer incorrer os administradores em responsabilidade, nos termos da lei, por eventual prática de atos ilícitos e/ou de gestão danosa; 10) os elementos contabilísticos contêm informação que não se coaduna com a realidade; 11) os critérios e transparência das remunerações, participação no lucro de exercício e eventuais gratificações]; e c) seja nomeado perito ou peritos que devam realizar a investigação», fundamentando a sua pretensão, essencialmente, no seguinte: «o requerente é sócio da requerida, detendo uma quota que corresponde a 33,125% do capital social; os Requeridos são gerentes da requerida, e também são seus sócios; desde o exercício económico do ano 2017, que a requerida tem apresentado sucessivamente resultados líquidos decrescentes e que são temporalmente coincidentes com rutura de relações pessoais entre o requerente e os requeridos, seus irmãos, e da intenção destes de afastá-lo da vida da sociedade e de esvaziar os seus direitos societários, com a destituição (com justa causa) do requerente da gerência da sociedade, motivada pelo facto deste ter recusado a assinatura das contas relativas ao exercício de 2017, com a resolução (ilícita) do contrato promessa celebrado entre o requerente e os requeridos, o qual tinha por objecto a promessa de aquisição por estes da participação social daquele, e com a constituição em abril de 2019 da sociedade com a firma X Madeiras, Lda que tem por gerentes e sócios os filhos dos requeridos, a qual tem por objecto a mesma actividade da requerida; o requerente, em 20 de janeiro de 2020, comunicou que pretendia consultar, assistido por revisor oficial de contas ou outro perito, a escrituração, livros e documentos relativos aos exercícios dos anos 2014, 2015, 2016, 2017, 2018 e 2019; em resposta, os requeridos remeteram certos elementos da contabilidade que não se encontravam devidamente organizados e constavam de formato que tornava impossível a sua consulta; os requeridos disponibilizariam todos elementos solicitados através de uma “pen”, mas não se mostrou possível ao requerente o acesso a alguns dos dados disponibilizados na “pen”; em 2 de abril de 2020, o requerente solicitou o balancete analítico grau risco 8 (acumulado à data de dezembro de 2019); a requerida não respondeu ao pedido; em 22 de julho de 2020, o requerente informou que pretendia consultar, nomeadamente extratos completos da conta 11 à conta 89, em formato MS Excel, saft 2019, balanço, demostrações de resultados, anexo e certificação legal de contas, balancetes de abertura analíticos com detalhe de contas correntes, balancetes de abertura analíticos a 31.12.2019 com detalhe de contas correntes antes e depois de apuramento de resultados e regularizações; a requerida recusou a consulta de tais elementos alegando que continham informação detalhada, reservada e confidencial de clientes, fornecedores, credores e terceiro, e que exercendo o requerido atividade diretamente concorrencial é de prever que a informação constante desses documentos possa ser utilizada em prejuízo da sociedade; os argumentos utilizados em ordem a sustentar a recusa são falsos, insustentáveis e de manifesto pendor subjetivo; em 29 de julho de 2020, em assembleia geral da requerida, o requerente procurou esclarecer-se sobre a existência de relações comerciais entre a requerida e a sociedade X – Madeiras, Lda. e/ou de (eventuais) privilégios desta junto da requerida, colocou a questão de saber qual o motivo de a dita sociedade não estar mencionada no anexo às demonstrações financeiras como parte ou entidade relacionada e questionou qual o volume de negócios existente entre ambas as sociedades e montante da dívida; as informações prestadas pelo requerido C. A. sobre questões são presumivelmente falsas, e são incompletas e não elucidativas; este conjunto vasto de informações impõem-se na medida em que as transações da sociedade com partes relacionadas põem problemas de eventual apropriação injustificada de activos, em benefício de certas partes relacionadas, gerando conflitos de interesses entre sócios ou entre estes e gerentes; pela consulta dos elementos o requerente procura inteirar-se da situação financeira da requerida e apreciar a actuação dos gestores da requerida, o que apenas se logrará mediante consulta e auditoria (inquérito judicial); há sérias suspeitas de apropriação injustificada de activos, em benefício dos requeridos e da requerida estar a transacionar os seus produtos por um preço inferior ao normalmente praticado no mercado, permitindo à parte relacionada, e eventualmente aos seus controladores, os gerentes da sociedade Ré, a extracção abusiva de vantagens, em detrimento desta última».

O Requerente arrolou testemunhas e requereu «para prova do alegado no artigo 35.º, al. c), a notificação da segurança social para, no prazo que lhe for concedido, informar se, no período compreendido entre abril de 2019 e julho de 2020, C. M. e R. A. estavam, ou estiveram inscritos, inscritos como trabalhadores da A. L. Lda» e «para prova dos mesmos factos, a notificação da segurança social para, no prazo que lhe for concedido, juntar aos autos as declarações de remunerações entregues pela A. L. Lda no período referido».

Os Requeridos contestaram, pugnando pelo indeferimento do pedido de realização de inquérito judicial à Requerida, e fundando a sua defesa, essencialmente, no seguinte: «relativamente aos pedidos de consulta e envio de documentos (arts 10.º a 33.º da PI), trata-se de pedidos genéricos, vagos e indeterminados, referentes aos anos de 2014, 2015, 2016, 2017, 2018 e 2019 e sem referência a qualquer ato de gestão determinado; relativamente aos pedidos de esclarecimentos veiculados em assembleia geral, é o próprio Requerente que alega que a todos foi dada reposta, e não alega factos concretos que fundamentem as considerações genéricas, vagas e meramente conclusivas sobre a suposta falsidade ou insuficiência das informações aí prestadas; em relação às alegadas incorreções apontadas aos documentos de aprovação de contas, nem sequer em abstrato se poderia considerar estarem integradas no direito à informação; são também genéricos, vagos e indeterminados, e sem qualquer ligação com a matéria alegada, os pontos de facto indicados pelo Requerente como tendo interesse averiguar; o Requerente não alega factos susceptíveis de fundamentar inquérito judicial, que deve improceder; é falso que os Requeridos ajam, ou tenham agido, com a intenção de “afastar o autor da vida da sociedade e de esvaziar os seus direitos societários”; o Requerente violou deveres básicos de gerência, e, por isso, foi deliberada a sua destituição da gerência com justa causa, aprovada em assembleia geral; é falso que a resolução do contrato promessa celebrado entre o Requerente e os Requeridos tenha sido ilícita; no decorrer dos exercícios dos anos de 2017, 2018 e 2019, o Requerente praticou actos causaram e continuam a causar prejuízos à Requerida; em 04.05.2018, foi constituída a sociedade W – Indústria de Madeiras e Derivados, Lda, cujos sócios e gerentes, de direito, são T. J. e D. A., que são filhos do Requerente, e este é gerente, de facto, dessa sociedade, ou, pelo menos, age em nome e em representação da mesma, designadamente, negociando e celebrando negócios por conta da mesma; a referida sociedade W e o Requerente, diretamente, ou por intermédio dessa sociedade, exercem concorrência direta com a Requerida; o Requerente nunca transmitiu aos Requeridos os motivos dos pedidos de consulta formulados a partir de janeiro de 2020; os documentos remetidos estavam organizados por tipo e data; no dia 30.01.2020, o Requerente deslocou-se às instalações da Requerida e não solicitou aos Requeridos, ou a quem quer que fosse, a entrega da “pen” com os ficheiros e documentos que estava pronta para lhe ser entregue; o Requerente tem na sua posse o balancete analítico grau risco 8 (acumulado à data de dezembro de 2019); na assembleia geral datada de 29.07.2020, as questões formuladas pelo Requerente relativas às relações comerciais com a sociedade X - Madeiras, Lda e eventuais privilégios foram esclarecidas; o teor dos documentos de aprovação de contas não integra o conteúdo do direito à informação dos sócios, nem a sua eventual incorrecção poderia fundamentar um pedido de inquérito judicial; o requerente conformou-se com a deliberação de aprovação das contas, tomada na assembleia geral de 29.07.2020, que não...

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