Acórdão nº 4017/20.0T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelJOSÉ CARLOS DUARTE
Data da Resolução06 de Outubro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM OS JUÍZES DA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES 1. Relatório P. P.

intentou acção declarativa de condenação, com processo comum, contra Seguradoras ..., SA., agora denominada X Seguros SA, pedindo a condenação da mesma no pagamento da quantia de € 51.782,85, relegando para posterior liquidação a indemnização que resultar da IPP que lhe venha a ser fixada, tudo acrescido dos juros legais a contar da citação.

Alegou para tanto e em síntese que B. F., acusando o A. de se ter introduzido em sua casa, o perseguiu com a viatura que identifica, segura na Ré e, na data, hora e local que também identifica, o referido B. F. ao avistar o A., desviou a trajectória da viatura que conduzia, invadindo totalmente a faixa de rodagem contrária, indo embater com a frente esquerda do veículo no corpo do A., que ficou caído na valeta, com os membros inferiores fracturados e ferimentos e hematomas na cabeça.

Alegou também que sofreu as lesões que identifica, foi transportado para o Hospital ..., onde foi sujeito a intervenção cirúrgica, tendo tido alta alguns dias depois.

Mais alegou que sofreu danos não patrimoniais, que descreve, durante o período que aguardou a chegada da ambulância, o referido B. F. puxou-lhe as pernas e pontapeou-o, teve dores.

Alegou ainda que teve danos patrimoniais, referindo em concreto que tinha celebrado um contrato de trabalho a termo que não foi renovado em virtude do acidente, pelo que reclama a quantia que indica a título de perdas salariais, as roupas e calçado que trazia consigo ficaram rasgadas e inutilizadas, teve despesas em transportes, no aluguer de cama articulada e em medicamentos.

*A Ré, citada, contestou por excepção, invocando a incompetência em razão da matéria dos tribunais cíveis e, por impugnação, dizendo, em síntese, que o condutor do OI recebeu um telefonema da esposa, informando-o que se encontrava alguém desconhecido na sua habitação, onde se terá deslocado, tendo encontrado um desconhecido, que se veio a revelar ser o A., que fugiu, o condutor do OI terá pegado na viatura de forma a alcançar o Autor, este ao sentir a aproximação do OI, tentou evadir-se, tendo, para esse efeito, atravessado a rua na qual circulava, da esquerda para a direita, tendo ocorrido o embate, devido a este comportamento súbito e repentino, o condutor do OI não conseguiu evitar o embate entre o veículo e o Autor.

Mais refere que é necessário distinguir os danos que resultaram do embate e os danos que resultaram das agressões físicas ao A. por parte do condutor do OI.

Refere ainda que caso se prove o atropelamento doloso do A. por parte do condutor do OI, não está obrigada a indemnizar eventos nos quais a utilização de um veículo é manifestamente instrumental à actuação do agente, sendo aquele o único responsável.

Impugna os factos relativos aos danos, invoca que a peticionada indemnização por danos morais é excessiva, a cessação do contrato de trabalho ficou a dever-se a outras razões que não o evento dos autos.

Finalmente requereu a intervenção acessória provocada do condutor do OI.

*O A. foi convidado a responder às excepções alegadas na contestação:*Foi deferida a intervenção acessória provocada.

*O A. pronunciou-se e disse ainda que o facto de o atropelamento ter sido intencional não retira responsabilidade à Ré.

*Veio o interveniente acessório (e não interveniente principal como é referido nos autos, por várias vezes e em locais diversos) B. F.

contestar dizendo, em síntese, que o embate ocorrido entre o A. e o veículo por si conduzido enquadra-se na noção de acidente de viação, o evento dá-se após uma mudança repentina do sentido de circulação do A., que ia a correr do lado esquerdo e, repentinamente, virou para o lado direito, tentando evadir-se para um monte que se encontrava do lado contrário àquele em que circulava, acabando por embater na viatura conduzida pelo interveniente, não pegou na viatura para atropelar o A. e causar-lhe dano, mas com a intenção de recuperar os objectos que lhe tinham sido furtados, foi atrás do A. de carro, porque estava a recuperar de uma cirurgia e com mobilidade limitada, não podendo correr.

Impugna os factos relativos aos danos.

*Foi proferido despacho saneador, que julgou improcedente a excepção de incompetência em razão da matéria, julgou verificados os demais pressupostos processuais, consignou o objecto do litigio – “ Trata-se de uma acção de efectivação de responsabilidade extra-contratual decorrente de um evento estradal, na sequência do qual subsistiram danos patrimoniais e não patrimoniais para o autor, que o mesmo pretende ver reparados “ – e os temas da prova – “ A existência e a dinâmica do evento estradal; - Lesões físicas sofridas pelo autor imediatamente após o embate; - Danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pelo autor como consequência directa e necessária do evento estradal em causa nos autos; - Da situação profissional do autor: emprego e respectivos vencimentos “.

*A Ré requereu a realização de audiência prévia, a qual teve lugar.

*Junto aos autos o Relatório do IML, o A. requereu a ampliação do pedido, pedindo se acrescente ao pedido já formulado a quantia de € 28.448,00 a título de perdas futuras.

Alegou para tanto que o relatório pericial fixou ao A. um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 5%, o que gera uma perda de rendimentos que terão de ser indemnizados, tendo em consideração o salário base que auferia, a idade do A. à data do acidente e a esperança média de vida para os homens.

*O interveniente acessório impugnou a deduzida ampliação.

*A Ré apresentou reclamação ao Relatório pericial e impugnou a ampliação do pedido.

*Foi admitida a ampliação do pedido e deferida a prestação de esclarecimentos pelo Sr. Perito.

*O Sr. Perito prestou esclarecimentos *Realizou-se o julgamento, tendo vindo a ser proferida sentença que decidiu: Nestes termos e face ao exposto, julgo parcialmente procedente a ação e, em consequência:

  1. Condeno a Ré, “Seguradoras ..., S.A.”, a pagar ao Autor, P. P., a quantia de 352, 85 Euros, a título de danos patrimoniais e a quantia de € 30.000,00, a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros vencidos desde a data da presente sentença e vincendos até integral pagamento, sobre o capital de € 30.352,00, à taxa legal de 4%.

    *Custas na proporção do decaimento – Cfr., art.º 527.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

    *Inconformado veio o A.

    interpor recurso, pedindo a revogação da sentença, de modo a que seja atendida a indemnização peticionada de 80.230,85€UR, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões: 1. O Recorrente por causa direta e necessária do atropelamento de que foi vítima, ficou impossibilitado de trabalhar, sendo certo que à data do evento (22-3-2019), estava vinculado por contrato de trabalho, cujo termo estava previsto para 31-3-2019.

    1. Por força da incapacidade física absoluta em o prestar, a Entidade Empregadora, não renovou esse contrato, impossibilitando o Recorrente de receber a respetiva remuneração mensal, então fixada em 635,00€, nem recebeu qualquer subsídio estatal.

    2. Sofreu, pois, um prejuízo a título de danos patrimoniais de 11.700,00€UR (9 meses/2019 * 635,00€ + 9 meses/2020 * 665,00€), que o tribunal a quo não considerou.

    3. Relativamente aos os danos não patrimoniais ou futuros, tendo em conta que o Recorrente tinha 19 anos de idade, era saudável, com fraturas dos membros inferiores e intervenção cirúrgica, da culpa grave do condutor atropelante, de todos os padecimentos sofridos e sequelas que determinaram um deficit funcional permanente na integridade físico psíquica de 5% e, um défice funcional temporário total fixável num período de 124 dias, o período de défice funcional temporário parcial fixável num período de 126 dias, o período de repercussão temporária na atividade profissional total fixável num período de 250 dias, um quantum doloris de 5 pontos, um dano estético de 3 pontos, afigura-se ajustada a indemnização reclamada de 68.448,00€.

    4. Quando se trate de responsabilidade pelo risco, a constituição em mora da Recorrida ocorre desde a data da sua citação e por isso deveria a Ré ser condenada no pagamento dos juros legais desde a data da citação da Recorrida e não desde a data da prolação da sentença.

    5. Foram violados os artigos 483º (ex-vi artigo 499º), 503º, 562º, 566 e 805º do código civil.

      *Contra-alegou o interveniente acessório B. F., pugnando pela improcedência do recurso, tendo terminado com as seguintes conclusões: 1. Sem prejuízo da apelação principal, segundo a qual o ora Interveniente recorreu da sentença proferida nos presentes autos, donde se espera que venha a resultar a alteração da matéria de facto dada como provada, e por via disso, seja a Ré Seguradoras ..., S.A. absolvida do pedido contra si formulado, com a as necessárias e devidas consequências legais para o Interveniente, os danos não patrimoniais acham-se fixados na Primeira Instância por defeito, mas antes por excesso.

    6. Quanto aos DANOS PATRIMONIAIS, entendeu, e bem, o Tribunal a quo ao considerar: “Quanto ao dano de perdas salariais, analisando os recibos de vencimento juntos pelo autor a fls. 14 e 15, constata-se que, o autor no escasso período de três meses em que trabalhou teve várias faltas injustificadas (em janeiro faltou 8 horas, em fevereiro faltou 16 horas e em março faltou 36 horas), sendo legítimo presumir que a preterição do dever de assiduidade tenha pesado de forma decisiva na decisão da entidade patronal de não renovar o contrato de trabalho, razão pela qual não teve assento na factualidade provada que, em consequência do sinistro, o autor deixou de auferir rendimentos desde abril de 2019 a setembro de 2020” (negrito e sublinhado nosso).

    7. Porquanto, ao contrário do alegado pelo Autor/recorrente, segundo o artigo 351.º, n.º 2, al. g), do Código do Trabalho constituem justa causa de despedimento quer as faltas não justificadas ao trabalho que determinem diretamente prejuízos ou riscos graves para a...

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