Acórdão nº 211/21.5T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 13 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelALCIDES RODRIGUES
Data da Resolução13 de Outubro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório F. A. e A. P. intentaram contra G. C., no Juízo Local Cível de Guimarães - Juiz 3 - do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, a presente acção declarativa, sob a forma comum de processo, peticionando a declaração de resolução do contrato-promessa celebrado entre demandantes e demandado, com consequente condenação do R. no pagamento da quantia de €40.000, correspondente ao dobro do sinal prestado, acrescida de juros moratórios contados desde 12.01.2018 até efectivo e integral pagamento (que quantificam, à data da entrada da p.i. em juízo, em € 4.804); subsidiariamente, peticionam seja declarada verificada a condição resolutiva prevista na cláusula 6.ª desse mesmo contrato-promessa, declarando-se tal contrato resolvido e, em consequência, a condenação do R. a restituir-lhes €20.000, acrescidos de juros moratórios contados desde 12.01.2018 até efectivo e integral pagamento (que quantificam, à data da entrada da p.i. em juízo, em €2.402).

Para qualquer dos casos, reclamam ainda a fixação de uma sanção pecuniária compulsória no montante de €50, por cada dia de atraso do R. no cumprimento da obrigação de pagamento.

Para tanto, e em resumo, alegam que, por documento escrito outorgado em 12.01.2018, eles, AA., prometeram comprar ao R., que lhes prometeu vender, um determinado prédio, que identificam, tendo-lhe eles, demandantes, entregado a título de sinal e princípio de pagamento a quantia de €20.000.

Era sua intenção construir uma vivenda no prédio prometido comprar para lá passarem a habitar impreterivelmente no ano de 2020, facto de que deram conhecimento ao R..

Ficou contratualmente prevista a possibilidade de os demandantes resolverem o contrato celebrado quer caso até 31.12.2018 não fosse emitido o alvará de loteamento onde se integrava o prédio prometido comprar, neste caso com a restituição, pelo R., dos €20.000 pagos, quer caso até 31.12.2018 não fosse distratada uma hipoteca que incidia sobre o referido imóvel, neste caso assumindo o demandado a obrigação de restituir o sinal em dobro.

Na data de 31.12.2018 nem o alvará de loteamento estava emitido nem a hipoteca distratada, e que nunca o R. lhes foi dando conhecimento das diligências encetadas com vista ao cumprimento das referidas condições, não obstante as suas insistências nesse sentido, em 23.09.2020 notificaram o demandado solicitando informação sobre a emissão do referido alvará bem como sobre os elementos necessários ao agendamento do contrato definitivo, sem que do R. tivessem obtido qualquer resposta, pelo que em 24.10.2020 procederam à resolução do referido contrato-promessa através de carta registada com aviso de recepção.

Apenas em 06.11.2020, e após a recepção da carta resolutiva informou o R. que o alvará de loteamento fora emitido em 23.09.2020. Quanto ao distrate da hipoteca, afirmam que o mesmo só foi efectuado em 06.10.2020.

*Citado, contestou o R., pugnando pela total improcedência da ação.

Em abono da sua defesa, reconhecendo a celebração do contrato-promessa bem como a consagração das duas cláusulas resolutivas invocadas na p.i. mas negando que nunca tenha dado informações aos AA. sobre o estado das diligências que levava a cabo com vista ao cumprimento das obrigações assumidas, acrescentando que nunca foi interpelado pelos AA. para cumprir o contrato-promessa em causa, bem como que estes é que foram sempre atrasando a celebração do contrato prometido.

*Realizada a audiência prévia foi proferido despacho saneador, onde se afirmou a validade e regularidade da instância; foi fixado o objeto do litígio e enunciados os temas de prova, bem como foram admitidos os meios de prova.

*Realizou-se a audiência de julgamento.

*Posteriormente, a Mm.ª Julgadora “a quo” proferiu sentença, nos termos da qual decidiu julgar a acção parcialmente procedente e, em consequência: - Reconheceu a resolução do contrato-promessa de compra e venda celebrado em 12.01.2018 entre AA. e R.; - Condenou o R. no pagamento aos AA. da quantia de € 40.000, acrescida de juros moratórios contados desde 30.10.2020 até efectivo e integral pagamento, absolvendo-o do mais peticionado.

*Inconformado, o Réu F. L. interpôs recurso da sentença e, a terminar as respectivas alegações, formulou as seguintes conclusões (que se transcrevem): «Face ao exposto impõe-se que a sentença recorrida seja revogada e substituída, pois: A. Vem o presente recurso de apelação interposto da douta sentença que julgou procedente a acção, isto porque não pode o Recorrente conformar-se com o teor do mesmo.

  1. Os Autores intentaram contra o Réu, ora Recorrente, a presente acção declarativa, sob a forma comum de processo, peticionando, pela sua procedência, a declaração de resolução do contrato-promessa celebrado entre demandantes e demandado, com consequente condenação do R. no pagamento da quantia de €40.000, correspondente ao dobro do sinal prestado, acrescida de juros moratórios contados desde 12.01.2018 até efectivo e integral pagamento (que quantificam, à data da entrada da p.i. em juízo, em € 4.804); subsidiariamente, peticionam seja declarada verificada a condição resolutiva prevista na cláusula 6.ª desse mesmo contrato-promessa, declarando-se tal contrato resolvido e, em consequência, a condenação do R. a restituir-lhes €20.000, acrescidos de juros moratórios contados desde 12.01.2018 até efectivo e integral pagamento (que quantificam, à data da entrada da p.i. em juízo, em €2.402).

  2. Foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente a acção e, consequentemente: - Reconheceu a resolução do contrato-promessa de compra e venda celebrado em 12.01.2018 entre AA. e R.; e - Condenou o R. no pagamento aos AA. da quantia de €40.000 (quarenta mil euros), acrescida de juros moratórios contados desde 30.10.2020 até efectivo e integral pagamento, absolvendo-o do mais peticionado.

  3. Entende o Recorrente, todavia, que se impunha uma decisão diversa da recorrida, mais concretamente que a acção fosse julgada totalmente improcedente, na medida que não houve qualquer incumprimento contratual da sua parte.

    DOS FUNDAMENTOS DO RECURSO E. Nestas alegações, seguiremos a nossa linha de argumentação bebendo inspiração, sobretudo, no recente e mui douto Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 15.10.2020, em que é relator ALCIDES RODRIGUES.

  4. O contrato promessa assume-se, pois, como um contrato preliminar ou preparatório do negócio definitivo, um contrato de segurança ou de garantia do negócio prometido.

  5. O contrato deve ser pontualmente cumprido e só pode modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei (art. 406.º, n.º 1 do CC), designadamente, mediante a sua resolução fundada na lei ou em convenção (art. 432°, n.º 1, do CC).

  6. A simples mora não confere ao contraente fiel o direito (potestativo) de pedir a resolução do contrato, mas tão só o direito de pedir a reparação dos prejuízos que o retardamento causou ao credor – cfr. art. 804.º, n.º 1 do CC.

    I. Assim, o direito de resolução está sempre condicionado a uma situação de inadimplência (no caso de impossibilidade culposa – art. 801º) e, à semelhança do que sucede com a generalidade dos contratos, também a resolução legal do contrato-promessa pressupõe uma situação de incumprimento definitivo que resultará normalmente da conversão de uma situação de mora através de uma das vias previstas no art.º 808° do CC (seja pela interpelação admonitória, seja pela perda, objetivamente considerada, do interesse do credor).

  7. O regime geral dos contratos – designadamente as regras atinentes à falta de cumprimento e mora imputáveis ao devedor, entre elas as dos arts. 798º, 801º, 804º e 808º do CC – é aplicável ao contrato-promessa de compra e venda, tal como resulta do disposto genericamente no art. 410º, n.º 1, do CC, tendo este, no entanto, um regime específico (constante dos arts. 442º e 830º do CC) ao nível das sanções aplicáveis ao não cumprimento do contrato, quando tenha havido lugar à constituição de sinal (convencionado ou presumido – arts. 440º e 441º do CC).

  8. De acordo com o entendimento generalizado, na doutrina (cfr., neste sentido, entre outros, Calvão da Silva, Sinal e Contrato-Promessa, (…), p. 98/103 e Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória, 1987, p. 297; Antunes Varela, Sobre o Contrato-Promessa, p. 70, nota 1; Antunes Varela, RLJ, ano 119, p. 216, Almeida Costa, Contrato-Promessa, Uma síntese do Regime Actual, separata da ROA, ano 50, I, p. 54) e na jurisprudência (cfr., neste sentido, entre outros, os acórdãos do STJ de 22/06/2010 (relator Fonseca Ramos), de 11/02/2015 (relator Gabriel Catarino), de 19/05/2016 (relator Lopes do Rego), de 16/06/2016 (relator Pires da Rosa), de 13/10/2016 (relatora Maria da Graça Trigo), 2/02/2017 (relatora Maria da Graça Trigo) e de 30/11/2017 (relatora Fernanda Isabel Pereira), todos disponíveis in www.dgsi.pt.), salvo se da interpretação da vontade negocial resultar diversamente, o regime legal do sinal é inaplicável em caso de simples atraso no cumprimento. De facto, só o incumprimento definitivo e culposo do contrato-promessa (e o consequente pedido resolutivo) dá lugar às cominações previstas no art. 442°, n. ° 2, do CC, não bastando, para o efeito, a simples mora [que é necessário transformar em incumprimento definitivo, nos termos gerais do art. 808° do CC], porquanto nada justifica que se excecione o contrato-promessa do regime geral aplicável à generalidade dos contratos.

    L. A simples mora apenas constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor (n.º 1 do art. 804º do CC) e não lhe confere, em princípio, o direito à resolução do contrato.

  9. No caso de incumprimento do contrato promessa de compra e venda, a nossa lei abre dois caminhos ao contraente não faltoso: a)-a execução específica regulada no art. 830.º do C.C., havendo simples mora; b) - a resolução do contrato, havendo incumprimento definitivo, sendo que apenas este dá origem ao...

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