Acórdão nº 1083/19.5T8VCT-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 24 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelJOAQUIM BOAVIDA
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães (1): I – Relatório 1.1.

Na acção declarativa, sob a forma de processo comum, que J. K.

intentou contra Bank … – Sucursal em Portugal, na qual intervém a título acessório, do lado do Réu, a X Europe, SA – Sucursal em Portugal, foi em 27.10.2021 proferido despacho a indeferir a reclamação deduzida pela Autora contra as notas discriminativas e justificativas de custas de parte apresentadas pelos Réu e Interveniente acessória.

*1.2.

Inconformada, a Autora interpôs recurso de apelação daquela decisão, formulando as seguintes conclusões: «1. Com o recurso interposto pretende a Recorrente ver revogado o douto despacho datado de 27/11/2021, que indeferiu a reclamação às notas de custas apresentada pelas Rés, ora Recorridas, pois entende, por um lado que a interveniente acessória X Europe não existe qualquer relação jurídica entre esta e a Autora que fundamente um vencimento, pelo que não podem por esta ser reclamadas custas de parte, e por outro lado, entende que, em qualquer caso, se verificou um erro de cálculo no valor peticionado pela Ré e pela interveniente acessória X Europe, porquanto ter-se-ia de atender ao limite previsto no nº 2 do artigo 32º da Portaria 419-A/2019, de 17 de Abril, reduzindo-se a nota de custas da primeira para 2.652,00€ e da segunda para €2.260,00€.

  1. No que respeita ao primeiro argumento aduzido pela Recorrente, é inequívoco que, in casu, não existe qualquer relação jurídica material controvertida entre a A., ora Recorrente, e a interveniente acessória X Europe.

  2. De facto, a A., ora Recorrente, não formula qualquer pedido contra a interveniente acessória X Europe. A X Europe não é substituta legal do Réu Bank ..., pois este contestou a ação, não por isso revel (cf. artigo 329º do CPC). Nem a X Europe recorreu de uma decisão que a prejudicou direta e efetivamente.

  3. Ora, não se verificando nenhuma das circunstâncias referidas no parágrafo anterior, que excecionam a regra, a interveniente acessória X Europe nunca poderia, como não pode, nesta ação, alguma vez, ser absolvida ou condenada, e consequentemente ser “parte vencedora” ou “parte vencida” na mesma.

  4. Por outro lado, para que sejam devidas custas de parte, a lei, mais concretamente o nº 1 do artigo 533º do CPC, estipula que se cumpra o pressuposto do vencimento, de uma parte sobre a outra.

  5. Ora, se não existe qualquer relação jurídica entre a A., ora Recorrente, e a interveniente acessória X Europe, ora Recorrida, também não existe na relação entre estas “vencedor” ou “vencido”, e, consequentemente, não fica cumprido o critério do “vencimento”, para que sejam devidas custas de parte.

  6. Neste sentido, Ac. do TRP no processo nº 3039/15.8T8PNF-B.P1, publicado in www.dgsi.pt, cujo sumário refere o seguinte: “(…) III - Tendo a ré ficado em parte vencida no pedido que contra ela os autores formularam, as intervenientes acessórias provocadas do lado passivo, não têm qualquer direito a haver custas de parte dos autores, pela simples razão que entre elas e aqueles inexiste qualquer relação jurídica que fundamente um qualquer vencimento. IV - A interveniente acessória do lado passivo que ficou vencida, parcial ou mesmo na totalidade, também não tem qualquer direito a haver custas de parte da ré, pois que atento o regime da intervenção acessória, também não pode ser considerada como parte vencedora na ação. V - E pelas mesmas e adaptadas razões, não tem direito a haver custas de parte da primeira interveniente acessória que a chamou, a subsequente interveniente acessória do lado passivo, em virtude de não poder considerada como parte vencedora no confronto directo entre ambas.” 8. Ora a tal inexistência de relação jurídica, não é alheio o direito substantivo, pois que, de outro modo, o contrato de seguro celebrado entre o Réu-chamante, Bank ..., e a interveniente acessória chamada, X Europe, como que seria oponível ou estaria a ser discutido com a Autora, ora Recorrente, violando-se o princípio da relatividade dos contratos, consagrado no artigo 406 nº 2 do Código Civil.

  7. Sendo que a Autora, ora Recorrente, não pode ser compelida a litigar com um terceiro – com o qual não mantém qualquer relação jurídica material – por força de um contrato de seguro celebrado entre este e o réu-chamante e ao qual é alheia (e que não foi celebrado em seu favor) – cf. Ac. do STJ, proferido no dia 09-02-2021, no processo nº 972/16.3T8EVR.E1.S1 – 1ª Secção.

  8. Pois que, in casu, a interveniente acessória apenas é chamada para assegurar única e exclusivamente uma relação jurídica material que tem para com o Réu, e para se precaverem, mutuamente, de direitos e deveres., não resultando daí qualquer benefício ou prejuízo para a A.

  9. Daí que, não exista fundamento legal, para que a interveniente acessória X Europe reclame custas de parte à Autora, ora Recorrente.

  10. Ademais, cumpre referir que aqui não existe uma qualquer injustiça que atente contra as regras e princípios basilares do sistema jurídico ao entender-se que não existe direito ao reembolso das custas da interveniente acessória X Europe, porquanto se a Autora tivesse logrado ganhar a presente ação, também não teria direito a reclamar quaisquer custas de parte da interveniente acessória X Europe, quer por inexistência de relação material controvertida como defendido, quer porque não podendo nunca a X Europe ser condenada no presente processo, nunca poderia ser parte vencida.

  11. Injustiça outrossim seria, que a X Europe estivesse no presente processo, numa posição, em que pudesse, em qualquer circunstância, vencendo a Autora ou o Réu, reclamar sempre custas de parte.

  12. No que respeita ao segundo argumento aduzido pela Recorrente, entende aquela, que o douto despacho ora em sindicância, enferma de erro de interpretação jurídica, quando refere que o nº 2 do artigo 32º da Portaria 419-A/2019, de 17 não se aplica ao presente caso porque a interveniente X Europe apresentou articulado próprio, pois que o mencionado preceito legal nada tem que ver com a apresentação ou não de articulado próprio, tendo outrossim como objetivo evitar que havendo pluralidade de sujeitos na parte ou partes vencedoras, cada um destes sujeitos ou partes, tendo apresentado articulado próprio, beneficie da taxa de justiça paga por outros sujeitos ou partes vencedoras nos articulados destes, para cálculo de custas de parte, onerando a parte vencida sem qualquer justificação para o efeito.

  13. De facto, no presente caso, a interveniente X Europe está a aproveitar-se do articulado apresentado pelo Réu Bank ... e de todas as taxas de justiça que este pagou, para reclamar honorários à Autora na sua nota de custas, tendo em consideração para efeitos de cálculo, não só as taxas de justiça que ela própria pagou e que a Autora pagou, como ainda as taxas de justiça que aquele Réu pagou.

  14. Sendo certo que, aquele Réu também apresentou a sua nota de custas de parte à Autora, na qual naturalmente também considerou as taxas de justiça que ele-próprio pagou.

  15. Deste modo, a interveniente X Europe está a beneficiar do facto de existirem duas supostas partes vencedoras, para reclamar um montante superior de honorários nas custas de parte, que nunca poderia reclamar se não houve tal pluralidade, à custa da Autora que assim paga duas vezes honorários calculados sobre a taxa de justiça do Réu.

  16. Ora, tendo em consideração que neste processo foram pagas as seguintes taxas de justiça: 1.224,00€ pela petição inicial, 1.224,00€ pela contestação do Réu Bank ..., 408,00€ pela intervenção da X Europe e 1.224,00€ pela contestação da X Europe, o que perfaz um total de 4.080,00€, tal significa que a totalidade dos honorários a pagar pela A. ao Réu e à interveniente acessória tem como limite o montante de 2.040,00€ (4.080,00€x50%) e que sendo duas as partes, que não pode pagar mais que 1.020,00€ a cada uma (2.040,00€:2) – cf. nºs 1 e 2 do art.º 32 da referida portaria.

  17. Ora, a verdade é que a Ré Bank ... reclama 1.428,00€ a título de honorários e a interveniente acessória X Europe 2.024,00€, ou seja, mais 408,00€ a primeira do que o montante a que terá direito, e mais 1.004,00€ a segunda do que o montante a que terá direito.

  18. Neste contexto, deve o Réu Bank ... ver reduzida a sua nota de custas em 408,00€ para 2.652,00€ (3.060,00€-408,00€) e a interveniente acessória X Europe ver reduzida a sua nota de custas em 1.004,00€ para 2.260,00€ (3.264,00€-1.004,00€).

  19. Face ao exposto, o douto despacho recorrido viola, por erro de interpretação e de aplicação, o preceituado no nº 1 do artigo 533º do CPC, nº 2 do artigo 406º do Código Civil e nº 2 do artigo 32º da portaria 419-A/2019, de 17 de Abril.

    NESTES TERMOS e mais de direito que V. Exas. melhor e doutamente suprirão deve ser concedido provimento ao recurso interposto e, em consequência, revogar-se o douto despacho recorrido datado de 27/11/2021 proferido pelo Mma juiz do Tribunal a quo, substituindo-o por um outro que declare/reconheça que não assiste à interveniente acessória X Europe, ora Recorrida qualquer direito a...

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