Acórdão nº 1359/19.1T8BGC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 05 de Maio de 2022

Magistrado ResponsávelROSÁLIA CUNHA
Data da Resolução05 de Maio de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

*Acordam, em conferência, na 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães: RELATÓRIO J. B.

e M. C.

intentaram a presente ação declarativa sob a forma de processo comum contra J. A.

e A. C.

pedindo que: a) seja declarada nula e de nenhum efeito a escritura de justificação notarial lavrada em 21 de agosto de 2017 no cartório notarial a cargo do notário J. G., na qual os réus J. A. e A. C. figuram como justificantes e que se encontra exarada a fls. 99 a 100 verso do Livro de Notas para escrituras diversas nº 114-G relativamente ao prédio rústico sito em ..., freguesia de ..., concelho de ..., composto por terra de cultura de centeio, com a área de 5300 metros quadrados, a confrontar do norte com herdeiros de J. J., do sul com caminho, do nascente com A. P. e do poente com M. P., não descrito na Conservatória do Registo Predial de ..., mas inscrito na respetiva matriz, sob o artigo ..., da atual União de Freguesias de ... e ... (que proveio do artigo ... da extinta freguesia de ...); b) que seja declarado inexistente o direito justificado sobre o aludido prédio; c) que seja declarada a falsidade dos factos, cuja justificação se pretendeu através da referida escritura, não podendo os mesmos produzir quaisquer efeitos jurídicos quanto ao referido prédio rústico; d) que sejam cancelados todos os registos que venham a ser efetuados com base na escritura impugnada, no que ao aludido prédio rústico se refere.

*Como fundamento dos seus pedidos alegaram, em síntese, que, no dia 21 de agosto de 2017, foi lavrada a escritura objeto da presente impugnação na qual os réus se declararam donos e legítimos possuidores, entre outros, do prédio rústico inscrito na matriz sob o art. ..., melhor identificado na p.i., aí constando que o adquiriram, por compra verbal à Junta de Freguesia de ..., em 1970, sem que, no entanto, ficassem a dispor de título formal que lhes permitisse o registo na Conservatória Predial. Após a referida compra, passaram a usar e fruir tal imóvel, agindo como seus proprietários e suportando os respetivos encargos, atos que praticaram desde 1970 de forma pública, pacífica, ininterrupta e contínua, sem qualquer oposição e sempre na convicção de agirem em coisa própria.

Porém, os factos que constam da escritura impugnada e que justificaram a aquisição por usucapião são falsos e os réus não mantêm qualquer posse sobre o referido prédio desde 1970, nem sobre o mesmo praticaram quaisquer atos desde tal data, tanto mais que os réus eram menores de idade em 1970.

*Regularmente citados, os réus apresentaram contestação na qual invocaram a exceção de ilegitimidade dos autores para instaurar a presente ação, pedindo a sua consequente absolvição da instância.

Alegaram ainda que os factos que constam da escritura de justificação são verdadeiros, pugnando, com esse fundamento, pela improcedência da ação.

Pediram a condenação dos autores como litigantes de má fé, em multa e indemnização, invocando que a presente ação foi proposta com o intuito de retardar o prosseguimento da ação com o número 1350/17.2T8BGC.

*Por despacho proferido em 21.12.2020 (referência Citius 23000175) foi fixado à causa o valor de € 5 000,01, foi julgada improcedente a exceção de ilegitimidade ativa e foi tabelarmente certificada a verificação dos demais pressupostos processuais.

*Procedeu-se a julgamento e a final foi proferida sentença com o seguinte teor decisório: “Face ao supra exposto, julga-se improcedente a ação intentada pelos Autores J. B. e M. C. e, em consequência:

  1. Absolvem-se os Réus J. A. e A. C. dos pedidos contra si formulados; b) Julgar o pedido quanto à litigância de má-fé dos Autores improcedente, e, em consequência, absolvê-los.

    Custas do processo, pelos Autores, ao abrigo do disposto nos artigos 527.º, n.º 1 e 2 do Código de Processo Civil.

    Custas quanto ao incidente de litigância de má-fé pelos Réus.”*Os autores não se conformaram e interpuseram o presente recurso de apelação, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões: “I – DA AÇÃO - BREVE SÍNTESE: dos seus fundamentos, das suas peças processuais e tramitação e da sentença.

    1) Os Réus/Recorridos declararam, a 21/08/2017, através de escritura pública de justificação notarial, ser donos e legítimos possuidores, desde 1970, do prédio rústico sito em ..., freguesia de ... e concelho de ..., inscrito na matriz sob o artigo ...,da actual União de Freguesias de ... e …, composto por terra cultura de centeio, e que entraram na sua posse ainda no estado civil de solteiros, por compra verbal que fizeram à Junta de Freguesia de ...

    na data mencionada (1970), sem no entanto ficarem a dispor de título formal que lhes permitisse o registo na Conservatória do Registo Predial, mas que desde logo entraram na sua posse e fruição (desde 1970), em nome próprio, posse essa que declararam manter há mais de 20 anos, sem violência nem oposição de ninguém, ostensivamente, com o conhecimento de toda a gente e com aproveitamento de todas as suas utilidades, nomeadamente amanhando, adubando, cultivando e colhendo frutos, suportando os respetivos encargos, pagando as respetivas contribuições e impostos.

    2) Por tais factos serem, em relação ao referido prédio rústico, falsos, os aqui Recorrentes (Autores), J. B. e mulher M. C., intentaram contra os Recorridos (Réus), J. A. e A. C., ação declarativa sob a forma de processo comum peticionando, além do mais, o seguinte: A) a declaração: a.1) de ineficácia da escritura de justificação lavrada em 21 de agosto de 2017 no cartório notarial de J. G., na qual os Réus J. A. e A. C. figuram como justificantes relativamente ao prédio rústico sito em ..., freguesia de ..., concelho de ..., composto por terra de cultura de centeio, com a área de 5300 metros quadrados, a confrontar a norte com herdeiros de J. J., a sul com caminho, a nascente com A. P. e a poente com M. P., não descrito na Conservatória do Registo Predial de ..., mas inscrito na respetiva matriz, sob o artigo ..., da atual União de Freguesias de ... e ...; a.2) de inexistência do direito justificado sobre o referido prédio; a.3) de falsidade dos factos cuja justificação se pretendeu, através da referida escritura, não podendo os mesmos produzir quaisquer efeitos jurídicos quanto ao referido prédio rústico; B) O cancelamento de todos os registos que venham a ser efetuados com base na referida escritura.

    3) A referida acção de impugnação de justificação notarial é uma acção de simples apreciação negativa, cabendo aos Réus a prova dos factos constitutivos do seu direito, nomeadamente, do direito do qual se arrogam sobre o referido prédio e nos precisos termos que foram especificados na escritura de justificação notarial.

    4) Resumidamente, alegaram os Autores/Recorrentes na sua Petição Inicial que os factos declarados e constantes da escritura pública de justificação notarial celebrada pelos Réus/Recorridos, em 21/08/2017, são falsos. Porquanto: a) os Réus/Recorridos não mantêm desde 1970 qualquer posse sobre o referido prédio; b) os Réus/Recorridos não praticaram desde 1970 quaisquer atos de materiais de posse sobre o referido prédio; c) os Réus/Recorridos eram menores de idade em 1970.

    5) Os Réus, aqui Recorridos, apresentaram contestação e nesta invocaram a excepção de ilegitimidade dos Autores – julgada improcedente no despacho saneador – e limitaram-se a impugnar os factos articulados na petição inicial dos Autores, e não foi apresentada Reconvenção pelos Réus.

    6) O Tribunal de Primeira Instância considerou não provado que “os Réus celebraram o negócio descrito em 7) no ano de 1970” – Cfr. Alínea a) dos “factos não provados” da sentença recorrida.

    7) Tribunal recorrido que, para surpresa dos Autores – talvez até dos Réus! - e de todos quantos exercem advocacia ou magistratura, julgou improcedente a acção e absolveu os Réus dos pedidos contra si formulados.

    II – DO RECURSO 1 – RÁPIDA ALOCUÇÃO SOBRE OS SEUS FUNDAMENTOS 8) O Recurso de Apelação - sobre matéria de facto e sobre matéria de Direito - ora apresentado tem como fundamentos: a) erro de julgamento por errada e deficiente análise crítica da prova, insuficiência de prova ou incorreta valoração desta para a decisão de facto proferida (uma vez que a prova testemunhal e documental conduz, indiscutivelmente, a solução oposta à da sentença) e errada interpretação e aplicação do Direito, quer por violação das regras de apreciação de prova e de ónus de prova, quer por violação de normas e princípios relacionados com a tramitação do processo civil em si.

  2. nulidade da sentença por oposição dos seus fundamentos com a decisão e por o juiz ter conhecido de questões de que não podia conhecer, o que gerou uma decisão surpresa.

    9) Apesar da especificação por alíneas dos referidos fundamentos, não consideram os Recorrentes existir qualquer tipo de ordem, prevalência ou subsidiariedade entre os fundamentos especificados, pelo que, fazem questão que ambos os fundamentos sejam analisados pelo Tribunal da Relação de Guimarães, até para aquilatar da interpretação e aplicação do Direito que os Tribunais de Primeira Instância fazem e de como a Justiça anda ou pode andar pelas ruas da amargura.

    2 – DO RECURSO SOBRE MATÉRIA DE FACTO 10) O recurso sobre matéria de facto tem uma dupla vertente: a) por um lado, determinados factos alegados pelos Autores na sua petição inicial devem ser considerados provados, existindo prova documental quanto aos mesmos; b) e por outro, determinados factos considerados provados pelo Tribunal Recorrido devem ser considerados não provados, por inexistência e/ou incorreta valoração da prova produzida em julgamento.

    2.1 – Dos factos que devem ser considerados como provados 11) Foram alegados pelos Autores, nos artigos 7.º e 8.º da sua Petição, os seguintes factos: “O Réu marido é natural de ..., Montalegre, aí tendo nascido a 20 de Fevereiro de 1953.

    A Ré mulher é natural de ..., ..., aí tendo nascido a 15 de Fevereiro de 1957.” 12) Factos não impugnados pelos Réus e em relação aos quais existe prova...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT