Acórdão nº 78/22.6T8VPC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelCONCEIÇÃO SAMPAIO
Data da Resolução15 de Dezembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I – RELATÓRIO 1.1.

AA e BB, intentaram o presente procedimento cautelar de restituição provisória da posse, contra CC e esposa DD.

Para tanto, e em síntese, alegam que são donos e legítimos possuidores dos prédios que identificam e cuja serventia agrícola se faz através de um caminho público (ou, no menos, um caminho de consortes), que, nasce junto do caminho público da “...” e perpendicularmente a este numa extensão de cerca de cento e cinquenta metros. Este caminho liga o caminho público da “...” a um, outro, localizado a umas centenas de metros, que liga as povoações de ... e ..., sempre foi utilizado quer pelos Requerentes e seus antecessores quer por todos os vizinhos e seus antecessores, que cultivam os terrenos naquele lugar da ... ou ..., sem nunca terem sido molestados ou incomodados, pelos requeridos, seus antecessores (que, aliás, da mesma forma, também, ao longo dos anos se serviram do referido caminho para aceder ao seu imóvel) ou por qualquer outro compossuidor. Acontece que os Requeridos se apropriaram e destruíram o “caminho” e atuam como se o mesmo lhes pertencesse.

*1.2.

Os requeridos apresentaram oposição, excecionando por um lado, a ilegitimidade dos requerentes para estarem em juízo, a insusceptibilidade de o caminho ser possuído face à sua da natureza de público e a caducidade do direito à ação e impugnando, no mais, os factos alegados, concretamente que os requerentes não têm o direito de passagem que invocam, tendo o acesso aos prédios que dizem pertencer-lhes sido sempre feito por outro caminho, concluindo, a final, pela improcedência da providência.

*1.3. Realizada a audiência final, foi proferida decisão que julgou procedente o procedimento cautelar, e em consequência:

  1. Determinou a imediata restituição aos requerentes da posse sobre o caminho que, nasce junto do caminho público da “...” e perpendicularmente a este, numa extensão de cerca de 150 m medidos da poça de água até ao prédio referido em 2), e que seguindo o seu trilho culmina no caminho que liga ao caminho público que liga as povoações de ... e ..., permitindo o acesso ao prédio rústico dos requerentes inscritos na matriz sob os artigos ...14... e ...30.º da freguesa de ..., concelho ...; b) Determinou que os requeridos reponham o caminho no estado em que se encontrava, retirando todos os obstáculos e plantações que no mesmo trilho fizeram e se abstenham de, por qualquer meio, estorvar ou prejudicar o direito de passagem dos requerentes a pé, de carro ou de qualquer outra máquina e/ou veículo agrícola ou para fins agrícolas por tal caminho.

    *1.4.

    Inconformados com a decisão vieram os Requeridos dela interpor recurso, terminando com as seguintes conclusões: 1. Entendem os recorrentes, com o devido respeito, que a providência cautelar instaurada, face ao pedido deduzido, à prova efectivamente realizada e ao direito aplicável, tinha necessariamente que improceder.

    Enquadramento 2. A Primeira questão a reapreciar prende-se com a nulidade da Sentença nos termos do preceituado no artigo 615.º n.º 1 alíneas c) d) e e) do CPC.

    1. A Segunda Questão a reapreciar prende-se com a decisão sobre a Natureza do Caminho em discussão nos autos e a posse dos Requerentes sobre o mesmo.

    2. Uma Terceira Questão a reapreciar prende-se com a decisão sobre Caducidade do direito à acção por parte dos Requerentes.

    3. Impondo-se a reapreciação das provas infra indicadas por ter existido, também, erro na decisão da matéria de facto, cuja reapreciação, aqui também se peticiona.

      Nulidade da Sentença – nos termos do artigo 615.º n.º 1 alínea c), d) e e) do Código do Processo Civil 6. Os requerentes peticionam no RI que se ordene: - a restituição da posse, em que estavam, do caminho Público (ou pelo menos caminho de consortes) (…) de que foram esbulhados (…) - a condenação dos Requeridos a realizar as obras necessárias à reposição do caminho (…) No seguimento do que vinha alegado no seu RI, designadamente, em 12 a 15 e em 24.

    4. Este é, pois, o objecto da providência.

    5. Com base neste objecto, a Sentença determina: - a imediata restituição aos requerentes da posse sobre o caminho que nasce junto do (…) - Que os requeridos reponham o caminho no estado em que este se encontrava retirando todas as plantações e/ou aberturas e/ou obstáculos que no mesmo trilho fizeram (…) No entanto, 9. Esta decisão vem fundamentada na aquisição por parte dos requerentes do direito a uma Servidão de passagem por usucapião, e no correspondente direito de passagem e não na posse dos requerentes, como alegado, sobre um caminho público (ou quando muito de consortes).

    6. Os requerentes pedem a restituição da posse sobre um caminho público (ou quando muito caminho de consortes) e é-lhe concedida a restituição dessa posse sobre esse caminho, no entanto, não ao abrigo de um qualquer direito sobre o mesmo mas sim, com base (fundamento) naquele eventual direito de servidão de passagem (pela terra dos requeridos) por usucapião.

    7. Existe assim, uma clara contradição entre a fundamentação e a decisão o que torna a presente Sentença Nula nos termos do preceituado no artigo 615.º n.º 1 alínea c) do Código do Processo Civil.

    8. Ao apreciar uma eventual restituição da posse ao abrigo de um direito de Servidão de passagem, conheceu a M.ª Juiz de questão que não podia tomar conhecimento, pois encontrava-se fora do objecto da acção, sendo a sentença, nula também ao abrigo do preceituado no artigo 615.º n.º 1 alínea d) do Código do Processo Civil; 13. Entendendo-se a decisão no sentido de restituir a posse relativamente ao direito de servidão de passagem, então sempre estaria o M.º Juiz a decidir em objecto diverso do pedido, sendo a sentença nula ao abrigo do preceituado no artigo 615.º n.º 1 alínea e) do Código do Processo Civil.

    9. Nesta última hipótese, então, sempre a sentença seria nula porquanto ambígua e ininteligível neste seu dispositivo, nulidade que também, à cautela, se invoca nos termos do preceituado no artigo 615.º n.º 1 alínea c) do Código do Processo Civil.

    10. Deixam-se assim invocadas estas nulidades a fim de serem apreciadas ao abrigo do preceituado no n.º 4 do artigo 615.º do Código do Processo Civil.

      Impugnação da Matéria de facto 16. Vem ainda o presente recurso interposto para reapreciação da matéria de facto, relativamente aos factos 5, 6, 7, 8, 12, 13, 16, 17, 19, 21, 22, 23, 24, 25 dos factos indiciariamente provados e o facto f) dos factos não provados.

    11. Considerando os Recorrentes que uma correcta apreciação da prova produzida relativamente aos mesmos, infra concretamente indicada, impunha uma decisão inversa da proferida, tendo a M.ª Juiz errado notoriamente nessa apreciação e decisão, desde logo: A- Impugnação dos Factos 5 a 8 e 25 dos factos indiciariamente provados e d) dos factos não indiciados.

    12. Estes factos, entre si interligados, foram erradamente considerados como indiciariamente provados, na redacção constante da Sentença, e assumem relevância no que respeita à apreciação da posse dos requerentes sobre o caminho, natureza e configuração do mesmo.

    13. Sobre os mesmos, além do alegado pelos Requerentes no RI (artigos 12, 13, 14, 15 e 24, onde expressamente assumem a consciência de que o caminho em questão é público, foi produzida a seguinte prova, incorrectamente apreciada pelo Tribunal “a quo” em erro notório de apreciação: a) Declarações de Parte do Requerente EE, gravadas do minuto das 16.01 horas às 16:39 horas, no respectivo suporte informático conforme acta da audiência de discussão e Julgamento de dia 30-06-2022, nomeadamente, nos seguintes excertos: - No excerto das suas declarações gravadas do minuto 00:02:56 ao minuto 00:03:21, onde refere que caminho em discussão nos autos “era um caminho para as pessoas passarem” e que passava lá toda a gente de carro de bois.

      - No excerto das suas declarações gravadas do minuto 00:21:53 ao minuto 00:22:16, o Requerente confirma que o caminho em discussão nos autos era o caminho mais próximo para ...”, que era o caminho utilizado pela professora FF e pelos alunos que a acompanhavam, para a escola, confirmando ainda a sua consciência de que se trata de um caminho público. “Antigamente com os carros de bois era o caminho mais próximo para .... Inclusive a minha irmã tinha aulas, acompanhava a professora FF para as aulas era por ali que ia. Os carros de bois era por ali que circulavam”, referiu.

      O Requerido, confirmou expressamente o uso generalizado da população, inclusive a professora e alunos para se deslocarem para a escola em ... e que os carros de bois era por ali que circulavam e que era o caminho mais próximo para ....

      Referiu ainda “Quando começaram a utilizar os tratores o caminho começou a ficar desusado se assim se pode dizer e começou-se a usar o caminho que é a estrada que liga ... a ... mais longe, claro, criaram algumas condições, mas era o caminho mais longe e os tratores e as camionetas começaram a passar por lá. Ao passar por lá”… Como se pode ver, o Próprio requerente afirmou expressamente nestas declarações também que quando começaram a aparecer os tractores, começou a ficar desusado, começando a usar-se a estrada (entretanto composta), mais longe.

      É o próprio requerente que confessa que o caminho era apenas para carro de bois e que quando surgiram os tractores, estes tinham que ir por outro lado mais longe, utilizando outra estrada.

      Esta afirmação permite concluir, com elevado grau de certeza, que dada a largura estreita do caminho, (para carro de bois) os tractores já não conseguiam passar e começaram a passar pelo trajecto mais longo, noutra via (mais distante) entretanto melhorada para o efeito (facto que releva para configuração do caminho, infra abordada ainda a este respeito).

      Pergunta-se: Se, há data, não passavam os tractores, porque razão iriam poder passar agora sem invadir o terreno que ladeia o caminho pertença, ora, dos requeridos? - No excerto gravado do minuto 00:25:53 ao minuto 00:26:53, onde, a perguntas do mandatário do...

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