Acórdão nº 3372/18.7T8VNF.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelJOSÉ CARLOS DUARTE
Data da Resolução15 de Dezembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM OS JUÍZES DA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES 1. Relatório[1] AA intentou acção declarativa comum contra C..., SA e Cr..., SA e requereu a intervenção principal provocada de A... SGPS, SA, F... SGPS, SA, O... - Sociedade Gestora de Participações Sociais, SA, J... – I..., SGPS, SA, BB e CC, pedindo: - a título principal: a) ser reconhecido à autora, conjunta ou individualmente, o direito de preferência na cessão da quota com o valor nominal de € 994.625,95 no capital social da “OL...”, que a “C...” fez à “Cr..., SA” pelo preço de € 1.500,00 (mil e quinhentos euros), substituindo-se a autora à ali cessionária no respectivo contrato.

  1. ser ordenado o cancelamento de todos e quaisquer registos que hajam sido feitos na sequência dessa cessão, nomeadamente a favor da ré “Cr..., SA”, pelo Dep. 123/2016.04.27 e a sua inscrição na titularidade daqueles que venham a exercer a preferência; c) ser admitida a pretendida intervenção principal provocada activa e ordenada a citação dos intervenientes para, como autores, declararem nos autos se pretendem exercer a preferência.

  2. serem as rés condenadas em custas.

    - ou, a título alternativo: quando se entenda dever aplicar-se a forma processual do artigo 1037.º do Código de Processo Civil, ser ordenada a alteração da forma de processo e aproveitados os actos praticados e: a) ser reconhecido à autora o direito à licitação no exercício do direito de preferência na aquisição da identificado quota social; b) ser ordenada a notificação dos agora intervenientes para comparecerem no Tribunal no dia e hora que sejam fixados, a fim de se proceder a licitação entre eles e a autora, no que respeita ao exercício daquele direito de preferência.

    Alegou para tanto e em síntese: A O... S.G.P.S, Lda tinha como sócios a C..., SA, a O... - Sociedade Gestora de Participações Sociais, SA, a F... SGPS, SA, a J... – I..., SGPS, SA, BB, CC e a A., cada um titular das quotas que discrimina.

    O art.º 6º dos Estatutos da OL... prevê que a transmissão de quotas fica sujeita ao prévio consentimento da sociedade e a preferência, com eficácia real, dos demais sócios.

    A 25 de Março de 2016 a C... cedeu á Cr..., SA a quota de que era titular, pelo preço de € 1.500,00.

    Nem a transmissão, nem o seu projecto, incluindo a indicação do cessionário, do preço e dos demais termos e condições, contendo eventuais garantias de pagamento, foram, por qualquer meio, comunicados à OL..., nem foi pedido à sociedade o consentimento para a cessão, nem foram comunicados à A. e aos restantes sócios.

    A 16 de Novembro de 2017 realizou-se uma Assembleia da OL... em que estiveram presentes representantes da A..., da Cr..., SA, da O... - Sociedade Gestora de Participações Sociais, SA, da F..., BB, CC e da A., que supôs que a Cr..., SA era a nova designação social da C...; depois da Assembleia veio a verificar pela consulta da certidão permanente da sociedade que tinha ocorrido a já referida transmissão da quota; tendo a Cr..., SA intervindo na Assembleia da sociedade de 16/11/2017, sem oposição ou impugnação de tal intervenção, tem-se por prestado o consentimento da sociedade.

    Aqueles que pretende chamar aos autos a titulo de intervenção principal provocada são, na proporção das respectivas participações, co-titulares do direito de preferência relativo á transmissão da participação social da C... para a Cr..., SA.

    *A A. procedeu ao depósito da quantia de € 1.750,00, a titulo de preço da cessão, acrescido de € 250,00 a titulo de despesas.

    *Citadas contestaram as RR.

    por excepção invocando: - a falta de verificação de condição sine qua non da acção, concretamente a determinação prévia do preferente, invocando para tanto que, no caso, existem vários direitos de preferência concorrentes, pelo que a determinação do preferente faz-se através do processo especial de notificação para preferência previsto no art.º 1037º do CPC, que é prévio á acção de preferência; a A. não pode vir exercer o direito de preferência através da acção dos autos por não ter sido previamente encabeçada nesse direito pelo meio processual próprio; - a caducidade da acção, alegando para tanto que a A. teve conhecimento dos elementos essenciais da alienação na primeira semana de março de 2016, nessa data foram comunicadas à A., representada pelo seu filho, bem como aos demais sócios da OL..., as cláusulas essenciais da projectada cessão de quota, em concreto foi transmitido ao representante da A. a identidade da cessionária - a Cr..., SA -, o valor da cessão - € 1.500,00 -, e as condições de pagamento – imediato - , assim como foram explicadas a causa e finalidade da projectada cessão para justificar o valor simbólico da transmissão; a cessão foi registada a 27/04/2016, pelo que a partir daí tornou-se oponível á A.

    E, por impugnação, alegaram que a OL... surgiu da vontade de 5 irmãos, num plano de estrita igualdade, manterem e frutificarem, no seio familiar, uma parte do seu património financeiro e imobiliário; o capital social da sociedade foi subscrito na proporção de 20% por cada uma das sociedades gestoras de participações sociais anónimas que cada um deles tinha previamente constituído – na A... agregou-se o ramo familiar de DD; na C..., o de EE; na F..., o de FF; na O... - Sociedade Gestora de Participações Sociais, SA, o de O...; e na J..., o de BB, de quem a A. e BB e CC são filhos.

    Fruto do bom relacionamento que existia entre os cinco ramos familiares, a prática que ficou instituída entre os sócios era a de que todos os assuntos relacionados com a sociedade, com a sua gestão e com as quotas sociais fossem sempre tratados informalmente e resolvidos por consenso.

    A C... e a Cr..., SA tinham por acionistas EE, a mulher e os filhos, que identificam.

    No inicio de 2016 o único activo relevante que a C... detinha era a participação na OL...; não tinha sentido mantê-la em funcionamento com os custos que lhes estavam associados, pelo que decidiram dissolver a C... e transferir previamente a participação na OL... para outra sociedade, que detinham, a Cr..., SA.

    No inicio de março de 2016, nas instalações da OL..., teve lugar uma reunião que contou com a participação de representantes da A..., da O... - Sociedade Gestora de Participações Sociais, SA, da J..., da A. e da C...; à excepção do sócio BB todos os sócios da OL... estavam presente ou representados; nessa reunião os accionistas da C..., de modo informal, transmitiram aos presentes o seu propósito de encerrar a sociedade e transferirem a sua quota para a Cr..., SA, que era detida pelos mesmos accionistas, pelo preço simbólico de € 1.500,00; todos os sócios presentes ficaram cientes que a quota se mantinha no domínio da família de EE e que a substituição da C... pela Cr..., SA não tinha outro objectivo que não fosse o de permitir o encerramento daquela sociedade; todos os sócios, sem excepção, se bastaram com essa comunicação verbal e deram a sua concordância á cessão da quota, prescindindo de qualquer direito de preferência; a A. estava ciente que, caso a transmissão fosse efectivamente a título oneroso, esta nunca seria realizada por um preço inferior a € 481.179,37 e que é, pelo menos, o valor da quota tendo em consideração apenas o valor por que estão contabilizados os activos e que são inferiores ao preço de mercado; após a formalização da cessão a 25 de março de 2016, em todas as reuniões que se realizaram, com todos os sócios da OL..., foi sempre a Cr..., SA quem nelas participou, sem que houvesse qualquer contestação.

    Relativamente à Assembleia de 16/11/2017, a A. e o seu representante, que nela participou sabiam que era a Cr..., SA que nela participava e não a C... com essa nova denominação; durante a referida Assembleia a A. nunca questionou a participação da Cr..., SA na qualidade de sócia e não expressou qualquer intenção de exercer o seu direito de preferir na aquisição da quota que tinha adquirido.

    A alienação efectuada pela C... á Cr... constitui um negócio indirecto; a cessão de quota em apreço é um negócio mixtum cum donatione, já que envolveu uma transmissão que só na aparência foi onerosa; os sócios comuns das RR. não tinham como interesse e móbil alienar simplesmente a quota que possuíam na C... e receber o correspondente valor de mercado; pretenderam, tão somente, reestruturar o modo de exercício da sua participação na OL..., através da Cr..., SA; o valor da transmissão não tem a natureza de preço, não pode valer como contrapartida da cessão um montante irrisório, que cedente e cessionário sabem não corresponder ao valor de mercado; o substrato pessoal da 1ª e 2ª RR. é o mesmo, pelo que manteve-se o carácter fechado e personalista da OL...; não se verifica a razão de ser das preferências estatutárias; não existe o direito de preferência invocado pela A.

    O art.º 6º n.º 5 dos Estatutos da OL..., ao subordinar os efeitos da cessão, para além do consentimento da sociedade, á vontade dos demais sócios de exercerem a preferência, viola o disposto no n.º 5 do art.º 229º do CSC e por isso é nulo.

    O direito de preferência invocado pela A. não é oponível à Cr..., SA por não lhe assistir eficácia real, porque o pacto de preferência não foi sujeito a registo.

    Ainda que se entenda que o contrato de sociedade atribui à A. um direito convencional de preferência válido e eficaz, tal direito extinguiu-se por renúncia, pois na já referida reunião na primeira semana de março de 2016, em resposta á comunicação do projecto de cessão e respectivas condições essenciais, o filho da A., na qualidade de seu representante, declarou que, em face do circunstancialismo específico da projectada cessão, a sua mãe não pretendia adquirir para si a quota em causa; e tendo a Cr..., SA participado na Assembleia de 16 de Novembro de 2017, sem ter havido oposição ou impugnação de tal participação, o consentimento para a cessão foi prestado tacitamente pela sociedade e, assim, cabia à A. manifestar nessa mesma Assembleia pretender exercer o seu direito de preferência.

    Finalmente opuseram-se...

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