Acórdão nº 1717/17.6T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Abril de 2019
Magistrado Responsável | EUGÉNIA CUNHA |
Data da Resolução | 04 de Abril de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães (1)*I.
RELATÓRIO Recorrente: (..) Recorridos: (…) (…) com sede na Rua (…) , Vila Nova de Famalicão, intentou a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra (…) residentes na Rua (…) Vila Nova de Famalicão, pedindo a condenação dos Réus a: a) reconhecer o direito de propriedade da Autora sobre os prédios urbanos identificados na petição inicial; b) efetuar os trabalhos mencionados nos artigos 51.º a 55.º da petição inicial, com vista a repor o muro na situação (consolidada e sustentada) em que se encontrava antes da atuação ilícita e lesiva dos Réus; c) a pagar à Autora indemnização cujo cômputo deverá ser apurado em sede de incidente de liquidação.
Alegou, para tanto e em síntese, que é proprietária do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial sob a descrição (…) (resultante da sua desanexação do prédio descrito sob o n.º …), que confronta a Norte com o prédio dos Réus, que a delimitação entre estes prédios é feita por um muro pertencente aos Réus, que ameaça ruir, face à existência de fissuras, deformação e deslocamento, deterioração da argamassa de revestimento e infiltrações de água, colocando em causa os bens propriedade da Autora e a integridade física de todos os que frequentam a piscina por esta construída no prédio sua propriedade e que o estado do muro e a sua desconsideração por parte dos Réus tem feito com que a Autora se veja impedida de usar e rentabilizar o prédio na sua plenitude, danos causados com a conduta dos Réus cuja liquidação relega para momento posterior à prolação da sentença por ainda se estarem a sentir.
*Os Réus apresentaram contestação onde se defendem por impugnação, ao negar factos alegados pela Autora, e por exceção, ao alegar que o estado atual do muro se ficou a dever à atuação desta aquando da construção da piscina, mais concretamente à realização dos furos hertzianos e ao desaterro efetuado junto ao muro, deduzindo, com base nestes factos, reconvenção pedindo a condenação desta a: a) reconhecer que os defeitos que o muro apresenta resultam da sua conduta, b) efetuar ou custear na íntegra a construção de um novo muro, sólido e seguro, de acordo com as regras de engenharia, cujo valor deve ser liquidado em execução de sentença.
*A Autora/Reconvinda apresentou réplica, impugnando os factos alegados pelos Réus.
*Admitida a reconvenção, procedeu-se à realização da audiência de julgamento com observância das formalidades legais.
*Foi proferida sentença com a seguinte parte dispositiva: “Pelo exposto: » julgo a acção parcialmente procedente, e em consequência decide-se condenar os Réus (…) a reconhecer que o prédio urbano composto de edifício destinado a piscina colectiva com logradouro situado no Lugar de (…) , da freguesia de (..) descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Famalicão sob o artigo (…) pertence à Autora (…), absolvendo-os do demais peticionado.
» julgo a reconvenção totalmente improcedente, e em consequência decide-se absolver a Autora/Reconvinda (…) do pedido reconvencional.
» Custas pela Autora/Reconvinda e Réus/Reconvintes, na proporção de metade, nos termos do artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil".
*A Autora apresentou recurso de apelação, pugnando pela revogação da sentença e sua substituição por Acórdão que julgue procedentes os pedidos por si formulados.
Apresenta, para tanto, as seguintes CONCLUSÕES: “1 - O presente recurso visa: - Obter a reapreciação da prova gravada - Obter a revogação da douta sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados pela A..
2 - Com vista a obter a reapreciação da prova gravada, a recorrente transcreve supra as passagens dos esclarecimentos do perito que, na sua perspectiva, impõem decisão diversa da proferida pelo Tribunal recorrido e que contrariam frontal e inequivocamente a douta decisão sobre a matéria de facto no que diz respeito aos pontos infra identificados.
3 - As afirmações do perito (produzidas em audiência, mas também no relatório e nos esclarecimentos escritos) impõem que os factos não provados 5, 6, 7, e os factos constantes dos nºs 19, 20, 22, 23, 24, 26, 27, 28, 32 33, 34, 35 e 37 da p.i. passem a ser considerados provados, ou seja, - As anomalias referidas em E. põem em causa os bens que se encontram na propriedade da Autora e todos aqueles que frequentam o complexo de piscinas. (artigos 19.º e 20.º da petição inicial) - Os Réus, após construírem o muro, fizeram um aterro, e construíram a sua casa de habitação, sem terem reforçado (ou adaptado às novas cargas emergentes quer do aterro, quer da habitação) o muro. (artigos 22.º a 24.º da petição inicial) - Os Réus fizeram um aterro, tendo aumentado o volume de terras, o que provoca uma pressão suplementar sobre o muro e aumentou o impulso hidráulico (artigos 26.º a 28.º e 32.º da petição inicial) - Os RR. não dotaram o seu muro da drenagem necessária, pelo que a acumulação de águas (provocada pela falta de drenagem) aumenta ainda mais a carga que as terras em causa provocam no muro, já tendo causado o seu deslocamento, a sua deformação e muitas e profundas fissuras, tanto mais que este foi construído em blocos (e não em betão, como seria aconselhável de acordo com as boas técnicas construtivas e que teria sido apto a evitar o actual estado do muro (nºs 33, 34, 35 e 37 da p.i.) 4 - Devendo ainda ser considerado provado que - o muro dos RR. não foi construído de acordo com as técnicas construtivas aconselháveis ao seu caso, - para evitar o agravamento das anomalias que o afectam, o muro deve ser objecto de intervenção que lhe aplique um dreno interior, com vista a permitir a drenagem, e cintas verticais e horizontais em betão nos moldes apontados pelo perito, - se os RR. tivessem procedido à construção do seu muro em betão ou com cintas de betão e com um dreno interior, o muro não estava na situação (de existência de fissuras, deformação e deslocamento do muro, deterioração da argamassa de revestimento, infiltrações de água) em que se encontra actualmente e que inevitavelmente se irá agravar no futuro.
5 – As afirmações do perito (produzidas em audiência, mas também no relatório e nos esclarecimentos escritos) impõem que passem a ser considerados não provados os factos provados L, M e N.
6 - ou seja - O desaterro para a construção da piscina e as máquinas usadas interferiram com as terras envolventes que serviam de suporte e provocaram pequenos desabamentos.(artigo 11.º da contestação/reconvenção) - Vibraram com as terras circundantes. (artigo 12.º da contestação/reconvenção) - Foram efectuados mais de uma dezena de furos hertzianos a 4 - 5 metros do muro. (artigos 13.º e 14.º da contestação/reconvenção) 7 - ou, pelo menos e quando muito, devem passar a ser considerados provados, com a menção expressa constante do último parágrafo de fls 9 da douta sentença recorrida, 8 - Ou seja «também resulta peremptóriamente do referido relatório que não foi a movimentação de terras, por si só, que provocou as anomalias existentes no muro (cf. fls. 4 do relatório – fls. 70 dos autos), que os desabamentos referidos em L. não foram suficientes para colocar em risco a estabilidade do muro (cf. fls. 5 do relatório – fls. 71 dos autos), que não há qualquer deslaçamento dos alicerces do muro.» 9 - Consequentemente, devem ser julgados procedentes os pedidos formulados pela recorrente sob as alíneas b) e c) da p.i., para mais se se tiver em conta, como é devido, a factualidade já considerada provada pelo Tribunal recorrido, 10 - ou seja, e para o que aqui importa, «C.
No âmbito da sua actividade visando a promoção, o desenvolvimento e a prática da acção cultural, recreativa, desportiva e social na área das freguesias de(…) , de Vila Nova de Famalicão, a Autora construiu e explora um complexo de piscinas sito no prédio referido em A. (artigo 8.º da petição inicial) D.
Esse complexo de piscinas é frequentado diariamente por muitas crianças e jovens.(artigo 9.º da petição inicial) E.
O muro referido em B. apresenta as seguintes anomalias: existência de fissuras, deformação e deslocamento do muro, deterioração da argamassa de revestimento, infiltrações de água. (artigos 14.º a 17.º da petição inicial) F.
As anomalias estão-se a agravar com o tempo. (artigo 18.º da petição inicial) G.
Os Réus plantaram árvores e plantas junto ao muro que contribuem para o agravamento das anomalias referidas em E. (artigo 25.º da petição inicial) H.
O muro é de suporte de terras. (artigo 30.º da petição inicial) I.
O muro não oferece capacidade resistente às cargas transmitidas (impulso hidráulico e terras). (artigo 31.º da petição inicial) J.
Os Réus não dotaram o muro com qualquer sistema de drenagem, o que aumenta a carga que as terras provocam. (artigos 33.º e 34.º da petição inicial) K.
O muro foi construído em blocos/alvenaria de tijolo, sobre um muro de betão ciclópico assente sobre um muro existente em alvenaria de pedra. (artigo 37.º da petição inicial) » 11 - sendo certo que, mesmo sem alteração da decisão sobre a matéria de facto, a recorrente reputa tal factualidade provada de (mais do que) suficiente para a procedência dos pedidos.
12 - Compulsada a douta sentença recorrida, é possível concluir que o factor decisivo para que o Tribunal fizesse improceder os pedidos da recorrente foi apenas a mera circunstância do muro não estar em situação de ruina iminente.
13 - A recorrente não se conforma com tal entendimento, que tem subjacente apenas a tese de reacção (necessariamente a posteriori) após os danos acontecerem e que desconsidera a posição (pugnada pela recorrente) de prevenção e de observância do dever de cuidado que qualquer proprietário deve cumprir com vista a evitar a produção de danos em terceiros, sendo que, conforme já se referiu e está provado, o complexo de piscinas da recorrente é frequentado diariamente por muitas crianças e jovens.
14 - Ora, a tutela jurídica deve ser antecipada, impondo aos proprietários, in...
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