Acórdão nº 109/14.3TBCHV-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Abril de 2019
Magistrado Responsável | PEDRO DAMIÃO E CUNHA |
Data da Resolução | 04 de Abril de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.
-
RELATÓRIO.
Recorrentes: - (…); - (…); - (…); Recorrido: - O Exmo. Magistrado do Ministério Público (quanto ao recurso interposto pelos dois últimos Recorrentes).
*Nos presentes autos de incidente de qualificação da insolvência, em que é insolvente a sociedade “(..).” veio a credora “(…).” apresentar as respectivas alegações, peticionando a qualificação da insolvência como culposa, com a afectação pessoal de (..).
O Sr. Administrador de Insolvência apresentou o seu parecer pronunciando-se também no sentido de que a insolvência seja qualificada como culposa, com afectação de (…) O Ministério Público pugnou pela qualificação da insolvência como culposa, dando a sua concordância ao parecer apresentado pelo Sr. Administrador de Insolvência.
Citados os requeridos (sem prejuízo da questão levantada pelo Recorrente (…)), vieram a (…) deduzir oposição pugnando os requeridos pela qualificação da insolvência como fortuita.
*Foi realizada audiência prévia e proferido despacho saneador, no qual se procedeu além do mais à selecção dos temas de prova, não tendo havido reclamações das partes.
*Procedeu-se a julgamento com observância do legal formalismo.
*Na sequência foi proferida a seguinte decisão: “DECISÃO Pelo exposto, tudo visto e ponderado, decide-se:
-
Qualificar a insolvência da sociedade (..) como culposa.
-
Declarar afectados pela qualificação da insolvência (…), na qualidade de gerentes de facto e /ou de direito daquela sociedade.
-
Determinar a inibição de (…) para administrar patrimónios de terceiros, para o exercício do comércio, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de actividade económica, empresa pública ou cooperativa, por um período de seis anos.
-
Determinar a inibição de (…), para administrar patrimónios de terceiros, para o exercício do comércio, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de actividade económica, empresa pública ou cooperativa, por um período de quatro anos.
-
Determinar a inibição de (..), para administrar patrimónios de terceiros, para o exercício do comércio, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de actividade económica, empresa pública ou cooperativa, por um período de três anos.
-
Condenar (…) , a indemnizarem os credores da sociedade insolvente em função dos montantes dos créditos reclamados, reconhecidos e graduados, e não satisfeitos pelo produto da massa insolvente, até às forças dos patrimónios daqueles, em montante a liquidar em execução de sentença, e sendo solidária tal responsabilidade entre todos os afectados.
-
Absolver (…) dos pedidos de afectação da qualificação da insolvência como culposa. (…)”*Por requerimento entrado em juízo em 22/05/2018, veio o Requerido (…) invocar a invalidade da sua citação, com fundamento em nulidade e, ainda, no vício de falta de citação.
Alega, para o efeito, que a sua citação é nula por preterição da formalidade legal prevista no artigo 233.º do CPC e, ainda, que se verifica o vício de falta de citação previsto no artigo 188.º, n.º1, al. e) do CPC, porquanto não teve conhecimento do acto de citação por motivo que considera não lhe ser imputável.
Foi determinado o desentranhamento da oposição ao incidente apresentada pela Requerente (…), por esta não ter procedido ao pagamento da correspondente taxa de justiça.
*De seguida, o Tribunal proferiu a decisão constante de fls. 990 e ss. onde indeferiu o aludido requerimento por considerar, em síntese, que: - “(quanto à nulidade da citação) a citação encontra-se, portanto, perfeita, independentemente da advertência ao citando prevista no artigo 233.º do CPC, conquanto tal «formalidade complementar, não se traduz numa segunda citação, antes se configura como uma confirmação da citação já oportuna e validamente celebrada na data em que o terceiro a recebeu, no atendimento de uma situação em que se poderá presumir uma menor segurança e certeza no efectivo conhecimento, por parte do citado, dos elementos essenciais do acto» (Acórdão do Lisboa de 14.12.2010, proc. n.º 5981/08.3YYLSB-A.L1-7, relatora: Ana Resende, e, no mesmo sentido, Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra de 13.10.2015, proc. n.º 5981/08.3YYLSB-A.L1-7, relator: Ana Resende, disponível em www.dgsi.pt).
Aliás, note-se que esta carta registada seria remetida para a mesma morada em que o Requerido (…) refere que já não residia. Sendo assim, seria provável que, segundo a sua tese, se a pessoa que recebeu a primeira carta não tivesse, realmente, dado conhecimento ao Requerido de tal facto, o mesmo aconteceria com esta nova carta registada, pelo que não se vislumbra qualquer efeito útil nessa diligência, no contexto que é relatado pelo Requerido.
Em qualquer caso, sempre se refira que, ainda que tal omissão da advertência prevista no artigo 233.º do CPC tivesse como consequência a nulidade da citação, nos termos do disposto no artigo 191.º, n.º1 do mesmo diploma legal, conforme defende o Requerido, sempre tal nulidade não seria do conhecimento oficioso (neste sentido, Ac. do Tribunal da Relação do Porto de 04.12.2017, proc. n.º 513/15.0T8PNF.P1, relator: Jorge Seabra e Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra de 13.10.2015, proc. n.º 211/13.9TBVZL.C1, relator: Manuel Capelo, ambos disponíveis em www.dgsi.pt), ainda que fosse passível, em abstracto, de prejudicar a defesa do citando (artigo 191.º, n.º4 do CPC). Como tal, a nulidade invocada pelo Requerido sempre devia ter sido arguida no prazo indicado para a contestação, que há muito se esgotou, salvo se proceder o invocado vício de falta de citação.
Por outro lado, cremos que também não ocorre, em concreto, o invocado vício de falta de citação.
Dispõe o artigo 188.º, n. º1, al. e) do CPC que «Há falta de citação (…) e) Quando se demonstre que o destinatário da citação pessoal não chegou a ter conhecimento do ato, por facto que não lhe seja imputável».
No caso dos autos, conforme o próprio citando admite, a citação sob análise foi remetida para a sua morada registada em Portugal, tendo ali sido recebida por (…) que assinou o aviso de recepção constante dos autos a fls. 114-B. Assim, a citação em causa foi validamente realizada, embora tenha sido entregue a pessoa diversa do citando, nos termos anteriormente enunciados.
Cabe, portanto, ao destinatário da citação alegar e provar, perante o Tribunal, que não teve conhecimento do acto e, ademais, que não pode ser-lhe imputada qualquer responsabilidade no referido desconhecimento.
(…) É que, note-se, ainda que o Requerido tenha passado a residir e a trabalhar em França, em conformidade com o teor do seu requerimento, desde Outubro de 2012, tal não o terá inibido de, no momento em que foi nomeado gerente, em 31 de Dezembro de 2013, indicar como sua morada de residência a (…) Vila Nova de Famalicão. Se indicou esta morada para efeito de registo como sua residência, seria razoável e expectável que o Requerido tomasse conhecimento de toda e qualquer correspondência que para a mesma fosse remetida, ainda que já nessa altura se encontrasse a trabalhar e a residir no estrangeiro.
Ademais, sempre se refira que o Requerido não juntou aos autos qualquer documento passível de provar que se encontrava separado de facto ou mesmo divorciado da sua esposa no ano de 2015, mantendo, aliás, actualmente o estado civil de casado, conforme resulta do teor do seu requerimento.
Em qualquer dos casos, mesmo que tal separação de facto tenha ocorrido, tal não afasta a circunstância de que, efectivamente, a citação foi remetida para a supra mencionada morada e o aviso de recepção assinado por (..) , a quem cabia a obrigação de entregar prontamente tal citação ao Requerido (artigo 228.º, n.º2 a 4 do CPC), independentemente da relação pessoal que com este mantinha, na medida em que a lei admite que a citação seja entregue «a qualquer pessoa que se encontre na sua residência» e não apenas às pessoas que mantenham com o citando qualquer relação de natureza pessoal. Aliás, até mesmo o comportamento de (..) que recebeu a citação, é incompatível com a versão ora apresentada pelo Requerido, pois de acordo com a razoabilidade e as regras da experiência, qualquer pessoa de média diligência não assume o compromisso de entregar uma carta de citação a alguém com quem não mantém qualquer contacto.
Assim, tendo a pessoa que recebeu a carta sido advertida do dever de pronta entrega ao citando (artigo 228.º, n.º4 do CPC), inexiste qualquer circunstância que permita concluir que tal entrega não foi efectuada ou, ainda que tal não tenha acontecido, que o Requerido não seja responsável por tal omissão, por não ter diligenciado, em momento oportuno, pela alteração dos seus dados pessoais junto das entidades oficiais, conforme lhe competia (neste sentido, veja-se o já citado Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa de 14.12.2010, proc. n.º 5981/08.3YYLSB-A.L1-7, relator: Ana Resende, disponível em www.dgsi.pt).
Por fim, sempre se refira que o Requerido continuava a ser gerente da insolvente e esta, indubitavelmente, teve conhecimento do incidente de qualificação da insolvência, conforme resulta da oposição junta a fls. 120. Em conformidade com o disposto no artigo 192.º, n. º1 do Código das Sociedades Comerciais, a «administração e a representação da sociedade competem aos gerentes». Dispõe ainda o artigo 261.º, n. º1 do mesmo diploma legal que «Quando haja vários gerentes e salvo cláusula do contrato de sociedade que disponha de modo diverso, os respectivos poderes são exercidos conjuntamente, considerando-se válidas as deliberações que reúnam os votos da maioria e a sociedade vinculada pelos negócios jurídicos concluídos pela maioria dos gerentes ou por ela ratificados». Por fim, resulta do n. º3 deste citado artigo que «As notificações ou declarações de terceiros à...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO