Acórdão nº 236/07.3TCGMR.G3 de Tribunal da Relação de Guimarães, 24 de Abril de 2019

Magistrado ResponsávelJOSÉ AMARAL
Data da Resolução24 de Abril de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO Os autores (…) e mulher (…) intentaram, em 17-04-2007, no Tribunal de Guimarães, acção especial de prestação de contas contra o réu (..).

Alegaram que autor marido e réu (irmãos), em 11-04-1989, compraram, em comum, um terreno para construção, cujo preço pagaram a meias. Uma vez que são emigrantes, têm a sua vida em França e estava pendente um projecto de loteamento, os autores, em 20-10-1991, passaram procuração ao réu conferindo-lhe, entre outros, poderes plenos para ele vender os lotes a constituir. Tendo o loteamento sido aprovado em Outubro de 1992, o réu começou a vender e a receber os preços dos lotes vendidos. Contudo, ao longo de vários anos, à pelos autores solicitada informação sobre as vendas efectuadas e prestação de contas dos preços recebidos e despesas efectuadas, quando vinham a Portugal, foi o réu respondendo que precisava de organizar os documentos e na próxima as apresentaria. Tal nunca sucedeu, apesar da continuada exigência daqueles, até que, em Agosto de 2006, revogaram a procuração, mantendo-se, apesar disso, a recusa deste.

Pediram, por isso, a citação do réu para, no prazo legal, apresentar as contas do seu mandato ou contestar essa obrigação, querendo, sob cominação legal, nos termos do artº 1014º e sgs, do anterior CPC, e que, caso tais contas apresentem saldo a seu favor, seja o réu notificado para lho pagar, conforme artº 1016º.

Uma vez citado (04-05-2007-fls. 32), o réu contestou, alegando que as contas foram prestadas, havia três anos, nos exactos termos combinados entre ambos, nunca mais, até Agosto de 2006, os autores tendo reclamado o que quer que fosse. Não havendo quaisquer outras contas a prestar, deve a acção improceder.

Na resposta, os autores mantiveram que devem ser prestadas contas, seguindo os autos para apreciação e decisão sobre a existência de tal obrigação.

A audiência de julgamento concluiu-se em 13-07-2009 e, por sentença de 28-09-2009 (fls. 319 a 321), foi decidido que o réu está obrigado a prestar contas.

O apelo do réu para que esta Relação revogasse essa sentença não surtiu efeito, uma vez que, por Acórdão de 29-04-2010, foi confirmada aquela obrigação (fls. 442 a 466). [1] O mesmo sucedeu com o pedido de revista dirigido ao STJ, que, por Acórdão de 09-11-2010 (fls. 543 a 554), transitado em julgado, confirmou a decisão de 2ª instância e os respectivos fundamentos.

Então, uma vez notificado para apresentar as contas – contas relativas às receitas obtidas e despesas feitas em resultado da execução do mandato que, como foi julgado, constitui o fundamento da obrigação –, veio o réu fazê-lo, em 11-01-2011 – remetendo para um “relatório pericial” cuja elaboração, a pretexto da dificuldade alegadamente gerada pela falta de documentos implicada pelo longo período de tempo passado e pela existência de um acordo de sentido diverso que insiste ter sido firmado com o autor, solicitou a um perito e do qual resulta um saldo a seu favor de 449.484,11€.

Em tal relatório pericial (fls. 578 a 583), descrevem-se despesas no valor [2] de 1.308.444,11€ e receitas de 858.960,00€ e juntam-se duas intituladas contas-correntes.

Os autores contestaram tais contas (fls. 588 a 636), censurando os valores ali apontados e a conduta do réu, que reputam ser de má-fé, impugnando a sua realidade por baseadas apenas em previsões, alegando que não cumprem o requisito legal de especificação, sobretudo, da proveniência das receitas e da aplicação das despesas, nem contêm quaisquer documentos justificativos, pelo que não deverá considerar-se cumprida a obrigação e o réu deverá ser notificado para as corrigir, sob pena de serem rejeitadas.

À cautela e para o caso de assim se não entender, alegaram, ainda, que, conforme a seguir explicitaram ser sua perspectiva, as contas não correspondem à verdade, não traduzem a contribuição financeira dos autores nem a realidade das despesas e receitas, nomeadamente quanto aos seus montantes, assim tudo impugnando.

Pediram, ainda, a condenação do réu como litigante de má-fé.

O réu apresentou resposta, na qual concluiu como de início, refutando a versão dos autores e terminou pedindo também a condenação destes como litigantes de má fé.

Juntou documentos, sobre os quais os autores se pronunciaram.

Ordenado, sem mais, o prosseguimento dos autos por “a questão” não poder ser “sumariamente decidida”, em audiência preliminar marcada, fixou-se o valor da causa, proferiu-se saneador tabelar [3], elencaram-se os “factos assentes” e enumeraram-se, na Base Instrutória, os controvertidos (fls. 706 a 716) – sem reclamação.

Indicadas as provas realizou-se uma primeira perícia colegial cujo relatório e conclusões (unânimes) constam de fls. 770 a 780, de que ambas as partes reclamaram, tendo sido ordenados e prestados esclarecimentos insertos de fls. 817 a 818, 854 e 870 a 871.

Após intenso debate sobre a requerida realização de segunda perícia, foi esta ordenada e efectuada, encontrando-se junto, de fls. 938 a 951, o respectivo relatório e conclusões, de que longamente reclamaram os autores, constando, a fls. 979 a 985, os esclarecimentos prestados, sempre por unanimidade, bem como, a fls. 986 a 999, os documentos com eles aditados.

Designou-se e realizou-se, finalmente, a audiência de julgamento, nos termos e com as formalidades narradas na respectiva acta (fls. 1041 a 1046), no seu decurso tendo sido tomado depoimento de parte do réu (estando consignado que confessou o quesito 56º), ouvido em declarações o autor e inquiridas testemunhas.

Por fim, com data de 30-11-2015, foi proferida a primeira sentença (fls. 1047 a 1061), que julgou validamente prestadas as contas do réu ao autor e declarou a seu favor o saldo de €185.872,57 já actualizado a essa data e condenou aquele a pagá-lo.

Notificadas as partes, começaram os autores por requerer, com fundamento em erro material de cálculo, a rectificação da sentença, quanto à sua fundamentação aritmética e ao dispositivo condenatório (cfr. fls. 1072 a 1075).

Sem embargo, os mesmos autores, dizendo-se inconformados, interpuseram recurso da sentença para esta Relação (fls. 1106 a 1156), ao qual respondeu o réu (fls. 1222 a 1246).

Por sua vez, o réu, também inconformado com a dita sentença, igualmente recorreu dela para esta Relação (fls. 1162 a 1215), tendo os autores respondido (fls. 1252 a 1292).

Seguiu-se despacho (fls. 1297) da Mª Juíza titular do processo a não admitir os recursos (considerados intempestivos) e, depois, outro, no apenso (agora incorporado) relativo às reclamações consequentes das partes, no qual se entendeu ter havido lapso, motivo por que, num outro (fls. 1301 a 1303), se pronunciou sobre a rectificação e as nulidades arguidas e os admitiu ambos.

Nesta Relação, por Acórdão de 04-05-2017 (fls. 1436 a 1477), decidiu-se, como consequência do provimento parcial, anular a decisão de facto proferida em 1ª Instância e, assim, a sentença, em determinar que seja pelo tribunal a quo proferido despacho a convidar o réu ao aperfeiçoamento das contas, seguindo-se, após contraditório, a reelaboração dos temas da prova em conformidade, bem como a repetição do julgamento e a prolação de nova sentença, tendo, por isso, ficado prejudicada a apreciação da parte restante do recurso daquele e do dos autores.

Baixados os autos à 1ª Instância, notificado o réu para apresentar as novas contas corrigidas em conformidade com o decidido e prorrogado o prazo pedido para o efeito, em 09-01-2018, o réu – entre variados considerandos insertos no respectivo requerimento – apresentou uma conta-corrente com saldo a seu favor de 179.256,35€ (fls. 1494-vº a 1496), instruída com documentos juntos (fls. 1498-vº a 1595).

Então, os autores (fls. 1600 a 1621), deduziram reclamação (artº 944º) e contestação (artº 945º).

No âmbito da primeira, queixaram-se de: i) o réu não apresentar os valores efectivamente recebidos e pagos em relação às verbas da receita e despesa mas os resultantes da actualização monetária que fizeram mas não deviam ter feito; ii) o réu juntar, na mesma conta-corrente, montantes alegadamente pagos e recebidos independentemente de se tratar de movimentos comuns a ambos e cuja responsabilidade/benefício é solidária ou apenas relativos aos autores, tratando-se de situações distintas e não confundíveis.

Por isso, sustentam que devem ser apresentadas duas contas correntes e requereram que seja ordenada tal correcção.

No âmbito da segunda, impugnaram porque as contas não traduzem a verdade, uma vez que: i) não espelham, antes omitem, a contribuição financeira dos autores para o loteamento (montante entregue para o fundo comum, montante de honorários pago ao projectista, montante pago ao empreiteiro que executou as infra-estruturas); ii) nem a realidade das despesas e receitas do mesmo e outras despesas no âmbito do mandato (que discriminam).

Por isso, concluem que as contas-correntes deveriam ser como eles sugerem em dois quadros, resultando de um que os autores são credores de 380.864,01€ (metade do saldo apurado segundo os seus cálculos) e, de outro, de 101.143,31€, ou seja, um total de 482.007,32€.

Caso não seja deferida a reclamação e ordenada a correcção, pretendem que seja julgada procedente a impugnação e, ainda, o réu condenado como litigante de má-fé.

Por despacho de 06-03-2018, determinou-se: “Atento o teor do requerimento apresentados pelos autores, e com vista a evitar novas vicissitudes e/ou recuos no processo, nos termos e para os efeitos do disposto no nº 2 do art. 944º do CPC, proceda o réu: - à rectificação dos valores apresentados, extirpando-os da actualização efectuada, a fim de apenas fazer constar o que foi gasto e recebido; - à discriminação dos montantes despendidos que pertenciam solidariamente aos autores e ao réu, distinguindo-os daqueles que respeitavam apenas aos autores; - à discriminação dos montantes recebidos que beneficiavam os autores e ao réu, distinguindo-os daqueles que respeitavam apenas aos autores.” O...

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