Acórdão nº 26/18.8T8PTL-C.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 24 de Abril de 2019

Magistrado ResponsávelEUGÉNIA CUNHA
Data da Resolução24 de Abril de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães*I.

RELATÓRIO Recorrentes: os executados (…) e esposa, (…) Recorridos: os exequentes (…) e esposa, (…), (…) e esposa, (…).

(…) e mulher, (…), (…) e mulher, (…) intentaram a ação executiva, de que os presentes autos constituem apenso, para prestação de facto, contra (..) e outros, pedindo a remoção das pedras e rachão que ocupam parcialmente a entrada para o seu prédio, deixando-a desimpedida, remoção essa a prestar por terceiro à custa dos executados, sendo o título dado à execução a sentença condenatória proferida na ação sumária n.º 463/2001, do extinto 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Ponte de Lima, junta com o requerimento executivo, proferida contra os Réus (…) e mulher (..), aquele entretanto falecido e de que esta e outros executados são herdeiros, conforme escritura de habilitação que juntam.

*Os executados (…) e esposa, (…) , vieram deduzir os presentes embargos de executado, invocando, além do mais, a sua ilegitimidade processual (passiva) para os termos da execução, por, na sequência do falecimento do Réu, condenado, juntamente com a Ré (executada), naquela ação sumária n.º 463/2001, (…), o prédio referido naquele processo, pertencente ao falecido e mulher, de que executados são todos os herdeiros, ter sido adjudicado à Executada (…) em escritura de habilitação, partilha e conferência de bens do falecido (…), pai do embargante, outorgada em 26.12.2014 e junta com o requerimento executivo, pelo que nada têm a ver com a relação jurídica material controvertida, tal como configurada pelos exequentes, devendo ser considerados, nos termos do art. 26º e 278º, d), todos do CPC, parte ilegítima para a ação e absolvidos da instância.

Os exequentes apresentaram contestação, onde pugnam pela improcedência da ilegitimidade passiva, pois que a prestação de facto se funda na sentença condenatória da qual resulta uma obrigação pessoal dos Réus, decorrente de responsabilidade civil extra contratual, resultante da prática de atos ilícitos pelos mesmos, e não de qualquer obrigação resultante da titularidade do direito de propriedade sobre o prédio (serviente), cujo cumprimento, a exigir aos Réus condenados, pelo facto do falecimento do Réu marido, tem de ser exigido a todos os herdeiros deste que, conforme escritura de habilitação, partilha e conferência de bens doados junta com o requerimento executivo, e não apenas à filha M..

*Foi proferido despacho saneador a julgar “verificada a excepção dilatória de ilegitimidade processual dos Embargantes (..) e mulher, (…), determinando-se a absolvição dos mesmos da instância, nos termos do disposto nos artºs 551.º, n.º 3, 278.º, n.º 1, al. d), 576.º, n.º 2, e 577.º, al. e), do C.P.C”, com custas pelos Embargados, com os seguintes fundamentos: “A regra a ponderar no caso concreto é a estipulada nos artºs. 53.º, n.º 1, e 54.º, n.º 1, do C.P.C.

Os Embargantes são herdeiros e sucessores do original réu na acção sumária n.º 463/2001, cuja sentença foi dada à execução. Todavia, a legitimidade daquele (e da ré (..)) para a acção declarativa advinha-lhe da condição de proprietário do prédio rústico por onde se desenvolvia a servidão de passagem que servia os prédios dos Exequentes, constituindo a zona onde foram colocadas as pedras à entrada desse caminho.

A legitimidade para a acção declarativa deverá, naturalmente, reflectir-se na acção executiva.

Como tal, no que respeita aos limites subjectivos do caso julgado, existe identidade não só quando os litigantes no novo processo são as pessoas que pleitearam no outro “ou sucessores delas (entre vivos ou mortis causa), na relação controvertida: herdeiros, legatários, donatários, compradores, cessionários. As partes no novo processo serão pois idênticas às do anterior quando sejam pessoas que na relação ventilada ocupem a mesma posição que, ao tempo, estas ocupavam” [Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1993, 310]. De resto, os Embargados alegaram já no requerimento executivo os factos constitutivos da sucessão.

Assim, à luz do disposto no art.º 54.º, n.º 1, do C.P.C., a legitimidade para efeitos da acção executiva apensa afere-se pela titularidade do direito de propriedade sobre o prédio serviente na servidão de passagem a favor dos prédios dos Embargados, uma vez que foi essa servidão que foi posta em causa na acção declarativa e esteve na base do interesse em agir dos aí autores.

Como tal, cremos que falta legitimidade processual aos Embargantes para os termos da execução apensa, já que, do lado passivo, essa cabe à Executada (..), actual proprietária do referido prédio serviente.

Consequentemente, tal como a relação jurídica substantiva subjacente à sentença exequenda se apresenta, os Embargantes são partes ilegítimas”.

*Os exequentes/embargados apresentaram recurso de apelação, pugnando por que seja revogada a decisão recorrida e substituída por Acórdão que esteja em conformidade com as seguintes conclusões, que formula: 1.

Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida nos autos, na parte em que julgou procedente a excepção dilatória de ilegitimidade processual e, em consequência, determinou a absolvição dos Embargantes da instância.

  1. Para que o Tribunal recorrido pudesse extrair a conclusão que extraiu, quanto à (i)legitimidade dos Embargantes, teve de partir do pressuposto de que a legitimidade do (..) e mulher decorriam do facto de serem proprietários do prédio confinante com os dos Exequentes.

  2. Para uma cabal compreensão da temática em discussão é necessário ter presente a distinção entre obrigação ou direito de crédito (de pagamento de quantia certa, entrega de coisa certa ou prestação de facto), que tem natureza pessoal e que, salvo no caso de cessão de posição contratual, é titulada pelo devedor e, à morte deste, pelos seus herdeiros, e obrigação real ou propter rem, que é uma obrigação real e que, por essa razão, está associada à titularidade de um imóvel, acompanhando-o no caso de transmissão do mesmo, e que é titulada pelo proprietário do imóvel.

  3. Reportando-nos ao caso dos autos, para proferir decisão de mérito era essencial apurar se as obrigações resultantes da sentença condenatória dada à execução eram: - obrigações ou direitos de crédito, caso em que, tendo falecido os sujeitos passivos (…) e mulher, as mesmas teriam de ser cumpridas pelos seus sucessores, por força do disposto no art. 2068.º do Cód. Civil, os quais seriam, nesta hipótese, partes legítimas; - obrigações reais ou propter rem, associadas à titularidade de um prédio e, nesse sentido, com carácter ambulatório, caso em que as mesmas teriam de ser cumpridas pelo actual proprietário do imóvel, a qual seria, nessa hipótese, a única pessoa com legitimidade passiva para intervir nos autos.

  4. O Tribunal recorrido, não tendo respondido expressamente a esta questão, acabou por entender implicitamente que as obrigações resultantes da sentença exequenda estavam dotadas de ambulatoriedade e, como tal, acompanharam a propriedade do prédio “serviente”, sendo tituladas apenas pela actual proprietária M. (que é, ela e só ela, parte legítima), o que equivale a dizer que partiu necessariamente do pressuposto de que estavam em causa obrigações reais.

  5. A prestação de facto resultante da sentença dada à execução é uma obrigação de cariz pessoal, cuja titularidade é totalmente independente do facto de se ser ou não proprietário de um prédio confinante com o dos Exequentes – obrigação essa que tem por fonte o regime da responsabilidade extracontratual, previsto nos artºs. 483.º e seguintes do Cód. Civil, e que obriga à reconstituição in natura, traduzida na remoção das pedras indevidamente colocadas, de modo a deixar a abertura totalmente livre e desimpedida.

  6. Tendo a obrigação de prestação de facto decorrente da sentença dada à execução nascido de uma conduta ilícita dos aí Réus (que nada tem que ver com a titularidade de direitos reais sobre prédios confinantes), forçosa se torna a conclusão de que, face ao óbito dos mesmos, o cumprimento de tal obrigação terá de ser exigido a todos os seus herdeiros, e não apenas à Executada M..

  7. Face ao que se acaba de expor, a excepção de ilegitimidade passiva não poderia deixar de ser julgada improcedente, por não provada.

  8. De tal modo que, ao decidir como decidiu, o Tribunal recorrido violou, além de outras, as disposições dos artºs. 31.º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil.

  9. Deve, pois, ser revogada e substituída por Douto Acórdão que julgue improcedente a excepção de ilegitimidade invocada pelos Embargantes e determine o prosseguimento dos autos.

    *Os executados/embargantes apresentaram contra-alegações pugnando pela improcedência do recurso concluindo: 1) Vieram os Exequentes (…) e (…) interpor recurso da Douta Decisão do Tribunal Judicial de Ponte de Lima que julgou procedente a excepção dilatória de ilegitimidade dos Executados e doutamente decidiu que: “Termos em que se julga verificada a excepção dilatória de ilegitimidade processual dos Embargantes (…) e mulher, (…), determinando-se a absolvição dos mesmos da instância, nos termos do disposto nos artºs 551.º, n.º 3, 278.º, n.º 1, al. d), 576.º, n.º 2, e 577.º, al. e), do C.P.C.

    ” 2) Inconformados, pois, vieram os Apelantes recorrer da Douta Sentença proferida pelo Tribunal a quo, insurgindo-se essencialmente quanto a um aspecto: caracterização realizada pelo Tribunal a quo da obrigação exequenda.

    3) Absit iura verbo, entendem os Recorridos que nenhuma razão assiste ao Recorrente.

    4) Vêm os Apelante, dizer que, “A douta sentença recorrida julgou procedente a excepção de ilegitimidade por ter entendido, em suma, que a legitimidade de (…) e mulher na primitiva acção declarativa decorria do facto de os mesmos serem proprietários do prédio rústico (…) Para que o Tribunal recorrido pudesse extrair a conclusão que extraiu, quanto à (i)legitimidade dos Embargantes, teve de partir do pressuposto de que a legitimidade do (…) e mulher decorriam do facto de serem...

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