Acórdão nº 1135/12.2TBBCL-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelALEXANDRA VIANA LOPES
Data da Resolução07 de Novembro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I.

Relatório: Nos presentes autos de reclamação de créditos, apensos à ação executiva movida por “(…) Lda.

” contra “…, Lda.”, (…) e (…): 1.

Reclamaram créditos: a) (..) e (…); b) O Instituto da Segurança Social; c) A Caixa ..., S.A; d) (…) SA.

  1. Foi proferida sentença de verificação e graduação de créditos.

  2. A (…), S.A.. arguiu a nulidade da falta de notificação das reclamações de (..) e (..) e do Instituto da Segurança Social.

  3. Foi proferido despacho a indeferir o requerido, com o fundamento que a nulidade arguida apenas poderia ser objeto de recurso da sentença, uma vez que a mesma declarara que não era patente a existência de nulidades processuais ou exceções de conhecimento oficioso, que obstassem ao conhecimento do mérito da causa.

  4. A Caixa ..., S.A apresentou recurso de apelação da sentença de I-3 supra, no qual foram apresentadas as seguintes conclusões: “1. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida nestes autos em 28 de Novembro de 2017, na parte em que considera verificado e reconhecido como garantido por direito de retenção o crédito reclamado pelos credores P. B. e S. M., graduando-o em primeiro lugar para pagamento pelo produto da venda da fracção autónoma designada pela letra “C”, descrita na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º 291/...-“C” e apenas em segundo lugar o crédito reclamado pela Caixa ..., S.A.

  5. Afirma-se na douta decisão recorrida que “não é patente a existência de quaisquer nulidades processuais”, mais se dizendo que “procedeu-se às legais notificações nos termos do art.

    789.º do Código de Processo Civil (CPC), não tendo sido deduzida qualquer oposição”.

  6. Sucede que, tal não corresponde à verdade, estando a Caixa ... em crer que o douto Tribunal a quo só nisso não atentou por manifesto lapso.

  7. Com efeito, pese embora tenha sido notificada da Reclamação de Créditos apresentada nos autos pela “X – Material Eléctrico, S.A.”, não foi a Caixa ... notificada de quaisquer outras reclamações de créditos, designadamente as aduzidas pelo Instituto de Segurança Social, I. P. e por P. B. e S. M..

  8. Prescreve o artigo 789.º do CPC que “Findo o prazo para a reclamação de créditos, ou apresentada reclamação nos termos do n.º3 do artigo anterior, dela são notificados, pela secretaria do tribunal, o executado, o exequente, os credores reclamantes, o cônjuge do executado e o agente de execução, (…)”.

  9. Nos presentes autos foram omitidas as formalidades prescritas no preceito vindo de aludir quanto à credora reclamante Caixa ..., S.A.

  10. O que equivale por dizer que a Caixa ... nunca foi notificada das reclamações de créditos apresentadas pelo Instituto de Segurança Social, I.P. e por P. B. e S. M., tendo tão só tido conhecimento das mesmas quando notificada da sentença de verificação e graduação de créditos.

  11. Assim, a sentença ora em crise assenta no errado pressuposto de que inexistem nulidades que invalidem o processo e de que as partes foram regularmente notificadas nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 789.º do CPC.

  12. Tendo o Tribunal atentado, como não atentou, que a Caixa ... não foi notificada, como não o foi, das reclamações de créditos apresentada pelo Instituto de Segurança Social, I. P. e por P. B. e S. M., sempre deveria ter ordenado tal notificação, em cumprimento do preceituado no artigo 789.º/n.º1 do CPC, proferindo apenas a final, depois de decorrido o prazo previsto no artigo 789.º/n.º2 e n.º3, e de dada oportunidade à Caixa ... de impugnar tais créditos e de produzida eventual prova, sentença de verificação e graduação de créditos.

  13. É que, a omissão de tal notificação, além de constituir fundamento de nulidade, implicando a invalidade da sentença ora sindicada, impediu a Caixa ... de em tempo útil impugnar o crédito reclamado por P. B. e S. M., os quais, para mais, carecem de legitimidade para reclamar créditos.

  14. Por assim se ter verificado, violou a sentença ora recorrida o disposto nos artigos 789.º e 791.º do CPC, devendo, por conseguinte ser revogada e substituída por despacho que determine a notificação à Caixa ..., na pessoa dos respectivos mandatários, das reclamações de créditos apresentadas pelos credores Instituto de Segurança Social, I. P. e P. B. e S. M., proferindo-se nova sentença de verificação e graduação de créditos, apenas depois de verificados os devidos trâmites e prazos legais.

  15. Mas mais! E sem prescindir! Deveria o Tribunal a quo, pese embora a ausência de qualquer impugnação ao crédito reclamado, bem atento o preceituado no artigo 791.º/n.º4 do CPC, ter verificado se os credores P. B. e S. M. estavam habilitados a reclamar o seu crédito nos moldes em que o fizeram.

  16. Certo é que, e com todo o respeito que nos é merecido, não o poderá ter feito.

  17. Senão vejamos, resulta do artigo 788.º/n.º1 e n.º2 do CPC, que só o credor com garantia real sobre os bens penhorados pode reclamar, pelo produto destes, e com base em título exequível, o pagamento dos respectivos créditos.

  18. O elenco dos títulos executivos consta do artigo 703.º do CPC, sendo designadamente título executivo a) as sentenças condenatórias; b) os documentos exarados autenticados, por notário ou outras entidades ou profissionais com competência para tal, que importem constituição ou reconhecimento de qualquer obrigação; c) os títulos de crédito de crédito e d) os documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva.

  19. Ainda que se atentasse na redacção mais permissiva do anterior artigo 46.º do CPC, a estes apenas acresceriam “os documentos particulares, assinados pelo devedor, que importem constituição ou reconhecimento de obrigações pecuniárias, cujo montante seja determinado ou determinável por simples cálculo aritmético de acordo com as cláusulas dele constantes (…)”.

  20. Pois bem, com vista a ver reconhecido e graduado o seu crédito, os credores P. B. e S. M. apresentaram nos autos o contrato-promessa por si – alegadamente - celebrado com a reclamada “Y Imobiliária, Lda.”, nos termos que resultam do contrato junto como doc.n.º1 à respectiva petição de reclamação de créditos.

  21. O n.º1 do artigo 410.º do Código Civil define contrato-promessa como a “convenção pela qual alguém se obriga a celebrar certo contrato”.

  22. Assim, do mesmo “nasce uma obrigação de prestação de facto positivo, consistente na emissão de uma declaração negocial, que é a declaração de vontade correspondente a um outro negócio cuja futura realização se pretende assegurar, e a que se chama o negócio prometido ou negócio definitivo”.

  23. Podem, porém, no contrato-promessa ser inseridas cláusulas contratuais que consagrem outras obrigações para além da obrigação principal de celebrar o contrato definitivo. Ou seja, para além da vinculação à celebração do contrato prometido, as partes podem acordar também outras obrigações que emergem igualmente do contrato promessa e que podem não ser cumpridas, podendo desencadear a aplicação do regime geral adequado à sua exigibilidade, contanto que sejam exequíveis.

  24. Vejamos se é o caso dos autos.

  25. Conforme decorre do alegado em sede de requerimento inicial, pretenderia o credor reclamante ver-lhe reconhecido o crédito derivado do incumprimento do contrato-promessa por virtude do accionamento do regime previsto no artigo 442.º do Código Civil.

  26. A obrigação que assim se pretende ver reconhecida será, então, exequível em face do contrato-promessa junto aos autos? 24. Obviamente que não.

  27. Como refere Lebre de Freitas (in “A Acção Executiva em Geral, 2.ª edição, página 18), a pretensão é intrinsecamente exequível quando, em si, reveste características de que depende a sua susceptibilidade de constituir o elemento substantivo do objecto da acção executiva, para o que basta ter como objecto uma prestação que seja certa, líquida e exigível.

  28. Ora, perscrutado o contrato promessa junto aos autos, não vemos que no mesmo a executada/reclamada se tenha obrigado ao pagamento de qualquer quantia em caso de incumprimento da obrigação principal de celebração do contrato definitivo.

  29. Temos, assim, que os credores P. B. e S. M. careciam de legitimidade (por não disporem de título executivo) para reclamar o seu crédito ao abrigo do disposto no artigo 788.º do CPC.

  30. De facto, como não gozavam de título executivo, uma vez que o contrato-promessa não contém expressamente nem o reconhecimento da obrigação de pagamento do valor por si reclamado, nem a tradição do imóvel, teriam de se socorrer do disposto no artigo 792.º/n.º1 do CPC (vide Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 06/04/2010, processo n.º 2189/08.1TBBRG-B.G1, disponível in www.dgsi.pt), o que se verifica não terem feito.

  31. Está, assim, verificada a excepção dilatória da ilegitimidade daqueles credores reclamantes, em face do disposto no artigo 788.º, n.º1 e n.º2 do CPC (cfr.

    art.

    577.º/al. e) do CPC), excepção que deveria ter obstado ao conhecimento do mérito da reclamação deduzida e determinado a absolvição da instância (cfr. artigo 576.º/n.º2 do CPC).

  32. Sucede que, o Tribunal a quo, olvidou tanto quanto se vem de alegar, violando, assim, o preceituado nos artigos 791.º/n.º4, 788.º/n.º1 e n.º2, 577.º/al. e), 576.º/n.º2 e 578.º do CPC, 31. Motivo pelo qual deve, ainda, a sentença ora sindicada ser revogada e substituída por outra que julgue o crédito reclamado pelos credores P. B. e S. M. como não admitido, atenta a falta de legitimidade daqueles credores, com consequente absolvição da instância, graduando-se o crédito da Caixa ... em primeiro lugar para pagamento pelo produto da venda da fracção “C”.

  33. Acresce que, ainda que assim não se entendesse, o que apenas por hipótese de patrocínio se concebe, a verdade é que os Reclamantes P. B. e S. M. não alegam qualquer materialidade constitutiva de eventual incumprimento definitivo do contrato promessa de compra e venda e consequentes direito ao sinal em dobro e direito de retenção.

  34. Mas vejamos melhor: nos termos do n.º2 do artigo 442.º do Código Civil, se o não cumprimento...

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