Acórdão nº 15/18.2T8AMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelROSÁLIA CUNHA
Data da Resolução07 de Novembro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam em conferência na 1ª seção cível do Tribunal da Relação de Guimarães: RELATÓRIO MANUEL (…) intentou ação declarativa de condenação com processo comum contra (…) S.A.

, pedindo que a ré seja condenada: I - a proceder à reparação in natura (em espécie) do veículo; II. ou, na indemnização por equivalente, no pagamento da indemnização para a reparação do mesmo veículo; III. no pagamento da quantia da quantia líquida de € 48.999,99 e, IV. na quantia diária de € 15,00 por dia útil até entrega do veículo devidamente reparado, sendo que, por estes danos não poderem ser determinados ou quantificados nesta data, requer-se seja a sua liquidação remetida para execução de sentença.

V - a ministrar ao demandante todo o tipo de tratamento de fisiatria, de fisioterapia, de ortopedia, etc, médicos, medicamentosos, até final da sua vida, o que terão que ser ministrados pela demandada, ou, VI - caso assim se não entenda, sejam estes mesmos tratamentos por ela, demandada, suportados, sendo que, e, por estes danos não poderem ser determinados ou quantificados nesta data, requer-se seja a sua liquidação remetida para execução de sentença nos termos dos artigos 564º e 569º Cód. Civil e 556º nº1 alínea b) e nº 2 e 358º C.P.C.

Como fundamento destes pedidos alega, em síntese, que, no dia 13.12.2016, pelas 18.30h, ocorreu um acidente de viação em que foram intervenientes o veículo ligeiro misto, matrícula IP, propriedade de A. M., e por ele conduzido, e o veículo ligeiro de passageiros, matrícula DV, propriedade do A. e por ele conduzido.

O acidente de viação ficou a dever-se a culpa exclusiva do condutor do IP já que este não conduzia com atenção e circulava com velocidade excessiva razão pela qual não logrou imobilizar o dito IP e foi embater no DV que estava parado à espera que um peão transpusesse na passadeira.

Decorrência do acidente o DV ficou danificado na parte de trás e o A. sofreu lesões que importaram a sua hospitalização em serviço de urgência.

Como sequelas o A. teve dores, sofre de cervicalgia com irradiação para o ombro esquerdo, lombalgia quando em esforços e diminuição da amplitude da mobilidade cervical e lombar.

Deixou de poder exercer a sua profissão de trabalhador da construção civil, deixou de poder fazer caminhadas e sofre de dores recorrentes.

Mais alega que o DV está por reparar e que tal é possível.

*Regularmente citada, a ré contestou impugnando a factualidade alegada pelo A. e alegando o abuso de direito deste porquanto terá aceite a perda total do DV e agora pretende a sua reparação.

*Foi proferido despacho saneador, definiu-se o objeto do processo e procedeu-se à seleção dos temas de prova.

*Procedeu-se a julgamento e a final foi proferida sentença com o seguinte teor decisório: “Pelo exposto, decide-se condenar a R. Companhia de Seguros X Portugal, S.A. a pagar ao A. M. P., a quantia de: 1. €199,99 pelo telemóvel danificado; 2. € 2300,00 pela reparação do DV; 3. € 1253,00 pela retribuição que deixou de auferir no período de incapacidade; 4. € 300,00 pelo custo dos atos médicos que suportou; 5. € 64,00 pelo custo da certidão; 6. € 15000,00 pela perda de ganho/dano biológico; 7. € 7500,00 pelos danos não patrimoniais; 8. € 10,00 mensais até ao fim da vida do A. para compra de medicamentos (analgésicos e anti-inflamatórios); 9. € 15,00 por cada dia útil desde, 13.12.2016, até efetiva reparação do DV, a título de indemnização por privação do uso.

Valores aos quais acrescem juros moratórios, às taxas legais entretanto em vigor, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento.

No mais, absolve-se a R. do pedido.”*A ré não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões: 1ª) Em face da gravação dos autos e da impugnação factual trazida ao presente recurso, de par com a ampla aquisição pericial e documental da instrução dos autos, devem os factos dos itens referidos no texto desta minuta de alegações da apelação ser tidos como totalmente “não provados”; 2ª) Com efeito, nem dos depoimentos das testemunhas respetivas, nem do relatório de perícia médico-legal constantes da fundamentação da sentença se pode extrair válida prova dos itens respetivos, bem pelo contrário - como supra se deixou antes expresso; 3ª) Os princípios atinentes à responsabilidade civil, ou à reparação dos danos provindos de ato ilícito, segundo o disposto nos arts. 562º segs. CCivil, impõem uma equivalência de resultado pela recomposição do statu quo ante, e não devem constituir um meio de proporcionar injustificado enriquecimento ao lesado, ter um carácter especulativo ou, muito menos, constituir um modo fraudulento de enriquecimento patrimonial do lesado à custa do lesante, por rica ou saudável seguradora que seja em sua legal substituição; 4ª) Tampouco pode o lesado, senão em nítido abuso de direito, pretender receber pela privação dum veículo clássico, de coleção e de garagem, com uns 40 anos de matrícula e mais de 400 mil kms de uso, com o valor venal, comercial ou de troca de três a quatro mil euros e cuja reparação custava uns meros 2,3 mil euros, mea culpa mea culpa que seja quanto à seguradora responsável pela mesma, uma quantia à atualidade já duns 15 mil euros!; 5ª) A indemnização respetiva, em Direito, não pode é criar desequilíbrio tamanho como o que é imediatamente valorável/sindicável segundo as verbas supra citadas e a comparação entre si mesmas, numa análise que se requer vista à luz da história do nosso País – v. transcrições levadas ao texto desta minuta de alegações; 6ª) Também a indemnização do chamado dano biológico, rectius DPF (v. dano patrimonial futuro), deve respeitar as normas da equidade e composição do statu quo ante, à luz da perícia médico-legal que a tanto foi chamada – e que para tanto foi trazida ao lume dos autos explicitamente a propósito; 7ª) A verba que foi concedida na sentença a tal respeito, no valor de €15 mil, está mui para além e até mesmo fora dos parâmetros jurisprudenciais mais comuns, constituindo iníqua composição daquele dito statu quo ante, com violação da lei aplicável supra citada; 8ª) Deve a mesma ser reduzida para a quantia de € 5.000,00 e não mais; 9ª) Bem como deve a privação de uso ser retida na proporção equitativa do caso a ajuizar melhor a final, nesta sede; Termos em que, deve o recurso ser julgado procedente, reduzindo-se a condenação da aqui apelante Ré seguradora em conformidade, com todas as legais consequências”.

*O autor contra-alegou pugnando pela manutenção da decisão recorrida.

*O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente nos próprios autos, com efeito devolutivo.

*Foram colhidos os vistos legais.

OBJETO DO RECURSO Nos termos dos artigos 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC, o objeto do recurso está delimitado pelas conclusões contidas nas alegações dos recorrentes, estando vedado ao Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso, sendo que o Tribunal apenas está adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objeto do recurso.

Nessa apreciação o Tribunal de recurso não tem que responder ou rebater todos os argumentos invocados, tendo apenas de analisar as “questões” suscitadas que, por respeitarem aos elementos da causa, definidos em função das pretensões e causa de pedir aduzidas, se configurem como relevantes para conhecimento do respetivo objeto, excetuadas as que resultem prejudicadas pela solução dada a outras.

Por outro lado, o Tribunal não pode conhecer de questões novas, uma vez que os recursos visam reapreciar decisões proferidas e não analisar questões que não foram anteriormente colocadas pelas partes.

Neste enquadramento, as questões relevantes a decidir, elencadas por ordem de precedência lógico-jurídica, são as seguintes: I –Alteração da matéria de facto; II - Fixação do valor da indemnização na parte referente: a) ao dano biológico; b) à privação do uso do veículo.

FUNDAMENTAÇÃO FUNDAMENTOS DE FACTO Na 1ª instância foram considerados provados os seguintes factos: 1. O Autor nasceu a -.03.1957.

  1. A responsabilidade civil emergente da circulação do veículo ligeiro IP encontrava-se transferida, à data do embate, para a Ré por acordo de seguro titulado pela apólice n.º 200872332.

  2. No dia 13.12.2016 (1), pelas 18h30m, na rua …, Caldelas, Amares ocorreu um embate, em que intervieram os veículos com as matrículas IP e DV.

  3. O veículo ligeiro, matrícula IP, era propriedade de A. M., e por ele conduzido e o veículo ligeiro de passageiros, matrícula DV, era propriedade do Autor e por ele conduzido.

  4. Era de noite.

  5. O tempo estava seco.

  6. A via era ladeada por edificações de um e outro lado.

  7. Tem a velocidade limitada a 50 km/h.

  8. Configura uma reta, em patamar.

  9. Com uma largura de 6,20 metros.

  10. O seu pavimento, em betuminoso, estava sem buracos, nem fissuras.

  11. No local existe uma passadeira destinada ao atravessamento de peões, constituída por barras longitudinais paralelas ao eixo da via (marca M11), a qual está sinalizada por sinalização vertical – sinal A16a e H7.

  12. Naquelas circunstâncias de tempo e lugar, o veículo do Autor transitava por aquela artéria no sentido Terras do Bouro – Rendufe.

  13. Atento ao trânsito de veículos e de peões.

  14. Porque um peão estava a realizar a travessia da via, pela passadeira o Autor imobilizou o veículo antes da passadeira de forma a possibilitar a travessia da via.

  15. Quando estava imobilizado junto daquela mesma passadeira, surge o veículo seguro na Ré, cujo condutor por conduzir distraído, desatento relativamente ao restante trânsito e de forma imperita, não logrou imobilizar o veículo no espaço livre, visível e disponível à sua frente.

  16. Embatendo na traseira do veículo do demandante.

  17. O qual foi projetado para a frente.

  18. Tendo percorrido, pelo menos, 27,00 (vinte e sete) metros.

  19. Onde, após o embate, ficou imobilizado.

  20. Como consequência direta e necessária do acidente de viação supra descrito, o...

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