Acórdão nº 3313/18.1T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 28 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelJOAQUIM BOAVIDA
Data da Resolução28 de Novembro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I – RELATÓRIO 1.1. N. M.

instaurou procedimento cautelar comum contra C. P.

, pedindo que seja reconhecida «a forte probabilidade de vir a ser declarada, em ação principal, a existência de União de Facto entre a Requerente, N. M., e Requerido, C. P., desde o ano de 2007, por estes viverem em condições análogas às dos cônjuges e, em consequência», seja declarada «a existência do direito de permanência na habitação da casa de morada de família sito, Avenida … – Caminha, que se pretende por parte da Requerente».

Alegou, em síntese, que mantêm uma união de facto desde finais de 2006, altura em que a Requerente e o seu filho menor foram viver para uma casa do Requerido sita em ...

, e que desde essa data que vivem à vista de toda a gente como se de uma família se tratasse.

Ao Requerido foi diagnosticada, em 2016, a doença de Alzheimer e, actualmente encontra-se medicado contra os efeitos desta doença.

Há cerca de dois meses, a filha do Requerido, H. P., inibiu o pai de qualquer tipo de administração dos seus bens e, no dia 01.10.2018, impediu o pai de pernoitar na sua casa e obrigou a Requerente a entregara sua medicação. Mais dirigiu à Requerente um ultimato no sentido de abandonar a casa de morada de família até ao final do dia 02.10.2018 e ameaçou cortar a electricidade e a água.

*O Requerido deduziu oposição, onde conclui pela improcedência do procedimento cautelar.

Alega que adquiriu a casa em Dezembro de 2006, depois do início da sua relação com a Requerente, após o que a passaram a habitá-la com o filho da Requerente. Um mês após a aquisição, o Requerido legou à Requerente a casa e no período que se seguiu adquiriu com o seu dinheiro os bens que colocou em nome da Requerente. Em 2015, vendeu, simuladamente, à Requerente um prédio rústico de lavradio sito na freguesia da .... Devido à diferença de idade entre Requerente e Requerido e ao ascendente que a Requerente exercia sobre o Requerido, consentiu que aquela passasse a ser co-titular de contas bancárias, com dinheiro exclusivamente do Requerido, pois na verdade a Requerente não tinha qualquer património e auferia apenas o salário de € 580,00.

Entretanto, a Requerente começou a desinteressar-se pelo estado e condição de vida do Requerido, que passou estar mal alimentado e a apresentar-se desleixado na sua aparência. No dia 01.10.2018, o Requerido pediu auxílio à filha H. P., pois não queria outorgar uma procuração que iria conferir amplos poderes de administração e disposição dos seus bens à Requerente. Nesse dia, decidiu o Requerido separar-se da Requerente e refugiou-se aos cuidados da filha.

Sustenta que não dispõe de outra casa onde possa morar e que, devido à sua idade e condição física, é ele que mais precisa da casa para morar. Em contraposição, a Requerente tem pouco mais de 40 anos, dispõe de uma condição financeira muito folgada, totalmente proporcionada pelo Requerido e que lhe permite adquirir ou arrendar, sem dificuldade, uma casa para si e para o seu filho.

*Realizada a audiência final, foi proferida decisão a «julgar improcedente a presente providência cautelar, absolvendo da mesma o requerido».

*1.2.

Inconformada, a Requerida interpôs recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões: «1. O presente recurso interposto da douta decisão que decidiu «Por tudo o que vai exposto, decido julgar improcedente a providência cautelar, absolvendo da mesma o requerido».

  1. Tal decisão merece reparo por parte de V/Exas.

    1) Da nulidade da sentença pela oposição entre a fundamentação e a decisão 3. Estabelece o art.º 205.º, n.º 1 da CRP que “As decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei” – e a decisão em crise não é de mero expediente! 4. Fundamentar é enunciar explicitamente as razões ou motivos que conduziram ao Tribunal a tomar aquela decisão, é enunciar as premissas de facto e de direito.

  2. A obrigação de fundamentação representa um importante sustentáculo da legalidade, e o direito à fundamentação constitui um instrumento fundamental da garantia contenciosa, pois que é elemento indispensável na interpretação da decisão judicial.

  3. O processo cautelar, apesar de ter a natureza de processo urgente, não deixa igualmente de estar sujeito, nas decisões a proferir, a tal dever de fundamentação, conforme claramente decorre do art.º 363.º, que remete para o art.º 607.º, todos do Cód. de Processo Civil.

  4. Resumidamente, a requerente intentou a presente providência cautelar pedido para que, num primeiro momento, lhe fosse reconhecido a forte probabilidade de vir a ser declarada, em ação principal, a existência de União de Facto entre requerente e requerido desde do ano de 2007, por estes viverem em condições análogas às dos cônjuges, e, fruto da separação, num segundo momento, atribuir o direito de permanência na habitação da casa de morada de família a esta.

  5. A requerente conseguiu provar a existência da União de Facto, pois considerou, o Douto Tribunal, como facto provado que estes, ponto 5 e 6 da fundamentação e da motivação que refere que - “… não há dúvidas que requerente e requerido viveram em união de facto pelo menos desde inícios de 2007…”.

  6. Pelo que devia ter sido decretada parcialmente procedente o pedido da requerente.

  7. Não sendo, como foi, conclui-se pela oposição entre os fundamentos e a decisão e, consequente, nulidade da sentença.

  8. Tal entendimento decorre do Ac. STJ, de 19.2.1991: AJ, 15.º/16.º-31, que refere que, “Para que exista nulidade da sentença prevista no art. 668º, n.º1, al) c), de CPC é necessário que a fundamentação da decisão aponte num sentido e que esta siga caminho oposto ou, pelo menos, direção diferente”.

  9. Sendo que o raciocínio supra aponta, pelo menos, para uma direção diferente.

  10. Consequentemente, devia o tribunal a quo ter julgado procedente e decretar o reconhecimento da união de facto entre requerente e requerido, e, eventualmente, absolver o requerido quanto ao pedido referente a casa de morada de família.

  11. Não tendo sucedido considera-se existir oposição entre a fundamentação e a decisão a qual equivale a sua ininteligibilidade e que justificam a decisão, determina, consequentemente, as nulidades previstas nas als. c) do n.º 1 do art.º 615.º do Cód. Proc. Civil, Sem prescindir ou caso assim não se entenda; 2) Da nulidade da sentença pela omissão de pronúncia 15. Em face da sentença em crise, concede-se que o Tribunal a quo tenha fundamentado e motivado a sua convicção quanto a união de facto entre requerente e requerido, porém não decidiu quanto a esta.

  12. Bem como existe falta de pronúncia, quanto aos imóveis alienados pelo requerido na pendência da presente ação, dezembro de 2018, e com o qual teve um proveito de cerca de € 300.000,00 (trezentos mil euros).

  13. Refira-se que, atribui, o Tribunal a quo, a casa de morada família ao requerido por considerá-lo a parte mais fraca.

  14. Este facto nunca foi objecto de análise, nem tampouco foi confrontado com a situação económica da requerente.

  15. Essa diferença de património económico entre requerente e requerido é de cerca de € 100,000,00 (cem mil euros) que o requerido tem a mais que a requerente, requerimento datado de 29 de março de 2019, referência citius 2315971.

  16. Mais se entende, devia, o Tribunal a quo, ter oficiosamente requerido uma análise acerca da situação económica do requerido, isto porque se discutiu a atribuição da casa de morada de família.

  17. Assim, a nulidade prevista na 1.ª parte da al. d)do art. 615º do C.P.C., está diretamente relacionada com o comando fixado no n.º 2 do art. 608.º, segundo o qual “ O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.” 22. Consequentemente, deveria o tribunal a quo ter julgado procedente e decretar a união de facto entre requerente e requerido, devendo também, ter-se pronunciado quanto ao lucro da venda dos imóveis que integrou o património do requerido e assim decidir da atribuição da casa de morada de família à requerente.

  18. Assim, a omissão dos fundamentos de facto e de direito - à qual equivale a sua ininteligibilidade – que justificam a decisão, determina, consequentemente, as nulidades previstas nas als. d) do n.º 1 do art.º 615.º do Cód. Proc. Civil,… 24. … que se deixam expressamente invocadas, e que, a serem julgadas procedentes, como se impõe, deverão levar, nos termos e para os efeitos previstos no n.º 5 do art.º 662.º do Cód. Proc. Civil, a que se ordene ao Tribunal recorrido que fundamente a decisão apelada.

    Caso não se decida pela procedência da(s) nulidade(s) referidas: 3) Da apreciação incorrecta da prova produzida 25. Ficou provado, a muito custo, que o requerido padece da doença de Alzheimer, ponto 8 da douta sentença, apesar de constantemente desmentido pela própria filha do requerido, e consequentemente pelo próprio requerido.

  19. No ponto 12 o tribunal a quo considera como provado que a filha do requerido ameaçou cortar a água e a luz da, única, habitação da requerente e do seu filho menor.

  20. Deverá o referido ponto ser alterado uma vez que é falso tendo filha do requerido consumido tais ameaças, além de ter trocado as fechaduras das portas da casa.

  21. Tendo sido necessária a intervenção do Tribunal a quo para restabelecer o fornecimento de água, requerimento datado de 17/10/2018 e com a referência citius n.º 2110801 e despacho datado do 22/10/2018, referência citius n.º 43096095.

  22. No ponto 23 da sentença deu o Tribunal a quo ficamos sem saber se terá sido por causa da requerente, desinteresse, ou por causa do seu envelhecimento que este aparece desleixado.

  23. Nunca poderia o Tribunal a quo ter dado esse facto como provado, nem o referido nos pontos 24 a 30, esses ou são pessoais à requerente e disso dificilmente ou nunca se faz...

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