Acórdão nº 2708/17.2T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelRAQUEL BATISTA TAVARES
Data da Resolução14 de Novembro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I. Relatório D. C.

, casado, residente na Rua ..., Barroselas, Viana do Castelo, intentou a presente acção declarativa com processo comum contra J. S.

, residente na Rua …, Viana do Castelo, peticionando a condenação do Réu: a) a compensar o Autor num montante nunca inferior a €5.500,00 (cinco mil e quinhentos euros) por todos os danos não patrimoniais sofridos; b) a abster-se de comportamentos que afectem o seu descanso, o sono, o silêncio, o sossego e a saúde do Autor, mormente a não prosseguir os trabalhos inerentes à exploração do seu estabelecimento comercial em horário compreendido entre as 20h e as 8h, devendo ser condenado no pagamento de €100,00 por cada vez que o fizer; c) a retirar os motores e tubos do local onde se encontram, sem que possam sem substituídos por outros; d) a fechar a abertura reconstruindo o que destruiu, repondo a situação anterior às obras por si levadas a cabo naquela parede; e) no pagamento de uma multa indemnizatória de €100,00 por cada dia em que se verifique a situação prevista em c) e d) desde a data da citação e até efectivo cumprimento.

Alega, em síntese, que é proprietário das fracções autónomas identificadas na petição inicial, nas quais habita juntamente com a sua mulher e filho, desde 2001, e que o Réu é proprietário da fracção identificada no artigo 8º da p.i., na qual explora uma pastelaria.

Mais alega que o funcionamento do estabelecimento comercial lhe causa graves incómodos e perturba gravemente o seu descanso, sono, silêncio e a sua saúde, pois todos os dias da semana o Réu inicia os trabalhos, seja por si próprio seja através dos seus colaboradores, cerca das 6h30 terminando pelas 22h00, ainda que sem licença para tanto, realizando cargas e descargas de produtos de padaria e pastelaria o que faz com uma carrinha de mercadorias e carrinhos metálicos, que produzem ruídos ensurdecedores, interrompendo o seu descanso.

Que o Réu utiliza diversos equipamentos, nomeadamente de frio, como arcas frigoríficas e outros de calor como fornos de cozer pão e outros produtos de padaria e pastelaria e colocou no exterior do prédio tubos que alteram a estética e emitem gases e odores que incomodam e perturbam o descanso, o sono, o silêncio e o seu sossego, bem como de toda a vizinhança, e mesmo depois de instado pelo seu mandatário, em Dezembro de 2010, a retirá-los não o fez.

Que em 2017, o Réu procedeu a obras de remodelação do seu estabelecimento, no âmbito das quais colocou na parte traseira (que corresponde à frente da parte habitacional do prédio) dois motores de ar condicionado de grandes dimensões e que produzem altos níveis de ruído, e alterações estéticas ao edifício, pelo que foi contactado a fim de os retirar, o que nunca veio a acontecer e que o Réu não obteve autorização a assembleia de condomínio para a colocação de qualquer tipo de aparelhos no exterior do prédio. E, não obstante a deliberação da assembleia, iniciou os trabalhos para abertura de uma porta, que foram interrompidos por força da providência cautelar instaurada.

Regularmente citado, o contestou o Réu invocando a sua ilegitimidade pois o estabelecimento é propriedade e é explorado pela sociedade N. S., Unipessoal, Ldª; alegou ainda que a pastelaria funciona desde data anterior à da aquisição da fracção e funciona dentro do horário que lhe foi concedido através da licença de utilização emitidas.

Mais alegou que a pastelaria foi remodelada e os equipamentos existentes substituídos por outros mais modernos, eficientes e silenciosos, que funcionam intermitentemente, sendo que não existem tubos susceptíveis de alterar a estética do prédio nem emissão de gases e odores incomodativos e que as obras de abertura da porta foram levadas a cabo com autorização dos condóminos e devidamente licenciadas pela autoridade administrativa. Por fim, deduziu pedido reconvencional alegando danos patrimoniais e não patrimoniais resultantes da propositura desta acção.

O Autor pronunciou-se sobre a excepção de ineptidão invocada pelo réu, pugnando pela sua improcedência, mas à cautela, requereu a intervenção principal provocada da dita sociedade e peticionou a condenação do Réu como litigante de má-fé.

O Réu pronunciou-se quanto à litigância de má-fé pugnando pela improcedência do pedido de condenação.

Foi admitida a intervenção principal provocada da sociedade N. S., Unipessoal, Ldª, a qual veio declarar aderir aos articulados apresentados pelo Réu.

Foi proferido despacho de não admissão da reconvenção, foi dispensada a realização da audiência prévia e foi proferido despacho saneador que julgou improcedente a exceção de ilegitimidade; foi também dispensada a identificação do objecto do litígio, bem como a enunciação dos temas de prova.

Veio a efectivar-se a audiência de discussão e julgamento com a prolação de sentença nos seguintes termos, no que concerne à parte dispositiva: “Pelo exposto, decide-se julgar a presente acção parcialmente procedente e, em consequência, condenar o Réu J. S. a fechar a abertura a que se alude nos pontos 20 e 21 dos factos provados, reconstruindo o que destruiu, repondo a situação anterior às obras por si levadas a cabo naquela parede.

Mais se decide absolver o réu dos restantes pedidos contra si formulados pelo autor.

Decide-se, ainda, absolver a interveniente principal de todos os pedidos formulados pelo autor.

Custas da acção por autor e réu na proporção do respectivo decaimento (art.º 527º, nºs 1 e 2 do CPC).

Registe e notifique.” Inconformado, apelou o Autor da sentença, concluindo as suas alegações da seguinte forma: “CONCLUSÕES 1.º - Por douta decisão, o Autor D. C. viu o Tribunal a quo a julgar a presente acção e a decidir a “acção parcialmente procedente e, em consequência, condenar o Réu J. S. a fechar a abertura a que se alude nos pontos 20 e 21 dos factos provados, reconstruindo o que destruiu, repondo a situação anterior às obras por si levadas a cabo naquela parede. Mais se decide absolver o réu dos restantes pedidos contra si formulados pelo autor. Decide-se, ainda, absolver a interveniente principal de todos os pedidos formulados pelo autor.

” 2.º - Salvo o devido respeito, que aliás é muito, não concorda o Autor, ora Recorrente, com a decisão de absolvição dos Réus dos pedidos formulados pelo Autor e daí o presente Recurso. Com efeito, 3.º - O Autor, aqui Recorrente, considera que o Tribunal a quo incorreu em erro, ao dar como provados o ponto 25. da “FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO”, “3.1. Factos provados”, constante na douta sentença recorrida 4.º - Mais se considera que o Tribunal a quo incorreu em erro, ao dar como não provados os pontos a., c., g., h., i., j., k., l., m., e n. da “FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO”, “3.2. Factos não provados”, constante na douta sentença recorrida.

5.º - Conquanto o dito, e face ao que se pode apreender com a audição das gravações da audiência de julgamento, prova documental e declarações de parte, bem como de outras provas carreadas para o processo, deveria ter sido outra a fundamentação de facto e sua motivação, já que existem provas suficientes para criar no Tribunal a convicção necessária e exigida para concluir no sentido que de seguida se irá expor.

6.º - Relativamente ao ponto 25. Dos factos dados como provados, dir-se-á que o ponto 15. dos factos dados nos informa que a Ré “colocou, na parte traseira do seu estabelecimento comercial (que corresponde frente da parte habitacional do prédio), um aparelho de refrigeração [a que adiante se designará de “Compressor”, como as testemunhas a ela se referiam] cujo motor produz ruido.

”.

7.º - Cabe, desde logo, dizer que bem se sabe que os motores que ali existiam não são os mesmos, ou seja, se houve uma substituição de motores, eles não são iguais, sendo certo, até, são bem diferentes, razões pelas quais foi a presente acção instaurada.

8.º - Acresce, ainda, que como dá conta o Tribunal a quo na sua fundamentação (“3.3. Motivação”), a testemunha “M. M.

(…) Referiu que no exterior do edifício estavam instalados, há 15 anos, dois equipamentos de refrigeração e um de ar condicionado e três no interior do estabelecimento (cf. fls. 63 verso), sendo que o motor de frio/refrigeração foi reduzido a uma única unidade exterior (cf. fls. 64)”.

9.º - Sucede que, tal como a douta Sentença dá conta (bem como a testemunha M. M.), este novo Compressor veio substituir dois outros aparelhos, mais pequenos e menos potentes, que se situavam no exterior do edifício, bem como outros três que se situavam no interior da Pastelaria.

10.º - Logo, o motor colocado no exterior teria de ser, sempre, muito mais potente ao que lá existia, que era menos potentes e de menor dimensão.

11.º - Mais, o facto dado como provado no ponto 15. é cheio de conclusões genéricas.

12.º - Isto resulta do facto de, na verdade, na Contestação não ser alegado nenhum facto concreto sobre as razões que levam a considerar o porquê de “O tipo de aparelho referido em 15.” ali “sempre” existir.

13.º - Igualmente, não se percebe as conclusões insertas no facto dado como provado no ponto 25., quando se lê, no mesmo, que o dito aparelho é “moderno, eficiente e silencioso” e “é imprescindível ao funcionamento do estabelecimento”.

14.º - Tais pensamentos são conclusões, que se deveria basear em factos dados como provados.

15.º - Sucede que os mesmos nunca foram alegados e/ou provados, razões pelas quais também não consta, em lugar algum, da douta Sentença recorrida.

16.º - Estas generalidades tornam, inclusive, difícil ao Autor organizar o seu contraditório, quer através da alegação de factos, quer através da organização de prova que a infirme.

17.º - Acresce, ainda, que as conclusões alegadas, que nos vimos a referir, integra a defesa por excepções invocadas pela Ré. Tal consubstancia, nesses termos, uma alegação essencial à sua defesa – vide artigo 5.º, n.º 1, do Código do Processo Civil, e artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil.

18.º - Ou seja, cabia ao Réu o ónus de alegar e provar os factos constantes no ponto...

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