Acórdão nº 3387/17.2T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelALEXANDRA ROLIM MENDES
Data da Resolução14 de Novembro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães Relatório: M. V. e D. M., casados, residentes na Rua …, em ..., Barcelos, e C. G. e J. M., casados, residentes na Rua …, em ..., Barcelos, instauraram a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra “XX, S.A”, com sede do Lugar de … (Clínica Particular ...), em ..., Barcelos, e A. M., casado, sócio-gerente da 1.ª ré de 30.09.1999 a 03.11.2005, residente na Rua …, n.º …, em Barcelos, pedindo a sua condenação na restituição aos autores das quantias por estes entregues àqueles no valor global de 140.000,00 Eur. (cento e quarenta mil euros), acrescida de juros de mora, desde a citação até efetivo e integral pagamento.

Para tal alegaram, em suma, que a 1.ª ré, doravante designada por Y, foi constituída em 09/06/1999, sob a forma de uma sociedade por quotas, com o capital social de €5.000,00 (cinco mil euros) distribuído pelos seguintes sócios:

  1. José casado com Maria; b) A. M. casado com D. A.; c) C. M. casado com M. L.; d) M. A. casado com L. C.; e) J. D. casado com C. B..

    Vinculando-se a referida sociedade com a assinatura do gerente, foi nomeado para tal cargo, em 30/09/1999, o sócio A. M., que se manteve em funções até à transformação da dita sociedade em sociedade anónima em 10/08/2005.

    Por contrato promessa de cessão de quotas, celebrado em 31/10/2003, a 1ª ré, representada pelo gerente A. M., prometeu ceder a M. V. uma quota no valor nominal de €18.704,92 (dezoito mil, setecentos e quatro euros e noventa e dois cêntimos), que detinha na sociedade comercial por quotas “Clínica Particular ..., Ldª.”, com sede no Lugar ..., ..., concelho de Barcelos, pelo preço de €75.000,00 (sessenta e cinco mil euros), que foi pago da seguinte forma: a) €20.000,00 (vinte mil euros), no dia 11 de Novembro de 2003, através do cheque n.º 2100000024, sacado sobre o Banco ...; b) €30.000,00 (trinta mil euros), no dia 11 de Novembro de 2003, através do cheque n.º 9841367855, sacado sobre o Banco Caixa ...; c) €15.000,00 (quinze mil euros), no dia 20 de Julho de 2004, por meio de transferência bancária para a conta com o NIB 0036 0096 991000323... sediada no Banco ....

    Por sua vez, por contrato promessa de cessão de quotas, celebrado em 31/10/2003, a 1ª ré, representada pelo gerente A. M., prometeu ceder a C. G. uma quota no valor nominal de €18.704,92 (dezoito mil, setecentos e quatro euros e noventa e dois cêntimos), que detinha na sociedade comercial por quotas “Clínica Particular ..., Ldª.”, com sede no lugar ..., ..., concelho de Barcelos, pelo preço de €75.000,00 (setenta e cinco mil euros), que foi pago da seguinte forma: d) €17.500,00 (dezassete mil e quinhentos euros), no dia 15 de Novembro de 2003, através do cheque n.º 732835278, sacado sobre o Banco ...; e) €20.000,00 (vinte mil euros), no dia 30 de Dezembro de 2003, através do cheque n.º 4948333779, sacado sobre a Caixa ...; f) €12.500,00 (doze mil e quinhentos euros), no dia 09 de Novembro de 2004, através do cheque n.º 7448333787, sacado sobre a Caixa ...; g) €25.000,00 (vinte e cinco mil euros), no dia 28 de Dezembro de 2004 através do cheque n.º 0600000033, sacado sobre o Banco ....

    Sucede, porém, que os aludidos contratos-promessa vieram a ser revogados, por mútuo acordo dos contratantes, conforme resultou provado na sentença transitada em julgado, proferida no processo n.º 1944/12.2TBBCL que correu termos neste Tribunal da Comarca de Braga – Instância Central – 1ª Secção Cível – J1, com as mesmas partes.

    Nessa conformidade, destruindo a revogação os efeitos dos contratos-prometidos, eliminando as transferências de riqueza que estes implicavam, estão os réus obrigados a restituir aos autores o que estes lhes entregaram e que já lhe vêm exigindo sem sucesso.

    A ré “XX, S.A” contestou por exceção e por impugnação.

    Confirmou que esteve pendente entre as partes a ação n.º 1944/12.2TBBCL, onde ficou provado que a Y desconhecia a existência dos contratos promessa, bem como a existência de pagamentos alegadamente feitos em cumprimento deles, além do mais, também ali se provou que as quantias entregues como contrapartida da promessa de transmissão das quotas, foram transferidas para diversas contas bancárias, cujos titulares foram identificados, mas nenhuma delas, para qualquer conta detida pela 1.ª ré.

    Por exceção, alegou que após ter transitado em julgado a decisão proferida na ação n.º 1944/12.2TBBCL, e por configurar matéria penal, a ré efetuou uma participação ao Ministério Público contra os autores, o 2.º réu e outros (por burla qualificada, infidelidade e outros ilícitos), sendo que as questões controvertidas dos autos estão intrinsecamente ligadas à ação declarativa original e à matéria constante da participação criminal e do pedido de indemnização cível que ali visa enxertar.

    Naquela outra ação declarativa foi a Y que chamou à demanda o aqui 2.º réu, A. M., onde o mesmo declarou o conhecimento do negócio cuja titularidade assumiu, afirmando inclusivamente que havia sido realizado em nome e por conta da Y, e dos seus interesses, porém, é claro que os autores e o réu A. M. estabeleceram negócios pessoais, manipulando os factos e subvertendo os termos e condições negociais e devoluções de quantias ajustadas, procurando agora imputar as responsabilidades e consequências financeiras a esta sociedade.

    Mais alegou que, uma vez intentada pelos autores a ação declarativa n.º 1944/12.3TBBCL, e vendo estes a sua pretensão negada, tendo entretanto e por sua vez a 1.ª ré desencadeado o processo-crime e estabelecido legal vinculação a formular pedido de indemnização civil, em momento prévio à instauração da presente ação, qualquer pretensão que os autores pudessem ter devia ser ali deduzida.

    Aliás, sendo todos os autores e réus sujeitos no aludido processo penal, e tendo ele por fundamento factos necessária e diretamente conexos com a matéria que constitui a causa de pedir e o petitório destes autos, terá de ser declarada a litispendência entre estes dois processos (e o respetivo pedido de indemnização civil).

    A presente causa está dependente do julgamento do processo-crime, e aquele decisão afetará e prejudicará o julgamento dos presentes autos, retirando-lhe o fundamento e/ou a sua razão de ser, existindo um nexo de prejudicialidade entre eles, pelo que deverá ser suspensa a presente instância, até à decisão daquela causa prejudicial.

    Acresce que também os requisitos do caso julgado se encontram verificados. De facto, as partes são as mesmas, pois que a ora 1.ª ré deteve também a mesma qualidade jurídica no processo n.º 1944/12.3TBBCL – já transitado em julgado -, e no qual o réu A. M. assumiu a posição de interveniente acessório, ocupando um lugar idêntico ao daquela; nesse mesmo processo, ocuparam também os autores a mesma posição processual; no processo-crime, são sujeitos processuais também a 1.ª ré (desta feita na qualidade de participante), sendo que os autores e o réu A. M. ocupam a posição de participados.

    O efeito jurídico pretendido também se repete. Se no processo n.º 1944/12.2TBBCL os autores requeriam a devolução em dobro de um sinal que alegadamente pagaram, a causa de pedir não pode deixar de se considerar ser exatamente a mesma, não obstante o valor agora peticionado seja em singelo.

    Sempre sem prescindir, alega ainda a 1.ª ré ser parte ilegítima, já que os autores assentam o pedido numa revogação por mútuo consentimento do contrato promessa então celebrado entre as partes, e que tal resultou já provado na ação n.º 1944/12.2TBBCL. Porém, o que se retira da sentença é que, a existir uma qualquer revogação por mútuo consentimento, esta sempre teria que ter ocorrido entre os autores e a 1.ª ré, e tal não poderia suceder porque a 1.ª ré não tinha conhecimento de qualquer negócio, e nenhum produto desse negócio reverteu a seu favor ou para as suas contas.

    Deve, pois, soçobrar a pretensão dos autores relativamente à 1.ª ré com o fundamento de ter existido um consentimento desta à revogação, já que nenhuma sustentação para este entendimento flui da sentença e acórdão transitados em julgado.

    A 1.ª ré deduziu ainda defesa por impugnação nos arts. 105.º e seguintes da contestação, negando a existência do contrato-promessa efetuado entre os autores e o réu A. M., negócio que só veio a conhecer, quando foi citada para o processo n.º 1944/12.2TBBCL.

    Mais alegou que o pagamento das quantias peticionadas nunca foi feito à Y, que nunca delas beneficiou, e sempre foi alheia a qualquer tipo de acordos que hajam envolvido os autores e o réu A. M., pelo que não se vinculou validamente a qualquer negócio jurídico, não podendo ser condenada a qualquer devolução.

    A final peticiona, ainda, a condenação dos autores como litigantes de má-fé, pois não desconhecem eles que não teve papel neste processo, pelo que a ação não poderia ter sido instaurada contra a Y; não desconhecem que a Y não recebeu nem beneficiou de qualquer quantia entregue por eles, não lhe cabendo a si operar ou responder por qualquer devolução de valores a que eventualmente tenham direito.

    Sendo manifesto que os autores alteraram conscientemente a verdade de factos, que não desconhecem, tentando locupletar-se à custa da 1.ª ré, e dos seus atuais acionistas e profissionais, distorcendo factos e imputando condutas à 1.ª ré que sabem não corresponder à verdade, devem, por conseguinte, ser condenados na indemnização prevista no art. 543.º do C. P. Civil, a qual não deverá ser inferior a 50.000,00 €.

    O réu A. M. contestou por exceção, ser parte ilegítima, já que agiu como gerente da Y, pelo que não tem interesse direto em contradizer, pois que enquanto pessoa singular não pode ser condenado no pedido.

    Por impugnação alegou, em suma, que reconhece que celebrou os contratos-promessa e que recebeu os cheques identificados na petição, porém, os mesmos não foram revogados por mútuo acordo das partes, a sua causa de extinção foi outra. Aliás, o que resulta da sentença proferida na ação n.º 1944/12.2TBBCL é que os autores e o ali chamado...

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