Acórdão nº 1008/15.7T8VNF-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelJOSÉ ALBERTO MOREIRA DIAS
Data da Resolução10 de Julho de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

RELATÓRIO Recorrentes: José (…) Recorrida: (…) Lda.

Por apenso aos autos de execução para pagamento de quantia certa, que (…) Lda., instaurou contra (…) S.A., José (…) e Paulo (…), dando à execução a letra junta em anexo ao requerimento executivo, vieram os executados (..) S.A.

(esta, no apenso A), José (…) e Paulo (..) (estes, no apenso B) deduzir oposição à execução mediante embargos, invocando: 1º - a nulidade do contrato subjacente à emissão da letra e da própria letra, por falta de capacidade da sociedade executada, na medida em que o contrato subjacente à letra e a própria letra constituem a prestação de uma garantia prestada pela sociedade executada, X – Restauração, S.A., à sociedade “Y – Restauração e Bebidas, Lda., garantia essa que é contrária ao fim da sociedade executada.

Para tanto alegam, em síntese, que quando foi celebrado o contrato de fornecimento de café de fls. 17 a 23, entre a sociedade executada e a exequente, contrato esse em cuja elaboração e preparação das respetivas cláusulas a sociedade executada não teve qualquer intervenção, tendo-se limitado a aceitar a proposta de contrato tipo cujo clausulado foi fixado unilateralmente pela exequente, esta sabia que não iria ser fornecido qualquer café à sociedade executada e, bem assim, que a sociedade executada não iria encomendar ou adquirir qualquer quantidade de café ou de outros produtos, mas que quem iria encomendar e consumir café e teria de cumprir as obrigações contratuais emergentes daquele contrato seria a sociedade “Y”, tal como acabou por acontecer, sendo o café fornecido e faturado à cessionária; Acontece que ao outorgar aquele contrato, a sociedade executada tornou-se solidariamente responsável pelo pagamento à exequente dos valores devidos pelo fornecimento de café a outras empresas e pelos eventuais incumprimentos das obrigações emergentes desse contrato, sem que tivesse qualquer interesse justificado na prestação de tal garantia, o que contaria o fim dessa sociedade; 2º - a nulidade da cláusula penal prevista na cláusula 7ª, nº 3 do contrato de fornecimento de café celebrado, por se revelar manifestamente excessiva, sustentando, em súmula, que essa cláusula prevê o pagamento do preço de café não consumido, o que permite à exequente receber a totalidade do preço do café que perspetivava vender até ao final do contrato, a que acresce o benefício de não ter de fornecer o café não consumido, o que tudo permitirá à exequente obter duas vantagens adicionais que o cumprimento pontual do contrato não lhe proporcionaria, já que com a declaração da resolução do contrato, receberá imediatamente o valor do preço dos 5.280 Kgs., ficando, também, com essa quantidade de café, o que quer dizer que a exequente ganha mais desta forma que com o cumprimento integral do contrato, uma vez que recebe a totalidade do valor do café previsto fornecer no contrato à sociedade executada (6.500 Kgs.), conservando, porém, a propriedade sobre os 5.280 Kgs. de café não fornecido; A referida cláusula é abusiva, contrária aos princípios da boa fé, não é proporcional com os eventuais danos que se pretendem ressarcir e como tal proibida nos termos da al a) do art. 19º do DL 446/85, o que determina a respetiva nulidade; Acresce que ainda que assim não se entenda, serão aplicáveis as disposições dos arts. 810.º e ss. do CC, por o credor não poder exigir uma indemnização que exceda o valor do prejuízo resultante do incumprimento da obrigação principal; Além disso, não existe culpa da sociedade executada no incumprimento do identificado contrato, pois a responsabilidade pela aquisição do café estava cedida a terceiros; 3º- a nulidade e a inexequibilidade do título dado à execução, alegando, em síntese, que o aceite da letra dada à execução está assinado pelos executados José e Paulo, sem qualquer menção da qualidade em que outorgam e sem que tenha sido aposto no título, no local destinado ao aceite, qualquer carimbo ou indicação da sociedade “X”; Os oponentes José e Paulo limitaram-se a assinar a letra de garantia nos locais e com os dizeres sugeridos pelo sociedade exequente, pensando estar a prestar uma garantia pessoal à sociedade “X” no âmbito do contrato de fornecimento de café celebrado; A sociedade executada é representada, desde abril de 2007, por um administrador único, tendo sido designado para esse cargo o executado José, que é quem, desde então, representa a sociedade executada; O executado Paulo não é administrador, nem à data detinha ou detém qualquer cargo social na sociedade executada “X”, nem à data detinha, ou detém, qualquer cargo social nessa sociedade; A letra dada à execução foi entregue em branco, apenas com as duas assinaturas nela apostas, tendo sido preenchida, a posteriori, pela exequente; O facto de constarem duas assinaturas apostas no aceite - uma de José, que é administrador único da sociedade executada, e outra de Paulo, que não é sócio, sequer exerce qualquer cargo social naquela sociedade -, permite concluir que não é esta sociedade a aceitante da letra dada à execução, nem tal vinculação poderá deduzir-se, pelo que essa sociedade não se encontra validamente vinculada; Acresce que a exequente sabia que a sociedade executada era gerida e obrigada apenas por um administrador único, tal como fez constar no contrato de fornecimento de café e no pacto de preenchimento da letra, documentos esses que ela própria elaborou; Deste modo, a letra entregue deveria ser completada pela exequente, não com a indicação da sociedade executada no lugar do sacado, mas sim com a identificação dos aceitantes José e Paulo, pelo que existe um flagrante erro no preenchimento, que inutiliza a própria letra dada à execução; A sociedade executada é, assim, parte ilegítima, já que os signatários da letra dada à execução não a assinaram, sequer o poderiam fazer, na qualidade de administradores daquela sociedade, o que determina a nulidade do título por falta de forma do aceite; 4º- a nulidade do pacto de preenchimento da letra, por indeterminabilidade do respetivo objeto, sustentando que o pacto de preenchimento não prevê qualquer limite máximo de valor a garantir, sequer critérios adequados definindo o objeto ou prazo da garantia, sendo que o pacto previa a garantia de pagamento de obrigações futuras decorrentes de fornecimentos que seriam efetuados aos cessionários do estabelecimento “T. C.”; Acresce que mesmo que se entenda que o pacto não é autónomo face ao contrato de fornecimento, o facto de o pacto não mencionar a que contrato se associa torna esse pacto sem objeto determinável; 5º- a nulidade do pacto de preenchimento e da letra, em função do carácter perpétuo, alegando para o efeito, em síntese, que a letra dada à execução configura uma assunção de dívida por prazo ilimitado, o que determina a respetiva nulidade, por ser contrário à ordem pública, uma vez que a exequente poderia preencher a letra quando o entendesse; 6º- o abuso de direito da exequente na exigibilidade do consumo contratado e na resolução do contrato por incumprimento do mesmo, alegando que a exequente sabia que a executada não teria condições para consumir o volume de café contratado e, por isso, é abusivo que resolva o contrato com fundamento no incumprimento, sendo que o próprio contrato previa a prorrogação do período do contrato, de modo a que o consumo total contratado fosse atingido; 7º- a nulidade da cláusula que obrigava à aquisição de quantidades mínimas de café, por contrária à lei, alegando, em síntese, que essa cláusula, contendo uma obrigação de aquisição de quantidades mínimas de café, consubstancia uma restrição concorrencial contrária às normas da defesa da concorrência (art. 4.º, n.º 1, da Lei n.º 18/2003, de 11.06), já que acaba por influenciar a duração do contrato, o que determina a respetiva nulidade; e 8º- a falta de preenchimentos dos pressupostos da resolução contratual, sustentado que o mero consumo de café em quantidade inferior ao contratualmente previsto não é fundamento de resolução do contrato e do pedido de indemnização, por a sociedade executada “X” não ter agido com culpa e por estar prevista a prorrogação do prazo de vigência do contrato no caso de atingido o prazo de vigência do contrato de fornecimento de café, a quantia de café contratada não estar atingida.

Acresce que em março de 2014, a sociedade executada “X” celebrou com o senhorio do estabelecimento um contrato de resolução do contrato de arrendamento e a exequente acompanhou todo esse processo, tendo, nesse âmbito, trocado correspondência com a administração do T. C.; O primeiro desses inquilinos, a “V. S., Unipessoal, Lda.”, ainda consumiu café no mês de dezembro de 2014; Acontece que inesperadamente, por carta de 11 de agosto de 2015, a exequente rescindiu o contrato de fornecimento celebrado com a executada “X”, por incumprimento da cláusula 1ª, ponto 4, als. a) e b) do contrato, sem invocação de qualquer outra razão válida que legitimasse tal rescisão.

A exequente contestou, defendendo-se por exceção e por impugnação.

Alegou que não obstante o contrato celebrado entre as partes não ser de adesão, que todas as cláusulas desse contrato foram negociadas e acordadas entre as partes contratantes; Invocou a exceção do abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium, sustentando que a invocação pelos apelantes da exceção da nulidade e da inexequibilidade do título dado à execução com fundamento de que as assinaturas apostas no lugar do aceitante se reportam a si a título particular e não à sociedade executada, por no lugar do aceite não constar o carimbo dessa sociedade, quando, no pacto de preenchimento consta, logo no início, “X – Restauração, S.A.”, em que esta declara autorizar expressamente a sociedade exequente a preencher e a apresentar a letra anexa, contrato este em que no lugar do aceitante consta a assinatura de ambos os oponentes e no qual apuseram o carimbo da empresa, estes deixaram-na em plena e...

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