Acórdão nº 1562/17.9T8VNF-G.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução06 de Junho de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

  1. RELATÓRIO Recorrente: (…) Nos autos de insolvência em que são insolventes (…) e(…) , foi ordenada a venda dos bens apreendidos à ordem do processo de insolvência.

Em 19/10/2018, foi lavrado auto de aceitação de proposta apresentada por (…) para aquisição dos bens descritos no auto de apreensão sob as verbas n.ºs 1, 2, 3 e 4 (cfr. doc. de fls. 21 e 22).

Por requerimento datado de 29/10/2018, (…) , residente na Rua …, União de Freguesias (…) concelho de (…) e, notificado do auto de aceitação de proposta antes referido, na qualidade de filho dos insolventes, apresentou-se a exercer o direito de remição dos bens apreendidos pelo respetivo preço de adjudicação, a saber: - verba n.º 1 – 16.400,00 (dezasseis mil e quatrocentos) euros; - verba n.º 2 – 16.400,00 (dezasseis mil e quatrocentos) euros; - verba n.º 3 – 16.900,00 (dezasseis mil e novecentos) euros; e - verba n.º 4 – 16.900,00 (dezasseis mil e novecentos) euros (cfr. fls. 23).

Nesse requerimento, o identificado A. R., apesar de não ter sido apresentada qualquer proposta de aquisição pelo bem da verba n.º 5, propôs-se adquirir o mesmo pelo preço de 100,00 euros (cfr. fls. 23), proposta esta que veio a ser aceite.

Por escritura pública de compra e venda de 06/12/2018, (…) , comprou aqueles bens (incluindo o da verba n.º 5, este pelo preço de cem euros) no exercício do direito de remição e pelos preços atrás referidos (cfr. fls. 26 a 32).

A verba n.º 1, corresponde a um prédio urbano, composto por lote de terreno para construção, denominado “Lote …”, sito em(…) , concelho de (...), inscrito na respetiva matriz sob o art. … e descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o n.º …. /(...) (cfr. doc. de fls. 26 a 32); A verba n.º 2, corresponde a um prédio urbano, composto por lote de terreno para construção, denominado “Lote …”, sito em (…) a, concelho de (...), inscrito na respetiva matriz sob o art. … e descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o n.º … /(...) (cfr. doc. de fls. 26 a 32); A verba n.º 3, corresponde a um prédio urbano, composto por lote de terreno para construção, denominado “Lote …”, sito em (…) concelho de (...), inscrito na respetiva matriz sob o art. … e descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o n.º …/(...) (cfr. doc. de fls. 26 a 32); E a verba n.º 4, corresponde a um prédio urbano, composto por lote de terreno para construção, denominado “Lote …”, sito em (…) concelho de (...), inscrito na respetiva matriz sob o art. … e descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o n.º … /(...) (cfr. doc. de fls. 26 a 32).

Pela ap. (…) , de 2018/10/03, foi inscrito, no registo, sob os prédios atrás identificados relativos às verbas n.ºs 1, 2, 3 e 4, o Proc. (…) T8BRG, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo Central Cível de Braga, Juiz 2, em que o aí Autor (…) demanda os aqui insolventes(…) , bem como (…) pedindo que se declare ineficaz, relativamente ao Autor, as doações e permutas destes imóveis, e se declare o direito do Autor de os executar no património dos Réus, (…9 , a fim de satisfazer o seu crédito, ou, caso assim se não se entenda, se declare nulo e de nenhum efeito o contrato de doação constante da escritura datada de 13 de agosto de 2013, pela qual os Réus (…9 doaram à Ré (…) a propriedade destes prédios (cfr. doc. de fls. 33 a 38).

Durante a prospeção de mercado, anúncio de venda dos bens supra descritos e receção de propostas, o administrador de insolvência desconhecia a pendência da ação atrás descrita (cfr. doc. de fls. 49).

Por requerimento de fls. 16 a 19, (…) , requereu, ao abrigo do disposto nos arts. 838º, n.º 1 do CPC e 17º do CIRE: a- a anulação da venda por negociação particular ao aqui requerente, no exercício do direito de remição de todos os imóveis constantes da escritura pública de compra e venda realizada no dia 06 de dezembro de 2018, no Cartório Notarial do Dr.(…) , melhor identificados no documento n.º 4, declarando-se tal escritura nula e de nenhum efeito, com o consequente cancelamento dos registos efetuados a favor do requerente; b- a devolução ao requerente da quantia de 66.700,00 euros, correspondente à totalidade do montante por este pago pela aquisição dos aludidos imóveis; c- a indemnização ao requerente, correspondente ao valor por este pago a título de IMT – 4.334,00 euros -, imposto de selo – 533,60 euros -, despesas com escritura e registos – 834,29 euros – e despesas com emissão do cheque visado – 52,00 euros, tudo no montante de 5.753,89 euros.

Para tanto alega, em síntese, que após a celebração da escritura de compra e venda teve conhecimento que havia sido registada, em 03/10/2018, a ação n.º 4275/18.0T8BRG, no âmbito do qual se peticiona a ineficácia/nulidade de determinados negócios celebrados pelos insolventes e que envolvem os prédios por ele remidos; A eventual procedência dessa ação permitirá executar todo aquele património, agora pertencente ao requerente; O requerente desconhecia a existência daquele ónus à data da celebração da escritura e, por isso, o mesmo não foi tomado em consideração, sequer foi referido na escritura; A sua vontade negocial foi assim viciada, no que respeita aos seus motivos determinantes no que se refere ao objeto do negócio, o qual nunca teria sido realizado se conhecesse aquele ónus do registo da ação.

Por requerimento de fls. 41 a 42, A. R. veio reformular o requerimento atrás referido, pedindo que: a- se anule a venda por negociação particular ao requerente de todos os prédios urbanos – lotes 2, 3, 9 e 10 -, constantes da escritura pública de compra e venda realizada no dia 06 de dezembro de 2018, no Cartório Notarial do Dr. (...), melhor identificados no documento n.º 4, declarando-se tal escritura nula e de nenhum efeito relativamente a tais prédios, com o consequente cancelamento dos respetivos registos efetuados a favor do requerente; e b- a devolução ao requerente da quantia de 66.600,00 euros, correspondente à totalidade do montante por este pago pela aquisição dos aludidos prédios (cfr. 54 e 55).

Em 13/03/2019, sobre o assim requerido por A. R., recaiu a seguinte decisão: “Nos termos do art.º 251 CC, O erro que atinja os motivos determinantes da vontade, quando se refira à pessoa do declaratário ou ao objeto do negócio, torna este anulável nos termos do artigo 247.º Consoante disposto no art.º 247 CC, Quando, em virtude de erro, a vontade declarada não corresponda à vontade real do autor, a declaração negocial é anulável, desde que o declaratário conhecesse ou não devesse ignorar a essencialidade, para o declarante, do elemento sobre que incidiu o erro.

Já nos termos do disposto no art.º 838 CPC, sob a epígrafe Anulação da venda e indemnização do comprador 1 - Se, depois da venda, se reconhecer a existência de algum ónus ou limitação que não fosse tomado em consideração e que exceda os limites normais inerentes aos direitos da mesma categoria, ou de erro sobre a coisa transmitida, por falta de conformidade com o que foi anunciado, o comprador pode pedir, na execução, a anulação da venda e a indemnização a que tenha direito, sem prejuízo do disposto no artigo 906.º do Código Civil. (…) Heinrich Ewald Horster refere (A Parte Geral do Código Civil Português, Teoria Geral do Direito Civil, 6ª reimpressão, Almedina, pág. 567) que «o negócio jurídico apenas pode desempenhar as suas funções quando a vontade, que se manifesta através da declaração negocial, se formou de uma maneira esclarecida, assente em bases correctas, e livre, sem deformações provindas de influências exteriores. Se a vontade não se formou esclarecida e livremente, ela está viciada. Na sequência do vício, que fere a vontade, também a declaração negocial em que esta se manifesta fica viciada».

O vício da vontade negocial que se traduza ou envolva uma deficiência de discernimento do seu autor constitui, assim, erro que corresponde à ignorância ou falsa representação de uma realidade (a ignorância do que se ignora) que poderia ter intervindo ou interveio entre os motivos da declaração negocial.

O erro, particularmente no quadro dos desvalores de um negócio jurídico, equivale sempre à ignorância de algo e implica, em geral, «uma avaliação falsa da realidade: seja por carência de elementos, seja por má apreciação destes». Fala-se a este respeito «no desconhecimento ou na falsa representação da realidade que determinou ou podia ter determinado a celebração do negócio».

O erro situa-se, assim, na formação do negócio jurídico, portanto em momento logicamente anterior a este. E deve notar-se que «só existe erro quando falta um elemento ou a representação mental está em desacordo com um elemento da realidade existente no momento da formação do negócio jurídico.

De salientar, desde já, que nem todo o erro é considerado juridicamente relevante e origina a anulação do negócio realizado. As necessidades de segurança e estabilidade do tráfico jurídico exigem que a relevância do erro como fundamento da anulação do negócio dependa de determinados pressupostos, ou seja, é necessário que «concorram certos requisitos», sendo que, relativamente ao seu regime de relevância, «cada ordem jurídica está perante um dilema: se não atende ao erro, vale um resultado que o errante não quis, ficando assim violado o seu direito à autodeterminação a realizar por meio do negócio jurídico; se atende ao erro, fica desiludida a expectativa da outra parte que confiou naquilo que entendeu e é perturbada a segurança do comércio jurídico».

Para a solução desse dilema e na falta de uma solução geral tida por correta, cada ordem jurídica opta, de acordo com a mentalidade dos seus destinatários e dentro do seu sistema, por estabelecer os critérios de relevância do erro que considera ajustados e que o Cód. Civil condensa nos art.ºs 247º a 252º, interessando, para o caso em apreço, o erro vício na formação da vontade, também chamado, por vezes, erro-vício, ou erro-motivo, para o distinguir do erro na...

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