Acórdão nº 349/15.8T9BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Março de 2019
Magistrado Responsável | TERESA COIMBRA |
Data da Resolução | 11 de Março de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Juiz Desembargadora Relatora: Maria Teresa Coimbra.
Juiz Desembargadora Adjunta: Cândida Martinho.
I.
Acordam, com conferência, os Juízes de Secção Tribunal do Tribunal da Relação de Guimarães.
No processo 349/15.8T9BRG que corre termos no juízo local criminal de Guimarães foi decidido (transcrição):
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Absolver a arguida M. B.
da prática, na forma continuada, de um crime de abuso de confiança à segurança social, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 6º, 107º, nº 1 e 2 e 105, nº 1 a 4 e 7, do RGIT (Lei 15/2001, de 5 de Junho), de que vinha acusada.
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Declarar extintas as medidas de coacção aplicadas à arguida M. B.
– artigo 214º, nº 1, alínea d), do CPP.
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Condenar o arguido C. M., pela prática, na forma continuada, de um de crime de abuso de confiança contra a segurança social, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 6º, 107º, nº 1 e 2 e 105, nº 1 a 4 e 7, do RGIT (Lei 15/2001, de 5 de Junho), na pena 14 (catorze) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 4 (quatro) anos, ficando no entanto a suspensão condicionada ao pagamento, no prazo de 4 (quatro) anos, a contar do trânsito em julgado da presente sentença, das cotizações referidas em 5), que se encontrem ainda em dívida, e demais acréscimos legais, de acordo com o disposto no artigo 14º, nº 1, do RGIT.
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Condenar a arguida M. E.
, na pena de 180 (cento e oitenta) dias de multa, à taxa diária de € 7,00 (sete euros), pela prática, na forma continuada, de um crime de abuso de confiança contra a segurança social, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 6º, 7º, 107º, nº 1 e 2 e 105, nº 1 a 4 e 7, do RGIT (Lei 15/2001, de 5 de Junho).
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Condenar os arguidos C. M. e M. E.
nas custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 2 (duas) UC para cada um – artigos 513º e 514º, do CPP e artigo 8º, nº 5 e Tabela III do RCP.
Julga-se o pedido de indemnização civil parcialmente procedente e, consequentemente, decide-se: f) Absolver a demandada M. B. do pedido de indemnização formulado pelo Instituto da Segurança Social, I.P.
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Condenar os demandados C. M. e M. E.
, solidariamente, no pagamento ao Instituto da Segurança Social, I.P., da quantia de € 46.869,99, acrescida dos juros de mora à taxa legal prevista no artigo 3º nº 1, do DL 73/99, de 16 de Março, e que sucessivamente estiver em vigor, contados desde a data do vencimento de cada uma das cotizações a que diz respeito, até efectivo e integral pagamento.
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Custas cíveis a cargo dos demandados e demandante, na proporção do decaimento - artigo 523º, do CPP e artigo 527º, nº 1 e 2, do CPC.
(...)*Inconformados os arguidos C. M. e M. E. interpuseram recurso para este Tribunal da Relação concluindo do seguinte modo ( transcrição): 1- Foi dado como provado a prática, por parte dos Recorrente C. M. e M. E., do crime de abuso de confiança contra a segurança social, p. e p. pelos artigos 6.º n.º 1 e 107º, n.ºs 1 e 105.º n.º 1 do Regime Geral das Infrações Tributárias, aprovado pela Lei n.º 15/2001 de 5 de Junho.
2- Foi aplicada, ao Recorrente C. M., a pena 14 (catorze) meses de prisão.
3- Foi aplicada, à Recorrente M. E., a pena de 180 (cento e oitenta) dias de multa, à taxa diária de 7,00€ (sete euros).
4- O Tribunal suspendeu a aludida pena de prisão, aplicada ao Recorrente C. M., por 4 (quatro) anos a contar do trânsito em julgado da decisão.
5- O Recorrente foi, ainda, condenado ao pagamento de indemnização cível na quantia de 46.869,99€ (quarenta e seis mil, oitocentos e sessenta e nove euros e noventa e nove cêntimos), correspondente ao montante global das cotizações em dívida para com o Instituto da Segurança Social, I.P., e demais acréscimos legais.
6- Subordinou o douto Tribunal a quo, ainda, a suspensão da execução da pena de prisão de 14 meses, ao pagamento, por parte do Recorrente C. M., da indemnização cível, no prazo máximo de um 4 (quatro) anos, tendo o pagamento da referida indemnização sido, consequentemente, integrada na condição de suspensão da execução da pena de prisão.
7- O cálculo da indemnização deve estar sempre sujeito a critérios de equidade, proporcionalidade, adequação e razoabilidade.
8- Verifica-se que tal não sucedeu, o que resulta num cumprimento, ab initio, impossível.
9- Conclui-se que, nesta medida, se torna incompreensível que a suspensão da execução da pena de prisão fique dependente do pagamento da indemnização cujo pagamento é incomportável face às condições financeiras, presentes e futuras, do Recorrente C. M..
10- Esta desproporção resulta na condenação em pena de prisão, quando na realidade o Tribunal tem um poder-dever de aplicação de uma pena de substituição e, mormente, quando considerou ser a pena de prisão efetiva excessiva e desnecessária para a satisfação das necessidades de prevenção manifestadas no caso sub judice.
11- Deve assim a condição imposta ser revogada ou ajustada a valores que o Recorrente possa razoavelmente suportar.
12- Acresce que a Recorrente M. E. foi condenada ao pagamento solidário da indemnização cível, que constitui, em simultâneo, a condição de suspensão da execução da pena de prisão do Recorrente C. M..
13- Ao sujeitar o cumprimento da condição de suspensão da execução da pena de prisão do Recorrente C. M. ao pagamento solidário da indemnização, ignorou o Tribunal a quo os desideratos que com aquela pena de substituição se visa alcançar, os quais impõem a pessoalidade e a intransmissibilidade da condição de suspensão.
14- A condição de suspensão da execução da pena deve ser aplicada em exclusivo ao arguido condenado numa pena de prisão, de modo a satisfazer as finalidades de prevenção especial de socialização, o que uma obrigação/condição de suspensão solidária impede em absoluto.
15- Deve a condição imposta, por isso, ser revogada ou, uma vez ajustada a valores que o Recorrente C. M. possa razoavelmente suportar, deverá, de igual modo, ajustar-se, a final, o valor devido a título de indemnização cível a ser pago por cada um dos Recorrentes, tendo em conta a sua real capacidade económica e os princípios da equidade, proporcionalidade e adequação.
16- A Recorrente M. E. considera que os pontos 2, 3, 4, 9, 10 e 11 dos factos dados como provados na sentença posta em crise foram incorretamente julgados, padecendo de erro notário na apreciação da prova.
17- Não ficou, de forma direta e irrefutável, provado, em audiência de julgamento, que a Recorrente M. E. gere a sociedade “TC. – Confecções, Unipessoal Ldª.” e, mormente, que a mesma teve qualquer envolvimento na retenção das contribuições devidas à Segurança Social.
18- Do acervo probatório que permitiu ao Tribunal a quo formar a sua convicção resulta, apenas, que a mesma colaborava na orientação do setor produtivo da sociedade, cabendo a gestão do negócio e as decisões quanto a atos de relevo a ela respeitantes, como o pagamento das cotizações à Segurança Social, ao Recorrente C. M..
19- As regras da experiência comum permitem concluir que os Recorrentes foram educados de acordo com princípios distintos daqueles que atualmente regem as relações conjugais, imperando, ainda, no que à relação de ambos diz respeito, os ditames do “poder marital”, que determinam que cabe ao homem o governo e à mulher a coadjuvação sem qualquer poder decisório.
20- Deve, por isso, na ausência de prova direta e irrefutável e de harmonia com o princípio in dubio pro reo, a Recorrente M. E. ser absolvida do crime de abuso de confiança contra a segurança social, alterando-se, em consonância, os pontos 2, 3, 4, 9, 10 e 11 dos factos dados como provados, passando os mesmos a integrar os factos dados como não provados.
21- Deve, ainda, o pedido de indemnização cível quanto à aqui Recorrente improceder ou, quanto muito, e tendo em consideração a sua situação económica e o montante fixado a título de condição de suspensão/indemnização a ser paga pelo Recorrente C. M., ser ajustada a valores que a mesma possa razoavelmente suportar, de harmonia com os princípios da equidade, proporcionalidade e adequação.
Foram violados os artigos 50.º n.º 1 e 51.º n.º 2, ambos do Código Penal, bem como os artigos 18.º e 30.º n.º 3, ambos da Constituição da República Portuguesa.
*O recurso foi admitido e em resposta o Ministério Público junto da primeira instância pugnou pela manutenção da decisão.
*Idêntico parecer veio a ser defendido pelo Ministério Público junto deste Tribunal.
*Foi cumprido o nº 2 do art. 417º do CPP.
Após os vistos, prosseguiram os autos para conferência.
II.
Cumpre apreciar e decidir tendo em conta que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.
À apreciação deste tribunal traz o recorrente C. M. a ilegalidade e impossibilidade do cumprimento da condição imposta para suspensão de execução da pena; a recorrente M. E. discorda da afirmação da sua responsabilidade penal e da condenação no pagamento solidário do montante fixado a título de indemnização civil.
É a seguinte a matéria de facto fixada em primeira instância e respetiva motivação( transcrição): Da acusação: 1) A empresa TC. – Confecções Unipessoal Lda., NIF …, com sede na Rua …, Guimarães.
2) A arguida M. B. constava como gerente de direito da sociedade, sendo que os arguidos M. E. e C. M. exerceram de facto as funções de gerentes da sociedade arguida durante o período em causa nos presentes autos, tomando todas as decisões pertinentes para o funcionamento.
3) Nesta qualidade, os arguidos M. E. e C. M. e M. B. estavam obrigados a descontar, nas remunerações pagas aos trabalhadores daquela sociedade, a cotização de 11% e aos sócios gerentes (taxa de 10%, 9,3% e 11 %, esta última a partir de Janeiro de 2013 com a redacção introduzida pela Lei 66-B/2012, de 31 de Dezembro), bem como a entregar o seu valor nos serviços da Segurança Social, até ao dia 15 do mês seguinte àquela a...
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