Acórdão nº 6420/14.6T8VNF-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Fevereiro de 2019

Magistrado ResponsávelALCIDES RODRIGUES
Data da Resolução14 de Fevereiro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório M. P. e mulher S. S. propuseram uma ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra (1º) X – Imobiliária, S.A., (2º) A. F. e mulher Maria, (3º) M. G. e mulher C. P. e (4º) M. M. e mulher M. R., pedindo que: I - se declare nulo o negócio de compra e venda do prédio urbano objecto da escritura transcrita no ponto 18 da petição inicial, ordenando-se o cancelamento do registo de aquisição subsequente, II - se declare nulo o negócio de compra e venda do veículo automóvel BMW de matricula AE, ordenando-se o cancelamento do registo subsequente; III – caso não proceda a nulidade pedida no ponto I, a condenação dos réus M. G. e mulher a pagarem o preço da compra do prédio urbano, acrescido de juros de mora, calculados à taxa legal, desde a data de realização da escritura e até efetivo pagamento, IV - caso não proceda a nulidade pedida no ponto II, a condenação dos réus M. M. e mulher a pagarem o preço da compra do veículo BMW, correspondente ao valor da avaliação do mesmo reportado à data de venda, acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde a data da declaração de venda e até efetivo pagamento.

V – se proíba a condenação da ré sociedade de vender o veículo Audi Q7 matricula BO.

Alegaram para o efeito, e em síntese, que: “(…) d - o negócio de compra e venda do prédio urbano d.1 - (…) 17.º Em 27 de dezembro de 2012, compareceram no cartório em Barcelos do notário J. S., o réu A. F., em representação da ré X-.. e o réu M. G..

18.º Em escritura designada de compra e venda fizeram consignar o seguinte: «COMPRA E VENDA (…) PRIMEIRO A. F., (…), o qual outorga na qualidade de presidente do conselho de administração e em representação da sociedade anónima “X - IMOBILIÁRIA, S.A.”, (…) SEGUNDO M. G., (…) DECLAROU O PRIMEIRO OUTORGANTE: Que, em nome da sociedade sua representada, e pelo preço de € 100 000,00, já recebido, vende ao segundo outorgante o PRÉDIO URBANO, composto pela casa de habitação de rés-do-chão, andar e logradouro, situado no lugar ..., freguesia de ..., concelho de Barcelos, descrito no registo predial sob o n.º …, (…), inscrito na matriz predial urbana sob o artigo … DECLAROU O SEGUNDO OUTORGANTE Que aceita este contrato, nos termos exarados e que o prédio adquirido destina-se exclusivamente a habitação.

(…)».

- cfr. doc. n.º 6 junto (…) d.3 - simulação do negócio 36.º Em data anterior à outorga da escritura transcrita no ponto 18.º, os réus A. F. e mulher deram conhecimento ao réu M. G., seu tio, que a casa onde habitavam se encontrava em nome da ré sociedade.

37.º Confidenciaram-lhe ainda que pretendiam ficar com essa casa, querendo retirá-la de imediato do património da ré sociedade, uma vez que eram sócios / acionistas de um conjunto de sociedades.

38.º Sendo que, essas sociedades encontravam-se com problemas económicos e receavam vir a ser acionados por efeito de avais prestados a entidades bancárias.

39.º Receavam ainda que a fazenda nacional os viesse a responsabilizar, subsidiariamente, pelas dívidas fiscais desse grupo de sociedades.

40.º Os réus A. F. e mulher confidenciaram ainda ao réu seu tio que não queriam pagar qualquer valor aos autores, também acionistas, decorrente da venda dessa casa pela ré sociedade.

41.º Nestas circunstâncias, os réus A. F. e mulher pediram ao réu M. G. que aceitasse figurar como comprador fictício do referido prédio, com o intuito de enganar os seus credores e os autores.

42.º Fazendo-os crer que a ré sociedade já não era proprietária desse prédio.

43.º O réu M. G. aceitou figurar como aparente comprador do prédio.

44.º Foi o réu A. F. que diligenciou pela marcação da escritura, pagou os emolumentos da mesma e o registo de aquisição a favor do réu M. G. - cfr. doc. n.º 7 junto 45.º Pagou também o IMT e o imposto de selo devidos pela aquisição do prédio.

46.º O réu M. G. não pagou o preço declarado de € 100 000,00, nem qualquer outro valor, que, pois, a ré sociedade não recebeu.

47.º De resto, o prédio referido é composto de rés-do-chão, 1.º andar e logradouro, encontra-se bem conservado, possui boa exposição solar e bons acessos.

48.º Este prédio vale, na realidade, € 250 000,00 (duzentos e cinquenta mil euros).

49.º Aliás, os réus M. G. e mulher não dispunham de quaisquer valores ou rendimentos que lhes permitissem comprar esse prédio urbano.

50.º Ele é reformado, recebendo uma pensão de cerca de € 500,00 e ela aufere o salário mínimo nacional, como auxiliar de cozinheira no Lar da freguesia de ..., Esposende.

51.º São os réus A. F. e mulher que pagam o IMI devido pelo prédio.

52.º São eles que o habitam, suportam as despesas com os consumos de energia elétrica, água, taxa de saneamento e quaisquer despesas com a normal conservação e beneficiação do prédio.

53.º Deste modo, a ré sociedade não quis na realidade vender ao réu M. G. o prédio urbano referido, que, consequentemente, não o quis comprar.

54.º As declarações negociais constantes da escritura de compra e venda, divergem, pois, da vontade real de cada um dos réus.

55.º O negócio aí representado é simulado e, por isso, nulo e de nenhum efeito. e - a compra e venda do veículo BMW matrícula AE (…) 57.º A ré sociedade era (é) proprietária do veículo automóvel em título.

58.º Os réus A. F. e mulher decidiram retirar esse veículo do património da ré sociedade.

59.º Para o efeito, procederam exatamente do mesmo modo referido na alínea d., servindo-se do réu M. M. para esse fim - cfr. doc. n.º 8 junto (…) 61.º É o réu A. F. que circula diariamente com este veículo, paga o imposto e o prémio de seguro devido, abastece-o de combustível e custeia as despesas de assistência e reparação do mesmo.

62.º O réu M. M. não pagou qualquer preço por esse veículo.

63.º Este réu não quis comprar esse veículo, nem a ré sociedade o quis vender.

64.º As declarações de compra e venda desse veículo divergem por isso da vontade real destes réus.

65.º A compra e venda deste veículo é, pois, também simulada.

f - pagamento do preço do prédio urbano e do veículo 65.º-A Sem prescindir, caso não se prove a nulidades das vendas do prédio e veículo, sempre os autores enquanto acionistas teriam direito a exigir o pagamento do preço desses bens.

65.º-B Os valores respetivos não entraram no património da X-.., estando os réus obrigados a efetuar o pagamento do preço, acrescido de juros de mora à taxa legal, pois que já o deveriam ter feito nas datas respetivas.

g - o veículo Audi Q7 matrícula BO 66.º Nesta data apenas se mantém em nome da ré sociedade o veículo em título - cfr. doc. n.º 9 junto 67.º O réu A. F. está a diligenciar também pela venda fictícia deste veículo a um seu familiar.

68.º Isto no mesmo circunstancialismo referido anteriormente quanto ao prédio urbano e quanto ao veículo BMW.

69.º Importa por isso impedir a venda desse veículo.

(…)”.

*Na parte final da petição inicial os recorrentes requereram, entre outras, as seguintes provas: «(…) b - a notificação dos réus M. G. e M. M. para que juntem aos autos os seguintes documentos: - os comprovativos do efetivo pagamento do preço do prédio e veículo - os extratos das suas contas bancárias dos meses de novembro de 2012 a janeiro de 2013, quanto ao prédio, e, setembro a novembro de 2013, quanto ao BMW - as suas declarações de IRS dos anos de 2012 e 2013 - os comprovativos do pagamento dos emolumentos da escritura, registo de aquisição, IMT, imposto de selo, consumos de energia, água, taxas de saneamento e IMI (prédio urbano) - os comprovativos do pagamento do IUC, prémio de seguro, gastos de combustível e assistência do veículo».

*Citados, os Réus contestaram.

*Foi proferido despacho saneador, no qual foi afirmada a validade e regularidade da instância; foi conhecido parcialmente do mérito a acção, julgando-a desde logo «parcialmente improcedente (…), no que tange ao pedido de declaração de nulidade dos negócios de compra e venda do imóvel e do veículo de matrícula AE por falta de poderes de representação e por violação do disposto no artigo 397º do CSC e do artigo 261º do CC, assim como o consequente pedido de cancelamento dos aludidos registos de aquisição e o pedido de condenação no pagamento do preço devido pela venda do imóvel e do veículo AE»; determinado o prosseguimento dos autos, «apenas, para conhecimento (i) do pedido de declaração de nulidade dos negócios de venda fundado na existência de simulação de negócio (…)»; foi definido o objecto do litígio – a «simulação do negócio de venda do imóvel titulado pela escritura de 27/12/2012 e a simulação da venda do veículo de matrícula AE» e o «propósito de concretização da venda simulada do veículo de matrícula BO» –, e enunciados os temas da prova – «Saber se existiram acordos simulatórios entre o Réu A. F. e os Réus M. G. e M. M.

»; «Saber se existiu divergência entre a vontade real e vontade declarada, com a intervenção de M. G. e de M. M. na qualidade de compradores como meros testas de ferro»; «Saber se existiu intenção de enganar (e de prejudicar) terceiros, maxime, os Autores na qualidade de accionistas e os credores da sociedade». «As relações familiares entre os Réus».

*Por despacho datado de 23/05/2016, foi determinada a notificação dos Réus para, no prazo facultado, juntarem «os documentos indicados na alínea b) de fls. 11 verso, sendo que, no que tange aos extractos bancários, deverão juntar os relativos às contas bancárias de onde foi levantado/transferido o valor destinado ao alegado pagamento dos preços. Caso os não juntem, deverão justificar a não junção em idêntico prazo».

*Na sessão de julgamento de 22/10/2018, o mandatário dos AA. formulou um requerimento «requerendo que os réus M. G. e M. M. fossem notificados pessoalmente para juntarem aos autos os documentos ainda em falta, ou seja, comprovativos do efetivo pagamento do preço do prédio e veículo, extratos das duas contas bancárias dos meses de Novembro de 2012 e Janeiro de 2013, quanto ao prédio e, Setembro a Novembro de 2013, quanto ao BMW, as suas declarações de...

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