Acórdão nº 19/18.5T8CBC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Dezembro de 2019

Magistrado ResponsávelRAQUEL BATISTA TAVARES
Data da Resolução17 de Dezembro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I. Relatório M. G.

, residente na Alameda …, freguesia de ..., concelho de Oeiras e, ocasionalmente, no lugar de ..., União de Freguesias de ..., concelho de Cabeceiras de Basto, subsequentemente a procedimento cautelar que viria a ser apensado como apenso A, veio intentar a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra J. F.

, residente na Av. ..., freguesia de ..., concelho de Cabeceiras de Basto, X – Indústria de Paletes, Lda, com sede na Zona Industrial de ..., Lote 1, concelho de Cabeceiras de Basto e M. P.

, casada com o 1.º Réu e residente na Av. ..., freguesia de ..., concelho de Cabeceiras de Basto.

Alega para tanto e em síntese, que é o legítimo proprietário de um prédio misto denominado “Cerco ...

”, situado no lugar de ..., União de Freguesias de ..., concelho de Cabeceiras de Basto, descrito na Conservatória do Registo Predial … sob o n.º .../20000829 e que a 3.ª Ré é dona do prédio denominado “Y”, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º .../20030729 e inscrito na matriz sob o artigo ..., tendo-o cedido (por comodato ou arrendamento) aos 1.º e 2.ª réus, de modo que estes o destinaram ao exercício da sua atividade industrial.

Mais alega que no dia 8 de junho de 2017 tomou conhecimento que 1.º e 2.ª Réus instalaram, no limite nascente do prédio da 3.ª Ré, a uma distância de cerca de 39,70 metros da sua casa de habitação, um equipamento de tratamento sanitário e de secagem de paletes de madeira, destinado ao extermínio do nemátodo da madeira do pinheiro, que funciona 24 horas por dia, todos os dias da semana e do fim-de-semana, produzindo barulhos ensurdecedores, superiores ao permitido pela legislação do ruído, que se propagam por mais de 100 metros e se ouvem intensamente no interior da sua casa de habitação, mesmo com todas as portas e janelas fechadas.

Que desde então, e apesar de intentado procedimento cautelar comum com o n.º 142/17.3T8CBC (apenso A destes autos), o qual foi julgado procedente, não lhe é possível repousar, descansar e dormir com sossego e tranquilidade na casa de habitação, o que lhe vem provocando danos morais.

Concluiu o Autor, peticionando a condenação dos Réus: a reconhecerem o seu direito de propriedade sobre o prédio descrito em 1.º da petição inicial; a cessarem a atividade do equipamento de secagem de paletes e a absterem-se de desenvolverem, no prédio supra descrito no artigo 13.º da petição inicial, qualquer atividade ruidosa; no pagamento de uma indemnização, por danos não patrimoniais, no montante de €20.000,00.

Regularmente citada veio a 2.ª Ré apresentar contestação, pugnando pela sua absolvição e mais requerendo a condenação do Autor, enquanto litigante de má-fé, no pagamento de uma indemnização em montante nunca inferior a €5.000,00.

Alegou, em síntese que o Autor habita em ... e apenas se desloca a Cabeceiras de Basto 2 a 3 vezes por ano e que se queixa de todas as empresas situadas no parque Industrial de ....

Que, em setembro/outubro, fez diversas obras para melhorar a insonorização e reduzir drasticamente o ruido das estufas, com a colocação de novos amortecedores e aparelhos que reduziram a vibração dos motores; que continuou a fazer novas obras de insonorização, contratando uma empresa especializada para alterar os motores das estufas de secagem por outros menos potentes e mais silenciosos, já colocados; que foi obrigada a contratar uma empresa situada em Ribeira de Pena, denominada … Florestas, Lda., para proceder à secagem de madeira, com elevados custos para si; que, por isso, deixou de utilizar o citado equipamento de secagem, ou melhor as estufas, deixando de produzir ruídos.

Alega ainda que o Autor, por não habitar permanentemente na habitação de Cabeceiras de Basto, não sofreu, ou sofre, quaisquer danos não patrimoniais tendo alegado factos que sabe não serem verdadeiros e que, por isso, atua como litigante de má fé.

Regularmente citada, a 3.ª também contestou, impugnando os factos da petição inicial com exceção dos artigos 1.º, 2.º, 12.º 13.º e 14.º e, mais, invocando exceção de ilegitimidade passiva, porquanto, em suma, nada tem que ver com a gestão da 2.ª Ré.

Em resposta à exceção de ilegitimidade passiva veio o Autor pugnar pela sua improcedência e, por outro lado, requerer a condenação da 2.ª Ré enquanto litigante de má fé, porquanto a mesma invocou factos que sabiam serem falsos na contestação, designadamente ter cessado a atividade do equipamento sanitário e de secagem de paletes.

Realizou-se audiência prévia, na qual foi conhecida e julgada improcedente a exceção de ilegitimidade passiva, e, bem assim, foi definido o objeto do litígio e enunciados os temas da prova.

Veio a efectivar-se a audiência de discussão e julgamento com a prolação de sentença nos seguintes termos, no que concerne à parte dispositiva: “Nestes termos, julgando procedente a presente ação:

  1. Condeno os réus a reconhecerem o autor como dono e legítimo proprietário do prédio misto denominado “Cerco ...”, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º .../20000829; b) Condeno os réus a que, no prédio rústico “Y”, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º .../20030729, façam cessar a atividade do(s) equipamento(s) de tratamento sanitário e de secagem de paletes de madeira que ali se encontra(m) instalado(s), e nesse prédio se abstenham de desenvolver qualquer atividade ruidosa, entendendo-se esta como qualquer atividade que continue a perturbar o autor no gozo e exercício dos seus direitos de personalidade e de propriedade; c) Condeno os réus a indemnizarem o autor, solidariamente, por danos morais, mediante o pagamento da quantia de € 10.000,00 (dez mil euros); d) Condeno a 2.ª ré como litigante de má-fé, em multa processual que se fixa em 3 U.C.’s, e em indemnização a favor do autor, prevista no artigo 543.º, n.º1, alínea a) do Código de Processo Civil, cuja quantia deverá ser liquidada, após audição das partes, em incidente próprio; e) Condeno os réus no pagamento, solidário, das custas.

    Notifique.” Inconformada, apelou a Ré X-Indústria de Paletes Lda da sentença, concluindo as suas alegações da seguinte forma: “CONCLUSÕES I - A apelante vem interpor recurso da sentença proferida pelo Tribunal a quo de 03/09/2019, que decidiu condenar a Ré no seguinte: a) a fazer cessar a atividade dos equipamentos de tratamento sanitário e de secagem de paletes de madeira no prédio rústico “Y”, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº .../20030729; b) a indemnizar, solidariamente, o Autor por danos morais, mediante o pagamento da quantia de €10.000,00 (dez mil euros); c) ao pagamento de uma multa processual fixada em 3 U.C.´s, bem como a pagar uma indemnização ao Autor, nos termos do artigo 543º, nº 1, al. a), do Código de Processo Civil, a liquidar em incidente próprio, por litigância de má fé.

    II - É contra a bondade do assim decidido que se insurge a agora apelante, sendo as razões de discordância com a sentença recorrida as seguintes: a) por considerar que a sentença é nula, por violação do disposto nos artigos 607º, nº 4 e 5 e 608º, nº 2 e 542º do CPC, por haver insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e erro notório da apreciação da prova; b) por considerar que foi violado o princípio da proporcionalidade disposto nos artigos 18º, nº 2 e 19º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa, doravante designada por CRP.

    III - O Tribunal a quo, nos pontos 7., 8., 9.,18., da fundamentação da sentença – crf. ponto III. – deu como provados os factos seguintes: a) “7. EM 08-06-2017, o autor tomou conhecimento que, a uma distância de cerca de 40 metros da sua casa de habitação no prédio “Cerco ...”, os 1.º e 2.ª réus haviam instalado, no limite nascente do prédio “Y”, um equipamento de tratamento sanitário e de secagem de paletes de madeira, que têm posto em funcionamento 24 horas por dia, de dia e de noite, todos os dias da semana e do fim de semana.” - sublinhado nosso.

  2. “8. Produzindo barulhos que se ouvem intensamente no interior da casa da habitação do autor, mesmo com todas as portas e janelas fechadas.” c) “9. Em consequência, não é possível ao autor repousar, descansar e dormir com sossego e tranquilidade naquela sua casa de habitação.” d) “18. Desde Junho de 2017 que, em consequência do ruído proveniente do prédio “Y”, o autor não utiliza aquela sua casa de habitação, encontrando-se, em consequência, perturbado e frustrado.” IV - O Tribunal a quo refere na motivação da sentença que formou a sua convicção com base nos depoimentos das testemunhas D. C. e M. D., bem como no relatório de avaliação de ruído ambiente anexo ao relatório pericial que consta dos autos.

    V - Na formação da convicção do Tribunal a quo para dar como provados os factos referidos no ponto 3. deste articulado, o mesmo valorou os depoimentos das testemunhas supra referidas, desvalorizando completamente outros depoimentos constantes nos autos.

    VI – O Tribunal a quo desvalorizou o depoimento da testemunha J. T. na parte em que se mostra favorável à apelante e valorou-o na parte em que se mostra desfavorável à mesma.

    VII - Para além disso, O TRIBUNAL A QUO NÃO TEVE EM CONSIDERAÇÃO O RELATÓRIO PERICIAL NO SEU TODO, NEM OS DEPOIMENTOS DOS PERITOS NA FORMAÇÃO DA SUA CONVICÇÃO RELATIVAMENTE AOS FACTOS INDICADOS NO PONTO 3. DESTE ARTICULADO, DESVALORIZANDO A PROVA PERICIAL JUNTO AOS AUTOS EM PROL DE PROVA COLHIDA DO DEPOIMENTO DE TESTEMUNHAS DE DÚBIA IMPARCIALIDADE.

    VIII – A testemunha D. C. tem uma irmã que tem uma relação laboral com o autor e, portanto, de dependência, sendo esse facto importante para a valoração do seu depoimento.

    IX – A referida testemunha contradiz-se ao longo do seu depoimento, consoante as questões que lhe são colocadas sejam feitas pelo mandatário do Autor ou pelo mandatário da Ré.

    X - De facto, questionada sobre se o Autor continuou a utilizar/habitar a casa depois da Ré começar ali a desenvolver a sua atividade, a testemunha responde que...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT