Acórdão nº 4778/15.9T8VNF-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelALCIDES RODRIGUES
Data da Resolução19 de Setembro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório Por sentença datada de 12/06/2015, proferida nos autos a que estes se encontram apensos e na sequência da falta de elaboração do plano de revitalização no âmbito do PER que correu termos no proc. n.º 427/14.0T8VNF, foi declarada a insolvência da sociedade X, Entreposto Comercial de Carnes S.A..

*No prazo legalmente previsto, a interessada Credora Y, SL, veio apresentar alegações nos termos do artigo 188º, n.º 1, do C.I.R.E, pugnando pela qualificação da insolvência como culposa (cfr. fls. 6 a 11).

*O Administrador da Insolvência emitiu e juntou aos autos o seu parecer, em obediência ao disposto no art. 188º, n.º 2, do C.I.R.E., pronunciando-se pela qualificação da insolvência como culposa e afetados por essa qualificação os administradores A. F., R. G. e S. C.

(cfr. fls. 42 a 45).

*Foi declarado aberto o incidente (fls. 89).

*O Ministério Público pronunciou-se no sentido da qualificação da insolvência como culposa, devendo ser afetados pela qualificação como culposa A. F., R. G. e S. C.

(cfr. fls. 91 a 93).

*Os requeridos S. C. e R. G. apresentaram oposição.

*O requerido A. F. apresentou oposição.

*O requerido F. L. apresentou oposição.

*Foi proferido despacho saneador com identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova (cfr. fls. 186 e 187).

*Designada data para o efeito, realizou-se audiência de discussão e julgamento (cfr. 250 a 256, 310, 311, 342 e 343).

*Posteriormente, a Mmª. Julgadora “a quo” proferiu sentença, datada de 29/01/2019, (cfr. fls. 344 a 355), nos termos da qual decidiu: «a) qualificar a insolvência da sociedade “X, Entreposto Comercial de Carnes, S.A..” como culposa, nos termos do artº 186º, nº 1, nº 2, e n.º 3, al. a)do CIRE; b) determinar a afectação pela referida qualificação do administrador de direito e de facto A. F. [artº 189º, nº 2, al. a), do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas]; c) não determinar a afectação de S. C., R. G. e de F. L.; d) fixar em 8anos o período de inibição do administrador para o exercício do comércio, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de actividade económica, empresa pública ou cooperativa [artº 189º, nº 2, al. c), do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas]; e) determinar a perda de quaisquer créditos sobre a insolvência ou sobre a massa insolvente detidos pelo administrador(artigo 189.º, n.º 2, al. d) Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas]; f) condenar o administrador indemnizar os credores da devedora declarada insolvente no montante dos créditos não satisfeitos, até às forças do respectivo património, sendo essa condenação solidária, no montante que não vier a ser pago após a realização do rateio final [artº 189º, nº 2, al. e), do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas]».

*Inconformado com esta sentença, A. F. dela interpôs recurso (cfr. 358 a 367) e, a terminar as respetivas alegações, formulou as seguintes conclusões (que se transcrevem): «CONCLUSÕES 68° Em síntese e na substância, o Recorrente, por via do presente Recurso, pugna pela revogação da sentença recorrida no sentido de considerar furtuita a insolvência da devedora em causa e, em consequência, libertar o Recorrente das injunções previstas no artº 189º, n° 2 do ClRE.

  1. Para tanto, o Recorrente, em contraponto com a douta sentença recorrida, demonstrou e provou que não violou:

  1. O dever de apresentação à insolvência da sua representada.

  2. O dever de apresentar as contas c) O dever de manter a contabilidade organizada, d) O dever de apresentação e colaboração até à data da elaboração do parecer referido em n° 2 do artº 188° do CIRE.

  3. Não contribuiu para o desaparecimento, de todo ou em parte considerável, do património da devedora.

    70° Com efeito, a Meritíssima Juiz do Tribunal à Quo, julgou incorrectamente a matéria de facto e respectiva prova produzida nos autos a qual, por via de julgamento correcto apenas poderia conduzir a qualificação da insolvência como furtuita.

    71º Objectivamente, os concretos meios probatórios constantes do processo impunham decisão diversa da recorrida, ou seja qualificação da insolvência como furtuita.

    DOS CONCRETOS MEIOS PROBATÓRIOS.

    72° No que concerne ao dever de apresentação à insolvência demonstrou-se e provou-se nos autos que a apresentação do PER contempla, na íntegra, todos os objectivos de apresentação à insolvência, com a vantagem de a devedora continuar a operar no mercado em condições económicas e financeiras viáveis e melhor e mais adequada protecção de credores.

    73° A apresentação a PER nos termos do artº 17º-A e segts do CIRE, paralisa o dever de apresentação à insolvência.

    74° Assim sendo, quanto a esta matéria, a decisão recorrida deve ser revogada no sentido de consignar que o Recorrente cumpriu o dever de apresentar a sua representada à insolvência.

    DO DEVER DE APRESENTAR CONTAS E MANTER A CONTABILIDADE ORGANIZADA.

    75° Refere o Sr. Administrador de Insolvência no seu douto parecer e no depoimento prestado em sede de audiência de julgamento, que a contabilidade da sociedade insolvente foi processada e manteve-se organizada até ao final do mês de Dezembro de 2014.

    76° A sociedade apresentou e requereu PER- Processo Especial de Revitalização - no mês de Setembro de 2014.

    77º Em Janeiro de 2015, através de contactos e negociações havidas com os credores da devedora, constatou-se a existência de fortes indícios de o PER não obter votos suficientes para a sua aprovação.

    78° Nesta conformidade, o espectro da declaração de insolvência da devedora deixou de ser uma assombração para ser uma realidade.

    79° É, pois, nestas circunstâncias que a devedora já com redução de recursos humanos se vê impossibilitada de continuar a manter a contabilidade actualizada, mantendo, contudo, a mesma, organizada.

    80° Aliás, em Maio de 2015, apenas quatro meses após ter sido parcialmente interrompido o processamento da contabilidade da devedora, esta foi declarada insolvente.

    81º Ora, estes escassos quatro (4) meses em que o processamento da contabilidade da sociedade insolvente foi parcialmente interrompido, por si só, não prejudica a compreensão da situação patrimonial e financeira da devedora e muito menos ocorre a violação do princípio da materialidade.

    82° Aliás, o Exmo Sr. Administrador de Insolvência no seu douto parecer e no depoimento prestado em sede de audiência de julgamento afirmou que a contabilidade da devedora encontrava-se devidamente processada de forma a evidenciar com clareza todos os elementos relevantes passíveis de afectar avaliações ou decisões do responsável da empresa.

    83° Assim sendo, como é, não se vislumbra a possibilidade de a contabilidade da devedora tal como foi entregue ao Exmo Sr. Administrador de Insolvência. prejudicar a compreensão da situação patrimonial e financiamento da devedora.

    84° Nesta conformidade, quanto a esta matéria a decisão recorrida deve ser revogada no sentido de considerar que o Recorrente enquanto órgão social incumbido da administração da devedora, cumpriu o dever de manter a contabilidade organizada.

    III - DO DEVER DE APRESENTACÃO E COLABORACÃO ATÉ À DATA DA ELABORAÇÃO DO PARECER REFERIDO EM Nº 2 DO ARTº 188° DO CIRE.

    85° O Exmo Sr. Administrador de Insolvência, no seu depoimento prestado em audiência de julgamento, esclareceu o Tribunal que o Administrador da devedora/insolvente - A. F. - lhe tinha voluntariamente facultado todos os elementos contabilísticos disponíveis da devedora, tendo, para o efeito, visitado o Exm" Sr. Administrador da Insolvência no escritório deste.

    86° Na data da visita e entrega de todos os elementos contabilísticos disponíveis, que ocorreu antes da data da elaboração do parecer referido em nº 2 do artº 188º do CIRE, o ora Recorrente manifestou perante o Exmo Sr. Administrador de Insolvência total e absoluta disponibilidade p/ colaborar e prestar todas as informações tidas por convenientes.

    87º A douta sentença recorrida, discricionariamente e à luz da livre convicção do Tribunal, refere que «para nós ficou claro que, apesar do contacto pessoal, nenhuns esclarecimentos cabais foram prestados».

    88° É, apenas, por via desta livre convicção do Tribunal à Quo, que na douta sentença se concluiu que o Recorrente enquanto órgão social incumbido da administração da devedora, violou o dever de colaboração a que alude o n° 2, alínea i) do artº 186º do CIRE.

    89° A violação dos deveres de apresentação e colaboração até à data da elaboração do parecer referido no n° 2 do artº 188º do ClRE, implica, necessariamente, incumprimento reiterado de tais deveres, o que de facto jamais ocorreu.

    90° Assim sendo, no que concerne a esta matéria, a decisão recorrida deve ser revogada no sentido de considerar que o Recorrente, enquanto órgão social incumbido da administração da devedora, cumpriu os deveres de apresentação e colaboração até à data do parecer referido no nº 2 do artº 188° do CIRE.

    DO DESAPARECIMENTO DE TODO OU EM PARTE CONSIDERÁVEL DO PATRIMÓNIO DA DEVEDORA: 91º Como resulta claro do conteúdo da douta sentença recorrida, o património da insolvente não foi destruído, não foi danificado, não foi inutilizado, não foi ocultado, nem desapareceu.

    92° O património da devedora, foi objecto de vários negócios que visavam agilizar e tornar mais «leve» a estrutura operacional na perspectiva da votação favorável do PER e em consonância com as propostas apresentadas neste.

    93° Aliás, justamente em consonância com as propostas apresentadas no PER - redução de custos operacionais - não se justificava a manutenção do contrato de locação financeira do imóvel no qual a devedora exercia a sua actividade.

    94° Tal contrato implicava um custo mensal - renda - absolutamente incompatível com as propostas apresentadas no PER.

    95° É, pois, nestas circunstâncias que ocorreu a cessão da posição contratual que a devedora mantinha em tal contrato, 96° deslocando-se a actividade da...

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