Acórdão nº 2723/20.9T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Novembro de 2021
Magistrado Responsável | SANDRA MELO |
Data da Resolução | 04 de Novembro de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES identificação do processo Autor e Apelante: A. G..
Ré e Apelada: Empresa ... de Elastómeros, Lda.
autos de ação de anulação de deliberações sociais I.
Relatório decisão recorrida: O presente recurso, com efeito meramente devolutivo, vem interposto da sentença que julgou a ação improcedente e absolveu a Ré do pedido.
A mesma veio precedida do seguinte despacho, a que o Recorrente se refere, discordando, nas suas alegações, mas que não foi objeto das conclusões deste recurso: “Por manifesto lapso, motivado pela consulta do processo por meios telemáticos, julgo verificada a nulidade arguida pelo R., e, ao abrigo do disposto no art.º 615, 1, d), declaro nula a sentença proferida, passando a produzir-se sentença sanada da apontada irregularidade.” Aliás, apesar das conclusões do recurso serem extensas e intrincadas, apenas se debruçaram sobre a matéria de fundo da sentença, reproduzindo as conclusões que haviam sido apresentadas nas contra-alegações do recurso que deu origem a este despacho, pedindo, apenas, no final, em vez da improcedência do recurso, a sua procedência.
Vejamos, para melhor contextualização, os atos processuais mais relevantes para o conhecimento deste recurso.
Na petição inicial que apresentou, o Autor pediu que fossem declaradas inválidas, as deliberações adotadas nos pontos 1 e 2 da AGE realizada em 19/08/2019, bem como ser ordenado o cancelamento dos registos resultantes das referidas deliberações, com todas as legais consequências daí decorrentes.
Alegou, para tanto, em síntese: é titular de metade do capital social da Requerida, assumindo, tal como o titular da outra quota, a qualidade de gerente. A requerida vinculava-se com a assinatura de estes dois específicos gerentes, mas foi deliberada a destituição do A. do cargo de gerente – ponto um – e a nomeação para tal cargo de H. N. – ponto dois - . Apontou para a violação de um conjunto de preceitos legais que teriam sido violados com tais deliberações, o que determinaria a sua invalidade.
Em 09-09-2020, foi proferido despacho que considerou confessados os factos articulados pelo Autor e determinou o cumprimento do disposto no n.º 2 do artigo 567º do Código de Processo Civil.
Em 21-9-2020, a Ré veio invocar justo impedimento e requerer que fosse admitida a contestar a ação contra si intentada; após a oposição do Autor, a contestação não foi admitida, porquanto tal situação de justo impedimento foi julgada improcedente, por não verificada, em conclusão de 8-10-2020.
Quer o Autor (em 24-9-2020), quer a Ré (em 6-10-2020), apresentaram alegações nos termos do artigo 567º, n.º 2 do Código de Processo Civil.
Foi proferida sentença, notificada às partes por ato de 29-01-2021, com o seguinte decisório “aderindo por completo aos fundamentos de facto e de direito invocados pela A., e dada a falta de contestação da R., regularmente citada, julgo procedente a presente ação, declarando anuláveis as deliberações adotadas nos pontos 1 e 2 da AGE realizada em 19/08/2019, bem como ser ordenado o cancelamento dos registos resultantes das referidas deliberações, com todas as legais consequências daí decorrentes, por violação dos art.ºs 58,1, c) e 4,
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Código das Sociedades Comerciais”.
Em 4-2-2021, a Ré apresentou requerimento de interposição de recurso, invocando, em curtíssima súmula, nulidades da sentença, apontando falta de enunciação das questões que lhe cabia solucionar, de especificação dos factos provados e não provados, omissão de conhecimento de questões que lhe cumpria conhecer e afirmando a caducidade do direito de arguir as anulabilidades invocadas na petição, concluindo que a sentença violou as disposições legais em que se louvou, pelo que deve ser revogada.
Em 8-3-2021 o Autor apresentou contra-alegações, defendendo que “não se encontrava obrigado o Meritíssimo Juiz “a quo” a fazer mais do que efetivamente determinou, devendo improceder quaisquer nulidades imputadas pela Recorrente quanto ao cumprimento dos requisitos da perfeição da sentença” e concluindo, após as 140 proposições das suas conclusões, que o recurso interposto devia improceder.
Em 1-4-2021, foi proferido o despacho supramencionado, que, julgando verificada a nulidade arguida pelo Réu ao abrigo do disposto no artigo 615º, nº 1 alínea d) do Código de Processo Civil, declarou nula a sentença proferida, com a produção de nova sentença “sanada da apontada irregularidade.” É desta sentença que o Autor recorre, apresentando as seguintes conclusões, que pela sua extensão, se reduzem, expurgadas de parte do seu excesso: “18. …devendo improceder quaisquer nulidades imputadas pela Recorrente quanto ao cumprimento dos requisitos da perfeição da sentença.
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E, até na subsunção dos fatos (derivados da confissão ficta), ao Direito não existe qualquer óbice ao procedimento levado a cabo na sentença sob recurso.
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Assim, dever-se-ão considerar como confessados os seguintes: 21. A sociedade Requerida tem por objeto a indústria de recobrimento de elastómeros, e um capital social de € 575.000,00.
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Capital social esse que se encontra dividido em duas quotas, sendo uma, no valor nominal de € 293.250,00, pertença do sócio S. D., e outra, no valor nominal de € 281.750,00, pertença do aqui Requerente.
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Assumindo ambos, até ao passado dia 19/08/2019, a qualidade de gerentes, e desde a constituição da sociedade, vinculando-se a mesma, com a assinatura de estes dois específicos gerentes.
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Verificando-se, por esta via, que o Requerente possui a qualidade de sócio da Requerida, enquanto requisito de legitimidade ativa para o presente procedimento cautelar.
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Por carta datada de 30/07/2019, o ora Requerente – não obstante a qualidade de gerente - foi confrontado com a sua convocação para a realização de uma Assembleia Geral Extraordinária (AGE) da Requerida, a realizar em 19/08/2019.
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Constando da mesma, como pontos a submeter à deliberação da Assembleia os seguintes: (1) Discussão e votação de proposta de destituição do gerente A. G.. (2) No caso de ser deliberada a destituição do gerente A. G., apreciação e votação de propostas de nomeação de gerente para ocupar o cargo do gerente referido.
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Por carta datada do dia 07/08/2019 e entregue na Requerida em 07/08/2019 o aqui Requerente, face ao teor da convocatória recebida interpelou o gerente que procedeu a convocatória (S. D.), nos seguintes termos: “Foi com enorme surpresa que recebi a convocatória para uma Assembleia Geral Extraordinária da sociedade (AGE) de que ambos somos sócios. Sobretudo com os pontos que decidiu, unilateralmente e secretamente enunciar. Tudo o que me obriga a dizer e requerer-lhe o seguinte: (1) Explicite, atenta a formulação genérica e vaga constante do ponto 1 da convocatória para a AGE, no prazo máximo de 3 dias, quais os documentos e fundamentos nos quais estriba a sua pretensão de me destituir da gerência da sociedade, para que possa defender-me perante tal situação. (2)Tanto assim que me chegou ao conhecimento que já transmitiu a colaboradores da empresa que, após a data indicada para a AGE, eu deveria ser impedido de entrar nas instalações da sociedade, se assim o pretendesse fazer. (3) Como saberá, trata-se de um comportamento ilegal que, a concretizar-se (e pelo exposto em 2 para si é já uma certeza) causará prejuízos tremendos à minha pessoa mas, sobretudo, á nossa sociedade. (4) Porquanto, atento o previsto nos estatutos sociais, por um lado, os sócios terão que ser gerentes, existindo um direito especial à gerência, sendo necessária a assinatura conjunta de nós os dois como gerentes e não de quaisquer outros gerentes. (5) E, por outro, a gerência não poder ser exercida por não sócios, o que determinará, caso persista nos seus ilegais intentos, a mais que provável, paralisação total da sociedade. (6) Aproveito, também, para que possa ser objeto de ponderação e votação, que indique - se é que tem - a pessoa concreta que tem em vista para o exercício do cargo de gerente, porquanto o ponto 2 da ordem de trabalhos é, creio agora, deliberadamente, omisso quanto a tal aspeto. (7) Solicito, ainda, que seja incluído, nos pontos a serem discutidos na AGE convocada, o seguinte ponto adicional: “apreciação e discussão acerca do relacionamento empresarial, comercial e financeiro da sociedade com as sociedades L. T. – Lda. e, sobretudo, P. F., Unipessoal, Lda.”. (8) Bem como a inclusão, em consequência do anteriormente invocado, do seguinte ponto adicional: “deliberar a exclusão do sócio S. D.”. (9) Finalizando, atento tudo quanto se requereu e alegou, seja a AGE viabilizada através de Cartório Notarial competente, sob a participação da respetiva Notária, o que se requer seja confirmado em 3 dias a contar de hoje. (10) Bem como, em igual prazo, confirmação acerca da possibilidade de eu ser acompanhado por mandatário ou perito técnico, em sede de AGE”.
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Tendo solicitado resposta em 3 dias a contar da presente data, por forma a que pudesse organizar e preparar, devidamente, a AGE unilateralmente convocada pelo também gerente S. D.
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Por carta datada de 12/08/2019 – cuja cópia se junta sob o documento 5 - o gerente da Requerida (S. D.) enviou resposta ao pedido de informação, esclarecimento e inclusão de pontos na ordem de trabalhos formulado pelo Requerente na sua missiva de 07/08/2019; 30. O gerente da Requerida S. D., em representação da mesma e na mesmíssima qualidade em que procedeu, unilateralmente, à convocatória para a AGE, negou ter que responder ou esclarecer, ou informar “ao que quer que seja do que lhe é requerido”, que a inclusão de novos pontos na ordem de trabalhos não foi requerida tempestivamente e, por último, relega para o início da AGE a decisão de admissão, ou não, de o Requerido ser acompanhado por mandatário.
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O A. Requerido, atento o conteúdo da convocatória, ali compareceu, na data e hora aprazadas, acompanhado de mandatário.
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Mandatário que foi impedido, desde logo, de acompanhar o Requerido pelo então gerente e autoproclamado Presidente da Mesa...
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