Acórdão nº 2722/20.0T8BCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 13 de Julho de 2021

Magistrado ResponsávelJOSÉ CRAVO
Data da Resolução13 de Julho de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães*1 – RELATÓRIO Nos presentes autos de procedimento cautelar de restituição provisória da posse (1) em que figura como requerente Fábrica da Igreja Paroquial de X, com sede na Rua …, nº …, freguesia de X, concelho de Barcelos, e requeridos M. A.

, residente no Lugar de ...

, freguesia de X, concelho de Barcelos, J. O.

, residente no Lugar de ...

, freguesia de X, concelho de Barcelos, e J. A.

, residente no lugar de ...

, freguesia de X, concelho de Barcelos, decidiu-se por sentença de 16-12-2020, pela sua procedência parcial, ordenando-se a restituição provisória da posse à Requerente do prédio descrito em 1) e 3) dos factos provados e foram os Requeridos condenados a remover a vedação descrita em 16) dos factos provados e a absterem-se de praticar quaisquer actos que ponham em causa a posse da Requerente sobre o referido prédio.

O auto de restituição provisória da posse consta de fls. 81 dos autos.

* Notificados da decisão, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 366º n.º 6 e 372º do Código de Processo Civil, vieram os Requeridos deduzir oposição, nos termos constantes de fls. 87 a 94, onde, em síntese, alegam que a cedência do prédio que efectuaram à Requerente foi meramente precária, pelo que a posse por aquela exercida sobre o prédio é ilegítima, ademais porque a Requerente tomou posse do prédio na pendência da acção que correu termos entre as partes e onde aquela pretendia ver reconhecido o direito de propriedade sobre o prédio, o que não conseguiu.

Sustentaram, ainda, que devem dar-se como não provados os factos dados por provados em 4), 5), 6), 7), 8), 9), 10), 11), 12) e 13) cuja fundamentação assentou na autoridade do caso julgado, pois o caso julgado apenas abrange o segmento decisório.

* A Requerente pronunciou-se quanto ao teor da documentação junta pelos Requeridos e pugnou pela condenação destes como litigantes de má fé.

*Procedeu-se à realização da audiência final, nos termos e ao abrigo do disposto no 367º/1 do CPC, como da respectiva acta melhor consta.

*No final, foi proferida a seguinte decisão: “Destarte e por todo o exposto, julga-se improcedente a oposição deduzida pelos Requeridos M. A., J. O. e J. A.

e, consequentemente, mantém-se a restituição provisória da posse ordenada nos autos.

Custas a cargo dos Requeridos – artigo 539º, nº 1, do Código de Processo Civil.

Notifique e registe.” *Inconformados com essa decisão, apresentaram os Requeridos recurso de apelação contra ambas as decisões, cujas alegações finalizaram com a apresentação das seguintes conclusões: 1ª – 1ª questão: - quer o pedido principal, quer o subsidiário desta providência, ambos se reduzem ao mesmo objeto – “impedimento do direito de servidão de passagem”. Porém, compulsando a causa de pedir não se identifica qual o prédio dominante e serviente da servidão de passagem, nem a localização e extensão do caminho de servidão – verificando-se uma contradição entre o pedido e a causa de pedir.

  1. – 2ª questão: - “esbulhar” uma coisa é privar, retirar alguém do seu uso – o que já contém em si violência sobre uma coisa.

    Por isso, a violência a que se refere o artº 1279, conjugado com o artº 1261º,2 e o artº 255 todos do CC, exige uma carga maior – o “esbulho violento”. Este pressupõe sempre uma coação sobre pessoas por via direta ou indireta.

  2. – Para que a coação indireta se verifique é necessário que a violência sobre as coisas seja de tal maneira forte que constitua ela própria uma ameaça que amedronta o possuidor a não reagir, a deixar-se desapossar da coisa.

  3. – Provando-se apenas que … “na terceira semana de Novembro/2020, os Requeridos entraram no prédio e colocaram uma vedação composta de estacas e arame em toda a extensão da confrontação com caminho vicinal, situado a norte, ficando a Reqte impedida de aceder ao mesmo para proceder à sua manutenção e limpeza” (facto 16 e 17 da 1ª decisão), concluímos que: a) – o meio de vedação é frágil; um simples alicate abriria uma entrada num minuto … - cfr. doc. 9 da PI.

    1. – confrontando o terreno com o adro da igreja da Reqte - cfr. doc. 4 da PI cautelar - torna-se desnecessário o acesso pelo caminho de servidão.

    2. – a colocação de 3 ou 4 fiadas de arame amarradas a estacas após a decisão do ac. RG de 15.10.2020 com o esclarecimento de que os Requeridos foram absolvidos de todos os pedidos (incluindo do pedido de entrega e inutilidade superveniente da lide) tal atuação só pode significar que os Requeridos, anteriores possuidores do prédio, procederam ao exercício do seu direito de retomarem a posse do prédio conforme o faziam antes da instauração da ação nº 1942/18 (e não que pretenderam amedrontar alguém …).

    3. – contrariamente aos Requeridos, a Reqte não usufrui do prédio, já que apenas precisa de lá entrar para “manutenção e limpeza”.

    4. – tratando-se de um prédio rústico, cultivando-o os Requeridos com ervas aromáticas, fica assegurada a manutenção e limpeza do prédio.

  4. – Sobre a tese aqui defendida vide: - Manuel Rodrigues, in “a Posse”, 1981, pág. 366; - Orlando de Carvalho, in “Dtº das Coisas”, pág. 283/284; - Miguel Teixeira de Sousa, in anot. ao ac. da Rel. Guimarães de 6.12.2018, procº nº 2817/18.0T8VCT in blogippc.blogspot.com.

    - Ac. RG de 19.3.2020, dgsi, procº 281/19.6T8PRG (um cadeado).

    - ac. STJ de 19.5.2020, in CJ/STJ II, pág. 68, que procura definir a Jurispª sobre a matéria - negando a providª de r.p.p. num caso igual ao dos autos – “foi colocada uma rede para impedir a utilização de um caminho” … - outros Ac.s recusam a providência em casos como a colocação de um pedregulho à entrada de um caminho, etc.

    - vide, ainda “o conceito de violência” e a evolução da Jurispª, Carlos Gabriel Silva Loureiro, in “O Direito em Dia”, publicado na Net em 10.11.2020.

  5. – 3ª questão: - Deve também indeferir-se o pedido subsidiário (artº 362 e 379, CPC), uma vez que para além do “fumus boni juris”, a lei exige a “grave lesão e dificilmente reparável” – que inexiste e nem sequer foi alegada pela Reqte – cfr. parte final do facto 17 da 1ª decisão.

  6. – 4ª questão: - Deve dar-se como “Provada” a matéria alegada no item 1º, 2º, 3º e 4º da Oposição, conjugada com a decisão do ac. RG de fls 41, ss. e com o Facto 15 da 2ª decisão – “desde 4.12.2019, a Reqte está na posse do prédio”.

    Para tanto, os Requeridos apresentam como meio de prova o doc. 1, junto à n/Oposição, não impugnado pela Reqte e o aludido ac. de fls 41, ss.

  7. – 5ª questão: - Deve dar-se por adquirido no presente recurso que na decisão de improcedência do Pedido de entrega formulado pela aqui Reqte na ação nº 1942/18, o douto ac. RG de 15.10.2020 (fls 41, ss) teve em consideração a “confirmação da sentença recorrida na parte em que a autora não logrou provar a aquisição derivada da propriedade referente à parcela de terreno em causa, nem a aquisição originária, nem ainda pode beneficiar da presunção inerente à posse prevista no artº 1268-1, CC” – cfr. fls 61v.

  8. – 6ª questão: - Deve dar-se como adquirido no presente recurso que na decisão de improcedência do pedido de entrega formulado pela A. aqui Reqte no procº 1942/18, o aqui douto ac. RG de 15.10.2020 teve consideração que a Reqte ocupou o prédio em 4.12.2019, tendo esclarecido em despacho posterior que a decisão do acórdão contemplou também essa questão, ao revogar o pedido de inutilidade superveniente da lide, mais esclarecendo que a Reqte não tinha o direito de pedir a entrega do prédio aos RR, aqui Requeridos – cfr. doc. 3 da Oposição, não impugnado pela Reqte.

  9. – 7ª questão: - considerando-se as conclusões anteriores e o douto ac. RG de 15.10.2020, estão definitivamente julgadas as seguintes questões: 1ª – a escritura de justificação e doação de 30.9.04 não transmitiu a propriedade do imóvel para a A. e, por essa questão, a A/Reqte não podia, nem pode aqui, pedir a entrega do mesmo imóvel; 2ª – a A/Reqte não tem a posse do imóvel, por si e antepossuidores (alegação que fez tb na ação 1942/18) e por esta questão não podia, nem pode aqui, pedir a entrega aos Requeridos do imóvel; 3ª – a “posse” por via da ocupação que a Reqte fez do imóvel em 4.12.2019 e consequente pedido de inutilidade superveniente da lide foi considerado naquele douto ac. RG, tendo sido revogado o pedido de inutilidade superveniente da lide, pelo que também com base nessa questão declarou ilegítima a ocupação que fez do imóvel em 4.12.2019 – cfr. esclarecimento do doc. 3 junto à Oposição Cautelar, pelo que não pode a Reqte submeter novamente tais questões (propriedade e posse do prédio e ocupação de 4.12.2019) como fundamento deste novo pedido, e agora sob a capa da restituição do prédio, por ofensa de caso julgado.

  10. – 8ª questão: - com o devido respeito, face à decisão das questões submetidas à apreciação daquele douto ac. RG, que julgou a improcedência dos pedidos, vg, de entrega, não vemos como é possível qualificar como “esbulho violento” o ato dos RR de, após a decisão do douto acórdão, procederem ao normal exercício do seu direito, recuperando a posse do prédio de que vinham usufruindo desde há dezenas de anos – cfr. factos provados 1 a 8 e facto 10 e 11 da 2ª decisão recorrida.

  11. – 9ª questão: - Deve dar-se como “não provados” os factos 4) a 13), inclusive da 1ª decisão cautelar recorrida, conforme pedido final dos Requeridos na sua Oposição, uma vez que: - “o caso julgado num 1º processo, transitado, não se estende aos factos aí dados como provados para efeito desses mesmos factos poderem ser invocados, isoladamente, da decisão a que serviram de base, num outro processo … os fundamentos de facto não adquirem quando autonomizados da decisão de que são pressuposto, valor de caso julgado, de modo a poderem impor-se extra processualmente” – cfr. douto e recente ac. STJ de 17.5.2018, procº 3811/13.3T8PRD, dgsi no qual se expôs grande resenha doutrinal e jurisprudencial desta questão.

  12. – 10ª questão: - tendo o douto ac. RG de fls 41, ss integrado na decisão a ocupação que a Reqte fez do prédio em...

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