Acórdão nº 6438/15.1T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 13 de Julho de 2021

Magistrado ResponsávelPAULO REIS
Data da Resolução13 de Julho de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. Relatório J. P.

, F. L.

, R. A.

, F. M.

, I. P.

e mulher, A. M.

, M. P.

e marido, E. N.

, A. F.

e mulher, M. L.

, instauraram ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra Café Restaurante ...

, Lda.

, pedindo: a) seja declarado e reconhecido o direito de propriedade da herança aberta por óbito de B. J. e L. P., de que são únicos e exclusivos herdeiros, sobre o prédio que identificam; b) seja declarado e reconhecido que a ré ocupa o rés do chão do dito prédio precariamente e sem título, utilizando-o para atividade de restauração; c) seja a ré condenada: i) a reconhecer o constante das alíneas a) e b) e, consequentemente, a desocupar o rés-do-chão do dito prédio, restituindo-o devoluto de pessoas e coisas; ii) a abster-se da prática de quaisquer atos que atentem contra o direito de propriedade da dita herança sobre o aludido prédio; iii) a indemnizar a herança na quantia de € 2500, por mês, a título de danos patrimoniais por privação de uso do rés do chão do referido prédio, desde Julho de 2015 até efetiva entrega daquele, calculando-se os montantes já vencidos – com referência a 9 de Outubro de 2015 –, em € 7500, acrescido de indemnização relativa aos meses vincendos, de igual montante, até efetiva entrega do rés do chão do aludido prédio, devoluto de pessoas e coisas; iv) a indemnizar os autores na quantia de € 5000, na proporção de € 1000 para cada um dos cinco, a título de danos não patrimoniais; v) a pagar à herança, a título de sanção pecuniária compulsória, a quantia de € 500 por cada dia, no caso de persistir no uso e ocupação do rés-do-chão do dito prédio, após o trânsito em julgado da sentença e até cessar efetivamente esse uso e ocupação.

Para o efeito alegam, em síntese, que são os únicos herdeiros da herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de B. J. e de L. P., titular do direito de propriedade sobre o prédio que identificam, cujo rés do chão é ocupado pela ré sem qualquer título para o efeito, recusando restituí-lo aos autores e utilizando-o para o exercício da atividade de restauração, contra a vontade daqueles, o que lhes tem causado danos patrimoniais e não patrimoniais.

A ré contestou, arguindo a ilegitimidade ativa, por falta de intervenção de um dos herdeiros da herança em causa, e impugnando parte da factualidade alegada, sustentando que tomou de arrendamento o rés do chão do aludido prédio em 11-02-1981, que o contrato cessou em 2015 no contexto que descreve e que lhe assiste o direito a ser indemnizada pelo valor de obras que executou no imóvel, com autorização do senhorio, invocando o direito de retenção sobre o imóvel reivindicado até pagamento do montante indemnizatório.

Mais deduziu reconvenção contra os autores, pedindo: i) sejam os autores condenados a pagar-lhe uma indemnização correspondente ao valor das benfeitorias por si executadas no prédio em causa, no valor total de € 204. 244,64, acrescido de juros à taxa legal desde a citação até efetivo e integral pagamento; ii) se reconheça à ré o direito de retenção do prédio, em virtude da realização de obras de beneficiação que constituem benfeitorias úteis e necessárias, suspendendo-se a obrigação de restituir o imóvel enquanto não lhe for paga a indemnização; iii) subsidiariamente, na improcedência dos pedidos anteriores, se condene os autores a restituir a quantia de € 204.244,64, por força da aplicação do instituto do enriquecimento sem causa, acrescida de juros legais desde a citação até integral e efetivo pagamento; iv) sejam os autores condenados a pagar à ré a quantia de € 7.000,00 a título de indemnização por danos patrimoniais.

Os autores apresentaram réplica, articulado no qual se pronunciam quanto à matéria de exceção deduzida na contestação, defendem a inadmissibilidade da reconvenção e contestam o pedido reconvencional.

Os autores deduziram incidente de intervenção principal de A. A.

.

A ré apresentou articulado no qual se pronuncia quanto à matéria de exceção invocada na contestação à reconvenção constante da réplica, bem como invoca a litigância de má fé por parte dos autores.

Por despacho de 19-11-2017, foi admitida a intervenção principal provocada de A. A.

.

Por despacho de 30-04-2018, foi admitida a reconvenção quanto aos dois primeiros pedidos principais e ao pedido subsidiário, sendo rejeitada quanto ao pedido indemnizatório formulado, mais se proferiu despacho saneador, no qual se considerou suprida a ilegitimidade face ao incidente de intervenção principal provocada, após o que se procedeu à identificação do objeto do litígio e à enunciação dos temas da prova.

Realizou-se a audiência final - no decurso da foi admitida a intervenção principal de R. F., que declarou aceitar os articulados apresentados pelos autores -, após o que foi proferida sentença, que decidiu o seguinte: «Em face do exposto, o Tribunal: A. Julgando a ação e a reconvenção parcialmente provadas e procedentes: a) declara que a herança aberta por óbito de B. J. e L. P., representada pelos Autores J. P., F. L., R. A., F. M., I. P., M. P. e marido E. N., A. F. e mulher M. L. e pelas Intervenientes Principais R. F. e A. A., é proprietária do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...

/20010508-Y, situado na Rua ...

, inscrito na matriz sob o artigo ...

, composto por casa de rés-do-chão, primeiro e segundo andares, com logradouro, a confrontar de norte com J. I., sul e nascente Parque Municipal Desportivo e poente estrada municipal; b) declara que a Ré Café Restaurante ...

, Ld.ª, desde 29 de Julho de 2015, ocupa a parte do prédio identificada nos pontos 11) e 22) da fundamentação de facto, utilizando-o, sem título, para atividade descrita no ponto 26) da fundamentação de facto; c) condena a Ré a reconhecer o que consta das alíneas a) e b); d) condena a Ré a indemnizar a herança identificada em a) na quantia mensal de € 1.500, a título de danos patrimoniais pelo exercício de atividade lucrativa em violação do direito de propriedade na parte do prédio identificada nos pontos 11) e 22) da fundamentação de facto, desde 29 de Julho de 2015 até à cessação da utilização identificada em b); e) condena a herança identificada em a) a pagar à Ré a indemnização que vier a ser liquidada em incidente de liquidação relativamente às benfeitorias necessárias descritas na fundamentação de facto sob os pontos 36) e 29) u) e a benfeitoria útil identificada no ponto 29) v); f) condena a herança identificada em a) a reconhecer o direito de retenção da Ré destinado a garantir o direito de crédito reconhecido em e), onerando o espaço identificado em b), enquanto não pagar a indemnização que resultar do incidente de liquidação; g) condena a Ré a desocupar a parte do prédio identificada em b), restituindo-o à herança identificada em a), devoluto de pessoas e coisas, contra o pagamento do valor aludido em e) e a abster-se, após esse momento, da prática de quaisquer atos que atentem contra o direito de propriedade da dita herança sobre o prédio; h) absolve a Ré dos restantes pedidos formulados pela herança identificada em a).

  1. Julga improcedente o primeiro incidente de litigância de má suscitado pela Ré e procedente o segundo, condenando o Autor J. P., na qualidade de autor da declaração identificada no ponto 44) da fundamentação de facto, como litigante de má fé na multa de 5 UCs e no pagamento à Ré, a título de indemnização, o montante de 1.814,25 correspondente ao custo da perícia.

    Custas: a) da ação a cargo da herança representada pelos Autores e da Ré, na proporção de 2/10 e 8/10, respetivamente b) da reconvenção a cargo da Reconvinte e das heranças representadas pelos Autores, na proporção de 6/10 e 4/10, respetivamente.

    1. do primeiro incidente de litigância de má fé a cargo da Ré e do segundo incidente a cargo do Autor identificado em B), com fixação da taxa de justiça em 1 UC em cada um deles.

    Registe e notifique.» Inconformada, a ré apresentou-se a recorrer, pugnando no sentido da revogação da sentença, na parte relativa às alíneas d) e e) do dispositivo, terminando as alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem): «1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida a fls. dos autos, que condenou a Ré a indemnizar a herança (representada pelos Autores) na quantia mensal de € 1.500,00 desde 29 de Julho de 2015 e condenou a herança (representada pelos Autores) a pagar à Ré a indemnização que vier a ser liquidada em incidente de liquidação relativamente às benfeitorias necessárias descritas na fundamentação de facto sob os pontos 36) e 29) u) e a benfeitoria útil identificada no ponto 29) v); 2. Sem prescindir da extensa motivação constante da douta sentença recorrida, não pode a Apelante conformar-se com a mesma, mormente no que diz respeito às condenações acima descritas, que se traduzem numa intolerável situação de injustiça, materializada num injustificado enriquecimento sem causa dos Autores/Recorridos.

    3. O recurso versa as decisões da matéria de facto e da matéria de direito, porquanto o Tribunal a quo fez uma apreciação errada da prova produzida nos autos, errada subsunção da mesma ao direito aplicável e violou, inclusivamente, as regras aplicáveis à repartição do ónus da prova.

    4. A sentença recorrida condena os Autores a indemnizarem a Ré quanto às benfeitorias descritas nos pontos 36), 29) u) e 29 v) dos factos provados, que correspondem, salvo o devido respeito, a uma insignificância no plano das obras que a Ré realizou ao longo de vários anos e que valorizaram o imóvel em € 122.655,97 (valor este já deduzido do respetivo desgaste e depreciação das obras) (cfr. ponto 40. dos factos dados como provados).

    5. Existem obras que contribuíram para a valorização do prédio e que não podem ser levantadas sem detrimento do mesmo (pontos 35. e 40. dos factos provados), sem que o Tribunal a quo, injustificada e inexplicavelmente, as tenha atendido para efeitos de indemnização, dando origem a uma, inaceitável...

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