Acórdão nº 4279/17.0T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 23 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelANTÓNIO FIGUEIREDO DE ALMEIDA
Data da Resolução23 de Junho de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO

  1. X Imobiliária SA veio intentar ação declarativa, com processo comum, contra C. L., A. C.

    e J. C.

    , onde conclui pedindo que a ação seja julgada procedente, por provada e, por via disso:

    1. Sejam declaradas falsas as declarações prestadas pelos 1ºs réus na escritura de justificação e doação realizada no dia 27 de junho de 2014, identificada no artigo 1º da p.i.; b) Seja declarado e reconhecido que os prédios mencionados e identificados na escritura referida na alínea anterior não eram nem são propriedade dos 1ºs réus, não se tendo tão pouco operado a usucapião aí alegada; c) Seja declarado e reconhecido que tais prédios fazem parte integrante do prédio identificado no artigo 6º da p.i.; d) Seja declarada nula a doação feita pelos 1ºs réus ao 2º réu dos prédios objeto da mesma escritura de doação realizada no dia 27 de junho de 2014; e) Seja ordenado o cancelamento de todos os registos feitos com base na escritura de justificação e doação referida no artigo 1º ou dele consequentes; f) Sejam os réus condenados a verem reconhecidos os direitos referidos e declarados nas alíneas anteriores e, consequentemente, a reconhecer que a autora é dona e legítima possuidora dos prédios identificados na petição; g) Condenados os réus a reconhecer que não adquiriram os direitos de propriedade e de posse do prédio identificado no artigo 1º da p.i., por qualquer meio legítimo de transmissão de tais direitos, e que não são donos, nem legítimos possuidores de tais prédios; h) Condenados os réus a não mais perturbar os direitos de propriedade e de posse da autora sobre o prédio identificado no artigo 6º da petição; i) Condenados os réus a pagar à autora a quantia de €24.600,00 a títulos de danos patrimoniais e €10.000,00 a título de danos não patrimoniais; j) Condenados os réus a pagar aos autores a indemnização que vier a ser liquidada em execução de sentença, pelos prejuízos que vierem a causar, decorrentes da ocupação indevida do seu identificado prédio e da perda de negócios a realizar com terceiros, relativos ao mesmo prédio.

    Para tanto alega, em síntese, que os réus C. L. e A. C. outorgaram escritura de justificação notarial de posse e doação no dia 27.06.2014, na qual: - se arrogaram proprietários dos prédios aí identificados com base na falsa arguição de que os adquiriram por compra verbal no ano de 1977 e desde essa data os vêm possuindo como se proprietários fossem, continuamente, publicamente, de boa-fé e sem oposição de quem quer que seja; e também - declararam doá-los ao réu J. C. que os aceitou.

    Os terrenos desses prédios sempre fizeram parte de um imóvel denominado “Propriedade V.” comprado pela autora por escritura pública de compra e venda outorgada em 22.03.2000, que os vem possuindo por si e antepossuidores em termos compatíveis com a sua aquisição originária por usucapião, para além de beneficiar do respetivo registo de aquisição.

    Em 2013, os réus procederam à invasão desses terrenos, onde cortaram árvores, o que deu origem a reação da autora, através de participação crime, mantendo desde então ocupação dos mesmos, contrária à vontade da autora que, assim, vem sofrendo prejuízos patrimoniais (resultantes do abate, da queima de árvores e da privação de obter o normal aproveitamento dos respetivos frutos, arrendando-os a terceiros) e não patrimoniais.

    Pelos réus C. L., A. C. e J. C. foi apresentada contestação onde concluem entendendo dever a ação ser julgada improcedente e os réus absolvidos do pedido reafirmando o que consta da escritura de justificação, nomeadamente a aquisição verbal e a posse mantida desde 1977, impugnando a tese de que os terrenos aludidos na escritura pertençam aos prédios objeto da escritura pública de compra e venda outorgada pela autora no ano 2000.

    *Foi declarada a incompetência do Juízo de Competência Genérica de Cabeceiras de Basto, em razão de valor, e determinada a remessa dos autos ao Juízo Central Cível de Guimarães.

    *Foi dispensada a realização da audiência prévia, proferido despacho saneador, foi identificado o objeto do litígio e enunciados os temas da prova.

    *B) Realizou-se julgamento e foi proferida sentença onde foi decidido julgar a presente ação parcialmente procedente e, em consequência: I. Declarar falsas as declarações de justificação prestadas pelos 1ºs réus na escritura outorgada no dia 27 de junho de 2014, identificada no facto provado número 1; II. Declarar que a propriedade dos prédios mencionados e identificados na escritura referida na alínea anterior, não foi adquirida por usucapião pelos 1ºs réus e que estes não são seus donos e legítimos possuidores, condenando-os a reconhecê-lo; III. Declarar nula a doação feita pelos 1ºs réus ao 2º réu dos prédios objeto da mesma escritura de doação outorgada no dia 27 de junho de 2014; IV. Ordenar o cancelamento de todos os registos feitos com base na escritura de justificação e doação outorgada no dia 27 de junho de 2014; V. Declarar a autora dona e legítima possuidora do prédio identificado nos factos provados números 4 e 5 da presente decisão.

    No mais foi decidido julgar a ação improcedente, nessa parte se absolvendo os réus.

    *C) Inconformados com a sentença, vieram os réus C. L., A. C. e J. C. interpor recurso (fls. 115 vº e segs.) que foi admitido como sendo de apelação, a subir nos próprios autos, com efeito devolutivo (fls. 143).

    *Nas alegações de recurso dos réus C. L., A. C. e J. C., são formuladas as seguintes conclusões: 1ª Foi considerado na sentença que a autora logrou fazer prova da titularidade do prédio rústico denominado "Propriedade V.", inscrito na matriz sob o artigo ...º sito no Lugar de ..., freguesia de ...; 2ª No entanto, foi também reconhecido na sentença proferida que a pretensão da autora não se esgotava no reconhecimento daquele direito; 3ª Antes visava também a pretensão do reconhecimento de que os terrenos que os réus se arrogavam proprietários na escritura de justificação notarial eram parte integrante da mencionada "Propriedade V."; 4ª Acontece, porém, tal como é reconhecido na sentença, que a autora não logrou fazer prova daquele objetivo, pois não demonstrou o exercício dos atos de posse sobre tais terrenos; 5ª Assim, se até na própria sentença se reconhece a falta de prova pela autora sobre aquela matéria, tanto bastaria para a ação ser julgada totalmente improcedente e os réus absolvidos de todos os pedidos; 6ª Tanto mais que a autora não demonstrando ser dona dos prédios ocupados pelos réus mencionados na escritura de justificação notarial, nem sequer teria legitimidade para atacar a escritura de justificação notarial; 7ª Nem os pedidos de impugnação da aquisição daqueles prédios pelos 1ºs réus por usucapião, nem a transmissão por doação, a favor do 2º réu; 8ª Já que a autora não provou nem demonstrou que através da escritura de 22 de março de 2000 adquiriu os prédios que os réus estão a ocupar correspondentes à escritura de justificação notarial invocada; 9ª Faltando-lhe, por isso, legitimidade processual para instaurar ação judicial a impugnar judicialmente aquela escritura de justificação notarial, nem as declarações nela ínsitas; 10ª Porquanto, nos termos do artigo 30º do CPC, só seria parte legítima se tivesse interesse direto em demandar e se tivesse alguma utilidade na procedência da ação, o que, como se demonstrou, não se verificou; 11ª Porquanto a autora como é referido na sentença, não provou nem demonstrou que os prédios ocupados pelos réus lhe pertencessem, sendo os réus absolvidos daquele pedido de restituição e da indemnização peticionada; 12ª Conclui-se, assim, que a autora não demonstrando ser dona e legítima proprietária dos terrenos ocupados pelos réus não possui qualquer interesse direto em agir contra os réus e contra aquela escritura de justificação notarial; 13ª Daí que a autora careça de legitimidade para pôr em causa aquela escritura de justificação notarial e as declarações nela contidas, sendo-lhe também indiferente a doação feita pelos 1ºs réus ao 2º réu e o cancelamento dos registos feitos com base naquela escritura; 14ª Não tem, por isso, a autora legitimidade para obter a nulidade da escritura de justificação notarial, nem o cancelamento dos registos efetuados pelos réus; 15ª Pelo que a sentença tem de ser revogada nos pedidos de nulidade daquela escritura e do cancelamento dos registos; 16ª Não havendo, por outro lado, que retirar qualquer efeito ou consequências jurídicas da declaração de propriedade constante da apreciação parcial do pedido da autora formulado na alínea f) do petitório, já que a mesma se encontra desacompanhada da declaração de que os prédios identificados na escritura de justificação notarial faziam parte integrante da "Propriedade V."; 17ª Sendo, assim, inócua a parte da sentença proferida de que a autora é dona e legitima proprietária do prédio identificado na petição inicial sob o artigo ...º não produzindo qualquer consequência negativa para os réus sendo inofensiva e não atingindo a esfera jurídica dos réus e dos seus direitos legítimos; 18ª É que a compra pela autora dos prédios da antiga matriz predial rústica sob os artigos ...º, ...º, ...º e ...º, referenciados na escritura celebrada em 22 de março de 2000, não englobaram e deixaram de fora os artigos ...º e ...º da antiga matriz predial rústica e que eram também pertença do proprietário R. C.; 19ª Aliás, nunca os réus puseram em causa que a autora tivesse adquirido a denominada "Propriedade V." por escritura celebrada em 22 de março de 2000; 20ª Outrossim, os réus, o que contestaram foi que aquela "Propriedade do ..." também integrasse os prédios que estão a ocupar e que correspondem aos artigos ...º e ...º da matriz antiga, objeto da escritura de justificação que os 1ºs réus celebraram: 21ª Fica, assim, também demonstrada com toda a clareza que a autor nunca poderia reivindicar a totalidade dos prédios pertencentes aos proprietários R. C. e E. C., nomeadamente os correspondentes àqueles artigos...

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