Acórdão nº 2112/18.5T8CHV.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelJOSÉ ALBERTO MOREIRA DIAS
Data da Resolução21 de Outubro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores do Tribunal da Relação de Guimarães Relatório A. R.

(entretanto falecido, encontrando-se a ação a correr termos com os respetivos sucessores) e mulher, M. S. , residentes na Rua … n.º … Vila Nova de Monforte, ..., instauraram a presente ação declarativa, com processo comum, contra E. B., residente na Rua …, n.º … Vila Nova de Monforte, ..., pedindo a condenação desta a: a- reconhecer os Autores, com exclusão de outrem, como donos e legítimos proprietários do prédio identificado no art. 1º da petição inicial; b- reconhecer a existência de uma servidão a pé e de carro, com as características descritas e com a extensão indicada nos pontos 7º a 12º (além de outros) da presente petição inicial, com início no caminho público a norte do prédio da Ré, e termo na extrema norte do prédio dos Autores, ao longo da extrema nascente do prédio desta última; c- manter o espaço da servidão livre e desimpedido e a permitir o acesso dos Autores, sem qualquer constrangimento ao seu direito, independentemente da hora do dia ou da noite; d- tapar e/ou arrumar a vala aberta de modo a que os Autores possam passar no espaço da servidão para o seu prédio sem qualquer constrangimento, de forma cómoda como sempre o fizeram; e- retirar os castanheiros novos que impedem o exercício da servidão, mudando-os para outro lugar onde não impeçam a passagem dos Autores; Subsidiariamente, no caso da improcedência de todos aqueles pedidos: f- ser proferida sentença por meio da qual seja constituída uma servidão a pé e de carro, situada entre o caminho a norte e o prédio dos Autores a sul, numa extensão de 116 metros de comprimento e a largura de 4 metros, que onerará o prédio da Ré acima descrito, mediante o pagamento de uma indemnização que o tribunal entender justa, não devendo exceder a quantia de 20,00 cêntimos por cada m2.

Para tanto alegam, em síntese, serem donos e legítimos proprietários do prédio rústico composto de terreno de cultivo, com a superfície de 2.980 m2, sito em ..., inscrito na matriz predial rústica da União de Freguesias de ... e … sob o art. ..., o qual lhes foi doado pelos pais do Autor-marido em meados de 1982; Alegam factos tendentes a demonstrar terem adquirido o direito de propriedade sobre esse prédio por usucapião e sustentam que este se encontra com propriedade inscrita em seu nome na Conservatória do Registo Predial; Por sua vez, a Ré é dona e legítima proprietária do prédio rústico inscrito na matriz sob o art. …; O prédio dos Autores não tem comunicação com a via pública e há mais de 50 e 60 anos que os Autores e os seus antecessores vêm acedendo a pé e de carro (trator) ao seu prédio para o lavrar e tratar por uma servidão de passagem ou rodeira existente no prédio da Ré, com quatro metros de largura, numa extensão de cerca de 116 metros, sendo que tal servidão tem o seu início junto ao caminho público a norte, prolongando-se ao longo de toda a extrema nascente, até atingir o prédio dos Autores; Há cerca de dois anos, a Ré lavrou abusivamente o espaço da servidão e ali plantou oito castanheiros, assim como ao fundo do seu terreno, a sul, abriu uma vala que impossibilita a passagem do trator dos Autores.

A Ré contestou impugnando a generalidade da facticidade alegada pelos Autores.

Conclui pedindo que a ação seja julgada improcedente e que a ser constituída a servidão de passagem pelo prédio daquela em benefício do dos Autores, estes devem ser condenados numa indemnização nunca inferior a 195.300,00 euros.

Ordenou-se a realização de arbitramento tendo em vista fixar o valor da presente ação.

Realizado esse arbitramento, fixou-se o valor da ação em 12.424,80 euros, proferiu-se despacho saneador tabelar, dispensou-se a fixação do objeto do litígio e dos temas da prova, e conheceu-se dos requerimentos probatórios apresentados pelas partes.

Entretanto, faleceu o Autor A. R., pelo que foram habilitados os seus sucessores.

Realizada a audiência final, proferiu-se sentença julgando a ação parcialmente procedente, a qual consta de seguinte parte dispositiva: “Pelo exposto, julgo a ação parcialmente procedente por provada e, em consequência:

  1. Declaro que a Autora M. S.

    e as Intervenientes A. S. e N. R., sendo a primeira por si e as três na qualidade de sucessoras de A. R., são proprietárias do prédio rústico composto de terreno de cultivo, com a superfície de 2980 m2, sito na ..., inscrito na matriz predial da União das Freguesias de ... e ... sob o artigo ... e descrito na Conservatória de Registo Predial n.º ....

  2. Declaro que o prédio da R. descrito no artigo 5º e 6º dos factos provados se encontra onerado com uma servidão de passagem, em benefício do prédio descrito em 1) e 2), tratando-se de um caminho a pé e de carro que se localiza ao longo da estrema nascente – lado esquerdo ou parte de baixo colocando-se o observador no caminho público – do prédio da Ré, com 4 metros de largura e uma extensão de cerca de 116 metros, com o seu início junto ao caminho público a norte, prolongando-se ao longo de toda a estrema nascente, até atingir o prédio dos Autores.

  3. Condeno a Ré a manter o espaço da servidão livre e desimpedido e a permitir o acesso dos Autores, sem qualquer constrangimento ao seu prédio, independentemente da hora do dia ou da noite.

  4. Condeno a Ré a tapar e ou arrasar a vala aberta de modo a que os Autores possam passar pelo espaço da servidão para o seu prédio sem qualquer constrangimento como sempre o fizeram.

  5. Absolvo a R. dos demais pedidos formulados pelos AA.

    Custas pelos AA e pela R. na proporção dos respetivos decaimentos que se fixam em 10% e 90% respetivamente, considerando o decaimento dos AA. no pedido formulado em e) (art. 527º nºs 1 e 2 do CPC)”.

    Inconformada com o assim decidido, a Ré interpôs o presente recurso de apelação, em que formula as seguintes conclusões: 1 – A sentença em apreço condenou a ré a reconhecer que o seu prédio se encontra onerado com uma servidão de passagem em benefício do prédio dos autores, tratando-se de um caminho a pé e de carro que se localiza ao longo da extrema nascente do prédio da ré, com 4 metros de largura e uma extensão de cerca de 116 metros, como início junto ao caminho público.

    2 – Relativamente aos factos provados com relevância para a condenação sobredita a douta sentença apenas apurou: “Tal servidão sempre se revelou até à data descrita em 16 (há cerca de 2 anos tendo em conta a data da entrada da petição inicial) por sinais de carácter permanente, por meio de uma rodeira ou caminho lavrado visível no solo desde há mais de 50 anos”.

    3 – Diz a sentença recorrida: “Os factos descritos em 12 e 18, designadamente a existência da referida servidão de passagem no terreno da Ré resultou da análise conjugada da prova testemunhal produzida, declarações de parte e também da própria inspeção ao local”.

    4 - A inspeção ao local atesta apenas os factos constatados nesse dia e não factos que têm de se produzir ao longo de 20 anos, embora não se veja nas fotografias juntas quaisquer sinais visíveis e permanentes.

    5 – A menção que a ré em depoimento de parte “escorregou” admitindo a passagem dos autores pelo seu terreno, não corresponde à verdade como se poderá verificar no seu depoimento gravado em 202101112145917_1356467_2871893, onde a ré afirmou várias vezes que os autores não passavam pelo seu terreno e que após a entrada da ação em Tribunal, tinham passado lá uma vez, o que sabia pois tinham lavrado metade da sua terra.

    6 - O Sr. R. A., sobrinho do falecido autor também de nome A. R. prestou o seu depoimento no áudio com a menção 20210112153827_1356467_2871893; a grande parte do seu depoimento foi focado no tamanho da vala que divide os prédios dos autores e da ré e referiu uma única vez e completamente “de passagem” que havia trilhos de passagem ao minuto 7:41.

    7 - Já o senhor A. T. (20210113142910_1356467_2871893) se bem que afirmasse que se passava pelo terreno da ré, também disse: “Passava-se pelo lado que estava livre (..) porque antigamente semeavam-se lá batatas (…) junto à extrema a terra era cultivada, não havia caminho marcado (19:47) (…) o senhor C. R. passava por onde lhe dava jeito (20:00) ali não há caminho nenhum (…) quando lá passam (41:26) lavram. Quando se trepa lavra-se”.

    8 – Do depoimento do Sr. A. T. pode-se inferir, salvo melhor opinião, que pelo prédio da ré passava o autor ou alguém a seu mando, mas que não existiam sinais visíveis e permanentes de tal passagem.

    9 - Já quanto ao depoimento da Dª M. R., irmã do falecido autor A. R. só em 6:55 responde “Pois” à pergunta do advogado dos autores “Não seria a passagem?”.

    10 - Quanto à testemunha M. R., também irmã do falecido autor A. R., cujo depoimento está gravado em 20200113151319_1356467_2871893, disse aos 8:10 minutos que o seu pai passava por onde desse menos prejuízo e a 18:20 repete entrava por onde desse menos prejuízo e logo à frente refere expressamente: ”Nunca lá vi sinais nenhuns; estava tudo lavrado”.

    11 - Também a testemunha citada pela Exmª Juíza a quo, G. J., cujo depoimento se encontra gravado em 2021011354933_1356467_2871893, refere ao longo do seu depoimento que o sobrinho (R. A. sobrinho do falecido autor) passava e lavrava quando passava (7:50) e aos 16:00 minutos afirma que nunca houve caminho, lavrava sempre.

    12 - Por tudo o que até aqui foi escrutinado nos depoimentos das testemunhas onde a Senhora Juíza assentou a sua convicção concordamos com esta quando diz: “Efetivamente, as testemunhas confirmaram ao Tribunal que a passagem para o terreno dos autores sempre foi pelo terreno da ré, desde o tempo do C. R., pai do autor marido, por ali se passando a pé e com as burras/vacas e depois com o trator, o qual conseguia passar por cima da vala que antes era um pequeno rego ou agueira o qual dividia os prédios, cuja baixa profundidade sempre permitiu a passagem, apesar da elevação do prédio dos autores face ao da ré.” Tal conclusão da Senhora Juíza não se nega e está patente nos depoimentos atrás enunciados.

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