Acórdão nº 2480/17.6T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelANTÓNIO BARROCA PENHA
Data da Resolução21 de Janeiro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I.

RELATÓRIO Caixa ..., S.A.

propôs a presente ação declarativa comum contra D. S., D. A.

e T. S.

, peticionando que: a) se julgue ineficaz relativamente à autora, a doação objeto de impugnação, permitindo-se à CAIXA ... executar aquele património na esfera jurídico-patrimonial do donatário com vista à cobrança coerciva do seu crédito; Subsidiariamente, e no caso de improcedência do pedido principal, b) se declare nula a doação operada, por simulação absoluta, ordenando-se o respetivo cancelamento do registo da aquisição.

Alegou para o efeito, em síntese que: - Celebrou com D. S., aqui 1.º Réu, na qualidade de garante/fiador, dois contratos de mútuo, tendo sido dada de garantia de todas as responsabilidades decorrentes dos mesmos contratos a favor da CAIXA ... hipoteca voluntária sobre as frações melhor identificadas nos contratos celebrados; - A mutuária deixou de cumprir a obrigação de pagamento das prestações mensais dos empréstimos, em Abril de 2011, tendo entretanto sido declarada a insolvência da mutuária em 15.07.2011; - Não obstante a venda das identificadas frações em processo de insolvência, remanesce em dívida, no que respeita aos financiamentos aludidos, e à data de 12.04.2017, a quantia total de € 112.976,79; - Após diligências efetuadas pela autora, constatou-se que únicos bens dos quais o fiador, aqui 1º réu, era proprietário, suscetíveis de satisfazer o montante remanescente em dívida, haviam por este sido doados, com reserva de usufruto, aos seus filhos, aqui demais réus, por escritura pública de doação celebrada a 06.02.2013; - Aquando da aludida transferência de propriedade, conhecia o 1º réu a sua posição de devedor à CAIXA ..., assim como tinha a perfeita consciência que não tinha hipótese de honrar os seus compromissos bancários assumidos com a CAIXA ...; - E que, para além dos imóveis doados, não detinha património suscetível de constituir garantia de pagamento das dívidas contraídas pela mutuária, das quais era responsável solidário e principal pagador; - As doações efetuadas impedem a Caixa … de obter satisfação integral dos seus créditos; - A declaração de vontade constante da dita escritura pública de doação não corresponde à efetiva e real vontade dos declarantes, pois que que o doador não quis doar aos seus filhos os aludidos bens, nem estes (menores de 5 e 3 anos de idade) quiseram tomar de doação os mesmos imóveis, tanto quanto é certo que o 1º réu continuou a agir como se de verdadeiro proprietário dos imóveis doados fosse.

Os réus contestaram, invocando, desde logo, a existência de contradição entre o pedido subsidiário e a causa de pedir, por não ser a ação de impugnação pauliana o meio processual adequado à verificação da simulação.

Impugnando, alegaram, em síntese, que: · O primeiro réu assumiu somente a qualidade de fiador e principal pagador, nunca tendo expressamente renunciado ao benefício da excussão prévia (art. 638º, n.º 1, do C. Civil), nem tão pouco, atendendo à modalidade de pagamento em prestações do mútuo, ao benefício do prazo previsto no art. 782º, do C. Civil; · Em momento algum a autora resolveu os contratos de mútuo em relação ao réu D. S., nunca o tendo interpelado para pagar, nem para pôr termo à mora; · O valor dos imóveis doados sempre seria insuficiente para pagar a dívida em causa, uns pelo seu valor ser diminuto, outros, porquanto têm registada a favor de terceiro (Banco ..., S.A.) uma hipoteca; · O primeiro réu tem património muito superior aos valores dos prédios doados.

· O negócio de doação dos imóveis aos seus filhos resultou de acordo em processo de divórcio com a sua ex-mulher, de modo que os filhos menores de ambos pudessem ficar proprietários dos mesmos imóveis.

Impugnaram ainda o montante de juros calculados, porquanto não é indicado o prazo a que se referem os referidos juros, invocando que os mesmos estão parcialmente prescritos.

Concluem que a presente ação de impugnação pauliana ser julgada improcedente, por não provada e, em consequência ser considerado válida e eficaz em relação à autora a doação efetuada pelo réu D. S. aos seus filhos menores e também réus D. A. e T. S.. Deve igualmente ser considerado improcedente, por não provado, o pedido de nulidade por simulação da doação efetuada pelo réu D. S. aos seus filhos menores e também réus.

Notificada para o efeito, a autora respondeu à matéria de exceção deduzida na contestação através do requerimento de fls. 216 a 219.

Na audiência prévia, foi proferido despacho saneador em que se indeferiu liminarmente o pedido formulado pelos réus no sentido de ser considerada válida e eficaz em relação à autora a doação efetuada pelo réu D. A. aos seus filhos menores, bem como se julgou não verificada a exceção dilatória de ineptidão da petição inicial/erro na forma de processo. Fixou-se ainda o objeto do litígio e enunciaram-se os temas da prova.

Procedeu-se à realização da audiência de julgamento.

Na sequência, por sentença de 8 de Maio de 2020, veio a julgar-se improcedente a presente ação e, em consequência, os réus absolvidos dos pedidos formulados, quer a título principal, quer a título subsidiário.

Inconformada com o assim decidido, veio a autora Caixa ..., S.A interpor recurso de apelação, nele formulando as seguintes CONCLUSÕES DA IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO.

AMPLIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO E REAPRECIAÇÃO DA PROVA GRAVADA.

1) Em face da prova produzida em juízo, documental e testemunhal, deveria ter sido dado como provado o seguinte facto: O Réu D. S. tinha perfeito e cabal conhecimento do incumprimento emergente dos financiamentos melhor identificados na petição inicial antes da instauração da presente ação.

2) Tal factualidade, alegada pela ora Apelante nos artigos 15.º a 17.º da petição inicial, resulta demonstrada, à saciedade, pelo próprio depoimento de parte do Réu, cfr. ficheiro n.º 20200228144821_5463243_2870507, minutos 6h42 a 8h09, minutos 10h00 a 10h30, minutos 31h47 a 34h26 e cfr. ficheiro n.º 20200228153302_5463243_2870507, minutos 17h46 a 20h29.

3) O Réu D. S. confessou que tinha perfeito conhecimento da dívida antes da instauração da presente ação de impugnação pauliana.

4) O Réu é gerente de uma empresa, pessoa envolvida e habituada ao tráfico comercial e jurídico, ou seja, tem de ter perfeito conhecimento das dívidas que titula, seja na qualidade de mutuário, seja na qualidade de fiador.

5) Só alguém com conhecimento de que tem dívidas e que podem vir a ser executadas, tem a necessidade de proteger os bens registados que dispõem na sua esfera jurídico-patrimonial, como in casu sucedeu.

6) O Tribunal deu como provado os factos melhor elencados nos pontos 2.27 e 2.29 e deu como não provado “que o primeiro réu, até ao momento em que foi citado para a presente demanda, desconhecia a existência do crédito da autora”, pelo que não devia ter julgado a ação improcedente.

7) O Réu tinha a perfeita consciência de que não tinha hipótese alguma de honrar os compromissos bancários assumidos com a CAIXA ..., razão pela qual nunca procedeu ao pagamento a que estava obrigado.

8) Da análise da seleção da matéria de facto feita pela 1.ª instância, impõe-se a ampliação da matéria de facto por este Tribunal da Relação, de molde a que se incluam nos factos provados o melhor identificados supra com a consequente anulação da decisão de 1.ª instância, nos termos e ao abrigo do disposto no art.

662.º, n.º 2, al.

  1. do CPC.

    9) Devendo, na lógica do supra exposto e da peticionada alteração da matéria de facto, ser excluído o facto n.º 2.30 e n.º 2.31 dados como provados na sentença.

    10) Os factos “- que no empréstimo referido em 2.1.

    o primeiro réu declarou constituir-se fiador solidário; que a autora foi citada no mencionado processo de insolvência; que os autos de insolvência referidos em 2.18.

    iniciaram-se com a apreensão dos bens imóveis supra identificados, designadamente a fracção autónoma designada pela letra “S” e 29/500 da fracção autónoma designada pela letra “A”; que foram esses os imóveis adquiridos como descrito em 2.20; que o crédito da autora sobre o primeiro réu, à data de 12.04.2017 ascendia a € 112.976,79;” estão em contradição com os factos dados como provados, pelo que devem ser excluídos do elenco dos factos não provados.

    11) A lei clara quanto à solidariedade da fiança, pelo que o Tribunal laborou em erro ao decidir dar como não provado que o fiador não é fiador solidário.

    12) Resulta à saciedade dos autos, quer através dos documentos, quer através do depoimento da testemunha arrolada pela CAIXA ... (cfr. ficheiro n.º 20200228153302_5463243_2870507, minutos 05:26 a 14h30), que a CAIXA ... foi citada para reclamar créditos no processo de insolvência da mutuária e que os bens imóveis aí vendidos eram os bens imóveis hipotecados.

    13) Dá, ainda, o Tribunal como não provado a seguinte factualidade: “- que aquando da doação, o réu D. S.

    tinha a perfeita consciência de que não tinha hipótese alguma de honrar os compromissos bancários assumidos com a CAIXA ...

    , razão pela qual nunca procedeu ao pagamento a que estava obrigado e que, para além dos imóveis doados, não detinha qualquer património suscetível de constituir garantia de pagamento das dívidas contraídas pela mutuária;- que as doações aos aqui réus T. S.

    e D. A.

    impedem a CAIXA ...

    de obter a satisfação integral dos seus créditos, facto de que o primeiro réu tem, e tinha, perfeito conhecimento porquanto no seu universo patrimonial inexiste, como inexistia à data, quaisquer outros bens livres de ónus ou encargos que pudessem (e possam) garantir a satisfação do crédito da autora;” 14) O Tribunal ad quo dá como provado que, aquando da doação, o Réu D. S. era conhecedor da sua posição de devedor à CAIXA ... (cfr. facto 2.27. dado como provado), bem como, a sua intenção foi a de se subtrair os imóveis doados da sua esfera jurídica e se furtar, desse modo, à ação dos credores (cfr. facto 2.29.

    dado como provado).

    15) Não se compreende, com o devido respeito que é muito...

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