Acórdão nº 6250/18.6T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Março de 2021
Magistrado Responsável | JOSÉ AMARAL |
Data da Resolução | 04 de Março de 2021 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO O autor N. D.
intentou, em 31-10-2018, no Tribunal de Guimarães, a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra a ré “Seguradoras ..., SA”.
Nela pediu a condenação desta a pagar-lhe a quantia global de €99.332,01, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, com juros de mora desde a data do sinistro, e, ainda, a quantia diária, a fixar equitativamente, correspondente à privação do veículo.
Alegou, na petição, em síntese, que, em 29-11-2017, sofreu as consequências de um embate entre o seu veículo automóvel QF e o NA seguro na ré, por causa e por culpa da condutora deste. Descreveu ter sofrido diversos danos, cujas 21 parcelas somam a referida quantia, além dos da privação do uso a fixar.
Juntou documentação.
A ré foi citada em 05-11-2018.
Aceitou, na contestação, a responsabilidade mas impugnou em grande parte os factos relativos aos danos, bem como os documentos, concluindo não dever a quantia pretendida.
O autor respondeu.
Foi dispensada a audiência prévia, proferido saneador tabelar, identificado o objecto do litígio, elencado o rol dos factos assentes e enunciada a temática a provar.
A audiência, iniciada em 03-12-2019, concluiu-se em 22-09-2020 e nela foram observadas as formalidades narradas nas actas respectivas, no seu decurso tendo sido, além do mais, tomado depoimento ao autor e inquiridas testemunhas de ambas as partes.
Com data de 26-10-2020, foi proferida a sentença, que culminou na seguinte decisão: “Em face do exposto, julgo parcialmente procedente a presente acção condenando a Ré a pagar ao Autor: A.
A quantia de € 44.604,90 (quarenta e quatro mil, seiscentos e quatro euros e noventa cêntimos), acrescida de juros calculados à taxa legal, contados sobre a quantia de € 42.104,90 (quarenta e dois mil, cento e quatro euros e noventa cêntimos) desde a data da citação e sobre a quantia de € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros) desde presente data, em ambos os casos até efectivo e integral pagamento; B.
A quantia diária de € 13,00 (treze euros), desde a presente data até efectivo e integral pagamento da indemnização aludida em A. supra.
Custas por Autor e Ré na proporção do decaimento (artigo 527º do CPC).” A ré seguradora não se conformou e apelou.
Concluiu deste modo as suas alegações [1]: “I- A Ré impugna, por entender que foram incorretamente julgados, a decisão proferida quanto ao facto do ponto 12 da matéria dada como provada e pontos 1 e 2 da matéria dada como não provada II- Para formar a sua convicção quanto ao cerne dos factos em causa, ou seja, quanto ao valor comercial do QF à data do acidente, o julgador ateve-se, essencialmente, ao relatório da avaliação do “Eurotax” que consta a fls 26 e 27 dos presentes autos.
III- O documento em causa não está assinado, contém imprecisões consistentes na indicação de equipamentos duplicados ou inexistentes (cfr motivação da decisão da matéria de facto, fotografias que a Ré juntou como Doc 2 com a sua contestação, ofício da Mercedes-Benz Portugal que deu entrada nestes autos no dia 22/04/2029, com a Ref Citius 8549186, fatura de venda do QF em novo ao autor, que deu entrada nestes autos no dia 04/04/2019, com Ref Citius 8481917 e depoimento da testemunha J. M., supervisor do serviço de peritagens da Ré (cfr passagens dos minutos 12m07s a 14m36s do seu depoimento gravado no sistema H@bilus no dia 22/09/2020, entre as 15h15m23s e as 15h44m29s (ficheiro áudio 20200922151523_5628699_2870529.wma), e dele não consta qualquer explicação quanto aos critérios usados para alcançar os valores indicados no relatório de fls 26 e 27, não se sabendo, nomeadamente, se são resultado de meras operações matemáticas (nomeadamente a aplicação de algum fator percentual de desvalorização ao preço em novo do veículo), ou se resultam de alguma consulta efetiva ao mercado, o que não resulta minimamente justificado nesse documento IV- Assim, entende a recorrente que, o documento em causa não é, de modo algum, fiável e que, ao reconhecer a tal elemento de prova a valia suficiente para indicar ou confirmar o valor do veículo e, do mesmo passo, ao não ter considerado outros elementos de prova que trouxeram aos autos informação sobre o efetivo valor de mercado desse carro, o julgador, a nosso ver, incorreu em erro de julgamento.
V- A esse propósito depôs em audiência de julgamento a já falada testemunha J. M., que exerce funções de perito avaliador supervisor ao serviço da ré, o qual esclareceu as diligências que efetuou para apurar o valor de mercado do QF, resultando das suas declarações que tal veículo valia, à data do acidente, 38.000,00€, montante pelo qual poderia ser adquirido no mercado de usados um automóvel igual.
VI- Assim, no seu depoimento gravado no sistema H@bilus no dia 22/09/2020, entre as 15h15m23s e as 15h44m29s (ficheiro áudio 20200922151523_5628699_2870529.wma), nas passagens dos minutos 02m04s a 3m24s, 3m44s a 3m50s, 6m11s a 6m54s, 7m35s a 10m15s, 11m09s a 14m, 14m37s a 15m47s, 25m49s a 27m42s, esta testemunha relatou que, depois de lhe ter sido solicitada a realização de diligências para apuramento do valor do QF, pediu uma nova cotação Eurotax (cujo relatório se juntou como Doc 13 com a contestação da ora recorrente, apontando para 38.000,00€) e, sobretudo, consultou diretamente ao mercado, mais precisamente concessionários da marca Mercedes-Benz.
VII- No que toca à avaliação do Eurotax, foi obtida pela testemunha J. M. uma “cotação” no valor de 38.050,00€ (Doc 13 junto com a contestação); porém, mais importante do que isso, esta testemunha relatou o resultado da consulta que fez junto de “Stand” da própria marca, no âmbito da qual lhe foi feita a indicação de um valor de mercado para o QF de 35.000,00€.
VIII- Como esclareceu esta testemunha, não obstante tenha obtido a indicação pela própria marca de que o QF valia 35.000,00€, aceitou atribuir a esse carro o valor indicado na cotação do Eurotax que obteve, por ser superior.
IX- As declarações prestadas pela testemunha J. M. afiguraram-se credíveis e não foram postas em causa por qualquer outro elemento de prova constante dos autos, ou pelo depoimento de qualquer outra testemunha, sendo que o valor indicado por esta testemunha para o QF é aproximado ao que consta nos anúncios que o próprio autor juntou como Doc 9 e 10 com a sua petição inicial, que apontam para uma valorização de entre 40.000,00€ e 42.500,00€, apesar de se dever salientar que o veículo mencionado no Doc 9 (valorizado em 42.000,00€) tem menos de metade dos quilómetros do QF.
X- Assim, considera a Ré que, atendendo ao ofício da Mercedes-Benz Portugal que deu entrada nestes autos no dia 22/04/2029 (Ref Citius 8549186) e à fatura de venda do QF em novo ao autor (que deu entrada nestes autos no dia 04/04/2019, com Ref Citius 8481917), enquanto elementos que demonstram que no relatório de fls 26 e 27 dos autos não é feita uma descrição exata das características do QF, conjugados com o depoimento da testemunha J. M., gravado no sistema H@bilus no dia 22/09/2020, entre as 15h15m23s e as 15h44m29s (ficheiro áudio 20200922151523_5628699_2870529.wma), nas passagens dos minutos 12m07s a 14m36s,9m11sa 19m15s,2m04sa3m24s,3m44sa 3m50s,6m11sa 6m54s,7m35s a 10m15s, 11m09s a 14m, 14m37s a 15m47s, 25m49s a 27m42 e ainda ao teor do relatório que a Ré juntou como Doc 13 com a sua contestação, se impunha decisão diversa da proferida quanto aos pontos da matéria de facto impugnados, pelo quie - deve ser dado como provado, quanto ao facto do ponto 12 da matéria de facto dada como provada, que: “ a viatura QF tinha, à data do acidente, um valor de mercado de € 38.000,00€ (artigo 38º da p.i.).
- deve ser dado como provado, quanto ao ponto 1 da matéria de facto dada como não provada, que “À data do acidente, o veículo com a matrícula QF valia 38.000,00 € (artigo 13º da contestação).
- deve ser dado como provado, quanto ao ponto 2 da matéria de facto dada como não provada: “Era possível adquirir, na altura do acidente, no mercado de usados, um veículo igual ao QF e no mesmo estado de conservação, pelo valor € 38.000,00 (artigo 14º da contestação).
O que se requer XI- A pretensão que o autor deduziu na PI a propósito dos danos sofridos pelo QF baseava-se ou tinha por objeto o alegado valor desse carro e não o custo da respetiva reparação, sendo certo que, lendo-se a douta petição inicial, bem como a contestação, verifica-se que as partes estavam, como estão, de acordo quanto à excessiva onerosidade da reconstituição natural, ou seja, a reparação do QF.
XII- Em face do que acima se expôs, o tribunal, ao atribuir ao Autor o custo da reparação do QF, quando o pedido formulado se baseava e consistia no alegado valor desse carro o julgador condenou a Ré em “objeto diverso do pedido”, o que acarreta a nulidade da douta sentença, nos termos do disposto no artigo 615.º n.º 1, alínea e) do CPC, a qual, expressamente, se invoca, devendo ser anulada a douta sentença, regressando os autos ao Tribunal de Primeira Instância, para que seja proferida nova decisão que supra esse vício.
XIII- O critério de “perda total” estabelecido no artigo 41.º do DL 291/2007, ainda que inserido num diploma destinado a regular os procedimentos extrajudiciais de reparação de danos emergentes de acidente de viação, deve ser usado, também, pelo julgador para integrar o conceito de excessiva onerosidade da reconstituição natural, estabelecido no n.º 1 do artigo 566º do Cod Civil.
XIV- Caso seja atendida a impugnação da decisão proferida quanto à matéria de facto, no que toca ao ponto 12 dos factos provados e 1 e 2 dos não provados, no sentido de que o valor de mercado do QF o de 38.000,00€, 120% desse montante ascende a 45.600,00€, ou seja, quantia inferior à da soma custo da respetiva reparação e o dos seus salvados, verificando-se, assim, a previsão da regra do artigo 41.º do DL 291/2007.
XV- Face ao exposto, entende a Ré que, seja por via da valorização, enquanto...
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