Acórdão nº 175/12.6TBVRM.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelJOAQUIM BOAVIDA
Data da Resolução11 de Março de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães (1): I – RELATÓRIO 1.1.

Na execução, fundada em sentença homologatória de transacção, que corre termos sob o nº 175/12.6TBVRM, no Juízo de Execução de Guimarães – Juiz 2 – do Tribunal Judicial da Comarca de Guimarães, instaurada por M. G.

contra A. J., o Executado interpôs recurso de apelação do despacho proferido em 14.11.2020, sob a referência citius nº 170489140, formulando, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões: «

  1. Vem o presente recurso interposto do despacho de 16.11.2020 que sob a referência 170489140 indeferiu o pedido de indeferimento da execução, por manifesta falta de título, assim como violação de normas processuais e substantivas pelas criminalmente mancomunadas exequente e agente de execução, com a consequente a declaração de nulidade e/ou anulação da venda.

  2. Contrariamente ao decidido pelo tribunal a quo, num Estado de Direito, o princípio do efeito da preclusão processual, não abrange nem convalida as situações ilícitas, aliás, criminosas, pois entre o valor Justiça, assegurado por uma tutela jurisdicional pronta e efetiva e o valor da certeza e de estabilidade das situações jurídicas, prevalece sempre o valor Justiça, até porque não há Estado de Direito sem Justiça.

  3. Ademais, o fim nobre que levou à institucionalização do monopólio estadual da administração justiça (evitar o arbítrio entre os humanos e a barbárie), em especial na parte coerciva, leva a que o juiz não possa descarregar no executado o odioso de não ter visto e alegado na alvorada do processo o que ele, juiz, também devia ex officio ter visto e, aliás, em primeiro lugar, mas outrossim não viu.

  4. No caso concreto dos autos, além de ser dada à execução sentença homologatória que não constitui título suficiente, exequente e agente de execução, por várias e repetidas vezes, enganaram rectius burlaram o tribunal, recorrendo a todo o tipo de logros de acordo com os momentos e impulsos processuais, desde o uso de documentos falsos, falsas informações, corrupção e prevaricação da senhora agente de execução, com o que a exequente obteve uma absurda e elevada vantagem patrimonial à custa do empobrecimento do executado.

  5. Nuclearmente está em causa a nulidade tout court (substantiva) da execução por, manifesta, falta de título e, ainda que assim se não considerasse, mas sem conceder, a monstruosa, aliás, ilícito-penal tortuosidade imprimida à execução pela senhora agente de execução que a mando da exequente violou normas materiais e processuais para satisfazer os desígnios, claramente, criminosos.

  6. O tribunal a quo entendeu que tendo havido oposição à execução e julgada esta improcedente se constituiu caso julgado quanto à validade e suficiência do título, pois que “…a preclusão da alegação de um fundamento distinto que já se verificava a partir do momento da entrega da petição inicial dos embargos de executado passa a atuar através da exceção de caso julgado, se esse fundamento for indevidamente alegado numa ação posterior.”.

  7. Ou seja, neste segmento o tribunal a quo não considerou que na execução o controlo da suficiência do título é do conhecimento oficioso e pode/deve ocorrer a todo o momento até à transmissão de bens a terceiros e que a respetiva nulidade (processual ou material) é insuprível nem por efeitos do caso de preclusão.

  8. Dessarte, o tribunal a quo, devia aplicar o artigo 732.º/6 do CPC na interpretação de que mesmo havendo oposição à execução, a sentença que sobre ela incidir apenas constitui caso julgado formal para as questões que em concreto tenham sido apreciadas e decididas e que, ao contrário do decidido, está sujeita à regra rebus si stantibus, de modo que o caso julgado formal não impede o juiz de posteriormente indeferir a execução se novos fundamentos sejam de fato sejam de direito sobrevierem ao seu conhecimento e que não havia detetado nem se pronunciado antes.

  9. O processo de execução não é um processo declarativo onde funcione o princípio do dispositivo, constituindo, aliás, e ao invés, um aliud, no qual é exercido o poder coercivo do Estado, não sendo, pois, lícito, sem mais, transportar as disposições de um para o outro, obtendo um resultado aberrante pela aplicação simbiótica de normas, como de resto o impõe o artigo 551.º/5 do CPC.

  10. Verdade é que é doutrina e jurisprudência pacífica de que a não dedução de oposição à execução, no prazo oportunamente assinalado ao executado, não o impede de propor ação declarativa que vise a repetição do indevido por inexistência na execução de ónus de concentração da defesa.

  11. Sendo isto assim, por maioria de razão é de concluir que nada impede o executado de, por simples requerimento, suscitar questões de que o juiz devia (deve) conhecer oficiosamente até que a execução esteja extinta, não valendo neste caso concreto a apressada extinção da execução decretada pela senhora agente de execução, posteriormente ao requerimento de nulidade de todo o processado, quer por falta de título quer pela conduta criminosa da agente de execução, exequente e demais representantes.

  12. É inconstitucional, por violar o artigo 20.º/1 e 4 da Constituição, a norma extraída do artigo 728.º/1 e 732.º/6 do CPC, na interpretação de que existe um ónus por parte do executado de concentração na oposição à execução e que, assim, a sentença proferida na oposição por embargos constitui caso julgado de questões que nela não foram colocadas nem conhecidas ou decididas e impede o juiz de posteriormente oficiosamente ou a requerimento indeferir a execução por falta ou insuficiência do título.

  13. Por outro lado, ao caso sub judice, o limite temporal balizado no artigo 734.º/1 do CPC (até ao primeiro ato de transmissão dos bens penhorados), não se aplica ao caso de que nos ocupamos, na medida em que, visando esta norma proteger terceiros de boa fé, a exequente, além de mala fide, aliás, criminosa, é a própria compradora! n) Que, note-se, na compra utilizou dinheiro proveniente de crimes (abuso de confiança qualificado, fraude fiscal qualificada, falsificação de documentos, burla agravada e branqueamento de capitais) posto que, abusando gravemente do cargo de cabeça-de-casal, antes havia roubado ao executado milhões de euros e a quantia depositada nestes autos, poucos dias depois foi devolvida àquela pela corrompida agente de execução que, a troco do pagamento da quantia de 49.733,45€, se havia deixado corromper para praticar atos ilícito-penais.

  14. Decorre do artigo 10.º/5 do CPC que a ação executiva já pressupõe a existência de um direito, que foi previamente declarado ou então está reconhecido num documento que é essencial neste tipo de ação, ou seja, o título executivo é o documento do qual resulta a exequibilidade de uma pretensão e, portanto, a possibilidade da realização coativa da correspondente prestação através de uma ação executiva.

  15. Neste processo executivo, foi dada à execução uma sentença homologatória de uma transação, já melhor descrita na decisão recorrida e da qual resulta que exequente e executado, enquanto irmãos e herdeiros, celebraram um contrato promessa de compra e venda de dois prédios incluídos na herança, tendo sido convencionado uma cláusula penal de 25 000,00€ para o eventual incumprimento.

  16. Destarte, é manifesta a falta de título para a presente execução, uma vez que o contrato celebrado e homologado, por sentença, foi um contrato promessa de compra e venda que se mostra por cumprir, faltando determinar jurisdicionalmente quem incumpriu o quê e porquê.

  17. A sentença que homologa a transação mediante a qual as partes celebraram um contrato de promessa de compra e venda, não constitui título suficiente para uma execução de pagamento de quantia certa, porquanto inexiste qualquer condenação ou obrigação de pagamento de qualquer quantia.

  18. Das cláusulas 1.ª a 3.ª da transação e correspondente parte dispositiva da sentença homologatória, alcança-se que o tribunal não adjudica os bens referenciados nos artigos 1.º e 2 da transação, antes condenando as partes a cumprirem o acordado contrato de promessa de compra e venda (necessariamente futuro).

  19. Através cláusulas 5.ª e 6.ª, vemos que as partes relegaram para momento posterior a fixação do preço que é condição de validade ou elemento essencial do contrato (formal) de compra e venda de imóvel e, não menos importante tem de constar no título, perceção que o comum dos mortais tem de quando vai outorgar uma escritura de um contrato de compra e venda de imóveis, pois o preço é condição sine qua non da respetiva realização do contrato.

  20. Pelo teor das cláusulas 7.ª e 8.ª sai reforçada a óbvia e única conclusão que estamos perante um contrato promessa de compra e venda, e não um contrato definitivo, pois vemos que as obrigações de constituição de hipoteca e pagamento do preço são projetadas para o futuro condicional o que, além do mais, se colhe do advérbio “será”, o que não deixa de ser sintomático que a vontade das partes foi a celebração de um contrato promessa e cujos contratos definitivos coenvolvem obrigações recíprocas tema que retomaremos.

  21. Apodítico de que se não está perante um contrato de compra e venda com efeitos reais, mas sim de um contrato promessa é o teor da cláusula 11.ª que estabelece a cláusula penal e que reza: «Em caso de incumprimento do ora acordado, o Autor pagará a título de cláusula penal a quantia de € 25 000,00 (vinte e cinco mil euros).» w) Trata-se, portanto, de uma cláusula penal estabelecida previamente entre as partes em caso de incumprimento do acordado e não – insista-se – pelo eventual incumprimento do pagamento do preço.

  22. Em tal medida, essa sentença homologatória é manifestamente insuficiente para servir de título à execução da pretendida obrigação de pagamento/indemnização, o que constitui vício insuprível determinativo da extinção da execução. - Ac. do STJ de 30.04.2015, processo 312-H/2002 in www.dgsi.pt y) No requerimento executivo, a exequente enganou literalmente o tribunal, pois refere (art. 5) “(…) o executado...

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