Acórdão nº 257/20.0T8VNF-D.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelJOSÉ ALBERTO MOREIRA DIAS
Data da Resolução04 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

RELATÓRIO.

S. M.

, residente na Avenida …, Amares, instaurou a presente ação de insolvência, requerendo que fosse declarada insolvente.

Por sentença proferida em 23/01/2020, declarou-se a requerente S. M. insolvente e, além do mais, nomeou-se administrador de insolvência, ordenou-se a imediata apreensão de todos os bens desta, ainda que arrestados, penhorados ou por qualquer forma apreendidos ou detidos, e fixou-se o prazo de trinta dias para a reclamação de créditos pelos credores da insolvente.

Essa sentença foi notificada aos demais credores e interessados, que foram citados por éditos e anúncios publicados no Portal Citius no dia 24/01/2020 para reclamarem os créditos sobre a devedora/insolvente, lendo-se nesse edital e no anúncio que: “Para citação dos credores e demais interessados correm éditos de 5 dias”.

“Ficam citados todos os credores e demais interessados de tudo o que antecede e ainda: o prazo para a reclamação de créditos foi fixado em 30 dias.

O requerimento de reclamação de créditos deve ser endereçado ao administrador de insolvência nomeado e apresentado por transmissão eletrónica de dados (n.º 2 do art. 128º do CIRE). Sempre que o credor não esteja patrocinado por advogado, o mesmo requerimento deve ser apresentado ou remetido por correio eletrónico ou por via postal registada ao administrador de insolvência nomeado, para o domicílio profissional constante do anúncio (nº 3 do art. 128º do CIRE), acompanhado dos elementos probatórios de que disponham.

Mesmo o credor que tenha o seu crédito reconhecido por decisão definitiva, não está dispensado de o reclamar no processo de insolvência, se nele quiser obter pagamento (n.º 5 do art. 128º do CIRE).

O requerimento de reclamação de créditos deve constar (n.º 1 do art. 128º do CIRE): - A proveniência do(s) créditos(s), data do vencimento, montante de capital e de juros; - As condições a que estejam subordinados, tanto suspensivas como resolutivas; - A natureza comum, subordinada, privilegiada ou garantida e, neste último caso, os bens ou direitos objeto da garantia e respetivos dados de identificação registral, se aplicável; - A existência de eventuais garantias pessoais, com identificação dos garantes; - A taxa de juros moratória aplicável.

(…).

Ficam ainda advertidos que os prazos para recurso, embargos e reclamação de créditos começam a correr finda a dilação e que esta se conta da data da publicação do anúncio eletrónico na Área de Serviços Digitais dos Tribunais, acessível no endereço eletrónico https://tribunais.org.pt”.

Em 24/02/2020, o administrador de insolvência juntou aos autos o auto de apreensão de bens, em que se lê que este apreendeu a favor da massa insolvente em 21/02/2020, os seguintes bens: Verba n.º 1 – fração autónoma designada pela letra “Q”, correspondente a estacionamento coberto e fechado, do prédio urbano sito na Rua …, n.º …, da União de Freguesias de …, concelho de Braga, registado na Conservatória do Registo Predial de … com o n.º …º e inscrito na matriz predial urbana sob o art. …º; Verba n.º 2 – prédio rústico denominado “Leira do …, Lado Sul”, composto de cultura arvense de regadio, sito no Lugar de …., freguesia de ..., concelho de Amares, registado na Conservatória do Registo Predial de … com o n.º … e inscrita na matriz urbana sob o art. …; e Verba n.º 3 – viatura automóvel da marca “Seat” com a matrícula ID.

Nesse auto de apreensão o administrador de insolvência consignou que “Por ainda não se ter procedido à apreensão material da viatura, e se desconhecer o estado em que a mesma se encontra, não se atribui qualquer valor à mesma”.

Por requerimento entrado em juízo em 10/03/2020, por apenso aos presentes autos de insolvência, J. J. e mulher, M. L., residentes no Lugar de …, n.º … Braga, requereram, ao abrigo do disposto no art. 144º do CIRE, a restituição e separação de bens apreendidos, pedindo que se: a) declare nulos, por simulados (e/ou falsos) os negócios de doação celebrados pelos requerentes a favor da sua filha, aqui insolvente/devedora, formalizados por escritura de doação do imóvel melhor identificado em 2 do presente requerimento e por documento particular (formulário) de doação do veículo automóvel melhor identificado em 3 deste requerimento, outorgado que foram pelos requerentes a favor da insolvente; b) ordenar a restituição do direito de propriedade que incide sobre a fração “Q”, melhor identificada em 2 supra, e que incide sobre o veículo automóvel com a matrícula ID, melhor identificado em 3 supra, na esfera patrimonial dos requerentes e, consequentemente, se digne determinar a separação desses bens da massa insolvente; c) ordenar o cancelamento dos registos efetuados com base nas transmissões da fração “Q” e do veículo automóvel ID, por doação, a favor da insolvente.

Para tanto alegam, em síntese, que a apreensão material efetiva do prédio urbano composto de casa de rés-do-chão para habitação, sito no n.º .. da Avenida ..., da freguesia de ..., concelho de Amares, descrito na Conservatória do Registo Predial de … com o n.º … e inscrito na matriz predial sob o art. …, teve lugar em 05/03/2020, depois de esgotado o prazo para a reclamação de créditos, cujo termo ocorreu em 28/02/2020; Por escritura pública de 23/03/2014, os requerentes doaram à insolvente, sua filha, o prédio urbano composto por garagem apreendido à ordem da massa insolvente, e por documento particular (formulário tipo) doaram à insolvente o veículo automóvel, também ele apreendido nos autos; Acontece que essas declarações negociais não estão de acordo com as vontades dos neles doadores e donatária; Essa divergência resulta de um acordo celebrado entre os requerentes e a insolvente em que incumbiram esta de “fazer a gestão do património dos requerentes, seus pais, forma então encontrada para ultrapassar os limites impostos pela idade avançada dos mesmos e para retirar da esfera jurídica dos requerentes o seu património, que ficou vazio, com o consequente e eventual prejuízo de potenciais credores ou outros”; As declarações negociais firmadas naqueles documentos são nulas, por simuladas; Não obstante essas declarações, são os requerentes que agem e atuam como verdadeiros donos e proprietários de tais bens, sendo eles que ocupam, fruem e possuem a fração “Q” (garagem) e que usam, fruem e possuem o veículo automóvel, sendo a requerente-mulher que tem “a direção efetiva” deste; São também os requerentes que usam e limpam, designadamente, pagam o seguro automóvel, titulado a favor da requerente-mulher, e que, inclusive, possuem o respetivo livrete, levam ou determinam quem leve o veículo ao centro de inspeções, para a realização das inspeções periódicas, entre outros.

Por despacho proferido em 24/04/2020, a 1ª Instância determinou que fosse lavrado termo de protesto a que alude o art. 146º, nº 3 do CIRE e ordenou a citação da massa insolvente, dos credores e dos devedores para contestarem, querendo, constando esse despacho do seguinte: “Lavre termo de protesto a que alude o artigo 146º, nº3 CIRE.

Cite a massa insolvente, os credores e a devedora para, querendo, contestarem a presente ação no prazo legal.

A citação dos credores será realizada por meio de edital eletrónico publicado no portal Citius, considerando-se os mesmos citados cinco dias após a sua publicação.

Notifique o A.”.

A massa insolvente contestou defendendo-se por exceção e por impugnação.

Invocou a exceção perentória da caducidade do direito dos requerentes a requereram a restituição e separação de bens apreendidos à ordem da massa insolvente, sustentando que contrariamente ao alegado pelos requerentes, os bens a que estes se reportam na petição inicial foram apreendidos a favor da massa em 21/01/2020 e, portanto, antes do termo do prazo fixado para a reclamação de créditos, que terminou em 28/02/2020, mas a petição de restituição e separação desses bens apresentada pelos requerentes deu entrada em juízo para além do prazo de cinco dias posteriores à apreensão desses bens, a que alude o art. 144º do CIRE; No entanto, tendo a apreensão dos bens sido realizada antes do termo do prazo fixado para a reclamação de crédito, o direito à separação e à reclamação tinha de ser exercido pelos requerentes até ao termo desse prazo para a reclamação de créditos, isto é, até 28/02/2020; Acresce que independentemente do acabado de expor, os requerentes têm perfeito conhecimento que os bens estavam apreendidos desde 21/02/2020, conforme é demonstrado pelo documento que juntam, enviado através da sua mandatária ao administrador de insolvência, em 03/03/2020; Conclui, sustentando que o direito de restituição e separação de bens que os requerentes exercem nos presentes autos de insolvência se encontra extinto, por caducidade; Exceciona sustentando que a nulidade dos negócios por simulação não pode ser invocada pelos requerentes, simuladores, contra terceiros de boa fé, como é o caso de todos os credores e da massa insolvente nos presentes autos; Impugna parte da facticidade alegada pelos requerentes.

Conclui que por via da procedência da exceção da caducidade ou, subsidiariamente, pela não prova da facticidade alegada pelos apelantes, se julgue a ação improcedente.

Também a devedora/insolvente S. M. contestou invocando a exceção perentória da caducidade do direito de restituição e separação que os requerentes vêm exercer nos presentes autos, alegando basicamente os mesmos argumentos que foram aduzidos pela contestante massa insolvente; Impugnou parte da facticidade alegada pelos requerentes, sustentando que as doações que estes lhe fizeram da garagem e do veículo automóvel são verdadeiras e efetivas doações.

Terminou pedindo que por via da procedência da exceção da caducidade se julgue extinta a presente instância ou, subsidiariamente, se julgue a ação improcedente por não provada.

Por articulado entrado em juízo em 28/05/2020, os requerentes J. J. e mulher, M. L., responderam a ambas as contestações, concluindo pela...

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